Acórdão nº 291/11.1BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I- Relatório C.........., Lda., deduziu impugnação judicial contra o Instituto da Segurança Social, IP., reagindo contra a decisão proferida em 28/12/2010, pela Directora do Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes, Sector de Setúbal, no âmbito do processo de averiguações n.º ........., que considerou a existência de contribuições apuradas e devidas pela Impugnante no valor total de EUR 12.328.423,81. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, por sentença proferida a fls. 1928 e ss. (numeração do SITAF), datada de 20/01/2020, julgou parcialmente procedente a Impugnação apresentada e, em consequência, determinou a anulação da parte da liquidação relativa ao período compreendido entre Outubro de 2003 e Novembro de 2006 e a sua improcedência relativamente à restante liquidação.

A impugnante interpôs recurso jurisdicional contra sentença, conforme requerimento de fls. 2001 e ss. (numeração do SITAF), formulando as seguintes conclusões de recurso.

(A) O presente recurso versa sobre a sentença proferida pelo TAF de Almada que julgou a impugnação judicial deduzida do ato tributário de liquidação adicional de contribuições à Segurança Social relativo aos períodos de 2003 a 2010, no montante de €12.328.423,81. parcialmente procedente (tendo o decaimento sido de €9.388.977,50); (B) A sentença recorrida deve ser retificada quanto à percentagem de decaimento da Recorrente, que é de 76% e não de 82%; (C) A referida sentença deverá ser declarada nula, por falta de especificação dos fundamentos de facto; (D) A sentença recorrida adere, sem qualquer seleção dos factos que se terão por provados, ao Projeto de Relatório de Inspeção da Segurança Social (tão-pouco aderindo ao Relatório Final), adesão da qual apenas pode resultar que o teor do documento é aquele e não outro, mas já não que o seu conteúdo se tem por provado; (E) Por consequência, não constam da matéria dada como provada os factos em que na verdade se baseou o Tribunal a quo para decidir naquele e não noutro sentido, sendo que, por outro lado, não deu o Tribunal a quo, nem como provados, nem como não provados, factos alegados pela Recorrente e necessários à boa decisão da causa; (F) Caso assim não se entenda, deve a sentença recorrida ser revogada, por padecer de erro de julgamento, por errada subsunção dos factos ao direito no que respeita à prescrição das alegadas dívidas por contribuições à Segurança Social dos períodos entre outubro de 2003 e setembro de 2005, na medida em que a notificação do início dos trabalhos de inspeção não interrompeu a contagem do prazo de prescrição nos termos do artigo 63.º, n.º 3 da Lei n.º 17/2000, de 8 de agosto; (G) Por outro lado, encontra-se a sentença recorrida inquinada de erro na aplicação do direito no que ao ónus da prova da legalidade do ato tributário sob debate que incumbia, não à Recorrente, mas antes à Segurança Social, porquanto tratando-se de um ato tributário, não goza o mesmo de presunção de legalidade, recaindo sobre o seu autor e não sobre o destinatário o dever de demonstrar a verificação dos respetivos pressupostos legais; (H) Num universo de 330 trabalhadores, a Segurança Social ouviu 18 trabalhadores, dos quais apenas 12 tiveram o seu contrato de trabalho analisado, o que não pode considerar-se uma amostra adequada; (I) Esse ónus de prova foi, in casu, incumprido pela Segurança Social, devendo, nos termos dos artigos 640.º, n.º 1 e 662.º, n.º 1 do CPC aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, aditar-se ao probatório, com base no procedimento administrativo, os seguintes factos: a. não obstante terem sido notificados 50 trabalhadores, apenas 18 foram efetivamente ouvidos pelo Instituto da Segurança Social em sede procedimental; b. dos 18 trabalhadores ouvidos pelo Instituto de Segurança Social, apenas 12 tiveram o seu contrato de trabalho analisado individualmente.

(J) A prova carreada para os autos pela Segurança Social foi também erradamente valorada pelo Tribunal a quo, uma vez que existem contratos de trabalho juntos, lidos e assinados pela Recorrente e pelos seus trabalhadores e por isso não simulados, que fixam o local de trabalho na sede da Recorrente, em Portugal, de onde resulta conclusão diferente daquela a que chegou o Tribunal a quo: os trabalhadores, quando se deslocaram para trabalhar em obras no estrangeiro, encontravam-se efetivamente em deslocação ao serviço; (K) Por outro lado, o Tribunal o quo desconsiderou também, em absoluto, que trabalhadores houve que declararam ser eles próprios a custear despesas com alojamento e alimentação aquando da prestação de trabalho em obras no estrangeiro, o que significa que existiam de facto despesas a compensar; (L) Atendendo aos autos de declaração e aos contratos de trabalho constantes do processo administrativo junto aos autos, nos termos dos artigos 640.º, n.º 1 e 662.º, n.º l do CPC aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, deve o Tribunal de Recurso aditar ao probatório, com base no procedimento administrativo, os seguintes factos: a. dos contratos de trabalho constantes de fls. 101 a fls. 250 dos autos os trabalhadores são contratados pela Recorrente para a sua sede em Portugal; b. em diversas obras no estrangeiro nas quais os trabalhadores prestaram trabalho foram os trabalhadores a incorrer nas despesas de alojamento e alimentação (cfr. autos de declarações citados no artigo 186.º supra e constantes de fls. 99 a 162 dos autos); (M) O erro de julgamento em que incorreu a sentença recorrida abrange, ainda, o erro na qualificação das quantias pagas pela Recorrente aos trabalhadores; (N) Considerando-se, com a decisão recorrida, que não existe deslocação e que o trabalhador desenvolve a sua atividade sempre e apenas no estrangeiro, tal significa que, por aplicação dos normativos europeus quanto a coordenação em sede de Segurança Social, não assiste ao Estado Português e portanto ao Recorrido, o direito a cobrar as contribuições a que se arroga: nesse caso, a obrigação contributiva no país de destino mantém-se ao abrigo da alínea a) do n.º 3 do artigo 11.º do Regulamento, cessando a obrigação contributiva no país de origem, ou seja Portugal, por não estarem preenchidos os respetivos pressupostos.

(O) Ainda que o local de trabalho identificado nos contratos celebrados entre a Recorrente e os seus trabalhadores fosse ab initio no estrangeiro, que não é, é a própria regulamentação aplicável que determina a atribuição de ajudas de custo e reconhece que, quanto aos trabalhadores que se encontram nessas condições, as atribuições pecuniárias em causa não têm a natureza de retribuição; (P) A Recorrente pode disponibilizar a alguns dos seus trabalhadores, alimentação e alojamento e meios de deslocação - o que de resto não é generalizado, conforme resulta do PA, muito embora tenha sido extrapolado como verificando-se em todos os casos -, mas tais serviços não se sobrepõem às ajudas de custo, nem estas se esgotam no custeio daquelas necessidades, como é estabelecido pela jurisprudência dos tribunais superiores; (Q) A Recorrida limitou-se a considerar, sem mais, as importâncias auferidas pelos trabalhadores a título de ajudas de custo como rendimento de trabalho dependente, sem sequer determinar se as mesmas ultrapassam os limites legalmente aplicáveis; (R) Os trabalhadores em causa receberam o salário que é adequado às suas funções e qualificações, que foi estabelecido no contrato de trabalho, que os trabalhadores conhecem, leram e assinaram, e que corresponde ao salário pago em Portugal e pela Recorrente aos demais trabalhadores com a mesma categoria profissional e que realizam trabalho igual; (S) Ao contrário do que se afirma na decisão recorrida, quer no sector da construção naval, quer em outros sectores de atividade que deslocam vários trabalhadores (como o transporte aéreo), quer até no âmbito do destacamento dos funcionários públicos (no contexto dos serviços que deslocam funcionários), a proporção entre salário base e ajudas de custo é similar à que se verifica na Recorrente, o que resulta de o limite legal das ajudas de custo ser estabelecido por dia de deslocação e, portanto, não ter um limite máximo mensal; (T) A circunstância de as ajudas de custo terem sido pagas pela Recorrente aos seus trabalhadores destacados com uma permanência e periodicidade mensal, não lhes retira o carácter compensatório de despesas feitas pelos trabalhadores, porquanto não se trata de quantias pagas independentemente (mas antes em resultado de) de deslocações ao serviço; (U) De resto, como resulta de jurisprudência dos tribunais superiores, nada obsta a que se cumulem ajudas de custo com outros abonos e serviços - in casu, despesas de viagem e serviços de alojamento e alimentação - em nada relevando também, para a qualificação das quantias como ajudas de custo, que o seu montante seja superior ao do vencimento base; (V) O ato sob discussão é, ainda, ilegal, porquanto, contrariamente à fundamentação do mesmo, o DL n.º 106/98 é inaplicável à situação em apreço, antes sendo aplicável, tratando-se de deslocações ao estrangeiro e da atribuição de ajudas de custo nessas deslocações e durante essas deslocações, o Decreto-Lei n.º 192/95, de 28 de julho; (W) O único requisito exigido pelo Decreto-Lei n.º 192/95, de 28 de julho, para que se possa falar de ajudas de custo, é a deslocação do trabalhador para o estrangeiro e que tal deslocação implique para o trabalhador a realização de despesas com alojamento e refeição e que não teria de custear se não fosse a deslocação ao serviço do empregador, o que sucede in casu, se não em todos, ao menos em alguns dos casos retratados no processo de averiguações que fundamenta, assim ilegalmente, o ato tributário sob discussão; (X) Por tudo quanto antecede, deve a sentença recorrida ser declarada nula ou, caso assim não se entenda, revogada e substituída por Acórdão que elimine o ato tributário sob discussão da ordem jurídica, com as demais consequências legais.

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