Acórdão nº 3138/15.6BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 01 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelDORA LUCAS NETO
Data da Resolução01 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório A Caixa Geral de Aposentações, não se conformando com a decisão sumária proferida pela Relatora, a 16.03.2020, que manteve a sentença do TAF de Sintra, de 24.07.2017, que, em sede de ação administrativa especial intentada contra si por V......, julgou a ação procedente e a condenou a reconstituir a situação do autor como se o ato anulado não tivesse sido praticado, procedendo ao pagamento ao autor de todas as pensões vencidas e não pagas, no prazo de 30 dias, e das que se vencerem, não havendo fundamento legal para a sua revogação ou não pagamento por motivo do autor viver em união de facto, veio da mesma reclamar para a conferência.

  1. Apreciação Importa, pois, retomar a apreciação do presente recurso, desta feita, pelo coletivo.

    Vejamos então.

    II.1.

    Em sede de alegações recursais, a Recorrente CGA, culmina com as seguintes conclusões: «(…) 1a A situação de união de facto foi expressamente tutelada na lei com a entrada em vigor do Decreto-Lei n° 191.B/79, de 25 de Junho, prescrevendo-se na alínea c) do ponto 2, do seu preâmbulo o “acolhimento do princípio da relevância de uniões de facto, de alguma forma equiparáveis à sociedade conjugal, de harmonia com a redacção actual do artigo 2020° do Código Civil”.

    2a A interpretação jurídica não se pode cingir à letra da lei, deve, isso sim, reconstituir, a partir dos factos, o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. É o que resulta claramente do n° 1 do artigo 9° do Código Civil.

    3a Fazendo uso dos princípios que devem nortear a interpretação jurídica, mesmo antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n° 133/2012, de 27 de Junho, sempre foi entendimento da Caixa Geral de Aposentações que resultava do disposto no artigo 47° do EPS em conjugação com interpretação do preâmbulo do mesmo diploma, sob pena de violação grave do princípio da igualdade, previsto no artigo 13° da Constituição da República Portuguesa, que a união de facto, à semelhança do casamento, para além de facto constitutivo, consubstanciava um facto extintivo do direito à pensão de sobrevivência.

    4a O Decreto-Lei n° 133/2012, de 27 de Junho, alterou a redacção da alínea c) do n° 1 do artigo 47° do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, passando a determinar que a união de facto também é um facto extintivo do direito à pensão.

    5a Este preceito, de forma expressa e inequívoca, consagrou um entendimento que já resultada da interpretação da lei.

    6a Se a vivência em condições análogas às dos cônjuges é equiparada ao casamento para efeitos de concessão de pensão de sobrevivência, então, por igualdade de razão, também deverá ser equiparada ao casamento para efeitos de extinção da mesma pensão.

    7a A sentença recorrida, ao sustentar entendimento contrário à aludida equiparação, viola o princípio da igualdade expressamente vertido no artigo 13° da Constituição da República portuguesa, uma vez que, relativamente às situações decorrentes de óbitos anteriores à entrada em vigor do Decreto-Lei n° 133/2012, de 27 de Junho, considera que o beneficiário de uma pensão de sobrevivência que venha a contrair casamento perde o direito à pensão; em contrapartida, o beneficiário que passe meramente a viver em união de facto não perde o direito à pensão de sobrevivência.

    8a O princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei é acolhido pelo artigo 13° da Constituição da República que, no seu n° 1, dispõe, genericamente, consagra terem todos os cidadãos a mesma dignidade social, sendo iguais perante a lei, especificando o n° 2, por sua vez, que ‘ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.

    9a O princípio da igualdade reclama, num primeiro passo, que seja conferido tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais mas também se reconduz à proibição do arbítrio, proibição essa que, naturalmente, não anula a liberdade de conformação do legislador onde ele a não infrinja.

    10a É inquestionável que o casamento e a união de facto representam realidades diversas, consubstanciam conceitos jurídicos diferentes. Porém, tendo presente a equiparação que é feita pela lei...

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