Acórdão nº 154/14.9BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I- Relatório O Município de Portimão veio intentar contra o Ministério das Finanças acção administrativa pedindo a anulação do despacho que indeferiu o recurso hierárquico interposto do despacho que não deferiu o pedido de revisão oficiosa da autoliquidação do IVA de 2007 e o reconhecimento do direito à dedução do imposto no montante de €285.691,69.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, por sentença proferida a fls. 279 e ss. (numeração do SITAF), datada de 12/06/2017, julgou procedente a acção administrativa e anulou o acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, reconhecendo o direito à dedução de IVA e ao pagamento pela Administração Tributária de juros indemnizatórios.

A Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional contra a sentença, conforme requerimento de fls. 294 e ss. (numeração do SITAF). Inconformada com a decisão, a recorrente alega nos termos seguintes: «A. A Recorrente não se conforma com a sentença ora recorrida, porquanto, no seu entendimento, atentas as disposições especiais do Código do IVA, bem como os factos descritos pelo A., aqui Recorrido, o erro por si alegado deve ser subsumido à disciplina das normas especiais do Código do IVA.

  1. O Autor apresentou pedido de revisão oficiosa, relativo ao ano de 2007, alegando que, até ao momento em que reviu procedimentos internos, limitava o exercício do direito à dedução ao IVA incorrido em actividades sujeitas e não isentas de imposto, utilizando para tanto o método de dedução do pro rata.

  2. Na sequência do Orçamento de Estado para 2008, concluiu que, durante anos, pagou prestação tributária de IVA em excesso, tendo apurado, segundo os seus cálculos, um valor de imposto suportado em excesso, no ano de 2007, de € 285.691,69.

  3. Tendo a revisão oficiosa sido indeferida, apresentou o A. recurso hierárquico daquela decisão, o qual veio igualmente a ser indeferido por considerar que o art.98º do Código do IVA e o art. 78º da LGT consagram normas gerais que apenas seriam aplicáveis caso não houvesse normas especiais do Código do IVA a ter em conta.

  4. Na Informação prestada no âmbito do processo de recurso hierárquico pode ler-se: "70 No caso concreto, da leitura do conteúdo da petição de revisão oficiosa, conclui-se que, não obstante as operações, relativas aos meses de janeiro a dezembro do ano de 2007, estarem documentalmente suportadas (pelas respectivas facturas) e registadas na contabilidade, o direito à dedução não foi exercido nas declarações periódicas dos períodos de tributação referidos no nº2 do artigo 22º, ou na última declaração do ano, por via da aplicação do disposto no nº6 do artigo 23º do CIVA." F. Decorre assim, da leitura conjugada das normas constantes dos artigos 22º e 78º do CIVA, que existe uma limitação temporal para o exercício do direito à dedução, devendo este ser exercido na declaração do período posterior àquele em que se verificou a recepção das facturas, sendo excepcionalmente admitida a dedução em momento posterior, nomeadamente em caso de rectificação de facturas ou para correcção de erros materiais ou de cálculo, mas sempre dentro do limite de dois anos.

  5. Não obstante os regimes de revisão oficiosa e do direito à dedução surgirem referidos no mesmo preceito legal - art.78º do Código do IVA - e a dedução corresponder a um momento de autoliquidação, as duas situações são, na verdade, juridicamente independentes entre si.

  6. Com efeito, o facto de constarem na mesma norma jurídica não significa necessariamente que exista uniformidade de regulamentação aplicável, sendo inequívoca a conclusão de que cada um dos mencionados regimes conta com a sua própria regulamentação, i.e., a revisão oficiosa no artigo 78.º da LGT e o direito à dedução do IVA em várias normas plasmadas no Código do IVA.

    I. Em suma, apesar de o n.º 2 do artigo 98.º do IVA estabelecer que, sem prejuízo de disposições especiais, o direito à dedução pode ser exercido até ao limite de quatro anos, numa aparente identidade total com o estabelecido no artigo 78.º da LGT, o sujeito passivo de IVA não tem liberdade para determinar o momento de exercício desse direito, limitando-se aquela norma a fixar um limite máximo de carácter geral, a partir do qual aquele direito não pode já ser exercido.

  7. No entanto, a douta sentença recorrida, ao apenas considerar na fundamentação aduzida, os artigos 78º nº6 e 98º, ambos do Código do IVA, parece ter ignorado que o entendimento dos serviços foi no sentido de as pretensões do ali Recorrente/Autor, não terem qualquer apoio nos artigos 22º e 23º do Código do IVA, disposições estas que regulamentam os prazos para o exercício do direito à dedução.

  8. O que os serviços salientaram, ao invés, é que o Autor havia exercido o seu direito à dedução com base no método que atempadamente escolheu pretendendo, ao cabo de quatro anos, o reconhecimento de valores de imposto dedutível calculados por meio da utilização de um método de imputação diferente.

    L. Ora, o Autor invocava a possibilidade de exercício do direito à dedução dentro do prazo de quatro anos, que alegava resultar da conjugação do disposto nos artigos 22º e 98.º do CIVA.

  9. E, quanto a esta questão, a douta sentença recorrida errou, denotando um raciocínio viciado, pois concluiu que, não tendo a conduta do A. cabimento no art. 78º nº 6, do CIVA, tal implicava que a opção por diferente método de dedução podia ser alterada dentro do limite dos quatro anos.

  10. Olvidando que a informação dos serviços desde logo considerou que a pretensão do Autor não tinha qualquer apoio nos arts. 22º e 23º do CIVA, onde se determina o momento que em que poderia ser exercido o direito à dedução e o momento em que poderia ser exercida a opção pelo método de cálculo do imposto dedutível.

  11. Normas estas que revestem, indubitavelmente, carácter especial face à norma geral do art.78º da LGT.

  12. Qualquer entendimento diverso sempre levaria à conclusão que as normas que prevêem prazos especiais não têm qualquer sentido útil, já que sempre lhes sobreporia a regra que estabelece o prazo geral de quatro anos, em manifesta violação do disposto no n.º 3 do art. 7º do Código Civil.

  13. Ademais, a questão da especialidade do artigo 78.º face ao artigo 98.º, ambos do Código do IVA não aparenta ser, sequer, controvertida, como se pode ver pelas decisões arbitrais proferidas nos processos nºs 91/2013-T e 117/2013-T, e já mencionadas em sede de contestação, R. que, aliás, estão em consonância, com a posição do Supremo Tribunal Administrativo, tendo resultado manifesta no acórdão, de 18-05-2011, processo n.º 0966/2010, que supra se mencionou e citou, em parte.

  14. O Autor, aqui recorrido, é, para efeitos de direito à dedução do imposto suportado, um sujeito passivo misto e, enquanto tal, o sistema legalmente instituído de funcionamento do IVA pressupõe o exercício pelo contribuinte de um direito de opção pelo método de cálculo do imposto dedutível.

  15. Sendo certo que, conforme determinado pelo art. 23º do CIVA, este direito de opção não é ilimitado, existindo condicionantes legais imperativas e, inclusivamente, a atribuição à Administração de poderes deveres discricionários.

  16. Ou seja, o que se tem de apreciar é a questão de saber se se o sujeito passivo pode, decorridos quase quatro anos, deduzir mais imposto do que aquele que anteriormente autoliquidou com base nos mesmos registos contabilísticos, por meio da utilização de um diferente critério de imputação.

    V. Devendo destacar-se que o contribuinte não se enganou a preencher as declarações, nem encontrou documentos de suporte que não houvesse correcta e atempadamente inscrito na sua contabilidade.

  17. Este entendimento da aqui Recorrente em nada contraria o Direito Comunitário, uma vez que o TJUE já se pronunciou no sentido da admissibilidade de os Estados Membros fixarem um prazo para o exercício do direito à dedução inferior ao da caducidade do direito de liquidação - v. Acórdão Ecotrade.

    X. Assim, do cotejo das disposições aplicáveis resulta que o âmbito de aplicação do nº 2 do artigo 98º do CIVA cinge-se ao exercício do direito à dedução pela primeira vez, por contraposição ao âmbito do nº 6 do artigo 78º do CIVA em que se regula o exercício do direito à dedução com base em documentos já registados na contabilidade.

  18. Se fosse considerado que as normas da revisão poderiam sobrepor-se às normas reguladoras do direito à dedução, tal implicaria, para além da violação clara, já supra referida, do princípio de que lei geral não revoga lei especial, resultaria igualmente na total perda de eficácia destas últimas, o que...

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