Acórdão nº 534/06.3BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 01 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | RICARDO FERREIRA LEITE |
Data da Resolução | 01 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo – Sul: I. Relatório A….., LDª, sociedade comercial por quotas, com sede na ….., recorrente/autora nos presentes autos, em que é recorrido/réu o MUNICÍPIO DE SINTRA, interpôs o presente recurso do acórdão do T.A.F. de Sintra, datado de 16.07.2007, que julgou improcedente a respectiva pretensão e absolveu o réu e os contrainteressados do pedido formulado, no sentido da anulação da decisão de ordenar o encerramento do estabelecimento de assador de frangos e demolição das obras nele efectuadas sem licença.
Em sede de alegações de recurso, a Autora repetiu a argumentação já esgrimida no âmbito da ação administrativa oportunamente intentada, a que fez acrescer apenas a arguição de alegada nulidade por omissão de pronúncia porquanto a decisão em crise não se teria expressamente debruçado sobre os pontos b), c), g), h), i) e j) do articulado de alegações de direito (embora indevidamente as apode de “alegações de recurso”), apresentado nos termos e para os efeitos previstos no nº 4 do artº 91º do CPTA, na versão aplicável à data.
Basicamente, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: · “A recorrente não coloca em crise a matéria fáctica assente, constante das alíneas A) a W), inserta na fundamentação de facto do douto Acórdão recorrido.
· Relativamente ao direito aplicável, discorda da interpretação e qualificação jurídicas dadas pelo Tribunal recorrido, na medida em que não acolheu as causas de invalidade que a recorrente atribuiu ao despacho impugnado.
· Considera a recorrente que o Município de Sintra, no exercício da actividade administrativa decorrente do despacho impugnado, violou os princípios da imparcialidade, igualdade, proporcionalidade e boa fé, consignados no artº. 266°., nº. 2 da Constituição da Republica Portuguesa, princípios a que ficam subordinados, no exercício das suas funções, os órgãos e agentes administrativos.
· Considera a recorrente que o despacho impugnado desrespeita o preceituado nos ar1°s. 4°., 5°., 6°. e 6°. A, todos do Código do Procedimento Administrativo.
· Princípios que respeitam à prossecução do interesse publico e do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos; princípios de igualdade e proporcionalidade; os princípios de justiça e imparcialidade e o principio da boa fé.
· A violação, a não observância e o respeito por tais princípios mostram-se sustentados pela recorrente, nos factos alegados na sua petição de recurso pelo que discorda que tenha feito a sua invocação, sem qualquer sustentação.
· Impunha-se, no entendimento da recorrente, que o Tribunal "a quo" tivesse apreciado da forma diferente da que o fez, os vícios por si suscitados nas alíneas b), c) e g) das suas alegações de recurso.
· Impunha-se que o Tribunal recorrido, no entendimento da recorrente, tivesse conhecido dos vícios por ela suscitados, nas alíneas h), i) e j) das suas alegações de recurso.
· Ao não fazê-lo, o douto Acórdão recorrido padece de omissão de pronuncia, pelo que se encontra ferido da nulidade prevista na ai. d), do nº. 1, do arl°. 668°., do C.P. Civil, devendo proceder as referidas conclusões.
· O despacho do Município de Sintra, impugnado nesta acção, comporta uma decisão desadequada perante a prossecução do interesse publico visado, sendo mesmo desnecessária, desproporcionada e injusta perante aquele.
· O Município de Sintra não ponderou os interesses juridicamente protegidos, envolvidos no caso vertente, não tendo mantido, ao proferir o despacho impugnado, a equidistância que lhe é exigível e a objectividade que se lhe impunha, em relação aos interesses particulares.
· O Município de Sintra ao notificar a recorrente para apresentar novo pedido de licenciamento, rejeitado anteriormente por ilegitimidade daquela, criou uma expectativa legítima nesta, no sentido que praticaria o acto que lhe foi submetido apreciar e solicitado.
· Não podendo a autoridade administrativa invocar o desconhecimento dos condicionalismos impostos e a serem cumpridos pelo particular, para obtenção do efeito condicionado ao pedido efectuado, ao frustrar tal expectativa, não respeitou o princípio da boa fé.
· A ilegitimidade imputada à requerente da operação urbanística, resulta unicamente do facto de não ter instruído o pedido de licenciamento com o documento a que alude a al. a), do nº. 1, do art°. 11, da Portaria nº. 1110/2001, de 19 de Setembro, nem o ter conseguido obter.
· Os actuais proprietários e senhorios do prédio onde se mostra situado o estabelecimento de assador de frangos/churrasqueira, detêm essa qualidade, por sucessão hereditária, desde 2002.
· As obras executadas naquele estabelecimento nunca foram alvo de oposição, pelo proprietário e senhorio à data em que foram concretizadas, nem mereceram, por parte dos actuais proprietários e senhorios, qualquer actuação judicial que manifestasse a sua discordância relativamente à respectiva construção.
· Obras que o Município de Sintra sempre reconheceu existirem, não tendo imposto à recorrente qualquer medida sancionatória perante a sua existência, até à rejeição do pedido de licenciamento que deu entrada em 30 de Junho de 2003.
· Obras inicialmente construídas em 1984 e objecto de ampliação em Outubro de 1995.
· A oposição dos actuais proprietários e senhorios do estabelecimento é ilícita perante o disposto no art°. 1.057°., do Código Civil.
· Enfermando o despacho impugnado dos vícios de violação de lei, nos termos dos art°s. 106°., nº. 2 e 109°., do RJUE.” As contra-alegações dos recorridos Município e contrainteressados foram ambas no sentido de, sumariamente, sustentar a decisão sob escrutínio, reiterando o respetivo teor e insistindo na ausência de violação de qualquer dos preceitos/princípios referidos pela recorrente nas suas alegações.
Conclui o Município nos seguintes termos: “I. O douto acórdão recorrido pronunciou-se quanto aos vícios alegados pela recorrente, pelo que não existe omissão de pronúncia; II. A interpretação e qualificação jurídica dos factos não poderia ser diversa por ser a que resulta expressamente da lei aplicável; III. A entidade demandada não pode, na· sua actuação, excepcionar a aplicação de algumas normas conforme a conveniência da ora recorrente; IV. A construção em crise não está licenciada pelo Município; V. A entidade demandada deitou mão do procedimento de reposição da legalidade urbanística apenas após ter dado oportunidade à recorrente para sanar a ilegalidade obtendo o necessário licenciamento; VI. Em todo o processo o Município cumpriu o disposto nos art.ºs 106.º e 109.º do RJUE, ao invés do afirmado pela recorrente; VII. A ora recorrente por ser arrendatária necessita de autorização do senhorio para proceder a obras de construção civil com ampliação da área coberta; VIII. A recorrente não logrou obter consentimento do proprietário do imóvel para o licenciamento das obras ilegais; IX. Ainda que tivesse obtido tal consentimento tal não implicava directamente a aprovação do pedido de legalização; X. Todas as informações constantes do processo de legalização apontam para o indeferimento do pedido; XI. Logo, não foi criada nenhuma expectativa de êxito das pretensões da ora recorrente pelo Município de Sintra; XII. Ao agir em conformidade com a lei o Município de Sintra não violou nenhum princípio geral de direito, designadamente não violou os princípios da imparcialidade, igualdade, proporcionalidade e boa fé, consignados nos artigos 4.º, 5.º, 6º e 6.º-A do CPA e decorrentes do art.º 266.º n.º 2 da CRP.
-
Assim, muito bem vai o douto acórdão recorrido ao negar provimento ao peticionado” Por sua vez, os contrainteressados, apresentaram as seguintes conclusões: “
-
Em todo o Processo, a Câmara Municipal de Sintra cumpriu o disposto nos Artigos nº 6° e 109° do RJVE.
-
Nem as disposições atinentes ao arrendamento, nem o documento existente no processo (Abril de 1984) dão poderes á A. para em nome dos senhorios a solicitar á entidade competente (Câmara) para proceder ás obras, pelo simples facto de sendo somente arrendatário necessitava do consentimento do senhorio para proceder ás obras.
-
A recorrente não obteve tal consentimento, nem mesmo em acção judicial intendada para o efeito (suprimento de autorização).
-
A recorrente não foi dada qualquer expectativa ou constituição de direitos pelo facto de solicitar á recorrente que instruísse novo pedido com a autorização do senhorio (que não conseguiu).
-
A Câmara agiu de acordo com a Lei aplicável, não violou nenhum princípio de direito e muito menos princípios constitucionais.
-
Não houve qualquer violação dos Artºs. 4°, 5°, 6° e 6ºA do CTA e Artº 266º nº 1 do C.P.C.
-
Não existe qualquer omissão de pronuncia.
-
Pelo que a Douta Decisão deve ser mantida, negando-se provimento ao recurso.”*A D.ª Magistrado do M.P. notificada para o efeito, emitiu douto parecer que antecede, pugnando pela improcedência da pretensão recursiva e consequente manutenção do acórdão em crise.
*Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
* II. Delimitação do objeto do recurso (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPT
-
As questões suscitadas pela recorrente prendem-se com uma alegada nulidade por omissão de pronúncia porquanto a decisão em crise não se teria expressamente debruçado sobre os pontos h), i) e j) do articulado de alegações de direito e com um alegado erro de julgamento pelo facto de não terem sido devidamente devidamente apreciadas as invocações feitas nas als. b), c) e g) das alegações e compaginados os vícios relativos a uma alegada violação dos princípios da imparcialidade, igualdade, proporcionalidade e boa fé, consignados no artº. 266°., nº. 2 da Constituição da Republica Portuguesa e nos artigos. 4°., 5°., 6°. e 6°. A, do Código do Procedimento Administrativo, com a matéria de facto dada por assente (e que a recorrente não questiona).
* III. Factos (dados como provados na sentença...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO