Acórdão nº 1045/12.3BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelDORA LUCAS NETO
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório M..., interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, de 04.04.2019,que julgou improcedente a ação administrativa especial por si intentada contra o MUNICÍPIO DE PALMELA, no âmbito da qual impugnou o Despacho do Vereador da Câmara Municipal, de 28.05.2012, exarado sobre informação técnica da Divisão de Fiscalização do Município, notificado pelo ofício n.° 1417/2012, de 24.07.2012, que ordenou a demolição da vedação existente no terreno sito junto ao caminho municipal 1029, Terrim, Freguesia de Pinhal Novo, Concelho de Palmela, “com reposição das condições anteriores à operação urbanística ilegal”, ao abrigo do disposto no n.° 1, do art. 106.°, do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 555/99, de 16.12., na redação introduzida pelo Decreto-Lei 26/2010 de 30.03.

Nas alegações de recurso que apresentou, culminou com as seguintes conclusões – cfr. fls. 339 e ss., ref. SITAF: «(…) 1. O presente recurso visa sindicar erros evidentes na fixação da matéria de facto, bem assim vícios de conhecimento de objeto não definido nesta ação, exorbitando do objeto do litígio e que conduziram a errada aplicação do direito e a uma decisão injusta.

  1. O despacho saneador, transitado em julgado, definiu o Objeto do litígio, em dois items, a saber: 1. se o acto que ordenou a ‘‘demolição” da vedação existente no prédio propriedade da autora viola o artigo 4º n.º 2, a/.a) do RJUE.

  2. “se o referido acto viola o artigo 62º da CRp”.

  3. As aspas (nossas) desde logo justificam-se pela desadequação (paradoxo) de conteúdo e literalidade. Uma vedação em rede não se pode demolir, como se fosse um muro, uma parede ou outra construção. Quando muito retira-se, afasta-se... na verdade já aí vai uma certa dose de imprecisão e de desvirtuamento dos factos.

  4. O mesmo saneador definiu os Temas da Prova: - características da vedação; distância ao eixo da via; amovibilidade da vedação; incorporação no solo da vedação.

  5. Foi ordenada a perícia que, pese embora de forma não muito assertiva e por vezes confusa, não deixa de reconhecer a amovibilidade da vedação. Vejam-se as respostas dadas: - “A vedação existente é em painéis metálicas de rede, suportadas em estacarias de madeira ou seja, aquilo que constitui o objeto do litígio, isto é a vedação facial à estrada municipal, é suportada por estacaria de madeira: “os prumos que suportam a vedação são de madeira”. “Não tem pilares de betão”-; - “os prumos de madeira sobem a uma altura de 2,00m” ; “ a rede metálica está colocada (sobe) a 1,65m de altura”. “a vedação confinante com a via pública tem uma dimensão de cerca de 30m”. “A vedação dista do eixo da via pública uma medida que varia entre os 7,20 m e os 7,50m”.

  6. A perícia distingue três tipos de muros: Muro de vedação; Muro lateral direito; Muro confinante com a via pública - v.fls.180, foto 3/8, superior.

  7. Desde logo, aquilo que é objeto do litígio é o terceiro tipo, ou seja, “Muro” confinante com a via pública.

  8. quer o de vedação, quer o lateral direito, não foram postos ali pela recorrente, mas já existiam muito antes de esta adquirir a propriedade.

  9. O de vedação percorre- no sentido nascente poente - toda a extensão da propriedade a norte, comum ao seu vizinho e tem as características descritas em fls. 180. Este sim é composto de pilares de betão e formado por alvenaria de tijolo, com uma altura media de 80cm e suporta uma rede ovelheira e pilares metálicos.

  10. O terceiro, confinante com via pública, é o que importa para o conteúdo do despacho impugnado, pois o que é objeto do litígio é o terceiro tipo, ou seja, Muro confinante com a via pública.

  11. Uma vez que, quer o de vedação, quer o lateral direito, não foram postos ali pela recorrente, mas já existiam muito antes de esta adquirir a propriedade.

  12. O de vedação percorre- sentido nascente poente - toda a extensão da propriedade a norte, delimitando do seu vizinho e tem as características descritas em fls. 180. Este sim é composto de pilares de betão e formado por alvenaria de tijolo, com uma altura média de 80cm e suporta uma rede ovelheira e pilares metálicos.

  13. O terceiro, confinante com via pública, é o que importa para o conteúdo do despacho impugnado.

  14. A intervenção da A restringe-se a este terceiro tipo, ao “muro” confinante com a via pública.

  15. Não obstante a advertência do senhor perito, não se furtou a confusões para que fora induzido pelas perguntas formuladas, não sendo coerente nem coincidente a designação dada pelo tribunal e o entendimento do senhor perito.

  16. Os números 5, 6, 10 e 11 ao falarem de pilares de ferro parece já estar-se a falar do muro lateral direito.

  17. Neste é que se situa a porta de acesso ao espaço em causa, porta configurada por dois postes de ferro seguros por parafusos fixados em sapatas de betão.

  18. Restringindo-se, ao que parece, o muro confinante com via pública aos números 7, 8 e 9.

  19. Falar de “muro de vedação” reportado ao confinante com a via pública encerra confusão, pois que não pode simultaneamente ser de rede metálica e ser muro. Existe contradição in terminis.

  20. Em seu lugar deve falar-se tão só de vedação em rede tendo na base, murete, pois que ali nenhum muro existe, como bem elucidam as fotografias juntas.

  21. “murete” foi, aliás, a expressão de que se serviu o senhor perito, na segunda perícia ordenada pelo tribunal a quo, com alvo no enunciado em i).

  22. Só que, paradoxalmcnte, vindo de um arquiteto, não se coaduna com a realidade atribuir-se à vedação a qualidade de “não é amovível “ pelo facto de se encontrar fixa ao solo através de um murete de betão”.

  23. O que significa “através de”?. Ideia instrumental, ou seja que não contacta com o solo diretamente. Bem certo. Até porque das fotografias juntas aos autos, v.g. fls. 187, foto 7/8 superior (com automóvel vermelho ali parado), sobressai a imagem clara de distância da rede ao solo.

  24. Mas não deixa de merecer registo a fórmula pouco segura, mesmo frágil, como apresenta a sua resposta: “ salvando melhor opinião”. Vindo de um arquiteto não é admissível este tipo de perícia e de resposta...

  25. Então não é ostensivo que a rede não toca sequer no dito murete? E como pode então dizer-se que a vedação “ se encontra fixa ao solo através do murete? Só se o perito não esteve no local.

  26. Pois a verdade é que a vedação em rede, objeto do litigio, se encontra fixa às estacas, ou prumos de madeira.

  27. E são estes que se apoiam no dito murete de um palmo de altura pelo lado de dentro e de zero em pelo lado de fora (não muro, que ali nenhum muro foi construído pela A).

  28. Esse “murete” é em matéria de tijolo e massa para unir e nele se apoiam as estacas de madeira.

  29. Quando na perícia se pergunta se o “muro” de vedação existente e confinante com a via pública se é de betão armado. Devia dizer-se se é de matéria rija, diferente de madeira. E devia também perguntar-se qual a altura desse murete.

  30. Teríamos como resposta incontornável que o dito murete, como é evidente nas fotos dos autos, nem sequer tem altura do exterior, virado para a estrada. Que apenas é visível pelo lado de dentro da propriedade, por ser o terreno mais baixo e em declive — cf. fls.204, fotos da segunda perícia.

  31. Aliás, esse murete tem também a função de segurar, ou suportar as terras e escorrências vindas da berma da estrada, que é mais alta e com as chuvas tudo escorre para a propriedade da autora.

  32. E é neste “muro” sem relevo, sem dimensão sequer visível da rua, que “os prumos de madeira que suportam a vedação encontram-se incorporados”.

  33. Ora, como pode então afirmar-se que a vedação é inamovível. Claro que não se move por si, mas é move-se, retira-se, desmonta-se, sem grande esforço, não precisa de operações de demolição.

  34. Bem vista a prova documental e pericial carreada, dos autos resulta evidente que os atos materiais praticados pela recorrente no seu terreno não integram, nem densificam o conceito de operação urbanística — n° 1 do artigo 4° do RJUE; 35. Igualmente não se trata de loteamento, nem de construção, de ampliação ou de alteração em área não abrangida por operação de loteamento nem por plano de pormenor que contenha as menções referidas na al. a) e c) do n° 2 do artigo 4° do DL 555/99.

  35. A referida norma legal no seu n° 1 disciplina a realização de operações urbanísticas submetendo-as a licenciamento ou a autorização administrativa.

  36. O n°2, trata do licenciamento das operações, obras e atos, previstos nas alíneas de a) a c) 38. O n°3 trata de situações de simples autorização administrativa, sem exigir licenciamento.

  37. E o seu n°3 alíneas, a) a g) regula as situações sujeitas a autorização por remissão para o DL 380/99, 22/9 a exigência de licenciamento e autorização administrativa " 40. A contrario do que se prevê naqueles normativos, não se trata in caso de obras de construção, nem de ampliação, nem de alteração em área não abrangida por operação de loteamento, nem por plano de pormenor.

  38. Trata-se tão só de uma elementar vedação em rede, que os autos documentam.

  39. A dita vedação é manifestamente precária e amovível, não se subsumindo ao conceito de operação sujeita a licenciamento e autorização administrativa.

  40. Com efeito, o conceito de licenciabilidade ínsito na al. c) do n° 2 do artigo 4“ é o de que, objetivamente, se tem de estar perante uma atividade ou resultado que represente uma construção ou reconstrução ou ampliação de algo pré-existente ou, por outro lado ainda, a alteração ou conservação de um imóvel destinado a utilização humana e, numa última aceção ainda, de construção que se incorpore no solo com carácter de permanência.

  41. No caso dos autos existe erro manifesto em sede de matéria de facto, vício que fere de nulidade a decisão impugnada, porquanto os elementos utilizados e colocados no local, para servir de vedação do terreno da requerente na frente confinante com a via pública municipal, não têm caracter...

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