Acórdão nº 6933/13.7BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelPATR
Data da Resolução22 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (DRFP), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por C…..

, contra a liquidação adicional de IRS, relativa ao ano de 1994, e respetivos juros compensatórios.

*** A Recorrente veio apresentar as suas alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem: “A. A douta sentença recorrida deu como provado a existência de suprimentos dos sócios à sociedade C….., Lda., apesar de considerar os mesmos de montante e proveniência incertos, tal como se passa a transcrever: “Os sócios provaram, no procedimento inspectivo, através da junção de cópias dos cheques, terem sido efectuadas transferências monetárias das suas contas para a sociedade, o que deverá corresponder aos suprimentos. Se tal dinheiro provem de adiantamentos, sinal nos contratos promessa, empréstimos de terceiros, poupanças ou outra fonte é facto que não foi possível apurar. No que respeita ao montante dos suprimentos, também não foi possível quantificar o seu montante”. (sublinhado nosso) B. Ora, para se qualificar os referidos valores como reembolso de empréstimo efectuado por sócio, tem imprescindivelmente de se verificar a montante o pressuposto de que aquele reembolso absolutamente depende, ou seja, a existência do empréstimo em que alegadamente esse reembolso se funda.

C. Na tentativa de fazer prova da existência dos referidos empréstimos, o Rdo apresentou cheques que não perfazem sequer o montante de Esc.8.000.000$00 / € 40.000,00, quando em termos contabilísticos a C….., Lda. chegou a ter inscrito (anos de 1992 e 1993) um valor de suprimentos alegadamente efectuados pelo Rdo de mais de Esc.100.000.000$00 / €500.000,00.

D. Assim, o montante dos cheques apresentados pelo Rdo não perfaz sequer 10% do valor total que na contabilidade se encontrava inscrito como empréstimos do mesmo.

E. Contabilidade essa que não evidenciava os documentos de suporte aos montantes inscritos na conta 25.5 (empréstimo de sócios). “Como resulta do probatório, e do RIT e da Acta da Comissão de Revisão, constantes da apensa RG, os documentos de suporte da contabilização da quantia em causa como suprimento não fundamentam tal qualificação" in Parecer 119/2010 do Ministério Público do TCA Sul, fls. 308 dos autos.

F. Pelo que, nunca poderia ter sido considerado como provado que tivessem sido efectuados suprimentos pelo Rdo, tal como se encontravam contabilizados na C….., Lda.

G. “ (..) A verdade é que o mesmo não faz prova alguma da verdadeira efectivação de tais suprimentos, e muito menos no elevado valor com que foram contabilizados.” in Parecer do Ministério Público junto do TAF de Leiria, a fls. 229 dos autos.

H. Acresce que, a Administração Fiscal ao reunir ainda mais elementos probatórios, comprovou o histórico de rendimentos declarados para efeitos de IRS pelo Rdo entre os anos de 1982 a 1993 (inclusive) concluído que tais rendimentos perfaziam Esc.10.710.484$00 / € 53.423,67. Quando, a contabilidade da sociedade registava que desde 1982 o valor dos empréstimos do Rdo à C….., Lda. ascendeu a Esc. 105.129.150$00 /€524.381,99.

I. Assim, resulta inevitavelmente abalado o argumento de que os valores inscritos como suprimentos tenham tido por origem os rendimentos do Rdo. “Ora, cabe ao recorrente o ónus de comprovar a justeza e conformidade da contabilização efectuada, o que manifestamente não fez” in Parecer 119/2010 do Ministério Público do TCA Sul, fls. 308 dos autos.

J. Foi ainda apurado que os valores dos proveitos da C….., Lda. se encontravam subestimados, pois as vendas eram contabilizadas por valores inferiores aos valores efectivos das transacções, e ainda que existiam adiantamentos que não eram contabilizados.

K. Por outro lado, verificou-se a existência de contratos promessa de compra e venda, que quando confrontados com as respectivas escrituras notariais, evidenciaram diferenças de valor.

L. Por todo o exposto e apurado, deveria a douta sentença ter dado como provado que os valores lançados a crédito na conta 25.5 (empréstimos de sócios) não resultam de suprimentos, mas sim da acumulação ao longo dos anos das diferenças verificadas entre os valores reais e os valores declarados nas vendas. Pelo que, o levantamento do valor de Esc.77.000000$00 pelo sócio gerente, reveste a natureza de adiantamentos de lucros colocados à disposição dos sócios no exercício de 1994, como tal, sujeito a tributação nos termos do disposto no art. 6.° al. h) do CIRS.

M. Considerou também a sentença proferida, que o acto de fixação do rendimento tributável, datado de 16-06-1998 estava inquinado do vício de incompetência relativa.

N. O referido acto foi praticado pelo Chefe da Divisão de Tributação, em regime de substituição desde 15-10-1997, José Maria Isaac de Carvalho.

O. A ausência de publicação, requisito de eficácia, que lhe foi apontada, não gerou qualquer dúvida quanto à autoria do órgão que praticou o acto, com competência para tal, ou sequer diminui as garantias de defesa do contribuinte.

P. Por outro lado, no pressuposto de ainda assim ser considerado o referido vício, tratando-se de incompetência relativa, traduzida na anulabilidade do acto, “ (...) decorrido certo tempo, o acto administrativo anulável já não pode mais ser anulado pela Administração ou impugnado perante os tribunais: a sua ilegalidade deixa de poder fundamentar uma anulação administrativa ou uma sentença anulatória e, portanto, ele passa a ser visto no ordenamento jurídico como um acto tão consistente quanto um acto legal ficando sujeito ao regime da revogação dos actos administrativos válidos. (...) Efectivamente ao fim de um determinado período de tempo - que é, normalmente, um ano contado da sua prática (..) - o acto já não pode mais ser revogado (anulado) pela Administração ou impugnado perante os tribunais." In Código do Procedimento Administrativo comentado de Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves - J. Pacheco de Amorim, 2.ª Edição, pág. 660.

Q. Sabendo como resulta dos autos, que o Rdo apenas alegou o referido vício de incompetência em sede de impugnação judicial apresentada a 04-01-2000, somos de concluir que o vício (a existir) deveria ter sido arguido no prazo máximo de 1 ano, não o tendo sido, ficou sanado a 16-06-1999.

R. Considerou ainda a decisão recorrida que apesar de no CPT não existir regulamentação expressa para o direito de audição, a liquidação impugnada deveria ter sido precedida do direito de audição do Rdo.

S. Releva mencionar que o CPT apenas previa como garantia dos contribuintes um “direito de audição" (artigo 19.°, alínea c)) que, por força do artigo 23.°, alínea e), se restringia ao processo de contra-ordenação fiscal.

T. Ora, a admitir-se a aplicabilidade do art. 100.° do CPA, sempre se dirá que se trata de uma formalidade instituída para assegurar as garantias de defesa dos interessados, por forma a garantir a justeza e correcção do acto final do procedimento, verificando-se a possibilidade de ocorrer a sua degradação em formalidade não essencial.

U. A sua preterição não implica necessariamente a invalidade do acto final, pois pode não resultar numa lesão efectiva e real dos interesses ou valores protegidos pelo preceito.

V. E foi precisamente o que sucedeu no caso dos autos, em que o Rdo participou em todo o procedimento conducente ao acto de liquidação, desde o início do procedimento inspectivo, na Comissão de Revisão através do vogal nomeado por si e na Reclamação Graciosa, merecendo sempre as razões de facto e de direito por si invocadas a respectiva análise por parte da AT.

W. O Rdo participou assim na formação da decisão da Administração Fiscal, não tendo transportado para os autos elementos susceptíveis de alterar a qualificação feita pela Administração Fiscal e consequentemente de por em crise as correcções determinadas.

X. Pelo que, mesmo que o direito de audição fosse concedido e exercido, nunca a AT poderia ter actuado de outra forma.

Y. Assim, estando esse direito cumprido por qualquer outra forma, ou sendo irremediavelmente o destino mesmo que fosse exercido, parece que tal formalismo, sendo, à partida, um trâmite essencial, se pode degradar em não essencial, não implicando inevitavelmente a nulidade do acto final, por não lesar os interesses protegidos. Neste sentido, Acórdão do STA, de 27-01-2010 (Processo: 0922/09), Acórdão do TCA Sul de 25-10-2005 (Processo: 01305/03).

Z. Ainda a entender-se que deveria ter sido formalizado o direito de audição do Rdo, que como já se disse não alteraria a decisão da AT por sempre ter participado da mesma, esse vício já estaria sanado, por falta de arguição no prazo de um ano, nos termos do regime consagrado no art. 136.° e ss. do CPA para os actos anuláveis, pois o Rdo invocou o alegado vício em sede de impugnação judicial (apresentada em 04-01-2000), pelo que se verifica que o vício (a existir) estaria sanado desde 16-06-1999, ou seja, um ano após a prática do acto.

AA. Considerou ainda o doutro tribunal existir erro na quantificação, apenas com a seguinte fundamentação: “Com efeito, a decisão administrativa assumiu que todos os valores recebidos pelo impugnante eram valores provenientes de distribuição de lucros, decisão posteriormente corrigida em sede de Comissão de Revisão de acordo com a percentagem de omissões de vendas na sociedade, que se estimou ser de 24%. Esta percentagem, e qualificação, não mereceu a concordância do perito do contribuinte, que embora tenha aceite o rendimento global de Esc. 55.596.687$ discordou que tal se devesse a distribuição de lucros na sociedade. A AT persistiu, assim, na argumentação de que os valores entregues a titulo de suprimentos correspondem aos valores dos proveitos omitidos pela sociedade.

Mas tal conclusão não está alicerçada em factos demonstráveis (sublinhado nosso) BB. Com tal fundamentação/conclusão não podemos concordar, maxime porque a actuação e decisão administrativa esteve...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT