Acórdão nº 523/06.8BECTB-A de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | DORA LUCAS NETO |
Data da Resolução | 26 de Novembro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório C...
, S.A., intentou uma ação executiva para pagamento de quantia certa contra o Município de Ponte de Sôr, no valor de € 82.260,81.
Por sentença de 29.06.2017, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, foi julgada procedente a ação, nos termos fixados no despacho de 17.09.2012 e, em consequência, condenado o Executado Município de Ponte de Sôr a proceder ao pagamento à Exequente C..., no prazo de 20 (vinte) dias, do montante total de € 82.260,81.
O Executado Município de Ponte de Sôr e a Exequente C...
, S.A.
, não se conformando com a sentença, vieram da mesma recorrer.
O Município de Ponte de Sôr, Executado e Recorrente, apresentou as suas alegações de recurso nas quais culminou com as seguintes conclusões – cfr. fls. 287 e ss., ref. SITAF: «(…) 1. A recorrente quando invoca o pagamento da multa, não exerce qualquer direito contratual, antes limita-se a executar vinculadamente a sanção aplicada, acto administrativo inegavelmente inimpugnável; 2. O reconhecimento das quantias em dívida e ora executadas de forma alguma fazem percutir o direito do recorrente de impor a realização da prestação em quantia certa aplicada a título da sanção administrativa por atrasos na execução da obra, conforme o artigo 201.º Decreto-lei n.º 59/99, então aplicável; 3. A recorrida não cumpriu a sanção aplicada; 4. Não obstante a mesma ser exigível 5. E ter a referida sanção formado caso decidido (Bestandskraft), por não ter sido impugnada; 6. É da natureza e função do acto administrativo inimpugnável conferir certeza e segurança jurídica nos mesmos termos e efeitos que o efeito de caso julgado de uma decisão judicial; 7. O carácter secundário da sanção face à prestação a cargo do empreiteiro, ainda que tenha como matriz a relação contratual, por força da natureza administrativa do acto em questão, autonomiza-se daquela, 8. A sanção aplicada não confere qualquer direito ao recorrente, uma vez que a mesma resulta, na sua natureza e efeitos, do exercício de poderes de autoridade; 9. Qualifica-se tal sanção como um verdadeiro acto de administrativo; 10. Que ao não ter sido impugnado, o acto administrativo sancionatório externalizou-se na ordem jurídica, produzindo efeitos impositivos que vinculam directamente o recorrente e a recorrida; 11. Multa esta que multa resultou do uso de poderes de autoridade, que não estão na livre disponibilidade, nem resulta de um juízo de oportunidade do recorrente; 12. Prevalece o princípio da legalidade na sua dimensão actual de prevalência da lei: a actividade administrativa "jamais é produto de uma faculdade permissiva, de um licere, de um Diirfen; mas sempre e só de uma faculdade concedente, de um posse, de um Kõnnen"; 13. Opondo-se a qualquer acto ou decisão judicial em modos e efeitos análogos ao caso julgado material, isto porque a sanção aplicada resultou de uma verdadeira DECISÃO administrativa, que estabelece uma relação jurídica nova e autónoma face à relação jurídica contratual de direito público; 14. Logo, o não cumprimento voluntário da sanção, legitima o recorrente a recorrer aos meios e faculdades legais previstas para o efeito, em particular os que estejam especialmente previstos e reconhecidos por lei, como é o caso do artigo 233.º.
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O recorrente exerceu o seu poder de autoridade reconhecido por lei deduzindo ao montante da prestação por si devida o valor da sanção aplicada à recorrida — artigo 233.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 59/99.
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Ao contrário do que invoca a sentença, não se trata de um compensação stricto sensu, antes do exercício de uma prerrogativa de poderes públicas que não carece de mediação judicial (isto porque a sua execução, como veremos supra, é directamente levada a cabo pela recorrente); 17.º Regime de Empreitadas e Obras Públicas, aplicável ao contrato, confere, não um direito, mas sim uma prerrogativa de autoridade pública de a execução da sanção ser feita directamente mediante a dedução ao valor das facturas pagas, enquanto meio especial de execução (veja-se o tratamento especial e autónomo que é dado no diploma legal); 18. Significa por isso, que pela natureza autoritária da faculdade legal conjuntamente com a previsão em lei especial, que as regras e requisitos da compensação não podem ser aqui invocados; 19. Até porque este poder de dedução não pode, pela natureza legal e especial de garantia conferida aos contratos administrativos, ser objeto de renúncia ou limitação, constituindo uma disposição imperativa que integra a ordem pública; 20. Vale o princípio lei especial derroga a lei geral; 21. Até porque, o conceito de superveniência, teleologicamente interpretado e tal como decorre dos autores citados na sentença, mais do que ao momento temporal da ocorrência do facto constitutivo do contra-direito, diz respeito à existência de um direito oponível ao pedido pelo Autor, que se consubstancia numa excepção peremptória; 22. Todavia, a execução da sanção, ainda que decorra de um facto anterior à acção, não carecia de invocação para a sua execução, nem do seu exercício, porquanto a faculdade legal conferida não faz depender das regras gerais relativas à compensação, mas do regime especial inerente às relações jurídicas administrativas; 23. Neste caso, o direito de dedução legal é um meio especial conferido aos contratos de empreitadas de obras públicas, cujo regime prevalece sobre o regime geral de extinção de obrigações; 24. Superveniência no sentido do artigo 171.º, n.º 1, do Código de Processo de Tribunal Administrativo deve ser entendido não tendo em conta a ocorrência temporal do facto, mas antes a susceptibilidade de produção dos seus efeitos; 25. O facto superveniente resulta da exigibilidade do exercício do direito, todavia in casu o facto que justifica a dedução e o exercício da prerrogativa pública de dedução só ocorre no momento em que é exigido o pagamento, logo supervenientemente à sentença; 26. Posto isto, a douta sentença não se ateve à especificidade da relação contratual e da prerrogativa pública conferida pelo artigo 233.º do Decreto-Lei n.º 59/99; 27. A isto acresce, sem conceder, o facto de ser admitida a compensação de uma sanção administrativa em função de um direito de crédito titulado pelo administrado por aplicação do artigo 89.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário ex vi artigo 155.º, n.º1 Código de Procedimento Administrativo; 28. O comportamento do recorrente é, por isso, legítimo e lícito, tendo a Câmara Municipal, na sequência da actuação da recorrida, deliberado proceder à compensação do crédito, conforme os artigos 7.º, n° 2 do Decreto-Lei n.º 433/99 aplicado supletivamente; 29. A decisão da câmara de exigir a compensação ocorre em data posterior à sentença que a condena, pelo que o facto extintivo é superveniente; 30. O artigo 89.º do Código do Procedimento e Processo Tributário deve ser interpretado em consonância com a finalidade e regime da execução fiscal e do acto administrativo em causa; 31. Posto isto tendo o recorrente transferido a quantia de 78.807,92€ para a recorrida em 4 de Maio de 2012, extinguiu-se integralmente o crédito da recorrida contra o recorrente, nos termos compensatórios acima alegados e deliberados. (…).» A C...
, S.A., Exequente e Recorrente, por seu turno, apresentou também alegações de recurso, culminando com as seguintes conclusões – cfr. fls. 308 e ss., ref. SITAF: «(…) A. Como decorre do caso julgado formal formado pelo Despacho de 17.09.2012, a Sentença recorrida não podia ter condenado o aqui Executado/Recorrido em mais do que no pagamento à ora Exequente/Recorrente do montante total de € 82.260,81, a menos que o contrário resultasse do transitado em julgado no recurso interposto pela ora...
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