Acórdão nº 1041/07.2BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelSUSANA BARRETO
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - Relatório A FAZENDA PUBLICA, não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por T... S.A.

, contra o ato de liquidação do IRC (por retenção na fonte) relativo aos exercícios de 2004 e 2005, nos montantes, respetivamente, de € 4 337 815,78 e € 7 064 442,84, e ocorrida aquando da colocação à disposição dos dividendos que auferiu da sua participação na sociedade comercial anónima portuguesa P..., SGPS, S.A.

, dela veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo Sul.

Pretérito aresto deste TCAS, julgou: a. conceder provimento ao recurso jurisdicional, revogando a sentença recorrida e julgar intempestiva a impugnação judicial, absolvendo a Fazenda Pública da instância; b. condenar a recorrida nas custas em ambas as instâncias.

O que foi objeto de recurso de revista, vindo o Supremo Tribunal Administrativo a entender conceder provimento ao recurso, revogar o acórdão recorrido e ordenar a baixa dos autos ao Tribunal Central Administrativo Sul para conhecimento das demais questões consideradas prejudicadas pela procedência da invocada caducidade do direito de impugnar, se nada mais obstar.

Ao que é pertinente: Nas alegações de recurso apresentadas, a Fazenda Pública, após notificação para sintetização e simplificação, formulou as seguintes conclusões: I - Quanto à ilegitimidade da Impugnante

  1. A sentença recorrida, ao considerar a impugnante parte legítima da impugnação, viola o disposto no nos n° 4 e 5 do artigo 19° da LGT, designadamente a parte final do n° 5, que condiciona o exercício dos direitos pelos não residentes, nomeadamente os de reclamação, recurso e impugnação, à designação de um representante fiscal com residência em território nacional.

    Ao contrário da fundamentação utilizada pela sentença recorrida, a designação de mandatários forenses não logra só por si preencher a exigência legal de designação de um representante fiscal com residência em território nacional. Sendo certo que o representante fiscal referido no n° 4 do artigo 19° da LGT pode ser um advogado, a constituição de um mandatário forense não é necessariamente meio de executar a exigência consagrada naquela norma.

    Sofre, pois, a sentença recorrida, dos vícios de violação de lei, concretamente do artigo 19° n° 4 e 5 da LGT, e de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, por considerar preenchida a exigência do artigo 4º com a simples constituição de mandatários forenses; b) A sentença recorrida, no seu discurso fundamentador, ao afirmar que o artigo 19º n° 4 do CPPT não pode ser interpretado no sentido de impor uma restrição ao exercício do direito à tutela jurisdicional efetiva da impugnante, bem como ao confirmar o entendimento do impugnante de que essa interpretação contende com o disposto no artigo 12° do TCE do qual resulta a proibição de toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade, admite apenas o facto constante do n° 10 do probatório. Contudo, o facto documentalmente provado a fls. 185 do processo instrutor — não ter o sujeito passivo nomeado qualquer representante, com residência em território nacional, para efeitos tributários — não foi levado ao probatório.

    Ora relevando esse facto para a exceção a decidir deveria integrar o probatório, uma vez que se encontra documentalmente provado (cfr.

    fls.

    185 do processo instrutor), padecendo a sentença recorrida de insuficiente fixação de matéria de facto.

  2. A imposição legal do n° 4 do artigo 19° da LGT não traduz qualquer discriminação em razão da nacionalidade, uma vez que a obrigação de constituir representante, com residência em território nacional, para efeitos tributários, impende sobre nacionais e sobre estrangeiros nas condições nele estipuladas.

    A eventual compressão decorrente da restrição ao exercício do direito de impugnar imposta no n° 5 do artigo 19° da LGT é proporcional à cobertura das necessidades que visa suprir decorrentes da específica situação do universo dos sujeitos passivos abrangidos por esse dispositivo legal.

    Também, nesta vertente, a sentença viola os referidos n° 4 e 5 do artigo 19° da LGT.

    II - Quanto à caducidade do direito de impugnar A reclamação graciosa apresentada pela impugnante, por ter por fundamento apenas matéria de direito, não era reclamação necessária e devia ser apresentada nos prazos gerais do artigo 70° n° 1 do CPPT e a impugnação não dependia do despacho que sobre ela recaísse, nos termos do disposto no artigo 132° n° 6 do CPPT. E A Impugnação devia, pois, ser apresentada no prazo do artigo 102° n° 1 do CPPT e, por ter sido apresentada muito depois, revela-se intempestiva.

    A sentença recorrida, ao considerá-la tempestiva, viola o disposto no n° 3 do artigo 131°, n° 6 do artigo 132° e 70° n° 1, todos do CPPT.

    III - Violação do contraditório Verifica-se que consta a fls. 257 a 269 dos autos um documento junto pela recorrida, em 06-07-2001, de cujo teor nunca a recorrente foi notificada até ter sido notificada da sentença.

    Tal documento foi junto para influenciar a decisão da causa, não foi junto com a petição da impugnação - sobre o mesmo foi aposto um visto de entrada e não consta dos autos qualquer despacho de desentranhamento - e teve a sua junção admitida com desrespeito do princípio do contraditório.

    A atuação judicial acima descrita é violadora do disposto no n° 3 do artigo 3º e 526° do CPC e no artigo 115° n° 1 e 4 do CPPT, e consubstancia irregularidade que, por influir na decisão da causa, produz a nulidade prevista no artigo 201° do CPC.

    Deve, pois, ser anulado todo o processado posterior à junção do doc.

    de fls. 257 e segs. com a consequente baixa dos autos ao tribunal recorrido para realização da notificação omitida e posteriores trâmites.

    IV - Omissão de notificação para alegações Sem conceder, deve ainda ser anulado todo o processado, por falta de notificação para alegações nos termos do artigo 120° do CPPT, por a sentença recorrida ter violado o disposto nesse artigo e se tratar de irregularidade com influência na decisão da causa, quer face à complexidade da matéria em discussão nos autos, quer face a anterior omissão de notificação para pronúncia sobre documento junto pela parte contrária. Sofre a sentença da nulidade prevista no artigo 201° do CPC.

    V - A sentença, ao considerar que as liquidações impugnadas padecem do vício de violação de lei, consubstanciado na violação do princípio da livre circulação de capitais, previsto no art. 56° do TCE, e 8º n° 4 da CRP, fez uma incorreta interpretação da factualidade subjacente bem como do artigo 56° do CE:

  3. Desde logo porque ao caso sub judice não é aplicável a Diretiva 90/435, uma vez que a participação da impugnante não atinge o nível de participação a que se refere o n° 1 do artigo 5.° dessa Diretiva. Ademais porque a impugnante não foi objeto de tratamento menos favorável, pois tratando-se de a exigência de um representante fiscal e a retenção na fonte representam apenas um tratamento diferente de situações diferentes. E quanto à taxa do imposto, a aplicada à impugnante não é diferente da aplicada às residentes. A aplicada em 2005, pela inexistência ao tempo de convenção para evitar a dupla tributação com a Espanha foi a taxa resultante de um benefício idêntico para todas a empresas em situação idêntica, residentes ou não residentes [aplicação conjunta dos artigos 80° n° 2 al. c) do CIRC e 59° do EBC]; a de 2006 foi determinada por aplicação conjunta dos artigos 80° n° 2 al. c) do CIRC e 10° n° 1 al. b) da CEDT entre Portugal e Espanha. Não ocorreu, pois, qualquer discriminação que não se fundamentasse em tratamento igual do que é igual e diferente do que é diferente. A sentença recorrida é que beneficia a impugnante sem fundamento, garantindo-lhe assim um tratamento mais favorável do que o dado a outras entidades em situação idêntica.

  4. O facto de as sociedades serem residentes ou não coloca-as, pelo regime fiscal que lhes é aplicável, em situações objetivamente diferentes, sendo certo que o crédito de imposto por dupla tributação internacional previsto no artigo 85° do CIRC exige montante de coleta suficiente à dedução, o que pode não ocorrer em muitas situações. O Tratado da CE não proíbe em absoluto a aplicação de medidas nacionais que estabeleçam diferenças entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação de residência, O artigo 58° do TCE dispõe que “o disposto no artigo 56° não prejudica o direito de os estados-membros: a) aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido”.

    VI - A sentença recorrida, ao fundamentar a sua decisão no artigo 56° do tratado CE faz dele uma aplicação direta e descontextualizada, sem integrar sistematicamente a norma no conjunto do tratado, designadamente sopesando a ressalva do artigo 58° relativamente ao artigo 56°. Além de que é duvidosa a aplicação direta do artigo 56° por não ser uma norma “self-executing” e carecer de desenvolvimento em direito comunitário derivado (Diretiva ou Regulamento CE). De qualquer modo, a aplicar-se diretamente, dever-se-ia articulá-la com o artigo 58°. Como muito bem refere o TCASul no Acórdão de 2 de Fevereiro proferido no processo n° 1959/07, não existe incompatibilidade com a livre circulação de capitais, por a situação cair na exceção da al. a) do n° 1 do artigo 58° do Tratado CE Aplicando como aplicou o artigo 56° do TCE, a sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação do artigo 56°, violando ambas as disposições (artigos 56° e 58° do TCE).

    VII - As liquidações em causa não constituem violações do disposto nos artigos 8º n° 2 da CRP e 1° n° 1 da LGT porque também não violam o primado do direito comunitário. A sentença recorrida é que, ao fazer...

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