Acórdão nº 1392/19.3BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelLINA COSTA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: N….., S.A.

, devidamente identificado como requerente nos autos de outros processos cautelares, instaurado contra Município de Tomar e massa Insolvente da A….., S.A.

, na qualidade de contra-interessada, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional do despacho que indeferiu o seu requerimento de prova testemunhal e da sentença proferida em 10.7.2019 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que indeferiu o pedido de suspensão de eficácia da deliberação da Câmara Municipal de Tomar de 19.8.2019, que determinou o exercício do direito de reversão do lote ….. do Parque Empresarial de Tomar, por não se verificarem os pressupostos de que a lei faz depender a concessão de providências cautelares.

Nas respectivas alegações, a Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem: A. O tribunal recorrido veio indeferir o requerimento para produção de prova testemunhal “[…] por se afigurar desnecessária ou impertinente”.

  1. E indeferiu o pedido de suspensão de eficácia da deliberação da Câmara Municipal de Tomar de 19.08.2019, pela qual se determinou o exercício do direito de reversão do lote …..

    do Parque Empresarial de Tomar, por entender não se verificarem os pressupostos de que a lei faz depender a concessão de providências cautelares.

  2. Para tanto, o tribunal recorrido formou a sua convicção “com base no acordo das partes, apurado mediante a posição por si assumida nos respetivos articulados, bem como com base no teor dos documentos juntos aos autos, todos indicados por referência a cada concreto ponto da matéria.” D. Não se conformando, o Recorrente interpôs o presente recurso, por considerar, com o devido respeito, que andou mal o tribunal a quo, (i) ao indeferir os requerimentos para produção de prova e, na sentença recorrida, (ii) ao concluir pela “falta de verificação de que a mesma (a requerente, aqui recorrente) seja legítima titular do direito de superfície sobre o lote, cuja reversão se determinou pela deliberação suspendenda”.

  3. O tribunal a quo afirmou “[…] com clareza inexistir “aparência de bom direito”, tal como requisitado pela norma contida no art. 120.º do CPTA.

    ”, concluindo pela improcedência “[…] sem necessidade de outras considerações, (d)o presente processo cautelar.

    ”.

  4. Para o indeferimento do requerimento probatório, o tribunal recorrido embora tenha apresentado algumas razões que motivaram o indeferimento, a fundamentação revelou‐se parca e manifestamente insuficiente, não permitindo à Recorrente perceber, de forma clara, e em que medida foi considerada “a desnecessidade ou impertinência” da prova requerida.

  5. Pelo tribunal recorrido foi violado o dever de fundamentação, ao qual se encontra adstrito nos termos do artigo 154.º do CPC.

  6. Não é possível ao tribunal vaticinar os depoimentos das testemunhas, não sendo consequentemente, possível aferir, sem mais, da pertinência e relevância (ou falta delas) para a causa decidenda, quando a eles não houve lugar, única e exclusivamente, por determinação do tribunal.

    I. Assente num juízo de prognose, a decisão resulta numa limitação irreversível do direito de prova da Recorrente, carecendo, nesses termos, de fundamentação bastante. E, nesse sentido, veja‐se o Tribunal Central Administrativo Sul: “O despacho proferido ao abrigo do artigo 90.º/2 do CPTA, que indefere requerimentos dirigidos à produção de prova testemunhal sobre certos factos, não se mostra devidamente fundamentado quando não permite perceber as razões pelas quais se afigura “clara desnecessidade” da prova requerida, nem incide sobre realidade onde seja evidente a desnecessidade de produção dessa prova, o que tornava imprescindível essa fundamentação.” (Ac. do Tribunal Central Administrativo Sul, de 18.12.2014, disponível em www.dgsi.pt) J. O tribunal recorrido também não fundamentou o juízo conclusivo que fez sobre a suficiência da prova (documental), não permitindo aos seus destinatários compreender o itinerário valorativo e cognoscitivo ínsito na decisão de indeferimento, o que consubstancia uma violação clara do n.º 2 do artigo 90.º do CPTA e também o artigo 154.º do CPC.

  7. O direito à prova surge como uma garantia da ação e da defesa e como uma emanação dos direitos, liberdades e garantias que merecem tutela constitucional.

    L. O tribunal a quo, ao ter decidido, sem mais, pela não produção da prova testemunhal requerida, coartou à Recorrente a possibilidade de fazer prova de matéria de facto relevante para a decisão da causa, designadamente no que respeita à titularidade legítima do direito de superfície sobre o lote por parte do Recorrente.

  8. Situação insustentável e penosa do ponto de vista da posição processual assumida pelo Recorrente, violadora do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, constitucionalmente consagrado nos artigos 20.º, n.ºs 1 e 4 e 268.º, n.º 4, ambos da CRP e artigo 2.º do CPTA, donde decorre um direito à prova constitucionalmente garantido.

  9. No que respeita à inexistência da “aparência de bom direito”, incorporado no requisito legal “fumus boni iuris” cuja verificação se exige para a procedência da providência cautelar, o argumento não procede.

  10. Por efeito do contrato de compra e venda que operou entre A….. (então titular do direito de superfície do lote) e B….. (incorporada no …..) e consequente transferência de ativos e passivos do ….. para o N….., o Recorrente sucedeu na posição contratual da B….., tornando‐se legítimo titular do direito de superfície sobre o lote.

  11. Existe registo de aquisição do direito de superfície sobre o lote a favor no Recorrente.

  12. Mais, de acordo com o artigo 7.º do CRPredial “O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.

    ” R. Acresce que as comunicações que têm por objeto o referido lote são dirigidas e notificadas ao N….., na qualidade de titular do direito de superfície, postura que foi, desde a data da aquisição do referido direito, sempre assumida pela CMT e da qual se retira um inequívoco reconhecimento, por parte da CMT, da titularidade legítima do direito de superfície do lote em questão pelo N…...

  13. Inclusivamente, o Recorrente foi notificado pela CMT da Deliberação de 24.06.2019 para se pronunciar, em sede de audiência prévia, sobre a intenção de a CMT exercer o “direito de reversão” sobre o direito de superfície do referido lote, o que confirma um efetivo reconhecimento da titularidade legítima do direito de superfície do N…...

  14. A CMT em momento algum atuou no sentido de provar a não titularidade legítima do direito por parte do …...

  15. O reconhecimento da titularidade do direito, ainda que não formalizado, não pode ser ignorado como o tribunal recorrido pretende.

    V. O direito de superfície (do N…..) é um direito real autónomo, em relação ao direito de propriedade (da CMT), que o onera, e confere ao seu titular a plenitude do gozo sobre a coisa construída ou implantada, e sem as limitações relativas à forma que caracterizam o direito de usufruto.

  16. O N….., legítimo titular do direito de superfície sobre o lote, exerce na sua plenitude um verdadeiro direito de domínio.

    X. E criada, no N….., uma legítima expetativa sobre o direito adquirido, a qual tem vindo a ser confirmada, ao longo dos anos, pela CMT.

  17. Não pode essa expetativa, sem mais, vir a...

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