Acórdão nº 8181/14.0BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 03 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelMÁRIO REBELO
Data da Resolução03 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: RECORRENTE: Autoridade Tributária.

RECORRIDO: H............., Lda.

OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo MMº juiz do TT de Lisboa que julgou procedente a impugnação deduzida pela H............., Lda., contra as liquidações adicionais de IVA dos anos de 1995 e 1996, com os nºs ............ e ............ e das liquidações dos respectivos juros compensatórios, com os nºs ............, ............, ............ e ............ no valor de €55.045,43.

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES: I- Como resulta da interpretação conjugada do art.º 16°, nº 6, alínea a) e arts 1°, n° 1, e 4°, n° 1, todos do CIVA, e tendo subjacente o conceito de indemnização, serão tributadas as indemnizações que correspondam, directa ou indirectamente, à contrapartida devida pela realização de uma actividade económica, isto é, que visem remunerar a transmissão de bens ou a prestação de serviços.

II - O mesmo não sucederá caso tais indemnizações visem sancionar a lesão de qualquer interesse sem carácter remuneratório porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano, caso em não são tributáveis em IVA, porquanto não têm subjacente uma transmissão de bens ou uma prestação de serviços.

III - Tendo presente o anteriormente expandido, entende esta RFP que, salvo o devido respeito, a douta sentença a quo baseou a sua fundamentação numa errónea valoração da matéria de facto assente nos autos, assim como numa incorrecta interpretação das normas legais aplicáveis, ao considerar que na sua globalidade a indemnização percebida pela Impugnante visava sancionar uma lesão de interesses materiais desta sem carácter remuneratório, por não remunerar qualquer operação, mas antes visarem a reparação de um dano.

IV - Motivo pelo qual, semelhante indemnização sempre estaria excluída do valor tributável do imposto, nos termos da sobredita alínea a) do n° 6 do art.º 16° do CIVA.

V - Ora, salvo o devido respeito, entende esta RFP que a douta sentença a quo não valorou o facto de a referida indemnização ter sido percebida na sequência de um procedimento de expropriação por utilidade pública.

VI - E que por tal facto, a indemnização em apreço não poderia visar sancionar uma lesão de interesses materiais da Impugnante sem carácter remuneratório, por não remunerar qualquer operação, na medida em que correspondem a uma contrapartida devida por uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

VII - É pois o que se verifica no caso em apreço, com a cessão (ainda que temporária) do imóvel por parte da Impugnante, na sua qualidade de arrendatária, por motivos de utilidade pública.

VIII - Sendo que é também esta a conclusão que se pode retirar do regime legal estabelecido no DL 438/91 de 09/11, o qual, no seu artigo 1° previa que: "Os bens imóveis e direitos a eles inerentes podem ser expropriados por causa de utilidade pública, compreendida nas atribuições da entidade expropriante, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização." IX- E no n° 1 do art.º 29° do citado diploma: "O arrendamento para comércio, indústria ou exercício de profissão liberal, ou para habitação no caso previsto no n.º 2 do artigo 9.º bem como o arrendamento rural, são considerados encargos autónomos para efeito de indemnização dos arrendatários.” X - Sendo que, nos termos do disposto no n° 4 do antedito preceito: "Na indemnização respeitante a arrendamento para comércio, indústria ou exercício de profissão liberal atenderse-á às despesas relativas à nova instalação, incluindo os referenciais de renda que o arrendatário irá pagar, e aos prejuízos resultantes do período de paralisação da actividade, necessária para a transferência, calculada nos termos gerais de direito." XI - E tratando-se de indemnização pela interrupção da actividade comercial, industrial, liberal ou agrícola, preceitua o n° 1do art.º 30° do diploma a que nos temos vindo a reportar que: "Nos casos em que o proprietário do prédio nele exerça qualquer actividade prevista no n.º 4 do artigo anterior, à indemnização correspondente ao valor do prédio acrescerá a que corresponder aos prejuízos da interrupção dessa actividade, calculada nos termos do mesmo preceito." XII - Em face do regime legal antecedentemente exposto, dúvidas não subsistem quanto ao carácter não ressarcitório das indemnizações pagas em razão do Código das Expropriações, no sentido em que correspondem à contrapartida devida por uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

XIII - Neste mesmo sentido importa considerar o que vem estipulado na alínea a) do n° 2 do art.º 14° da Directiva IVA (à semelhança do respectivo artigo 25° para as prestações de serviços), no que concerne à indemnização por expropriação, nos termos da qual: "[...] são consideradas entregas de bens [...] a transmissão da propriedade de um bem, mediante pagamento de uma indemnização, em virtude de acto das autoridades públicas ou em seu nome ou por força da lei." XIV - Em face do exposto, verifica-se que a quantia paga em virtude de um acto de expropriação público não deverá ser considerada um ressarcimento de um dano emergente, uma vez que aquele valor mais não é do que a contraprestação efectiva de uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

XV - Mas, ainda que assim não se entenda e sem conceder, não se pode deixar de olvidar que do elenco de “prejuízos" como tal qualificados pela Impugnante, comporta algumas rubricas que, pela respectiva natureza, não constituem danos que se possam qualificar como emergentes.

XVI- Decorre do disposto no n° 1 do art.º 564° do Código Civil, que "o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência dessa lesão” XVII - A prestação devida por danos emergentes ou prejuízos causados, por ter carácter indemnizatório, limita-se a repor a situação existente à data da ocorrência da lesão; sendo que o mesmo não sucede no caso dos lucros cessantes, os quais, por cobrirem prejuízos futuros, geram um enriquecimento na esfera do beneficiário.

XVIII - Ora, no caso em apreço, verifica-se que do total da indemnização mensal pretendida pela Impugnante e deferida pelo organismo público competente - € 54.395,64 - uma parte do mesmo reporta-se a "lucros não auferidos mensal”, no valor de € 33.715,99.

XIX - Deste modo, quanto a esta parte da indemnização arbitrada, parece evidente que a mesma se destina a compensar os lucros cessantes, isto é, a repor o nível de rendimento que, por força do dano, a Impugnante deixou de obter.

XX - Assim, estamos neste caso perante o ressarcimento de lucros cessantes, com o objectivo de reparar uma lesão com carácter remuneratório, motivo pelo qual, esta parte da indemnização tem subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços.

XXI - E por assim ser, pelo menos esta parte da indemnização sempre estaria sujeita a tributação em IVA, nos termos dos art.ºs 16° e 4 o do CIVA.

XXII - Sendo certo que a natureza de lucros cessantes a atribuir a parte da indemnização arbitrada à Impugnante já resultava do teor da informação do organismo público que sustentou a decisão de pagamento, quando ali se sustentou que aquela visava ressarcir não só os danos emergentes, como também os lucros cessantes e bem assim, os prejuízos relativos à perda futura de clientela.

XXIII - Assim e em face do antecedentemente exposto, não se vislumbram fundamentos que sustentem uma declaração de ilegalidade das liquidações de imposto impugnadas, motivo pelo qual deverão estas ser mantidas na ordem jurídica ou, caso assim não se entenda, sempre deverão as mesmas ser objecto de uma anulação apenas parcial, correspondente à parte da indemnização paga à Impugnante que não se reporta a lucros mensais não auferidos.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação totalmente improcedente, ou, caso assim não se entenda, deve a mesma impugnação ser considerada parcialmente improcedente, na parte em que a indemnização arbitrada à Impugnante respeita ao ressarcimento de lucros cessantes e prejuízos relativos à perda futura de clientela, tudo com as legais e devidas consequências.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA CONTRA ALEGAÇÕES.

O Recorrido contra alegou e concluiu: I - As indemnizações em apreço, pagas à Recorrida, têm um carácter meramente ressarcitório, sancionam a lesão de um interesse, sem carácter remuneratório porque não remuneram qualquer operação, antes se destinam a reparar um dano, e portanto, não são tributáveis em IVA, na medida em que as mesmas não tem subjacente uma transmissão de bens ou prestação de serviços; II - Nos termos do n°3 do art.º 103° da CRP. "Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei."; III - Não pode haver imposto cujo elemento constitutivo não esteja na lei; Por tudo o exposto deve ser totalmente improcedente o recurso.

Assim se fazendo JUSTIÇA! PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela procedência do recurso.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao julgar procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IVA decorrente de indemnização paga à Impugnante pelo “Gabinete do Nó Ferroviário de Lisboa”, por ocupação e encerramento temporários do seu estabelecimento.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação: A) A Impugnante, nos exercícios de 1995 e 1996, tinha por objecto a actividade de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT