Acórdão nº 1100/20.6BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelSOFIA DAVID
Data da Resolução26 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO S......... interpôs recurso da sentença do TAC de Lisboa que julgou improcedente a presente acção onde o A. e Recorrente impugnava o despacho do Director Nacional (DN) Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), do Ministério da Administração Interna (MAI), de 22/04/2020, que considerou inadmissível o pedido de protecção internacional formulado pelo ora Recorrente e ordenou a sua transferência para Itália, por ser esse o país responsável pela sua retoma a cargo.

O Recorrente formulou as seguintes conclusões de recurso: “I - Vem o presente recurso interposto da Sentença que julgou totalmente improcedente a acção e absolveu a entidade requerida dos pedidos formulados pelo requerente, ora recorrente, e com a qual não se conforma.

II - O recorrente, titular do processo de protecção internacional n.º 736.20PT, impugnou por via dos presentes autos, a decisão do Ministério da Administração Interna, proferida por despacho 22.04.2020, do Director Nacional Adjunto do SEF, que considerou o pedido de protecção internacional, apresentado pelo impugnante, inadmissível, e determinou a sua transferência para Itália por ser este o estado competente para apreciar pedido; III - Na impugnação apresentada peticionou a anulação da aludida decisão de 22.04.2020 e cumulativamente a condenação da entidade requerida a admitir o pedido de protecção internacional ou subsidiariamente a condenação da entidade demanda a instruir o procedimento de decisão com informação fidedigna e actualizada sobre o procedimento de asilo italiano e as condições de acolhimento dos requerentes de protecção internacional em Itália, de modo a poder se aferido, se no caso concreto, se verifica qualquer dos motivos enunciados no artigo 3.º, n.º 2, 2.º parágrafo do Regulamento (EU) 604/2013 do Parlamento Europeu e do Concelho de 26 de Junho.

IV - Para tanto alegou, ora, em síntese, e que se renova, que A decisão impugnada considerou o Estado Italiano responsável pela análise do pedido de protecção internacional apresentado pelo requerente, apenas com base na entrada registada na base de dados do Sistema Eurodac, e na ausência de resposta das autoridades italianas ao pedido de retoma a cargo, no prazo de duas semanas – prazo a que alude o artigo 25.º n.º 1 do Regulamento (CE) N.º 604/2013 do Conselho de 26 de Junho – sendo assim omissa no que concerne à situação actual dos refugiados e requerentes de protecção internacional em Itália.

V - A decisão impugnada, ao não considerar e atender à situação económica e social actual, o contexto da pressão migratória do Estado Italiano, designadamente quanto às deficiências sistémicas nas medidas de acolhimento dos requerentes de protecção internacional - no funcionamento do sistema de asilo e nas condições de acolhimento - associado às recentes medidas anti-imigração do governo italiano (Decreto Salvini), - factos que são do conhecimento de todos através da comunicação social e difundidos por organizações não governamentais, factos que são notórios, porque do conhecimento geral, sendo realidades facilmente acessíveis a qualquer cidadão mediamente informado, à Administração, designadamente ao SEF, ou a este Tribunal - cfr.. art.º 412.º, n.º 1, do CPC. (cfr. artigos 15 e 16 da p.i.) – padece de deficit de instrução; VI - Por seu turno, ao julgar infundada e improcedente a acção, lê-se na sentença, respeitosamente, ora em síntese: “O único vício que o requerente consubstanciadamente imputa ao ato impugnado, que considerou o pedido de proteção internacional infundado e determinou a transferência do requerente para Itália – descrita em 6) e 7), da matéria de facto – é a falta de realização de diligências tendentes a apurar do preenchimento do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento (EU) 604/2013.

(…), no procedimento de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional o SEF deve presumir que o sistema de proteção internacional do estado membro para onde entende que o requerente deve ser transferido respeita os direitos dos requerentes. Em consequência, inexistindo quaisquer elementos que abalem esta presunçãonão está obrigado a formular um juízo sobre o preenchimento da cláusula de salvaguarda.

Nas declarações que prestou perante o SEF nada invocou de concreto que permita concluir que dadas as suas particulares condições a transferência implica o risco de vir a sofrer tratamento desumano ou degradante, aliás o requerente alega que saiu de território italiano porque o seu pedido de proteção internacional foi recusado e que nunca foi perseguido ou sofreu maus tratos em Itália, a onde, durante o tempo que permaneceu, lhe foram garantidos alojamento condigno, cuidados médicos, acesso ao ensino e foi-lhe atribuído um rendimento para as suas despesas [cf. ponto 3), dos factos provados].

Perante estas alegações o SEF não estava obrigado a encetar as diligências instrutórias que o requerente pretende.” (sublinhado e negrito nossos) , (página 15 e 16 da sentença) VII - E concluiu a sentença que, “Do exposto decorre que a decisão impugnada não padece do vício que o requerente lhe assaca, pelo que o SEF não errou ao decidir como decidiu e, logo, o requerente não tem o direito de exigir que o estado português aprecie o seu pedido de proteção internacional, nem tem direito a exigir que o SEF proceda a nova instrução do procedimento.” (página 16 da sentença) VIII - Com o devido respeito que é muito, não assiste razão à sentença proferida.

Com efeito, das declarações que o requerente prestou perante o SEF é permitida a premissa de raciocínio de que ao ser recusado o pedido de protecção internacional o estado italiano deixou de garantir alojamento condigno, cuidados médicos, e qualquer apoio para a subsistência do requerente – e como tal o requerente viu-se forçado a deixar aquele país. Imponha-se, pelo menos, ao SEF na entrevista realizada questionar, de modo a concretizar cabalmente os factos, se depois do pedido ser recusado o Estado Italiano manteve as condições de acolhimento descritas, se saiu de Itália porque quis ou se tal lhe foi imposto pelas autoridades italianas, nomeadamente com a retirada das condições de acolhimento concedidas até então.

IX - Esclareceu o requerente na sua p.i. que ( artigo 13.º ), foi expulso do campo de refugiados que foi encerrado e foi-lhe dito que não poderia ficar mais em Itália, e a partir de então - e no seu trânsito para sair de Itália - deixou de ter qualquer abrigo, acesso a bens essenciais como água limpa, comida e foi obrigado a procurar abrigo com outros refugiados em edifícios abandonados, recebendo auxílio de voluntários que lhe davam comida e roupas, como deixou de ter acesso a quaisquer cuidados desaúde. E na sua impugnação, o requerente manifestou a sua disponibilidade para dar as explicações necessárias em relação a qualquer falta de elemento de prova, ao requerer as suas declarações de parte – não obstante, e apesar da manifesta insuficiência das questões colocadas pelo SEF na entrevista realizada ao requerente, o Tribunal não promoveu pela tomada das suas declarações, como não se pronunciou sobre a requerida declarações de parte - prova cuja produção se renova nos termos consignados no artigo 149.º n.º 4 do CPTA - enquanto diligência de prova fundamental para a procedência do pedido, pelo que deve ser a sentença anulada nos termos do disposto no artigo 135.º do CPA.

X - Acresce que, o requerente, na entrevista perante o SEF, prestou declarações sobre o tempo em que permaneceu em Itália, não constando do processo a data em que saiu daquele pais apenas que chegou a Portugal em 19.02.2020, tendo – cfr. ponto 3 dos factos assentes. Impondo-se o conhecimento, vertido no procedimento, das condições atuais existentes no procedimento de asilo e no acolhimento – e não só aquelas que foram concedidas ao requerente ao tempo em que permaneceu em Itália.

XI - Com efeito, De uma leitura conjugada do Regulamente de DublinIII, a decisão de “retoma a cargo” não pode ser tomada sem que o Estado Membro decisor tenha conhecimento – conhecimento este que tem de se revelar no procedimento - das condições atuais existentes no procedimento de asilo e no acolhimento no Estado Membro considerado responsável, quando sobre o mesmo recaiam dúvidas objetivas e fundadas sobre tais condições - para que possa verificar se...

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