Acórdão nº 00200/11.8BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | Ricardo de Oliveira e Sousa |
Data da Resolução | 16 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* *I – RELATÓRIO P., com os sinais dos autos, vem interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel promanada no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada por si intentada contra o MUNICÍPIO DE (...), também com os sinais dos autos, que julgou a presente ação improcedente, e, consequentemente, absolveu o Réu do pedido.
Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) 1. Resulta da matéria de facto provada que o Réu não divulgou qualquer legislação ou bibliografia até 30 dias antes da prova de conhecimentos, facto que é reconhecido pelo Réu e pelo Tribunal a quo.
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O Réu não apresentou qualquer prova - testemunhal ou documental - de que, em função das matérias objeto de avaliação, a divulgação de bibliografia ou legislação não se justificava.
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Por força do princípio da legalidade, consagrado no artigo 3.° do anterior CPA e 266.°, n.° 2 da CRP, competia ao Réu, e não ao Autor, o ónus da prova da licitude do ato impugnado, isto é, que o ato impugnado contém todos os pressupostos de facto e de direito (legais) que legitima a sua atuação.
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Ao exigir ao Autor a prova da “necessidade” de indicação de bibliografia, em vez de exigir do Réu a prova de que a mesma não era necessária, a decisão recorrida violou as regras do ónus da prova aplicáveis em matéria de impugnação de atos administrativos, tendo violado os artigos 342.°, n.° 1 e 2 do C.C., em conjugação com o disposto no artigo 3.° do anterior CPA e 266.°, n.° 2 da CRP.
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Não tendo o Réu feito prova da licitude do ato impugnado, nomeadamente da desnecessidade de indicação de bibliografia, deveria o Tribunal a quo ter concluído pela verificação do vício de violação do disposto no n.° 7 do artigo 9.° da Portaria n.° 83-A/2009, de 22/01.
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Verificando-se a existência de bibliografia com regras e técnicas diferentes, matéria que não chegou a ser apurada pelo Tribunal a quo, nem o Réu dela fez alegação suficiente e prova, salvo o devido respeito, não pode o Tribunal garantir que a classificação do Autor e dos restantes candidatos não seria diferente.
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Se o Réu tivesse cumprido o disposto no n.° 7 do artigo 9.° da Portaria n.° 83- A/2009, de 22/01, o resultado do concurso certamente que seria diferente.
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Ao contrário do que defende a decisão recorrida, a realização de testes psicológicos escritos e iguais em momentos temporais distintos permitirá aprendizagem ou, como referiu a técnica Liliana e ficou a constar do ponto 17 da matéria de facto dada como provada, é passível de familiarização antecipada com o seu conteúdo, de um modo que pode favorecer injustamente o desempenho de alguns candidatos.
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Também ao contrário do que ficou decidido, é jurisprudência pacífica que a violação do princípio da imparcialidade “(...) não está dependente da prova de concretas actuações parciais, verificando-se sempre que um determinado procedimento faz perigar as garantias de isenção, de transparência e de imparcialidade.” (cfr. Ac. TCAN de 16/11/2006, Proc. 545/05.6BECBR).
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Pelo que não tinha o Autor de fazer prova, para que se concluísse pela violação dos princípios da igualdade, transparência e imparcialidade, de que alguns candidatos foram favorecidos em seu detrimento, sendo certo que, ainda assim, se pode curiosamente verificar que vários candidatos obtiveram 20 valores nos testes psicológicos o que não é normal.
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Da mesma forma, é inédito que num concurso para ingresso na função pública, seja permitido o uso de lápis nos testes de avaliação, sendo que nenhuma razão lógica justifica a opção pelo lápis em vez da tinta, que dá muito maior garantia de transparência e sindicabilidade.
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Como parece evidente e inegável, o uso de lápis propicia com muito maior facilidade a adulteração dos resultados da avaliação e se fosse, como refere a decisão recorrida, as escrituras públicas também poderiam ser outorgadas e assinadas com lápis.
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Finalmente, por maioria de razão, os técnicos que procedem à avaliação dos candidatos, ainda que não façam parte do Júri ou não tenham poderes decisórios, devem ser nomeados e identificados antes de serem conhecidos os candidatos, desde que a sua avaliação, como é caso dos autos, seja suscetível de influenciar o resultado e classificação final.
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Conforme consta do ponto 8 e 10 da matéria de facto dada como provada, a nomeação da técnica que procedeu à avaliação psicológica que determinou a exclusão do Autor, foi feita após a realização da prova de conhecimentos técnicos,escrita.
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Tendo o Júri se declarado tecnicamente incompetente para avaliar psicologicamente os candidatos, jamais a classificação atribuída pela técnica em causa seria alterada.
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Daí que a regra de nomeação prévia dos técnicos que procedem à avaliação psicológica não pode deixar de ser cumprida, tal e qual como deve ser cumprida para os membros do Júri, sob pena de clara violação do princípio da imparcialidade e da transparência (artigo 6.° do anterior CPA e artigo 266.°, n.° 2 da CRP; vd. ainda artigo 19.°, n.° 3, al. s) da Portaria 83-A/2009, de 22 de janeiro).
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O eventual conhecimento prévio dos candidatos permite, contrariamente ao decidido, a quem avalia, traçar o perfil psicológico à medida do(s) candidato(s) da sua preferência ou conhecimento, que pode não coincidir com o mais apto do ponto de vista do interesse público em causa.
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Nada nos autos garante, nem foi feita prova nesse sentido, que se o concurso tivesse respeitado as mais elementares regras de transparência e imparcialidade, o resultado não fosse outro.
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A decisão recorrida violou, assim, o disposto nos artigos 5.° e 6.° do anterior CPA; n.° 2 do artigo 266.° da CRP e al. s) do n.° 3 do artigo 19.° da Portaria n.° 83-A/2009, de 22 de janeiro, este último aplicável por interpretação extensiva (argumento de maioria de razão) ao caso dos autos.
(…)”.
*Notificado que foi para o efeito, o Recorrido produziu contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido quanto à improcedência da presente ação.
*O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
*O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu o parecer a que alude o nº.1 do artigo 146º do CPTA.
*Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
* *II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir resumem-se a determinar se se a sentença recorrida incorre em erro[s] de julgamento de direito, por violação do disposto (i) “(…) [nos] artigos 342º, nº. e 2º do C.C., em conjugação com o disposto no nº.3 do anterior CPA e 266º, nº. 2 da CRP (…)”; (ii) “(…) no nº. 7 do artigo 9º da Portaria nº. 83/2009, de 22.01 (…)”, (iii) “(…) [por] violação do princípio da imparcialidade e da transparência (…)” e “(…) disposto nos artigos 5.° e 6.° do anterior CPA; n.° 2 do artigo 266.° da CRP e al. s) do n.° 3 do artigo 19.° da Portaria n.° 83-A/2009, de 22 de janeiro, este último aplicável por interpretação extensiva (argumento de maioria de razão) ao caso dos autos (…)”.
Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.
* *III – FUNDAMENTAÇÃO III.1 – DE FACTO O quadro fáctico apurado [e respetiva motivação] na decisão judicial recorrida foi o seguinte: “(…) 1. A 09/12/2009, a Câmara Municipal de (...) deliberou, por unanimidade, aprovar a abertura de concurso para um posto de trabalho de Técnico Superior (Área de Desporto), em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado; 2. Por despacho proferido a 15/01/2010 pelo Presidente da Câmara do Réu, foi determinada a abertura do concurso identificado em 1., bem como a composição do júri do concurso, que foi a seguinte: V.o como Presidente; S., designada para substituir a Presidente nas suas faltas e impedimentos, e I., como vogais efetivos; e M. e A., como vogais suplentes; 3. A 12/03/2010, por despacho do Presidente da Câmara do Réu, foi aprovado o programa das provas de conhecimentos, do qual consta o seguinte: “(...) O Júri decidiu então que os métodos de seleção constarão de 2 fases, sendo cada uma de carácter eliminatório, ficando em condições de aceder à fase...
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