Acórdão nº 1911/08.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução19 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 12.09.2017, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por A…..

    (doravante Recorrido ou Impugnante), que teve por objeto o indeferimento da reclamação graciosa que versou sobre as liquidações de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e respetivos juros compensatórios, dos anos de 2003, 2004 e 2005.

    O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

    Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “I – Pelo elenco de razões acima arroladas, ressalvando-se sempre melhor e douto entendimento e, o devido respeito, infere-se que a sentença proferida pelo Tribunal “ad quo” julgou procedente o pedido da impugnante com visível deficit instrutório e, lavrando em erro no que concerne à apreciação da matéria de facto.

    II – Todavia, se devidamente analisados os factos pertinentes à apreciação e formação da decisão da causa, prevaleceria uma fundamentação diferente, afastados que foram determinados circunstancialismos da selecção, sendo outros objeto de uma análise crítica deficiente.

    III – No presente caso estão em causa correcções levadas a cabo através de acção de inspecção relativas a alteração do regime de isenção previsto no art.º 53.º do CIVA, ao abrigo do qual se encontrava enquadrado o recorrido, até ao momento que se verificou ter ultrapassado os limites dessa isenção, precisa altura a partir da qual teria passado a ficar abrangido pelo regime normal trimestral, face ao volume de negócios obtido a partir de 2003.

    IV – Nessa senda, decidiu-se o Tribunal Tributário pela procedência do pedido, entendendo que: “… da prova levada a efeito nos autos, em concreto da prova testemunhal, ficou provado que dos valores considerados como base tributável, os montantes de € 400,00, em 2004, € 1 470,00, em 2005 e € 21 000, em 2006, respeitam a prestações de serviços efectuadas pelo impugnante como ator, às sociedades “D…..” e “e…..”, consistentes na leitura e apresentações de histórias e contos, designadamente em escolas e em Bombeiros, no âmbito de diversas acções de formação social desenvolvidas por aquelas empresas como parte da responsabilidade social, acções preparadas e coordenadas por essas mesmas empresas, e em que o Impugnante apenas intervinha na qualidade de ator, pelo que se trata de prestações de serviços de carácter artístico, não efectuadas a consumidores finais, e, por isso isentas de IVA nos termos do art.º 9.º , n.º 15, alínea a) do CIVA.” Assim, nada resulta dos autos que permita contrariar a conclusão de que todos os serviços prestados durante o ano de 2003 a 2006 pelo Impugnante, o foram no âmbito da actividade de ator e foram prestados a promotores artísticos e nunca a consumidores finais, pelo que se verificam as condições legais para o funcionamento da norma de isenção de IVA prevista no art.º 9.º, n.º 15, alínea a) do CIVA, o que determina que não se mostra devido o IVA liquidado pela AT, sendo assim ilegais as liquidações impugnadas.

    ” V – Contudo neste conspecto, é referir desde já que, nesse sentido, o artigo 9.º do CIVA, na sua previsão literal, consagra apenas a prestação de serviços quando feita a “um promotor” e não aquela que é dirigida pessoas colectivas que não se confundem com promotores artísticos.

    VI - A verdade é que os promotores de espetáculos de natureza artística devem, desde logo, na data do início da atividade, registar-se também na Direção Geral das Atividades Culturais.

    Neste caso, a entidade contratante dedica-se a actividades de mercado enquadradas no CAE 035220 - DISTRIBUIÇÃO DE COMBUSTÍVEIS GASOSOS POR CONDUTAS.

    VII – Ou seja, embora os serviços prestados pelo recorrido tenham um cariz artístico, a verdade é que quem o contratou, não se dedica à promoção de espectáculos, porquanto não se encontra como tal registado; mas, quem organiza essas atividades fá-lo integrado num mister cujo CAE corresponde à atividade económica de distribuição de energia e não à promoção de espetáculos. Tal nuance foi descurada pela análise da sentença recorrida.

    VIII – Como se conclui a moldura sub judice tem enquadramento no art.º 9.º, n.º 15 do IVA o qual prevê que “as 15) As prestações de serviços efectuadas aos respectivos promotores: a) Por actores, chefes de orquestra, músicos e outros artistas, actuando quer individualmente quer integrados em conjuntos, para a execução de espectáculos teatrais, cinematográficos, coreográficos, musicais, de music-hall, de circo e outros, para a realização de filmes, e para a edição de discos e de outros suportes de som ou imagem”.

    A actividade dos promotores encontrava-se regulada pelo Dec.-Lei n.º 394-B/84, de 26/12, sendo que posteriormente passou a constar do Dec-Lei n.º 315/95, de 28-11, e depois da Lei n.º 4/08, de 7/2.

    IX – Do supra exposto, não pode acolher-se a tese de que o impugnante beneficia da norma de isenção que se refere às prestações de serviços quando efectuadas aos respectivos promotores, impondo-se ter presente que as isenções previstas no CIVA, são de interpretação restritiva, dado que constituem excepções ao princípio geral segundo o qual o IVA é cobrado sobre cada operação efectuada a título oneroso por um sujeito passivo.

    X – Acresce até que por outro lado surgiriam restrições quanto a certas prestações de serviços por via do que foi previsto no anexo da Directiva l.V.A. 2006/112/CE, de 11-12-06, publicada no JOCE 346, p.76, i. é. quanto a prestações de serviços, tais como as de publicidade comercial, transporte e armazenagem de bens, locação de bens móveis, colocação de pessoal à disposição, e outras.

    XI – Ou seja, a questão é saber se, considerando a(s) prestação(ões) de serviços da impugnante exercida(s) de 2003 a 2006, quando contratada por entidades que exercem actividade com o CAE 035220 - DISTRIBUIÇÃO DE COMBUSTÍVEIS GASOSOS POR CONDUTAS, se deve enquadrar tal facto como uma prestação de serviços feita a entidades incluídas na lista das entidades caracterizadas como promotoras, ou se pelo contrário tais serviços revestem notoriamente uma natureza de publicidade comercial e fins que visam o lucro, enquanto fim perseguido por qualquer sociedade comercial.

    XII - Pelo que, como se conclui, o douto Tribunal “ad quo”, não esteou a sua fundamentação de facto e de direito nem de acordo com a prova constante nos autos falhando na selecção dos factos, nem conforme já exposto, ampliando a base instrutória para boa interpretação e aplicação da lei e, nessa medida, a decisão deve ser afastada da ordem jurídica, concluindo-se que as prestações de serviços em causa não estão isentas de IVA”.

    O Recorrido apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: “1ª) Só agora, em sede de Alegações de Recurso e nunca durante a pendência processual no Tribunal “a quo” (1ª Instância), é que a Recorrente (RFP) articulou e alegou algo em redor do que formula ex novo e pela primeira vez: 1.1) As empresas “D…..” e “E…..” só podem ser promotoras dos espetáculos do Impugnante se previamente se inscreverem, ou registarem na Direção Geral das Atividades Económicas; 1.2) Os Serviços prestados pelo Impugnante àquelas duas sociedades revestem a natureza de publicidade da imagem daquelas empresas, logo com intuitos comerciais e em vista da obtenção do lucro.

    1. ) Não fazendo estes únicos “themas” do Recurso do R.F.P., parte do que levou à sua Contestação era impossível o Tribunal “a quo” julgar e evidenciar o que inexiste como questão a solucionar (“ex vi” ao art. 123º do C.P.P.T.) 3ª) O Recurso do R.F.P. é impossível de ser julgado por este Tribunal Superior, já que não submete ao senso hierárquico e julgativo, do mesmo, qualquer matéria que antes tenha feito parte da posição assumida por aquele (RFP) na 1ª Instância, daí se entendendo que deve operar a sua improcedência “ab initio” e “in totum”.

      “Ad cautelem”, mas sem conceder, 4ª) Não tendo existido prestação de Serviço de Ator, pelo Impugnante, no exercício de 2003, a favor das empresas aludidas na Conclusão 1ª, o alegado pelo R.F.P., é improcedente, desde logo nos quantificados pecúlios ali oficiosamente liquidados de 2.567,85€ (sob o desígnio de colecta) e de 377,93€ (de juros compensatórios), mantendo-se a sentenciada anulação destas verbas.

    2. ) Nunca no Recurso o R.F.P. se opôs, ou colocou em causa os factos considerados como provados na sentença, sob as letras A a S (in III Fundamentação.1 Dos Factos), pelo que a sentença, e bem, sob pena de vir a ser declarada NULA (n.º 1 do art. 125º do C.P.P.T.) evidencia com ciência e rigor jurídico-processual a conexão e ligação entre os fundamentos e a decisão.

    3. ) NUNCA o RFP no seu Recurso indicou, ou cumpriu o que emana do art. 640º do C.P.C. aqui aplicável por efeito da al. e) do art. 2º do C.P.P.T., bem como do art. 281º do mesmo compêndio legislativo, no sentido de que o Recurso é interposto, processado e julgado como o de Apelação, por força do disposto no art. 4º n.ºs 1 e 2, do Dec. Lei 303/2007, de 24 de agosto, ou seja, não cumpriu o que lhe é taxativamente imposto, quando (e se) quer Recorrer da matéria de facto, pelo que o seu Recurso nessa parte é improcedente, pois NÃO MAIS se pode alterar o que consta da sentença do Tribunal “a quo”.

    4. ) O Impugnante recebeu o valor contratualizado, emitiu os recibos (verdes) de quitação, indicou a sua qualidade de Actor e redigiu que ocorre isenção de IVA com fundamento no art. 9º do CIVA, nunca a tal se tendo oposto qualquer uma das entidades que contrataram esses seus serviços.

    5. ) O Impugnante é inequivocamente estranho (porque terceiro) ao facto das entidades a quem prestou serviços (nomeadamente a D….. e E…..) e de quem recebeu o pagamento estarem (ou não) inscritas como promotores de espetáculos junto de qualquer Direção Geral.

    6. ) O Impugnante nunca estabeleceu com o público destinatário dos seus espetáculos, qualquer relação direta, em...

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