Acórdão nº 00638/15.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 09 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução09 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: A Ordem dos Advogados veio interpor presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 20.01.2021, pela qual foi julgada procedente a providência cautelar contra si intentada por M.

para suspensão da eficácia do despacho do Presidente do Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados, que determinou a execução da pena disciplinar de multa em que foi condenado o Requerente no âmbito de processo disciplinar, sob cominação de suspensão da inscrição como Advogado.

Invocou para tanto, em síntese, que o Tribunal recorrido ao deferir a requerida providência violou o disposto no n.º 2 do artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

O Recorrido contra-alegou defendendo a manutenção da decisão recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: A. Tendo sido notificada da decisão proferida nos presentes autos em 21.01.2021, a Requerida não se conforma com o teor do decisório em causa e, como tal, vem exercer o seu direito de recurso, nomeadamente por entender que o Tribunal recorrido laborou em equívoca apreciação tanto dos elementos de facto como de direito.

Desde já se diga que, B. A presente decisão cautelar visa secundar um pedido principal que não se poderá ter como procedente, desde logo porque, tendo sido apreciada a inimpugnabilidade do acto que o Requerente visou impugnar nos autos principais, e não tendo sido impugnado qualquer outro acto, nomeadamente, aquele que condenou o Recorrido na pena de multa, C. Não se conjectura como possível que os actos principais se possam deter sobre a apreciação da validade de um acto consequente de um acto pregresso que nunca foi impugnado.

D. Assim sendo, como é, não existe demanda principal por absoluta inexistência de objecto processual sobre o qual o Tribunal se possa pronunciar naqueles autos principais (Proc. n.º 638/15.1BEPRT que tramita na Unidade Orgânica 1 do TAF do Porto) e E. Nestes termos, tendo em conta a necessária instrumentalidade das providências cautelares, sempre se dirá que a presente providência cautelar carece de objecto de processo principal do qual se possa considerar instrumental e nestes termos, não poderá prevalecer, tendo em conta a sua dependência de um processo principal, F. Pelo que, sempre se dirá que a sentença ora colocada em crise procede a errónea apreciação dos factos, bem como a equívoca aplicação do direito, no sentido em que, tutela provisoriamente uma pretensão que não se encontra relacionada com um vínculo de instrumentalidade/dependência com qualquer pretensão principal, violando assim o previsto no n.º 1 do art.º 113.º CPTA.

Da errónea apreciação do pressuposto referente ao periculum in mora.

G. Do exercício argumentativo expendido pelo Recorrido no requerimento cautelar inicial salta à evidência, no que a este aspecto tange, que o mesmo apenas invoca um dano hipotético e meramente especulativo que resultará para si da impossibilidade de exercício da actividade profissional de advocacia, sendo certo que a pena disciplinar que lhe foi aplicada se resume a uma pena de multa no montante de 7.500,00 €.

H. No entanto, o Requerente apenas tenta demonstrar o preenchimento do pressuposto da perigosidade unicamente à luz da obrigação de cessar a sua actividade profissional como Advogado, invocando, a este propósito a hipótese da Recorrente exercer o efeito cominatório constante do previsto no art.º 143.º do EOA2015 (com idêntica redacção à do art.º 138.º do EOA2005), para o caso de haver incumprimento do pagamento da pena de multa que lhe foi aplicada.

I. Ora, por outro lado, o Recorrido não invoca, alega ou produz indício de prova de um qualquer argumento justificativo para o incumprimento da pena de multa que lhe foi validamente aplicada, tendo-se já sedimentado tal condenação como caso decidido.

J. E sempre o poderia ter feito, desde logo invocando a impossibilidade objectiva de cumprir com o pagamento da multa por não dispor da quantia, provando não ter meios como fazê-lo seja pelo pagamento a pronto, fazendo prova do indeferimento de pedido de pagamento prestacional, juntando prova de que não dispõe de liquidez para o efeito ou de que lhe foi recusado financiamento bancário para o efeito e de que não possui bens cujo produto da venda possa ser utilizado para esse fim, etc.

K. No entanto, o Requerente pura e simplesmente omitiu qualquer justificação para o incumprimento do pagamento da pena de multa que validamente lhe foi aplicada.

L. Ora, sempre se diga que o pressuposto referente ao periculum in mora deverá ser apreciado de forma objectiva e concreta, ligado à factualidade invocada e demonstrada pelo Requerente, para que a tutela cautelar seja sempre decretada perante um perigo actual ou iminente e sobre o qual o Requerente esteja impossibilitado de agir, a este obviando.

M. Não havendo justificação para o não cumprimento da pena de multa, o perigo decorrente da suspensão do exercício da profissão de Advogado não se trata de um perigo objectivamente actual ou sequer iminente, trata-se apenas de um exercício especulativo, N. Sendo certo que, não presidindo quaisquer razões ponderosas para o não pagamento da multa, sempre se terá que concluir que, a verificar-se a suspensão do Recorrido do exercício da Advocacia em razão do incumprimento da pena de multa aplicada, sempre este perigo terá como única força motriz da sua concretização a opção voluntária e consciente do Requerente em não cumprir, concorrendo, por isso, o Requerente para sua verificação.

O. Ou seja, o Requerente pretende ter o direito de não cumprir as sanções disciplinares que lhe foram validamente aplicadas.

P. Pelo que, só se poderá concluir que mal andou o Tribunal a quo quando, dando abrigo ao requerido pelo Recorrido, não só supriu a inexistência de qualquer invocação de perigo actual e iminente que para o Requerente pudesse decorrer do pagamento da pena de multa, Q. Como quando, equivocamente, deu como provado o preenchimento do pressuposto em causa, violando, assim, o disposto no n.º 1 do art.º 342.º do CCiv. como regra geral de distribuição do ónus de prova, bem como a al. f) do n.º 3 do art.º 114.º do CPTA que impõem ao Requerente não só o ónus de especificar os fundamentos do pedido, deles fazendo prova, como vinculam aquele que invoca o direito à tutela cautelar ao dever de fazer prova dos factos constitutivos desse direito.

R. Isto porque é manifestamente claro que o pagamento de uma quantia pecuniária, por si só, não se poderá ter como susceptível de originar qualquer situação de facto consumado ou de qualquer prejuízo de difícil reparação, dada a manifesta reversibilidade que o acto de pagamento reveste, sendo certo que, ainda que o Recorrido pudesse vir a obter ganho em sede principal, sempre poderia ver-se ressarcido pelo pagamento da quantia em causa acrescida do montante que se mostrasse comprovadamente justificada.

S. E, assim sendo, sempre se terá a apreciação produzida pelo Tribunal recorrido, neste aspecto, como incorrendo não só em equívoca interpretação dos pressupostos de facto, como interpretando de forma equívoca o disposto, tanto nos referidos dispositivos, como no n.º 1 do art.º 120.º do CPTA a propósito do pressuposto específico atinente ao periculum in mora.

Ainda assim, Da errónea apreciação do pressuposto referente ao fumus boni iuris T. Com a revisão de 2015 do CPTA deu-se uma alteração no critério de concessão das providências cautelares, tornando-o mais restritivo no que à prova da probabilidade de procedência da pretensão principal tange, neste sentido, veja-se o que diz J. C. Vieira de Andrade, «[…] a lei, em 2015, eliminou a diferença de regime entre a concessão de providências conservatórias e de providências antecipatórias, exigindo, para ambos os tipos de providências, a comprovação da probabilidade de procedência da acção principal, quando antes, se a providência fosse conservatória, bastaria que não fosse manifesta a alta de fundamento da pretensão principal.

[…]significa objectivamente uma maior exigência de prova feita ao requerente para a obtenção de medidas cautelares conservatórias – e, portanto, um maior relevo negativo da juridicidade material.» U. O que no caso, sempre implicaria que o Recorrido fizesse prova positiva da viabilidade da sua pretensão, no sentido de ser mais provável que venha a obter ganho do que venha a ser vencido, o que in casu manifestamente não aconteceu.

V. Ora, o único fundamento aduzido pelo Recorrido com o intuito de preencher o pressuposto processual referente à demonstração da viabilidade da pretensão a deduzir em sede de acção principal, refere-se a um pretenso efeito prescritivo que, conforme se demonstrará infra, não se verifica.

W. O Requerente invocou a prescrição da pena de multa aplicada, por, no seu entender, que o prazo dentro do qual a Ré poderia proceder à sua execução é de 3 (três) meses, X. Aplicando, neste sentido, e de acordo com o princípio da aplicação da lei mais favorável, o Estatuto da Ordem dos Advogados na redacção que decorre da Lei n.º 145/2015, de 9 de Setembro, Y. Fazendo, consequentemente, operar uma redacção constante do art.º 126.º do EOA2015 que, conforme resulta expressamente da letra da lei, não tem o alcance ou efeito que o Recorrido pretende, pois diz-nos o referido art.º 126.º do EOA2015, «Ao exercício do poder disciplinar da Ordem dos Advogados, em tudo o que não for contrário ao estabelecido no presente Estatuto e respetivos regulamentos, são subsidiariamente aplicáveis as normas procedimentais previstas na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho.» Z. É pois, clara a referência expressa a normas procedimentos, sendo certo que não se pode...

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