Acórdão nº 00319/10.2BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:*I. Relatório J., NIF (…), residente na Rua (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, proferida em 27/04/2017, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IVA e respectivos juros compensatórios, do período 0906T, nos montantes de €36.828,20 e de €314,81, respectivamente.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “

  1. A questão que se coloca neste processo é apenas esta: Um contribuinte que exerce várias actividades, adquiriu determinados bens para poder exercer uma delas, pela qual estava devidamente colectado, que era a de pastelaria, tendo suportado, nessa aquisição, devidamente comprovada, o pagamento do respectivo IVA, procedendo posteriormente à dedução desse IVA com os demais IVA’s recebidos noutras actividades e pediu o reembolso do excesso.

  2. Porém, a AT, agora com o apoio da sentença recorrida, entende que essa dedução é ilegal, porque o ora impugnante não chegou a exercer a actividade de pastelaria, de modo que não produziu quaisquer rendimentos com os bens adquiridos e pelos quais pagou o respectivo IVA, o que no entender do ora recorrente é ilegal.

  3. Nos termos legais, a dedução do IVA é feita nos termos dos artigos 19.º e 22°, ambos do CIVA, sendo o IVA pago nas diferentes actividades exercidas pelo sujeito passivo englobado globalmente e não objecto de deduções parcelares por actividade, o ora recorrente pode deduzir todo o IVA pago num determinado período, nos termos referidos no art°. 19°. do CIVA, apenas se exigindo que seja uma actividade declarada que vai ser exercida pelo sujeito passivo, como é o caso dos presentes autos.

  4. O art°. 22°. citado, por outro lado, determina que o direito à dedução nasce com a exigibilidade do imposto, ou seja, provado que todo o equipamento hoteleiro foi adquirido em 2007, em data não determinada pela matéria de facto, mas que o tribunal tem conhecimento pelos documentos juntos, com o relatório tributário, em Setembro e Outubro de 2007.

  5. Também está provado (Facto E) que o ora recorrente optou em sede de IVA, pelo regime normal de tributação de periodicidade trimestral F) Deste modo, atento o disposto no art°. 22°, n°. 2 citado, “a dedução deve ser efetuada na declaração do período ou de período posterior àquele em que se tiver verificado a receção das faturas”, pelo que o direito de dedução desse IVA teria de ocorrer ou o 4°. Trim/2007 ou o mais tardar no 1.º Trim/2008.

  6. Sucede, porém, que o ora recorrente, conforme consta da matéria de facto dada como provada (Facto B), “em 13.10.2008 foi emitido pela Câmara Municipal da (...), o alvará de utilização referente à fração referida na alínea anterior, neste constando que a mesma se destina a «comércio (padaria/pastelaria)» (cf Doc. a fls. 30 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido)”, pelo que só a partir deste alvará camarário era possível ao ora recorrente obter as necessárias licenças para abrir o estabelecimento, pelo que só a partir desta data teria necessidade de contratar pessoal e comprar mercadorias.

  7. O prazo legal para o exercício do direito de dedução só poderia ocorrer até ao fim do 1°. Trimestre de 2008 e o ora recorrente só obteve a licenciamento da fracção onde pretendia instalar o estabelecimento em finais de 2008, pelo que, sob pena de perder o direito de dedução, o ora recorrente teria de formular esse pedido antes de o estabelecimento começar a funcionar.

  8. Cumprindo todos os prazos legais do citado art°. 22°., agora o n°. 6, do CIVA, veio o ora recorrente requerer o reembolso do IVA pago a mais, decorridos que estavam 12 meses sobre a data em que se verificava a exigência do IVA e podia portanto ocorrer a dedução correspondente.

  9. Como todo o mau pagador, a AT procurou logo arranjar um pretexto para não pagar e fê-lo através da consideração separada de uma actividade do ora recorrente que ainda se não iniciara, por impossibilidade legal, o que é uma solução é incorrecta, pois, como está provado, o recorrente continuou a exercer a sua actividade comercial e só não exerceu aquela concreta actividade de pastelaria, porque a burocracia camarária o impediu de o fazer e depois já não pode começar, porque passou a ser perseguido pela AT.

    K). Face ao exposto, a decisão recorrida, para além de violar de forma flagrante o disposto nos artigos 19°., n°. 1, al. a) e 22°., n°s. 1 e 2 do CIVA, constitui um clara e flagrante ilegalidade, por erro sobre os pressupostos de facto, por não considerar as concretas circunstâncias em que o ora recorrente tinha de exercer o seu direito de dedução e a impossibilidade concreta em que se encontrava de impossibilidade de exercer a sua actividade devido ao facto de, enquanto não pudesse abrir o estabelecimento comercial, tinha o ora impugnante direito à dedução do IVA pago na aquisição do equipamento e mobiliário que o próprio técnico fiscal verificou existir.

  10. Aliás, nos termos da aI. a) do n°. 1 do art°. 20°. do CIVA, o ora recorrente podia deduzir o IVA pago na aquisição do referido equipamento, porque esse IVA incidira sobre bens adquiridos para a realização de prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas e apenas isso, pois que a lei não exige que esse IVA só possa ser deduzido nas operações ou actividades a que se destinam os bens adquiridos, quando o sujeito passivo desenvolve uma pluralidade de actividades comerciais.

    M). Essa limitação não está contemplada na lei e só é fixada, oficio circulado n° 30103 de 23/04/2008 do Director Geral dos Impostos, como referido no relatório da Inspecção Tributária, mas, conforme já decidiu o Tribunal Constitucional, no seu acórdão n°. 583/2009, 18/11/2009, “faltando-lhes força vinculativa heterónoma para os particulares e não se impondo ao juiz senão pelo valor doutrinário que porventura possuam, as prescrições contidas nas “circulares” da Administração Tributária não constituem normas para efeitos do sistema de controlo de constitucionalidade da competência do Tribunal Constitucional, designadamente para abrir a via de recurso prevista na alínea a) do n.° 1 do artigo 70.° da LTC”.

  11. Não estabelecendo o legislador qualquer distinção relativamente ao momento em que o sujeito passivo pode começar a deduzir o IVA por si pago, na aquisição de bens que se destinam subsequentemente a actividades sujeitas ao regime de IVA, pelo que é licito ao sujeito passivo proceder à contabilização como imobilizações corpóreas -equipamento hoteleiro - (anexo 1 - 15 fls.) e as obras no estabelecimento em imobilizações em curso - sub conta 441 - Obras em curso A.

  12. Bem como é lícito ao sujeito passivo começar imediatamente a proceder à dedução do IVA e à amortização dos custos efectuados.

  13. Deste modo, face à ilegalidade das liquidações efectuadas e actos constantes dos documentos 1 e 2, por criarem um pressuposto que o art°. 20°., n°1, al. a) do CIVA não exige e porque a referida ilegalidade determina a nulidade dessas liquidações, nos termos do art°. 99°. do CPPT, devem ser anuladas as liquidações ora impugnadas.

    Por isso, Deve ser dado provimento ao presente recurso e decidindo-se de harmonia com as conclusões que se deixam formuladas, ser revogada a sentença recorrida e proferida nova decisão que julgue procedente e provada a presente impugnação e consequentemente, nos termos do art°. 99°. do CPPT, devendo ser declaradas nulas as liquidações constantes dos documentos 1 e 2 por enfermarem do vício de ilegalidade, nos termos expostos e com as legais consequências, como é de lei e de JUSTIÇA!”****A Recorrida não contra-alegou.

    ****O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.

    ****Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; cumpre apreciar e decidir.

    ****II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida...

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