Acórdão nº 830/19.0BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCHÃO MARQUES
Data da Resolução26 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório J...

intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra contra o Município de Sintra processo cautelar visando a suspensão de eficácia da Deliberação de 16.05.2019 da Câmara Municipal de Sintra que o sancionou com a pena de demissão.

Por sentença de 21.09.2020 foi julgada improcedente a pretensão cautelar e absolvida a Entidade Requerida do pedido.

Não se conformando com o assim decidido veio o A. interpor o presente recurso para este Tribunal Central Administrativo, tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: 1 - Não se conforma o ora Agravante com a sentença recorrida, porquanto, nela se entende considerar improcedente o requerido pelo Agravante, designadamente a anulação da Deliberação de 16 de Maio de 2019, da Câmara Municipal de Sintra e respetiva condenação à adoção dos actos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o acto anulado ou nulo não tivesse sido praticado; 2 - Com o devido respeito, a douta sentença recorrida interpretou incorretamente o direito aplicável ao caso sub judice, razão pela qual o ora Agravante não pode concordar com a posição ali defendida pois, ao julgar da presente forma, incorreu, no vício de erro de julgamento por erro de interpretação das normas jurídicas aplicáveis, pelas razões que a seguir se expressam; 3 – Parecendo a douta Sentença esquecer o facto de que o Recorrente em momento algum, utilizou de forma abusiva e para fins ilícitos os meios colocados à sua disposição para o exercício das suas funções profissionais, nem fez uso da sua qualidade de funcionário da Câmara Municipal de Sintra para ter acesso a processos de urbanismo e através desse acesso obter remunerações ilícitas junto dos Munícipes; 4 – O Recorrente serviu de mero intermediário entre o munícipe P... e a Arquiteta que conduziu o processo, conforme documentado na p.i. apresentada, sendo demostrativo da boa-fé na presente situação, o facto de ter indicado ao Sr. P... o seu IBAN pessoal, algo que não faria caso pretendesse omitir essa circunstância; 5 – É falso que tenha incitado Munícipes a proceder a pagamento em dinheiro e a depósito de valores significativos diretamente na sua conta bancária, e que tenha usado de astúcia para os convencer que se destinavam a fazer aprovar processo de urbanismo, ou que tenha colocado em causa o bom nome da Recorrida, e demonstrado desrespeito pela hierarquia, indignidade de caráter e desonestidade intelectual, incompatível com o exercício de funções públicas numa autarquia local e assim inviabilizado a manutenção da relação laboral; 6 - Não tendo, em nenhuma altura, o Recorrente atuado com grave negligência ou com grave desinteresse pelo cumprimento dos deveres funcionais, nem incorrido nos comportamentos previstos nas alíneas a), c), e), j) e n) do artigo 297º da LGTFP, dispositivo legal utilizado pela Recorrida para consubstanciar e justificar a aplicação da pena disciplinar de demissão; 7 - Sempre foi reconhecido ao Recorrente o profissionalismo, a competência, responsabilidade com que sempre atuou, contribuindo para o bom relacionamento no âmbito do seu local de trabalho, e sempre disponível para colaborar; 8 - Não ficou provado e demonstrado que estejam reunidas as condições para aplicação da pena de demissão, pelo contrário, o Relatório Final elaborado e aprovado pela Recorrida, bem como a douta Sentença recorrida, olvidam factos essenciais apresentados e invocados pelo Recorrido não apresentando, nem demonstrando factos inequívocos que permitam sancionar com tal gravidade; 9 – O Recorrente entende assim não ter violado, de forma dolosa, deveres profissionais a que estava obrigado, designadamente os deveres de isenção, de prossecução do interesse público, de imparcialidade, de lealdade, de zelo, obediência e correção, previstos no artigo 73º n.º 2, alíneas a), b), c), e), f), g) e h) da LGTFP; 10 - Razão pela qual não existiria justificação para a remissão para o artigo 297º n.º 1 e n.º3 alíneas a), c), e), j) e n) da LGTFP do diploma legal acima indicado que prevê a pena disciplinar de Demissão, sanção esta a mais grave prevista na lei, tanto mais que, em nenhuma altura, o Recorrente, com algum comportamento por si adotado inviabilizou a manutenção da relação funcional; 11 - Acresce, ainda, que seria sempre, necessário que a gravidade da conduta do Recorrente inviabilizasse a manutenção da relação funcional, tal como refere o n.º 1 do artigo 297º da LGTFP, o que, no caso sub judice não ocorreu, não sendo minimamente demonstrado pela Recorrida, aquando da decisão tomada de aplicar a pena de demissão, algo que deveria ter sucedido e que o tribunal “a quo” ignorou; 12 - Pelas razões de factos e de direito anteriormente descritas o ora Agravante impugna as acusações da violação dos deveres profissionais que são imputadas na Acusação e que são confirmadas na Sentença recorrida.

13 - Não tendo praticado qualquer acto extremamente grave, que tenha levado à quebra da relação de confiança que a Recorrida depositou no Agravante quando o contratou, não inviabilizando a manutenção da relação funcional, que, como se sabe, constitui peça essencial para a aplicação da pena disciplinar de demissão; 14 - Existiu, assim, uma clara errada apreciação por parte da Agravada dos factos e provas transportadas para o processo disciplinar, pelo que deveria proceder o vício de erro sobre os pressupostos quanto à violação dos deveres profissionais imputados, inexistindo, portanto, fundamentos de direito que permitam no caso sub judice a aplicação de uma sanção disciplinar.

15 - Todos estes argumentos já utilizados pelo ora Agravante em sede de petição inicial e alegações finais, mas que não foram suficientes para sensibilizar a Meritíssima Juíz do tribunal “a quo”, a aderir ao seu pedido.

O Recorrido apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido. Concluiu do seguinte modo: 1.ª A par do que sucedeu na 1.ª instância, o Recorrente tenta novamente, nesta sede, que o Tribunal proceda a um “novo julgamento” sobre a verificação ou não das infrações cometidas, abstraindo-se do ato impugnado e até da sentença recorrida esquecendo-se, porém, que o recurso jurisdicional não constitui, nem pode constituir, uma renovação ou revisão do processo disciplinar.

  1. Com efeito, o Recorrente limita-se a dirigir a sua censura, não à decisão da matéria de facto dada por assente pelo Tribunal a quo, mas aos factos apurados no âmbito do procedimento disciplinar, olvidando que o eventual erro ou insuficiência da matéria de facto apurada em sede disciplinar, para integrar as infrações pelas quais o Recorrente foi sancionado, não determina, per si, o erro ou deficiência no julgamento da matéria de facto pelo Tribunal a quo (que o Recorrente nem sequer impugnou).

  2. Ora, atendendo a que tudo o que respeita ao alegado erro de julgamento no direito aplicável ao caso em concreto, invocado pelo Recorrente, assenta em factos alegados que não resultam da matéria de facto dada por provada - nem a mesma foi objeto de impugnação - é assim evidente, e consequente, a improcedência do raciocínio desenvolvido pelo Recorrente.

  3. Assim, bem andou o Tribunal a quo ao considerar pela inexistência de erro sobre os pressupostos subjacentes à sanção aplicada ao Recorrente, uma vez que resulta dos factos apurados no processo disciplinar que a conduta do Recorrente, além de indicar cabalmente que o mesmo agiu com culpa e dolo, revela-se de tal modo grave que constitui ostensivamente uma infração disciplinar que inviabiliza a manutenção do seu vínculo laboral, nos termos da al. a), c), e), j) e n) do n.º 3 do artigo 297.º da LTFP.

  4. Pelo que, é manifesta a improcedência do recurso interposto, porquanto ter-se-á que concluir pela impossibilidade de assacar qualquer censura a sentença ora recorrida devendo, por isso, manter-se na ordem jurídica a Deliberação de 16 de maio de 2019, que aplicou a sanção de demissão ao Recorrente.

• Neste Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto não se pronunciou.

• Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.

• I. 1.

Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar se: - Se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao ter concluído pela inexistência de fumus boni iuris e assim ter julgado improcedente a providência cautelar.

• II.

Fundamentação II.1.

De facto O tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos, em decisão que aqui se reproduz ipsis verbis: 1. Em 19 de setembro de 2018, através de email remetido por P..., foi reportado à Entidade Requerida o comportamento de um trabalhador do...

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