Acórdão nº 2636/05.4BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | CRISTINA FLORA |
Data da Resolução | 08 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO J....., E.....
e O.....
, vieram deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL contra o indeferimento tácito da reclamação graciosa nº 3158-……..3, que apresentaram contra as liquidações de IRS do ano de 2000 com os nºs 2004 50….. e 2004 50…., de 28.10.2004 e 02.10.2004, respetivamente, nos montantes a pagar de 214.828,68€ e 220.195,13€, também respetivamente.
O Tribunal Tributário de Lisboa julgou improcedente a impugnação.
Inconformados, os impugnantes vieram recorrer contra a referida sentença, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões: «QUESTÃO PRÉVIA 1. O presente recurso foi interposto per saltum para o Supremo Tribunal Administrativo por se entender, após a devida ponderação, que a matéria a decidir é exclusivamente de direito.
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Tanto quanto se pode depreender da sentença, considerou-se provado que, com a assinatura do contrato promessa dos autos, a promitente -compradora entrou de imediato na posse do prédio em causa.
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Caso assim se não entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, ou seja, caso se entenda que, por omissão, na sentença não se considerou provado que "Com a assinatura do contrato-promessa dos autos, a promitente-compradora entrou de imediato na posse do prédio dos autos" [o que, repita-se, na ausência de referência a esta realidade nos factos não provados, seria contraditório com o que resulta da al. C) dos factos provados e com todo o teor da sentença] desde já se requer, nos termos do nº 2 do artº 18º do CPPT, a remessa do processo para o Tribunal Central Administrativo Sul para que se adite aos factos provados a seguinte factualidade: "Com a assinatura do contrato-promessa dos autos, a promitente-compradora entrou de imediato na posse do prédio a que se refere a al. C) dos factos assentes".
RESTANTES CONCLUSÕES 4. A propriedade do prédio dos autos foi adquirida pelo promitente-vendedor C....., em data anterior a 1 de Janeiro de 1989.
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Nos termos do art. 5°, n.01, do Decreto-Lei nº 442-A/88, de 30 de novembro "os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias, criado pelo Código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 373, de 9 de Junho de 1965 (...) só ficam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que respeitam tiver sido efetuada depois da entrada em vigor deste Código" (01/01/1989).
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De acordo com o corpo do n.º 3 do art. 10º do CIRS os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática dos actos previstos no n.º 1 (no caso dos imóveis, na data de alienação onerosa do respetivo direito real).
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Esta consideração cede (é clara a redação da parte final do corpo do nº 3: "sem prejuízo do disposto nas alíneas seguintes") nos casos previstos nas als. a) e b) do referido n.º 3 do art. 10° do CIRS.
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A referida al. a) preceitua que, "nos casos de promessa de compra e venda ou de troca, presume-se que o ganho é obtido logo que verificada a tradição ou posse dos bens ou direitos objecto do contrato".
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No presente caso, como ficou provado, foi celebrado um contrato-promessa de compra e venda e, com ele, verificou-se a tradição e a mudança de posse do prédio objecto do contrato. Logo, o ganho que estaria eventualmente sujeito a imposto tem de considerar-se obtido naquela data.
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Em princípio, este ganho, obtido em 18 de Dezembro de 1998 por C....., constituiria uma mais valia sujeita a IRS que deveria ser objecto da declaração anual de rendimentos prevista no actual art. 57° do CIRS.
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No entanto, por força do já mencionado art. 5°, n.º 1 do Decreto-Lei nº 442-A/88, de 30 de Novembro, este ganho só ficaria sujeito a IRS se a aquisição do bem em causa tivesse sido efetuada depois de 01/01/1989.
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Por esta razão, o ganho obtido por C..... em 18 de dezembro de 1998 não estava sujeito a IRS e como tal, não pode, sob pena de grave violação da lei ordinária e da Constituição, ser objeto de tributação.
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A circunstância de, em execução do contrato promessa, ter sido celebrado o contrato prometido (isto é, a escritura de compra e venda) por aqueles que, nos termos da lei (art. 412º, nº 1 do Código Civil), sucederam nas obrigações do falecido promitente-comprador, é, do ponto de vista da tributação em sede de IRS, totalmente irrelevante.
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O acto (de venda) realizado por escritura de 1 de Junho de 2000 é, em sede de IRS, irrelevante, uma vez que é a própria lei que o desconsidera, para afirmar que o ganho se considera obtido em 18 de Dezembro de 1998 (data da tradição e mudança de posse em virtude de contrato promessa).
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Contrariamente ao que se decidiu na sentença recorrida, estamos perante uma situação enquadrável no âmbito do artº 5°, nº 1 do Decreto-lei nº 442-A/88, uma vez que o prédio objeto do contrato promessa com tradição celebrado em 1998 foi adquirido antes de 1 989.
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Ao contrário do que se decidiu na sentença recorrida, tem total aplicação no caso dos autos a presunção estabelecida na al. a) do nº 3 do artº 10° do CIRS, sendo a data relevante de obtenção do ganho para efeitos de tributação da mais-valia a da celebração do contrato promessa com tradição, isto é, 18.12.1998 (data em que o promitente-vendedor, pai e marido dos recorrentes, respetivamente J..... e O....., ainda era vivo).
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Ao contrário do que concluiu a sentença recorrida, o facto de não se ter provado que a AT teve conhecimento da celebração do contrato-promessa - por o promitente-comprador, alegadamente, não ter procedido ao pagamento da SISA aquando da celebração do contrato-promessa e tradição do bem - não releva para a desconsideração do facto tributário que se constitui, justamente, com essa tradição, independentemente daquilo que o promitente-comprador declarou ou deixou de declarar para efeitos de SISA.
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Foi assim violado o artº 5º do Decreto-lei nº 442-A/88, em conjugação com a al. a) do nº 3 do artº 10º do CIRS.
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Tais normas se interpretadas no sentido da sentença recorrida ou seja, sentido de se admitir que, nos casos de celebração de contratos-promessa com tradição, seja a Administração Fiscal a determinar o momento em que se considera verificado o ganho, viola, de forma clara, os princípios da segurança jurídica (ínsito no princípio do Estado de Direito Democrático previsto no art. 2º da CRP); da legalidade, constante do art. 3º da CRP, nas suas vertentes de legalidade fiscal - art. 103°, n.º 3 e de legalidade da atuação da administração - art. 266°, n.º 2 e ainda o princípio da igualdade, previsto nos art. 13º e 266º, n.º 2 da CRP, na sua modalidade de igualdade de tratamento dos cidadãos perante a administração, sendo por essa razão materialmente inconstitucional.
Termos em que se requer a V. Exas. que considerem o presente recurso como procedente, revogando-se a sentença recorrida, fazendo deste modo a necessária, costumada e, neste caso, imprescindível JUSTIÇA! Para o caso de se entender, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, que da sentença não resulta provado que "Com a assinatura do contrato promessa dos autos, a promitente-compradora entrou na posse do prédio dos autos" desde já se requer, nos termos do nº 2 do artº 18º do CPPT, a remessa do processo para o Tribunal Central Administrativo Sul para que se adite aos factos provados essa factualidade, sendo aí julgado o presente recurso.» ****A recorrida, devidamente notificada para o efeito, não contra-alegou.
**** Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público junto do STA que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
****Por decisão proferida em 18/09/2019 o Meritíssimo Juiz Conselheiro Relator nos presentes autos proferiu decisão declarando o STA incompetente em razão da hierárquia, indicando o presente TCAS como o tribunal competente.
**** Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público junto deste TCAS que emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
****Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
**** A questão invocada pelo recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir consiste em aferir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito, porque, no entender da recorrente estamos perante uma situação enquadrável no âmbito do art. 5.º, n.º 1 do DL n.º 442-A/88, sendo aplicável a presunção do art. 10.º, n.º 3, alínea a) do CIRS (conclusões 4 a 18). Mais invoca que a interpretação daquelas normas no sentido adotado pela sentença recorrida viola vários normativos e princípios constitucionais, (conclusão 19).
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FUNDAMENTAÇÃO A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto: «A) Em 11.01.1973, junto do Cartório Notarial de Loures, foi assinado por C..... e L....., como compradores, a escritura de compra e venda, pela qual, entre outros, este adquiriu o prédio rústico denominado “J...”, sito em Junqueira, freguesia de Vialonga, inscrito na matriz cadastral respetiva sob o artigo ...º da secção B... (cfr. fls. 47 a 59 dos autos).
B) Em 13.03.1980, junto do Cartório Notarial de Arruda dos Vinhos, C..... e L..... assinaram a escritura de “Divisão”, pela qual procederam à divisão do prédio identificado na alínea antecedente em lotes e adjudicação de uma parte a cada um deles (cfr. escritura de fls. 60 a 64 dos autos).
C) Em 18.12.1998 foi assinado por procurador de C..... e por representantes da sociedade “C....., Lda”, o escrito denominado “Contrato Promessa de Compra e Venda” através do qual o primeiro prometeu vender à segunda o prédio rústico sito em Junqueira, na freguesia de Vialonga, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ……º, da Secção B... e descrito na CRP de Vila Franca de Xira, sob o nº 2……., B-…., pelo preço de 380.000.000$00, sendo pago o montante de 15.000.000$00 a título de sinal e princípio de pagamento e o remanescente com a escritura definitiva, sendo declarado ainda no artigo 7º do escrito...
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