Acórdão nº 629/05.0BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução14 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO I-RELATÓRIO S.....RIO, LDA, (doravante Recorrente ou S.....) veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e correspondente liquidação de Juros Compensatórios (JC) com os números ..... e ....., no valor de €30.521,24 e €678,99, respetivamente, respeitantes ao ano de 2003, decretando, em conformidade, a anulação parcial do ato de liquidação de IVA pelo montante de €20.000,00, e correspondente proporção na liquidação de juros compensatórios.

A Recorrente, veio apresentar as suas alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem: “IV. CONCLUSÕES 80. Vem a Recorrente notificada da sentença proferida nos presentes autos, julgando a presente ação parcialmente procedente e determinando a anulação parcial da liquidação adicional de IVA n°. ....., no valor de €30.521,24 e a correspondente liquidação de juros compensatórios, com o n°. ....., no valor de €678,99, referentes ao exercício de 2003. A anulação parcial determinada pelo tribunal a quo atinge o ato impugnado de liquidação de IVA apenas pelo montante de €20.000,00, e a liquidação de juros compensatórios na correspondente proporção, absolvendo-se a Fazenda Pública quanto ao demais peticionado.

81. Ora, na sequência de renúncia à isenção de IVA em contrato de arrendamento de imóvel, a Recorrente apresentou em 11/04/2004 declaração periódica de IVA respeitante ao período 03/12T, na qual declarou imposto liquidado a clientes no montante de € 1.140,00, ao qual deveria ser deduzido o IVA dedutível no montante de € 28.769,60 suportado nos bens e serviços por si adquiridos para a realização das suas operações sujeitas a imposto, requerendo reembolso no montante de €20.000,00 e ficando os remanescentes € 7.629,60 como excesso a reportar em subsequentes períodos de tributação.

82. Na sequência de tal declaração periódica de IVA foi iniciado procedimento de inspeção tributária, culminando no relatório onde foi decidido o indeferimento total do pedido de reembolso, referindo encontrar-se ainda imposto em falta no montante de € 10.521,24, e propondo algo a que designa de “correções técnicas”, mas cujo cômputo a AT nunca procurou minimamente fundamentar ou justificar, no montante de € 30.521,24.

83. A decisão tomada pela administração que redundou na prática dos atos tributários impugnados desconsidera inteiramente a presunção de veracidade e a boa fé das declarações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei (artigo 75° n°. 1 da LGT), decidindo contra o ato por esta praticado na forma e no tempo legais, apenas com fundamento em “não ter sido possível confirmar sem base para dúvidas” que o IVA deduzido pela Recorrente era de facto dedutível, sendo por isso desprovida - bem como os atos tributários com base nela praticados - de base fundamentadora consistente e circunstanciadamente apoiada.

84. No seguimento deste relatório foram ainda emitidas as liquidações adicionais aqui impugnadas.

85. A decisão de indeferimento do pedido de reembolso foi objeto de impugnação judicial apresentada nos termos do n°. 13 do código do IVA e seguiu os seus termos no TAF de Sintra sob o n°. 103/05.5BESNT, e posteriormente na Secção de Contencioso Tributário deste TCA Sul, sob o n°. 09215/15, onde foi apreciada toda a relação jurídico-fiscal subjacente às liquidações ora impugnadas.

86. Com efeito, na sequência daquele relatório foram igualmente emitidas as liquidações administrativas de IVA impugnadas no âmbito dos presentes autos, cuja suspensão foi determinada por despacho de 01/09/2008, em virtude da existência de causa prejudicial (a impugnação judicial do indeferimento do pedido de reembolso no montante de €20.000,00, com o n°. TAF de Sintra de 103/05.5BESNT, e n°. TCA Sul de 09215/15), até trânsito em julgado da decisão a proferir naquele processo de impugnação judicial.

87. A 28/05/2015 foi proferida sentença no âmbito do processo de impugnação judicial n.° 103/05.5BESNT, julgando a ação procedente e determinando a anulação do acto de indeferimento do pedido de reembolso formulado nos autos, decisão que se tornou definitiva após acórdão do TCAS de 25/06/2019, transitado em julgado em 16/09/2019, que confirmou o sentido da decisão proferida em primeira instância e determinando a anulação do ato de indeferimento do pedido de reembolso, no montante de €20.000,00, formulado nos autos, considerando, entre outros fundamentos que: “a Impugnante podia exercer o direito à dedução do imposto suportado a montante na declaração que apresentou com referência ao 4º trimestre do ano de 2003, como sucedeu (cfr. alínea B dos factos provados).” 88. Contrariamente ao que refere o tribunal a quo, a Impugnante nunca declarou que apenas o montante de € 20.000,00 correspondia a IVA associado a despesas de construção do armazém destinado à realização das operações para as quais tinha renunciado à isenção de IVA; o que declarou e declara, isso sim, é que tanto as “correções técnicas” que constam do ponto 8 do relatório de inspeção que deu origem aos atos impugnados, no total de € 30.521,24, e o “imposto em falta no montante de €10.521,24" nunca foram adequadamente fundamentadas ou justificadas pela AT, tratando-se por isso, para o signatário, de duas cifras incognoscíveis.

89. O que a impugnante sabe e nunca colocou em causa é que o total do imposto deduzido no seguimento da renúncia à isenção levada a cabo pela Recorrente designadamente na sua declaração periódica de IVA relativa ao período 03/12T, corresponde a imposto dedutível associado a despesas de construção de um armazém objeto de arrendamento, operação relativamente à qual a impugnante havia renunciado à isenção de IVA (como consta do probatório).

90. Por isso, não compreende nem a decisão de liquidar adicionalmente o montante de € 10.521,24 - cifra nunca adequadamente fundamentada nem sequer justificada pela AT - nem a liquidação adicional de IVA no total de € 30.521,24 - cifra igualmente não substanciada ou justificada pela AT - tudo apenas assente na singela asserção, contida no relatório de inspeção junto ao requerimento inicial de impugnação, de que “não foi possível confirmar, sem base para dúvidas, que o IVA dedutível diz respeito a despesas de construção de um armazém”, simplesmente porque as residências dos dois sócios gerentes da Impugnante são contíguas ao armazém a que e refere a renúncia à isenção de IVA.

91. A afirmação contida na sentença recorrida de que “[1] do montante total referente a IVA dedutível acumulado por aquele sujeito passivo que perfazia o montante de €30.521,24, [2] apenas €20.000,00 correspondiam a despesas associadas à renuncia à isenção, [3] facto esse que se depreende pela circunstância do contribuinte apenas ter solicitado o reembolso daquele montante, e não da totalidade do IVA dedutível ”, revela uma contradição com os próprios fundamentos da decisão, já que, se ficou assente e foi decidido pelo TCAS que a Impugnante tinha direito não só ao reembolso de €20.000,00, como a “exercer o direito à dedução do imposto suportado a montante na declaração que apresentou com referência ao 4º trimestre do ano de 2003, como sucedeu (cfr. alínea B dos factos provados)”, então nunca poderia esse montante ser a única parcela do montante total referente a IVA dedutível acumulado por aquele sujeito passivo.

92. Esta afirmação denota aliás a falta de compreensão do funcionamento do IVA, uma vez que o reembolso é feito, não pelo IVA deduzido pelo contribuinte, associado a despesas de construção de um armazém objeto de arrendamento, mas apenas na parte em que esse imposto por ele deduzido excede todo o imposto liquidado nos seus inputs, razão porque do facto de apenas ter sido pedido reembolso de €20.000,00 não se pode “depreender” que nem todo o IVA deduzido correspondeu a despesas associadas à renúncia à isenção.

93. Por outro lado, e uma vez que foi realizado o reembolso pedido pela Recorrente, continua a não ser compreensível a que título pretende a AT manter a liquidação dos adicionais € 10.521,24, sobretudo tendo em conta que esse montante nunca foi, repita-se, adequadamente fundamentado ou justificado pela AT, violando o princípio da declaração (artigo 75° n°. 1 da LGT) e as regras sobre distribuição (artigo 74° da LGT) e satisfação do ónus da prova (artigo 100° n°. 1 do CPPT).

94. Estas regras são aplicáveis ao caso em apreço, uma vez que este mesmo Tribunal Central Administrativo do Sul decidiu, por acórdão proferido no âmbito do processo n°. 103/05.5BESNT, (proc. TC AS n°. 09215/15) - que aqui deve ter-se, para todos os efeitos por reproduzido - todas as questões relativas à legalidade do IVA deduzido pela ora Recorrente na sequência da referida renúncia à isenção de IVA, designadamente através da declaração periódica 03/12T, tendo acabado por, a propósito da mesma, declarar (linhas 6 a 8 da página 33 do acórdão), que: “não existindo dúvida alguma quanto à validade do exercício do direito à renúncia à isenção e tendo em conta que só com essa renúncia a Impugnante adquiriu o direito de deduzir o imposto suportado a montante com a construção dos imóveis, (...) a Impugnante podia exercer o direito à dedução do imposto suportado a montante na declaração que apresentou com referência ao 4º trimestre do ano de 2003, como sucedeu (cfr. alínea B dos factos provados).”.

95. Constitui assim também questão a decidir pelo tribunal ad quem, a de saber se a anulação meramente parcial do ato impugnado decidida nestes autos ofende o caso julgado formado pela sentença e acórdão que, ao julgar procedente a pretensão anulatória do despacho de indeferimento do pedido de reembolso de IVA (acórdão do TCAS, no âmbito do processo n°. 103/05.5BESNT, (proc TCAS n°. 09215/15)), procederam também à definição da situação material subjacente de que resulta a concreta relação jurídica de imposto formada entre a...

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