Acórdão nº 00217/14.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução27 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO M.

, J.

, S.

e J-.

(todos devidamente identificados nos autos) autores na ação administrativa comum que instauraram em 27/01/2014 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto contra o MUNICÍPIO DE (...) – na qual peticionaram a condenação deste a pagar-lhes a quantia de 20.000,00 € a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescidos de juros à taxa legal desde a citação e a quantia de 28.396,18 € a título de indemnização por danos patrimoniais, ou, subsidiariamente, a título de enriquecimento sem justa causa, acrescidos de juros desde 15/12/2010, tudo por referência a alegada ocupação abusiva pelo réu de prédio de que são comproprietários) – inconformados com a decisão proferida pelo Tribunal a quo em sede de audiência prévia (ata de fls. 250 SITAF) que absolveu o réu da instância com fundamento na verificação da exceção dilatória da ilegitimidade ativa, por preterição de litisconsórcio necessário ativo, dela interpuseram o presente recurso de apelação (fls. 284 SITAF), pugnando pela sua revogação e substituição por outra que julgue não verificada a situação de litisconsórcio necessário ativo, prosseguindo o processo para conhecimento do mérito, formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos: 1. Na petição inicial, alegou-se que os AA. eram comproprietários, na proporção de metade, do prédio em causa e que este foi ocupado abusivamente pelo R., pelo que se pediu a indemnização pelos prejuízos sofridos, quer a título de danos não patrimoniais, quer a título de danos patrimoniais, medidos estes pelo valor do prédio, correspondendo essa indemnização a metade do seu valor global, cfr. designadamente, arts. 62º (designadamente após a rectificação operada em audiência prévia), 85º e 91º da p. i..

  1. Nos termos do art. 33º do CPC, há litisconsórcio necessário quando a lei ou o negócio exigir a intervenção de todos os interessados na relação controvertida ou quando a acção, pela própria natureza da relação jurídica, para poder produzir o seu efeito útil normal, tenha que ser instaurada por ou contra diversas pessoas, sendo que, nos termos do nº 3 da mesma disposição, “a decisão produz o seu efeito útil normal, sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado”.

  2. No caso, a entidade responsável pela ocupação ilícita de todo o prédio, que conduz à sua aquisição, como se alegou na p. i., é só uma – o Réu.

  3. No caso, o inerente prejuízo a título de danos morais é sofrido por ambos os comproprietários, em princípio na proporção das suas quotas, mas podendo até ser diferente, conforme um haja ou não sofrido maiores do que o outro.

  4. No caso, a indemnização dos prejuízos referentes a cada quota ideal do prédio abusivamente ocupado e adquirido apenas cabe a cada um dos comproprietários, podendo até acontecer que um deles entenda nada pedir.

  5. Acresce que, nos termos do art. 1405, nº 2, do CC, cada um dos comproprietários pode, sozinho, reivindicar de terceiro a totalidade do prédio em causa, sem que seja lícito à parte contrária opor-lhe que esta não lhe pertence por inteiro.

  6. Logo, se os AA. aqui em causa pedissem a restituição do prédio – de todo o prédio – poderiam fazê-lo sozinhos.

  7. E, como é lógico, também o poderão fazer, se em vez da reivindicação, pedirem a indemnização pela ocupação e aquisição forçada do prédio. Particularmente quando apenas peçam tal indemnização na parte correspondente à quota que lhes caiba, como foi o caso.

  8. Acresce também que é absolutamente falacioso o argumento utilizado na sentença recorrida de que não se sabe, em concreto, que parte do prédio pertencia a cada um dos comproprietários e, logo, aos AA.

  9. É óbvio que não, desde logo porque o prédio nunca foi dividido, mas isso, não se pedindo a reivindicação de uma parte específica do prédio, é para aqui absolutamente irrelevante.

  10. O que se sabe é que os aqui AA. eram comproprietários, na proporção de 50%, do prédio abusivamente ocupado e adquirido.

  11. E, se pedem, por esse facto, indemnização correspondente a 50% do valor que estimam caber ao prédio, acrescida de 50% do valor dos incómodos morais que alegam ter sofrido, é evidente que nada interessa que parte concreta do prédio eventualmente lhes caberia se algum dia, hipoteticamente, viessem a querer dividi-lo.

  12. E isto é assim, quer seja a natureza do prédio para efeito de cálculo de expropriação igual em todas a suas parcelas ou não, pois o prédio não foi dividido entre os comproprietários e nada na lei impunha que o fosse, pelo que, não se pedindo aqui a reivindicação do prédio – repete-se – mas antes a indemnização entre outros factos pela sua ablação, o que releva é o valor global do prédio, sendo que para a determinação deste terão de concorrer evidentemente todas as parcelas, tenham ou não a mesma natureza.

  13. Por isso, a única coisa que interessa a este respeito é a determinação da quota ideal de cada comproprietário, que permite saber que parte da indemnização relativa ao valor do prédio cabe a cada um. E isso mostra-se determinado.

  14. É, assim, patente que a lei não exige a intervenção de todos os interessados na relação controvertida, como é patente que a decisão pode regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado, ainda que não vincule os outros comproprietários do prédio.

  15. O mesmo é dizer que, ao contrário do decidido, não existe, no caso, qualquer litisconsórcio necessário.

  16. E, logo, são os AA. parte legítima, por si só, na acção.

  17. Pelo que não poderia o R. ter sido absolvido da instância.

  18. Tendo a decisão recorrida violado o art. 1405º, nº 2, do CPC e o art.33º do CPC.

    O recorrido contra-alegou (fls. 301 SITAF) pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, formulando o seguinte quadro conclusivo: 1. Ao contrário do alegado pelos Recorrentes, a douta sentença proferida pelo tribunal “a quo” não viola o disposto no artigo 1405º, nº 2 do CPC e no artigo 33º do CPC.

  19. Nos pedidos formulados pelos Autores não é reivindicada a parcela, não é reivindicado o direito de propriedade.

  20. Atenta a “(...) natureza da relação jurídica administrativa estabelecida entre o Réu e a visada parcela nº 7, é necessária a intervenção nos autos de todos os seus proprietários”.

  21. Nos termos do disposto no artigo 33º do CPC, seria exigível a intervenção de todos os interessados, existindo litisconsórcio necessário.

  22. A falta do co-proprietário, A., traduz-se numa situação de ilegitimidade.

  23. A ilegitimidade é uma exceção dilatória, nos termos do disposto na alínea e) do artigo 577º do CPC, que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância, conforme dispõe o nº 2 do artigo 576º do CPC.

  24. Pelo que, deve manter-se a douta sentença proferida e em consequência ser o Réu absolvido da instância.

    * Remetidos os autos a este Tribunal em recurso, neste notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público não emitiu Parecer.

    * Após redistribuição (cfr. Despacho nº 1/2019 de 04/01/2019 do Exmo. Senhor Juiz Desembargador Presidente deste TCA Norte) foram os autos submetidos à Conferência para julgamento, com dispensa de vistos.

    * II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (Lei n.º 41/2013) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.

    No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pelos recorrentes as conclusões de recurso, a questão essencial a decidir é a de saber se o Tribunal a quo ao decidir pela absolvição do réu da instância, com fundamento na verificação da exceção dilatória de ilegitimidade ativa, por preterição de litisconsórcio necessário ativo, incorreu em erro de julgamento.

    * III. FUNDAMENTAÇÃO 1. Da decisão recorrida O réu MUNICÍPIO DE (...) foi absolvido da instância com fundamento na verificação da exceção dilatória da ilegitimidade ativa, por preterição de litisconsórcio necessário ativo, por decisão proferida em 27/06/2016 sede de audiência prévia (ata de fls. 250 SITAF). Decisão relativamente à qual é ali vertido o seguinte, que se passa a transcrever: «Tendo subjacente o disposto no artigo 578.º do CPC, mormente, o dever do Tribunal dever conhecer oficiosamente as exceções dilatórias, considerando que os quatro Autores são co-proprietários da parcela n.º 7, relativamente a metade dessa parcela, sendo que da outra metade é co-proprietário, A., porque se nos afigura que ocorre a preterição de litisconsórcio necessário ativo, o que é determinante da ilegitimidade dos Autores, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 577.º alínea e) e 33.º n.ºs 1 e 2, ambos do CPC, notifique as partes para emitirem pronúncia.

    O Senhor Mandatário dos Autores disse que qualquer dos co-proprietários pode defender em juízo a posse da totalidade do prédio, sem que lhe possa ser oposto que esse não lhe pertence por inteiro, nos termos do artigo 1405.º n.º 2 do Código Civil.

    Por maioria de razão, poderão os co-proprietários de metade indivisa de um prédio, solicitar em juízo, a indeminização pela sua ablação, sem que estejam acompanhados do restante comproprietário. Posto é que, apenas peçam indeminização pela parte que lhes diz respeito.

    De toda a maneira, desde já se avança que, mantendo-se a decisão sob a pronúncia e transitado a mesma em julgado, o remédio seria simples, seria o da suscitada intervenção do co-proprietário, nos termos do artigo 261.º do CPC.

    ***O Senhor Mandatário do Réu disse que...

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