Acórdão nº 2055/09.3BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução25 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 26.01.2017, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação apresentada por F….., Lda (doravante Recorrida ou Impugnante), na sequência do indeferimento do recurso hierárquico que versou sobre o indeferimento da reclamação graciosa que, por seu turno, teve por objeto a liquidação adicional de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC), atinente ao exercício de 2002.

    O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

    Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “I.

    O presente recurso visa reagir contra a douta sentença declaratória da parcial procedência da impugnação, deduzida contra a liquidação adicional de IRC n° ….., relativa ao exercício de 2002, consequência da acção de inspecção levada a efeito pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa.

    II.

    O presente recurso limita-se à parte relativa às despesas contabilizadas pela impugnante com refeições fornecidas aos funcionários que recebem também subsídio de alimentação, parte essa declarada procedente pela sentença judicial em causa e com a qual a Administração Tributária não se conforma, pelos motivos abaixo expostos.

    III.

    Tais despesas não foram aceites pela Administração Fiscal, como custos do exercício de 2002, uma vez que considerou aqueles custos como não sendo indispensáveis à formação dos proveitos.

    IV.

    Concretizando, a AT procedeu à presente correcção à matéria tributável de IRC, nos termos do disposto no artigo 23° do CIRC, por não serem de aceitar como custos dedutíveis os valores pagos (€18.043,05) pela F….., Lda. à empresa T….., Lda., relativos a almoços que esta fornecia, nas instalações da Impugnante, aos funcionários desta.

    V.

    É unânime na doutrina e jurisprudência que a dedutibilidade dos custos, efectuada nos termos prescritos pelo n° 1 do artigo 23° do CIRC, obedecerá necessariamente aos princípios da efectividade, comprovação e indispensabilidade.

    VI.

    Tal sucede porque para cumprir integralmente a cláusula geral do n° 1 do artigo 23° do CIRC, o sujeito passivo deverá provar a intrínseca relação do custo com a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, porquanto o custo dedutível constitui uma diminuição patrimonial que tem como objectivo a obtenção de um ganho futuro.

    VII.

    A Impugnante não procedeu à prova da indispensabilidade dos custos com as refeições dos funcionários, uma vez que os mesmos auferiam, junto com a retribuição mensal, o respectivo subsídio de alimentação.

    VIII.

    Assim sendo, e conforme consta da fundamentação da explanada pela inspecção, tais custos representam uma duplicação de custos, o que, só por si, inviabiliza a dedutibilidade dos mesmos para efeitos fiscais, por não serem indispensáveis à obtenção dos proveitos.

    IX.

    Mais, quando se está perante um caso de duplicação de custos, como no caso em apreço, a sua indispensabilidade face à obtenção dos proveitos ou ganhos nunca poderá ser provada, porque o resultado que se deseja obter com o mesmo já foi obtido.

    X.

    Sobre esta questão, a sentença em apreço refere o seguinte: “(...) Só não há duplicação quando os gastos têm afectações distintas.

    Ora, como tem sido defendido pela jurisprudência superior, o facto de uma empresa pagar o subsídio de refeição aos seus trabalhadores e suportar as despesas de alimentação pagas aos restaurantes onde os trabalhadores tomam as suas refeições não configura uma duplicação de custos capaz de afastar a dedutibilidade das despesas feitas nos restaurantes. Uma empresa pode suportar as despesas com a alimentação dos seus trabalhadores e pagar e estes mesmos trabalhadores os respectivos subsídios de alimentação, desde que devidamente documentados e representam para a empresa finalidades distintas: gastos destinados à realização de proveitos e outros orientados para a manutenção da fonte produtora.” XI.

    A referida fundamentação, salvo melhor opinião, será de aplicar às despesas suportadas quando se estiver perante encargos com refeições suportadas com trabalhadores dependentes da empresa por motivos de deslocação destes fora do local de trabalho mediante a apresentação de um documento comprovativo.

    XII.

    Estas despesas terão que, necessariamente, ter como base um documento emitido de forma legal para comprovar a sua aceitabilidade fiscal, bem como mapas de suporte onde conste o nome de quem efectuou a despesa e o justificativo da deslocação.

    XIII.

    Todavia, o caso em apreço é totalmente distinto, pois estamos perante almoços fornecidos aos funcionários da Impugnante, nas suas instalações.

    XIV.

    A relação de indispensabilidade de um custo face ao proveito que se visa obter deve traduzir-se na sua absoluta necessidade à obtenção do ganho.

    XV.

    Como já referimos, no caso sub judice não se verifica essa indispensabilidade.Por outro lado, nos termos do disposto no artigo 74° da LGT, cabe à Impugnante o ónus da prova, contudo, a impugnante não logrou provar a indispensabilidade dos custos em apreço para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

    XVI.

    Pelo que a douta sentença proferida pelo Mm°. Juiz a quo fez, a nosso ver, uma incorrecta interpretação de facto e de direito das normas legais e da ratio legis que a fundamentam, mormente os art.°s 23°, do CIRC, incorrendo assim em erro de julgamento, devendo, por esse motivo, ser revogada, na parte em que procedeu, com as legais consequências.

    Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de V. Ex“s., deverá o presente recurso ser julgado procedente anulando-se a douta decisão na parte em apreço, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA”.

    A Recorrida não apresentou contra-alegações.

    Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do então art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

    Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT) vem o processo à conferência.

    É a seguinte a questão a decidir:

    a) Verifica-se erro de julgamento, porquanto o pagamento de subsídio de refeição, a par do fornecimento de refeições, implica uma duplicação de custos, não tendo a Impugnante logrado demonstrar a indispensabilidade do custo? II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A.

    O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “

    1. A Impugnante tem como atividade principal o comércio de automóveis e equipamentos (acordo).

    2. Em 12.04.2002 a Impugnante emitiu o recibo nº 4206 em nome de Elsa Silva, referente ao pagamento do montante de 7.831,37€ da compra por esta da viatura FIAT Brava com a matrícula ….., em consonância com o documento de proposta de compra e venda assinada pela referida cliente em 05.04.2002 (cfr. docs. de fls. 112 e 113 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos).

    3. Consta da contabilidade da Impugnante o documento de proposta de compra/venda em nome de P….., referente à compra da viatura com a matrícula ….., pelo montante de 14.841,55€, sendo aí indicada a emissão de três recibos nos montantes de 7.481,96€, 6.983,17€ e 376,42€, perfazendo aquele total (cfr. docs. de fls. 110 e 111 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos).

    4. Consta do sistema informático utilizado pela Impugnante e da sua contabilidade, a aquisição em 18.11.2002, do veículo com a matrícula …..pelo valor de retoma de 24.950,00€, e o recibo referente à sua venda em 23.11.2002 pelo montante de 26.900,00€ (cfr. docs. de fls. 115 e 116 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos).

    5. Consta do sistema informático utilizado pela Impugnante e da sua contabilidade, a aquisição em 06.11.2002, do veículo com a matrícula …..pelo valor de retoma de 1.750,00€, o documento de proposta de compra/venda em nome de D….., referente à compra da viatura pelo montante de 3.043,00€, sendo aí indicada a emissão de dois recibos nos montantes de 2.893,00€ e 150,00€, perfazendo aquele total (cfr. docs. de fls. 122 e 123 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos).

    6. Consta do sistema informático utilizado pela Impugnante e da sua contabilidade, a aquisição em 02.08.2002 e 05.08.2002, dos veículos com as matrículas …..e ….., pelos valores de retoma de 7.253,58€ e 4.690,14€, respetivamente, e documentos processados com data de 31.12.2003 com os preços de venda de 10.363,66€ e 7.182,69€ (cfr. docs. de fls. 117 a 120 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos).

    7. Consta da contabilidade da Impugnante o documento recibo com o nº 5059 de 20.11.2002, emitido em nome de “S….., Lda”, no valor de 11.970,00€, com a menção de ser valor referente a viaturas usadas com as matrículas mencionadas na alínea antecedente e com os valores 7.257,51€ e 4.712,49€, encontrando-se este valor aposto manualmente (cfr. doc. de fls. 121 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos).

    8. Em cumprimento das ordens de serviço nºs ….. de 16/12/2004 e ….. de 12.05.2005, os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa iniciaram em 29.06.2005, à Impugnante, ação de inspeção de âmbito geral aos exercícios de 2002 e 2003 (cfr. fls. 26 do Processo de Reclamação Graciosa apenso).

    9. A Impugnante apresentou a declaração Modelo 22 do exercício de 2002 apenas em 29.08.2005 (cfr. fls. 89 da reclamação graciosa apensa).

    10. Em 17.02.2006, H….., TOC da Impugnante, assinou o termo de declarações onde consta que declarou o seguinte: “1 - Viatura com o número de chassi …...

      - Declarou que a mesma nunca chegou a entrar na empresa, pelo que não deveria constar da existência final.

      2 - Qual o número correcto do chassi evidenciado em inventário final de 2001, com o número …..- - Declarou que o número correcto daquele chassi é o número …...

      3 - Porque motivo os custos relacionados com as...

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