Acórdão nº 00430/17.9BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelRos
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* 1. RELATÓRIO 1.1.

O Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, interpôs recurso jurisdicional da decisão ali proferida em 26.06.2018, que absolveu o Recorrido da prática da contraordenação aduaneira de introdução irregular no consumo de 25 litros de gasolina optima 98, no valor de 33€, prevista no artigo 109.º, n.º 1, e na alínea c), do n.º 1, do artigo 96.º, ambos do RGIT, com base na dúvida probatória relativamente ao destino daquele combustível e à intencionalidade da respetiva conduta.

1.2.

O Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: «1. Os presentes autos de contra-ordenação tiveram origem em acção de fiscalização realizada pela GNR ao veículo pesado de mercadorias, com reboque, conduzido pelo arguido, o qual transportava 25 litros de gasolina em dois bidons (de 5 e 20 litros, respectivamente), acondicionados na 3.ª mala do atrelado, do lado direito, 2. Combustível esse que adquiriu em Espanha, por ser mais barato do que em Portugal, o qual destinava a aplicar no seu veículo particular, tendo o mesmo sido apreendido.

  1. O arguido transportava uma quantidade de combustível superior a 0 litros, constituindo uma forma de transporte atípica (o não transporte do combustível no recipiente de reserva adequado), estando condicionada a respectiva circulação ao cumprimento do preceituado no art. 60º nº 3, do CIEC, designadamente a declaração de introdução no consumo, facto não praticado pelo arguido (folhas 10 e 23).

  2. Desses elementos não resultam quaisquer dúvidas, em termos de prova da matéria de facto, sobre a origem do combustível, a razão da sua aquisição e qual o seu destino – folhas 7, 10 e 23 dos autos – razão pela qual não tem aplicação ao caso concreto os princípio in dúbio pro reo e da presunção da inocência do mesmo, pois a prova existente nos autos exclui qualquer dúvida e nem o arguido reclama a sua inocência.

  3. A conduta do mesmo foi voluntária e consciente, tem consciência do que estava a fazer, sendo tal comportamento motivado pelo propósito de poupar no valor do combustível em relação ao preço que teria de pagar em Portugal, sabendo que tal conduta tem relevância contra-ordenacional e como tal é proibida por lei – disposições conjugadas dos artigos 60º e 61º, do CIEC, e 96º nº 1 c) e 109º nº 1, do RGIT.

  4. Razão pela qual não poderia o arguido ser absolvido com base nos aludidos princípios, mas antes deveria a decisão que aplicou a coima ser mantida.

    Termos em que deve ser o recurso da decisão […] administrativa ser julgado improcedente e a decisão ora recorrida ser revogada, assim se fazendo JUSTIÇA.

    ».

    *1.3.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    1.4. Os autos foram com vista ao DMMP que emitiu douto parecer, concluindo pela procedência do presente recurso.

    Dispensados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.

  5. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Nos termos do artigo 75º do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social (RGIMOS), aplicável ex vi da alínea b), do artigo 3.º, do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), a decisão do recurso jurisdicional pode alterar a decisão recorrida sem qualquer vinculação aos seus termos e ao seu sentido, com a limitação da proibição da reformatio in pejus, prevista no artigo 72.º-A do mesmo diploma.

    Não obstante, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cfr. artigo 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal (CPP), aplicável por força do artigo 74.º, n.º 4 do RGIMOS), exceto quanto aos vícios de conhecimento oficioso.

    No caso, a questão suscitada pelo Recorrente consiste em saber se ocorre o invocado erro de julgamento na decisão que absolveu o arguido por subsistir dúvida quanto ao destino do combustível detetado e apreendido e à intencionalidade daquele.

  6. FUNDAMENTAÇÃO 3.1. DE FACTO A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto: «III – Com interesse para a decisão da presente questão, dão-se como provados os seguintes factos: A – Em «Auto de notícia por contraordenação e apreensão», elaborado pela GNR e datado de 10.06.2016, retira-se que: “[…] Hoje, pelas 11h 40 , em b) IC2 Km 185,8 Coimbra, acompanhado pelos agentes que no final assinam o presente auto, procedeu-se à fiscalização do veículo trator e semirreboque, de matrícula XX-XX-XX/C-XXXXX, marca Sania/Kogel, modelo R420/SN24P100, propriedade de T. Lda, residente em Rua (…), com o contribuinte n.º (…), conduzido por A. […]”. Do mesmo documento extrai-se que: “[…] Verificou-se que transportava na terceira mala do semirreboque do lado direito, dois bidons com 25 l (vinte e cinco litros) de gasolina optima 98, comprada em Espanha em 10-06-2016, conforme talão que se anexa. O condutor referiu que o referido veículo é para ser consumido na sua viatura particular em Portugal. A gasolina tem um valor patrimonial de 33,00 € (trinta e três euros) […]”. Ainda de tal auto se retira que: “[…] Pelo exposto, salvo melhor entendimento de V.ª Ex.ª, presume-se estar perante uma Contraordenação Aduaneira, Introdução Irregular no Consumo prevista pelo n.º 1 do Art.º 109.º com refª à al. c) n.º 1 Art.º 96.º, ambos do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho, punida pelo n.º 1 do Art.º 109º do mesmo diploma, por violação ao n.º 1, 2 e 3 do Art.º 60.º conjugado com o n.º 5 e 6 do Art.º 61.º, ambos do Código de Impostos Especiais de Consumo (CIEC), aprovado pelo Dec-Lei n.º 73/2010 de 21 de Junho […]” (cf. doc. a fls. 6 dos autos em proc. fis. e que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

    B – Em anexo ao auto referido na alínea anterior encontra-se a «Factura Simplificada» n.º 028510416/00010137», referente a 25,82 Lt. de «Optima 98» (cf. doc. a fls. 7 dos autos em proc. fis. e que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

    C – O Recorrente foi notificado por ofício dos serviços da GNR, datado de 17.06.2016 para cujo conteúdo integral aqui se remete (cf. docs. a fls. 8 a 11 dos autos em proc. fis. e que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).

    D – Em 05.07.2016, o Recorrente, através da sua Advogada, apresentou uma exposição escrita dirigida à Unidade de Ação Fiscal da GNR e que designou por «Defesa» (cf. docs. a fls. 12 a 17 dos autos em proc. fis. e que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).

    E – Em informação dos serviços da Delegação Aduaneira da Figueira da Foz da Alfândega de Aveiro, consta que: “[…] a dívida em sede de ISP e CSR, relativa aos 25 litros de gasolina “optima 98” apreendida no âmbito do presente processo, ascende a 16,798€ […]” (cf. doc. a fls. 22 dos autos em proc. fis. e que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

    F – Em «Despacho» da Sra. Chefe da Delegação Aduaneira da Figueira da Foz da Alfândega de Aveiro, datado de 22.05.2017, retira-se que: “[…] Foram recebidos, nesta Delegação Aduaneira, os autos de contra-ordenação aduaneira instaurados na Unidade de Acção Fiscal (UAF) - Destacamento de Acção Fiscal (DAF), de Coimbra, da GNR, sob o n.º 514/2016, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a), do art. 52°, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n° 15/2001, de 5 de Junho.

  7. Da notícia da infracção Decorre dos autos acima identificados, que agentes da GNR daquele Destacamento, no dia 10 de Junho de 2016, pelas 11H40, no IC 2, ao Km 185,8, em Coimbra, procederam à fiscalização do veículo pesado, trator e semi-reboque, da marca Scania e Kagel, com as matrículas XX-XX-XX e C-XXXXX, respetivamente, propriedade da empresa T., Lda, NIF (…) e sede na Rua. (…), mas conduzido por A., contribuinte fiscal nº (…), com domicílio na Rua (…).

    No decurso da fiscalização os agentes da GNR, detectaram na terceira mala do lado direito, do semi-reboque, dois bidons que continham 25 (vinte e cinco) litros de gasolina "óptima 98", adquirida em Espanha, conforme comprovativo da compra exibido e junto aos autos, (fatura simplificada, datada de 10/06/16 - folhas 4). De acordo com as declarações do condutor e constantes do auto de notícia, a gasolina destinava-se a ser consumida na sua viatura particular.

    Os bidons de gasolina foram apreendidos, nos termos do n° 1, do art. 73°, do RGIT e levantado auto de notícia, por violação das regras previstas no Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC), aprovado pelo D.L. nº 73/2010, de 21 de Junho, em matéria de aquisição de produtos sujeitos a IEC, já introduzidos no consumo e adquiridos, noutro Estado membro, por particulares, para uso pessoal.

  8. Da acusação: O descrito transporte de combustível por se não encontrar no reservatório do veículo, nem em recipiente reserva apropriado e exceder 10L (cf art.º 61.° n.º 5 e 6 do CIEC), constitui forma de transporte atípica, determinante de presunção de se não destinar a uso pessoal, sendo, consequentemente (ct art.º 61.° n.º 1 e 60.° do mesmo CIEC), devido imposto (ISP) e estando a respectiva circulação condicionada à observância das obrigações elencadas no n.º 3 do art.º 60.° do referido CIEC, e designadamente a declaração de introdução no consumo, o que não foi cumprido pelo arguido.

    Assim, foi A. acusado da prática de uma irregularidade, por violar os artigos 60° e 61°, do CIE, conforme antecede, incorrendo em contra-ordenação aduaneira por introdução irregular no consumo prevista na alínea c), do n° 1, do art° 96°, mas punida pelo nº 1, do artº 109°, ambos os artigos do RIT, com coima de 1 500 € a 165 000 €.

    O arguido foi notificado da acusação, de acordo com o art° 70º do RGIT, através do ofício n° 3028, de 17/6/16, daquele...

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