Acórdão nº 00500/19.9BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.1. A., S.A.

, intentou a presente ação administrativa contra o MUNICÍPIO DE (...), tendo em vista obter a condenação do Réu a pagar à Autora a quantia de 522.723,92€ (quinhentos e vinte e dois mil, setecentos e vinte e três euros e noventa e dois cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos, que à data da instauração da ação perfazem € 61.352,03 (sessenta e um mil, trezentos e cinquenta e dois euros e três cêntimos) e de juros de mora vincendos.

Para tanto, alega, em síntese, que é a entidade gestora do sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Norte de Portugal, e que o MUNICÍPIO DE (...), na qualidade de utilizador originário, integra o referido sistema multimunicipal.

Afirma que no ano de 2017 a autora faturou 0€ de serviços de abastecimento de água, na medida em que o volume de faturação real não atingiu os valores previstos no Anexo III ao contrato de concessão, porquanto o R. não consumiu a água produzida a partir do subsistema do Alto Rabagão, em violação do direito da autora exercer em exclusividade esta atividade concessionada; Assim, a autora tem o direito de cobrar os valores mínimos previstos no contrato de concessão ao R., no montante de €522.723,92, acrescido dos respetivos juros de mora.

Quanto ao R. encontra-se fixado no Anexo III ao contrato de concessão, para o ano de 2017, o valor mínimo anual de € 482.475,00, relativo ao serviço de abastecimento de água para consumo público, e o valor mínimo anual de € 171.566,00, relativo ao serviço de recolha e tratamento de efluentes; Nos termos da cláusula 22.ª, n.º 5 do contrato de concessão as tarifas são atualizadas, pelo que o valor mínimo fixado para o ano de 2017 e relativo ao serviço de abastecimento de água, quanto ao R., é de € 493.135,77; Assim, tendo-se verificado que o valor resultante da faturação da utilização do serviço, no abastecimento de água para consumo público foi inferior àquele valor mínimo, verifica-se o primeiro requisito para a cobrança daquele valor mínimo fixado no contrato de concessão; Por outro lado, o R. não atingiu aqueles valores mínimos por não consumir a água contratada e fornecida pelo sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Norte de Portugal, que serve todo o concelho, sendo-lhe tal situação imputável, incumprindo não só a obrigação de ligação ao referido sistema, como também obstado ao direito da autora exercer a atividade em exclusivo; Foi em consequência do incumprimento das regras previstas no contrato de concessão, que a Autora emitiu as faturas cujos valores ora reclama, que até à data não foram pagos.

1.2.Citado, o Réu contestou, defendendo-se por exceção, invocando a incompetência material deste Tribunal, a exceção do não cumprimento da concessão e dos dois contratos de fornecimento, abastecimento de água e de tratamento de efluentes, datados de 26/10/2001 e a nulidade dos contratos. Defendeu-se ainda por impugnação.

Quanto à exceção da incompetência material, invocou que a competência para julgar a matéria objeto dos autos é do Tribunal Arbitral, por força do convencionado pelas partes na cláusula 9.ª do contrato de fornecimento de água e na cláusula 10.ª do contrato de recolha de efluentes; Afirma que a questão relativamente à qual existe divergência entre a Autora e o Réu pode resumir-se à exigibilidade ou não do pagamento de consumos mínimos de água por parte do Réu à Autora, quando esta não garante o fornecimento de água a todo o concelho de (...) e não realizou todos os investimentos que se vinculou a executar nos termos da concessão; Logo, a fatura que a Autora pretende que o Réu pague não diz respeito a fornecimentos e serviços prestados por aquela, ou seja, a créditos resultantes do fornecimento de água ou de tratamento de efluentes urbanos, mas antes se refere a consumos mínimos de água que a Autora pretende impor ao Réu sem fundamento, reportados ao ano de 2017.

Assim, saber se o Réu está vinculado, ou não, no ano de 2017, ao pagamento de consumos mínimos de água, e, em caso afirmativo, no montante plasmado na fatura em questão, é matéria que deverá ser dirimida em sede de Tribunal Arbitral.

Quanto à exceção do não cumprimento alegou, em síntese, que a autora, no ano de 2017, não assegurou o fornecimento de água para consumo público a todos os sistemas municipais existentes no concelho de (...), geridos pelo Réu, razão pela qual não lhe adquiriu qualquer m3 de água no ano de 2017, à semelhança do que sucedeu noutros anos, tendo o incumprimento que lhe é assacado sido motivado pelo incumprimento por parte da Autora, traduzido na sua incapacidade de fornecer água para consumo humano a todos os sistemas municipais do concelho de (...), pelo que, enquanto essa obrigação não for cumprida pela Autora, não está obrigado a pagar os valores referentes aos consumos mínimos de água.

Quanto à exceção da nulidade dos contratos datados de 26/10/2001, alega que os mesmos são nulos na parte relativa à fixação de consumos mínimos, porquanto na interpretação da Autora imporia, ao Réu, obrigações contratuais desproporcionadas, logo, abusivas.

Na defesa por impugnação, pugnou pela improcedência da ação, alegando, em síntese, nada dever à Autora, uma vez que a fatura que a autora pretende que seja paga, não respeita a fornecimentos e serviços prestados por aquela, mas antes a consumos mínimos que a Autora lhe pretende impor.

1.3.

Devidamente notificada da contestação apresentada, a Autora apresentou réplica, em que pugna pela improcedência das exceções invocadas. Quanto à exceção de incompetência do tribunal por preterição de cláusula arbitral, reitera que o litígio apenas diz respeito ao cumprimento da obrigação de pagamento de faturas, bem como que o Réu apenas contesta o valor das faturas.

1.4.

Em 10 de julho de 2020, o TAF de Mirandela proferiu sentença, absolvendo o Réu da instância, constando da mesma o seguinte segmento decisório: «Face ao que vem exposto, julga-se este tribunal incompetente para conhecer a presente ação, por preterição de tribunal arbitral, pelo que absolvo o Réu da instância, nos termos conjugados do art. 89.º, n.ºs 2 e 4, al. a), do CPTA, e dos arts. 96.º, al. b), 576.º, n.º 2, 577.º, al. a), do CPC.

Custas pela Autora, nos termos do art. 527.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA.

Registe e notifique.

» 1.5.

Inconformado com a decisão proferida pelo TAF de Mirandela que absolveu o Réu da instância por preterição de Tribunal Arbitral, a Autora interpôs o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões: «1.Vem o presente recurso interposto da sentença proferida em 10/07/2020 (notificada à aqui Recorrente por notificação eletrónica elaborada e certificada em 13/07/2020), e que absolveu o Réu da instância, ao julgar procedente a alegada exceção de incompetência absoluta, por preterição da cláusula arbitral, decidindo: “Face ao que vem exposto, julga-se este tribunal incompetente para conhecer a presente ação, por preterição de tribunal arbitral, pelo que absolvo o Réu da instância, nos termos conjugados do art. 89.º, n.ºs 2 e 4, ai. a), do CPTA, e dos arts. 96.º, al. b), 576.º, n.º 2, 577.º, al. a), do CPC”.

  1. Salvo o devido respeito, a decisão tomada pelo douto Tribunal a quo consubstancia-se num manifesto ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO E DE DIREITO, porquanto: 3. Considera a Recorrente que o douto Tribunal a quo comete um erro de julgamento quanto à matéria de facto, pois que fixou o seguinte: “(...) pede a condenação do Réu a pagar à Autora a quantia de 522.723,92 (quinhentos e vinte e dois mil, setecentos e vinte e três euros e noventa e dois cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos, no valor de € 61.352,03 (sessenta e um mil, trezentos e cinquenta e dois euros e três cêntimos) e de juros de mora vincendos. Segundo alega, tais quantias correspondem a juros de mora devidos pelo pagamento tardio dos serviços de saneamento e de fornecimento de água prestados à Ré pela Autora na qualidade de concessionária da exploração, tratamento e fornecimento de água em alta e de saneamento.” – parágrafo 2.º, da pág. 1 da Sentença Recorrida.

  2. Nesse sentido, e conforme se retira da Petição Inicial apresentada pela ora Recorrente, a quantia de € 522.723,92 diz respeito a faturas de valores mínimos referentes ao ano de 2017, emitidas e não pagas pelo MUNICÍPIO DE (...), e não “a juros de mora devidos pelo pagamento tardio dos serviços de saneamento e fornecimento de água prestados”, conforme fixou o douto Tribunal a quo (certamente que por lapso), no 2.º parágrafo da sua sentença – Cfr. páginas 4 a 7 da Petição Inicial e documento 7 junto.

  3. Sendo certo que, a quantia de € 61.352,03 diz respeito aos juros de mora vencidos, calculados à data da propositura da ação, sobre os montantes de capital ali peticionados.

  4. Também assim, ao contrário do fixado na sentença recorrida, não é verdade que o Recorrido tenha alegado que “os valores exigidos na presente ação dizem respeito a juros de mora por atraso no pagamento de faturas referentes a consumos mínimos de fornecimento de água, a cujo pagamento o Réu entende que não está obrigado, em virtude do incumprimento do contrato por parte da Autora” – Cfr. parágrafo 2.º da página 9 da sentença recorrida.

  5. De facto, o Recorrido, na contestação apresentada (e disponível a páginas 222 a 235 do SITAF), e quanto à assacada incompetência absoluta deste douto Tribunal, apenas refere que “a questão relativamente à qual existe divergência entre a Autora e o Réu pode resumir-se à exigibilidade ou não do pagamento de consumos mínimos de água por parte do Réu à Autora, quando esta não garante o fornecimento de água a todo o concelho de (...) e não realizou todos os investimentos que se vinculou a executar nos termos da concessão.”, nunca se referindo a faturas de juros de mora – precisamente por não ser este o objeto dos presentes autos.

  6. Pelo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT