Acórdão nº 2060/19.1BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE PELICANO
Data da Resolução10 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul.

A sociedade O... – Sociedade Comercial e Industrial de Electrotécnica, S.A.

vem, no âmbito da presente acção de contencioso pré-contratual intentada contra o Instituto do Mar e da Atmosfera, I.P. e em que figura como contra-interessada a V..., recorrer da sentença proferida no TAF de Sintra que declarou a improcedência: - do pedido de anulação do acto de admissão da proposta apresentada pela contra-interessada no âmbito do “Concurso Público Internacional n° 18/2018, designado por «Fornecimento, Instalação e Colocação em Serviço de um Radar Meteorológico Doppler com Polarização Dupla (Santa Bárbara, Ilha Terceira, Açores”.

-do acto de adjudicação que recaiu sobre a proposta da contra-interessada; - do pedido de condenação do demandado a graduar a proposta da ora Recorrente em primeiro lugar e a praticar novo acto de adjudicação que recaísse sobre a proposta apresentada por esta, bem assim como a celebrar o correspondente contrato.

Apresentou as seguintes conclusões com as suas alegações de recurso: 1ª - A douta sentença para além de carecer de fundamentação, labora em erro, uma vez que a violação do regime do idioma da proposta da Contrainteressada não carece de ser analisada à luz do artigo 9.º do Código Civil.

2ª - A definição do Plano de Testes enquanto documento técnico (que não é totalmente certo que o seja) não justifica a possibilidade de o mesmo ser redigido em idioma inglês, ao abrigo da cláusula 23ª, n.º 5 do programa de concurso.

3ª - A cláusula 23ª, n.

º 5 do programa de concurso exige que para além de estar em causa documentação técnica, tem que respeitar a aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência, ou seja, a atributos «As propostas e todos os documentos que as acompanham devem ser obrigatoriamente redigidos em língua portuguesa. No entanto, aceita-se que os catálogos e documentação técnica que, em função do objeto do contrato a celebrar, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar, sejam apresentados em língua inglesa, o mesmo se aplicando à designação dos componentes, sobressalentes e ferramentas.» (sublinhados e realces da Recorrente) 4ª- 0 Plano de Testes reconduz-se a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos (termos ou condições) e, inclusive, tal resulta do relatório final «Nestes termos, o documento em crise (Plano de Testes) (...) exigida "pelo programa do procedimento", onde se encontram previstos os termos e condições relativas a aspetos da execução do contrato, não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos"», (sublinhados e realces da Recorrente).

Para além disso, 5ª-o Plano de Testes era um documento obrigatório da proposta e o qual era exigido sob pena de exclusão, tal como resulta do artigo 28º do PC que regula a exclusão da proposta, onde se pode ler na alínea o) que são excluídas as propostas «que careçam de algum dos seguintes elementos (...) v) Algum elemento dos exigidos que inviabilize a apreciação da proposta, designadamente dos constantes na Cláusula 22 deste Programa de Concurso (...)».

Que é exatamente o caso do Plano de Testes (sublinhados e realces da Recorrente).

6ª - Contrariamente à douta sentença, e onde esta parece gerar alguma confusão ao referir- se a «em função do concurso dos autos e do contrato a celebrar» não basta que se trate de documentação técnica para que seja admissível a sua apresentação em idioma inglês, tem igualmente que reportar-se a atributos.

7ª - Portanto, tratando-se 0 Plano de Testes de documento respeitante a termos ou condições (e, sendo obrigatório, como se viu), pode concluir-se que o mesmo tinha que ser apresentado em português, nos termos do n.

º 1 do artigo 58.

º do CCP, não se integrando na exceção prevista na cláusula 25ª, n.

º 3 do programa de concurso.

8ª - A norma contida na cláusula 25ª, n.

º 3 do programa de concurso é absolutamente transparente não sendo necessário recorrer nem ao artigo 9.

º do Código Civil nem à «posição do declaratário normal” 9ª - E, a jurisprudência vai no mesmo sentido de que a Recorrente «Se de acordo com o estabelecido no Programa de Procedimento, as propostas deviam ser instruídas, sob pena de exclusão, com as "fichas técnicas" dos equipamentos a fornecer, estes documentos não eram de apresentação facultativa mas de apresentação obrigatória, pelo que não recaíam na situação de excepção à utilização da língua portuguesa contida no nº 3 do artigo 58º do CCP; impunha-se, pois, que fossem expressos na língua portuguesa, ou sendo-o em língua estrangeira, que fossem acompanhados da respetiva tradução.

(...) a inobservância dessa exigência é sancionada com a exclusão da proposta, nos termos do artigo 146º nº 2 alínea e) do CCP»1.

(sublinhados e realces da Recorrente) 10ª - No mesmo sentido, o acórdão do TCA Norte processo 771/17.5BEAVR de 18 de maio de 2018 «Tal significa que a "ficha técnica" cuja redação em português era exigida pelo ponto 13.6 do programa do procedimento (Facto Provado 1.) teria mesmo de estar escrita em língua portuguesa ou, então, deveria ser acompanhada com tradução legalizada e declaração da sua prevalência, o que não sucedeu, em razão do que não poderia deixar de ser excluída com este fundamento.» (sublinhados e realces da Recorrente) 11ª - Neste caso, nem sequer se coloca a questão de inteligibilidade do documento ou a utilização esporádica no documento de expressões em idioma estrangeiro, mas sim, a redação integral e única em idioma estrangeiro, fora da exceção prevista no programa de concurso.

12ª - De todo o modo, o artigo 58.º, n.º 1 do CCP impõe a redação exclusiva dos documentos em português, porque prossegue fins de interesse público (e que não se cinge apenas a questões de compreensibilidade) e é uma imposição do Estado de Direito e da soberania nacional (artigo 11.º n.º 3 da CRP).

Assim, 13ª - Uma vez que 0 Plano de Testes respeita a termos ou condições e foi apresentado em idioma inglês em incumprimento da cláusula 25ª, n.º 3 do programa de concurso, a proposta da Contrainteressada tem que ser excluída nos termos do artigo 146 n.º 2 alínea e) do CCP e do artigo 28.º, alínea e) do programa de concurso, por violação da cláusula 25ª, n.º 3 do programa e do artigo 58.º n.º 1 do CCP, Da alegada falta de indicação dos atributos da proposta 14ª - A cláusula 22ª do Programa de Concurso, n.º 11, capítulo I, pontos v) e vi), impõe a indicação dos preços relativos ao transporte, instalação e colocação em serviço e, ainda, os relativos à manutenção dos equipamentos.

15ª - A douta sentença enferma também de erro quanto a esta matéria, uma vez que, tal como o Júri, especula que os preços em causa podem ser preços zero ou que podem encontrar-se diluídos nos outros custos, fundamentando a não exclusão da proposta com base na discricionariedade técnica.

Ainda que assim fosse, que apenas se representa por dever de defesa, 16ª - Não existe qualquer elemento ou evidência da proposta que comprove que os preços se encontrem diluídos em outros preços ou que sejam preços zero (ainda que se revele manifestamente duvidoso que assim fosse possível).

17ª - Os preços a indicar na proposta também assumem caráter absolutamente objetivo não «caindo» minimamente na discricionariedade técnica do Júri.

Mesmo que assim não se entendesse, 18ª - Não cabe ao Júri do Procedimento nem ao tribunal fazer aquilo que a Contrainteressada não fez, ou seja, de declarar expressamente cada um dos preços da proposta, de forma a cumprir com a exigência de apresentação de cada um dos preços da proposta.

19ª - Portanto, para além da omissão da indicação de atributos da proposta, não é possível afirmar que se fez operar a avaliação da proposta, pois, nesta matéria, tal como fez a douta sentença e o júri só é possível especular, não ficando assegurado que o preço da proposta da Contrainteressada seria inferior, por exemplo, ao da Recorrente e, portanto, que no contexto do critério de adjudicação determinasse a adjudicação à sua proposta.

20ª - Portanto, mal andou o tribunal recorrido, uma vez que a Contrainteressada omitiu a indicação de atributos e, como tal, a sua proposta teria que ser sancionada com a exclusão, nos termos da alínea o) da Cláusula 28ª do Programa de Concurso e a alínea a) do nº 2 do artigo 70º do CCP.

Da alegada falta de poderes de vinculação 21ª - Resulta de toda a sentença, com todo o devido respeito, uma manifesta falta de fundamentação, pois, o tribunal recorrido limita-se quase, essencialmente, a reproduzir jurisprudência e a invocar o entendimento do Júri.

22ª - De qualquer modo, ficou demonstrado que a pessoa que assinou a proposta e os documentos da Contrainteressada apenas detém os poderes de representação e que é confirmado pelo próprio certificado digital de representação, não detendo os necessários poderes de vinculação, os quais não são confundíveis.

23ª - É exigido nos termos do artigo 57.

º, n.

º 4 do CCP, que a pessoa que assina detenha os necessários poderes de vinculação, sendo que a procuração junta à proposta não confere os poderes de vinculação exigidos para subscrever o DEUCP nem os demais documentos nos termos do n.

º 1 do artigo 57.

º do CCP.

24ª - Da procuração apenas constam os poderes para «(...) apresentar uma proposta no concurso abaixo especificado e a subsequentemente negociar, assinar e executar o contrato com esta relacionado, investido de plenos poderes em nome da V..., e a realizar todas as restantes atividades necessárias neste âmbito o que não corresponde aos poderes exigidos para vincular a Contrainteressada nos termos do artigo 57.

º, n.

º 4 do CCP.

25ª - O acórdão do Supremo Tribunal Administrativo sob o nº 0206/15, de 12 de março de 2015 confirma o entendimento da Recorrente «Ela confundiu a assinatura da declaração prevista no art. 57º, n.º 1 al. a), do CCP, indispensável à enunciação da vontade de contratar, com a assinatura...

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