Acórdão nº 199/09.0BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução24 de Setembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO O Município de Loulé, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, datada de 29/11/2017, que no âmbito da ação administrativa instaurada por A..............

, julgou a ação parcialmente procedente, condenando a Entidade Demandada a realizar medições acústicas para verificação da conformidade com os valores limites de exposição ao ruído, tendo por referência o edifício de habitação do Autor, sempre que emita licenças especiais de ruído para a realização de atividades ruidosas temporárias na Praça do Mar (festividades, divertimentos públicos e espetáculos ruidosos), absolvendo-a do demais peticionado.

O Autor, igualmente discordando da sentença, veio interpor recurso, na parte do decaimento no pedido de pagamento de uma indemnização pelos danos alegados em consequência do ruído e pelas despesas com a instauração da presente ação.

* Formula a Entidade Demandada, aqui Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que ora se reproduzem: “A - À semelhança do entendimento perfilhado na Douta Sentença Recorrida, com ressalvo da revogação realizada pela Lei nº 75/2013, entende-se que o regime aplicável será o consagrado no Capitulo VII do Decreto Lei 210/2002, concretamente, o disposto nos seus artigos 29º a 34°.

B - Ora. face ao disposto no artigo 32º nº l. al. b), é inequívoco que a competência para a emissão da licença especial de ruído pertence ao Presidente do Câmara, não constituindo uma competência do Município, que enquanto autarquia local prossegue as suas atribuições através do exercício pelos respetivos órgãos das competências legalmente previstas (cfr. art. 3º da Lei 75/2013), pelo que a douta sentença viola o prescrito nesta disposição legal ao condenar o Município de Loulé, que, assinale-se, não detém competências para emitir a licença especial de ruído.

C - Acresce que, compulsadas as disposições legais supra transcritas, que correspondem ao Regime Legal vigente. dele não consta a previsão ou obrigação a cargo do Recorrente, Município de Loulé, de realização de medições acústicos sempre que seja emitida uma licença poro a realização de festividades, de divertimentos públicos e de espectáculos ruidosos nas vias públicas e demais lugares públicos nas proximidades de edifícios de habitação, sublinhando-se que estando prevista a possibilidade de suspensão imediata das actividades pelas autoridades policiais, tal medida afigura-se mais eficaz e ajustada.

D - Acresce que. o nº 5 do artigo 15º do RGR, aplicável por remissão expressa do artigo 32º, nº 1, al. c) do Dec. Lei 210/2002, dispõe que, 5 - A licença especial de ruído, quando emitida por um período superior a um mês, fica condicionada ao respeito nos receptores sensíveis do valor limite do indicador L (índice Aeq) do ruído ambiente exterior de 60 dB(A) no período do entardecer e de 55 dB(A) no período nocturno, pelo que. a contrário, no caso dos autos. uma vez que estamos perante licenças emitidas por curtos períodos. normalmente de um dia ou apenas algumas horas. não existe qualquer condicionamento quanto ao respeito nos receptores sensíveis dos limites aí prescritos.

E - Importa ainda considerar, que se o A. Recorrido não logrou provar que durante mais de 30 anos 1 desde que fixou residência no local, onde já eram realizados espetáculos há mais de 50 anos) os seus direitos tenham sido violados ou comprimidos, carece de interesse processual qualificado paro pedir a condenação do Recorrente para adaptar ou para se abster desta ou daquela conduta, concretamente, a realização de medições acústicas, sempre que emita uma licença especial de ruído.

F - Por outro lodo, em termos materiais. é notório o erro de julgamento de que enferma a douta sentença recorrida em condenar a Entidade Demandada, porquanto. antes. entendera já de forma expresso e inequívoco que, (...) o autor ao demonstrou que a entidade demandada tenha violado uma qualquer norma ou princípio jurídico, infringido uma qualquer regra de ordem técnica e de prudência comum ou incumprido um qualquer dever jurídico ou obrigação a que estivesse normativamente vinculada. (...)”.

Pede a revogação da sentença recorrida e que seja julgado improcedente o pedido de anulação do ato impugnado.

* Formula o Autor, aqui Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que ora se reproduzem: “1- Por contradição, entende-se o facto de afirmar e de negar ao mesmo tempo uma coisa ou a emissão de duas proposições contraditórias que não podem ser simultaneamente verdadeiras e falsas, entendendo-se como proposições contraditórias as que tendo o mesmo sujeito e o mesmo atributo diferem na quantidade ou na qualidade....

2 - Só existe, pois, contradição insanável da fundamentação quando, de acordo com um raciocínio lógico, seja de concluir que essa fundamentação justifica uma decisão preciosamente oposta ou quando, segundo o mesmo tipo de raciocínio, se possa concluir que a decisão não fica esclarecida de forma suficiente, dada a colisão entre os fundamentos invocados.

3 - Desde logo verifica-se que entre os factos provados, a fundamentação e a decisão existem contradições.

4 - Contradições essas que prejudica gravemente os interesses do ora recorrente e dadas como provadas pela douta sentença.

Ora, 5 - Quanto aos factos provados nos números 3 a 5 e 7 a 16 verifica-se que existe, da parte da sentença recorrida, contradição com a fundamentação e com as normas em vigor, nomeadamente com as normas constitucionais.

6 - Estamos perante violação de normas fundamentais com factos dados como provados.

7 - Ocorre insuficiência para a decisão da matéria de facto provada uma vez que dos factos vertidos na sentença recorrida, não faltam elementos necessários para que fosse formulado um juízo de condenação diferente dos termos em que o foi feito.

8 - Assim, verifica-se que a sentença recorrida decidiu contra jurisprudência vária em sentido contrário.

9 - Ora, como se vai aqui descrever, os referidos eventos na Praça do Mar produzem uma poluição sonora absolutamente inaceitável, que infringe grosseiramente o Regulamento Geral do Ruído e que prejudica gravemente a saúde do requerente e de seu agregado familiar.

10 - Durante o Euro 2004, a Câmara Municipal de Loulé, montou um palco gigante com 30 altifalantes a 5 metros de distância das janelas das habitações/residências sitas na Praça do Mar e funcionaram durante um mês (duração do Euro) com licença especial de ruído.

11 - O horário que constava no referido alvará junto como documento nº 5 aos autos era das 20,00 às 24,00.

12 - Sendo certo que, durante o período estival, emitiam e emitem ruído desde aa 16.00 até às 02H00 horas.

13- O barulho/ruído produzido pelos eventos tinha e tem origem (sobretudo) na música que aí é tocada e nas vozes e movimentos das pessoas.

14 - Ora, o ruído e vibrações produzidos, durante a noite, é de uma intensidade fortíssima, sendo que, a intensidade e a frequência são tais que, durante toda a noite, as fracções dos requerentes são invadidas pelo barulho produzido, e pelas trepidações produzidas pelo som emitido pelas supra referidas colunas do palco.

15 - As consequências desta poluição sonora nas condições de descanso do recorrente e do seu agregado familiar são óbvias.

16 - O recorrente e os membros do respectivo agregado familiar sentem dificuldades em adormecer bem como qualquer ser humano quando existe ruído fora do normal! 17 - Em suma, com a sua poluição sonora, a recorrida desrespeita de forma grosseira os limites máximos legais e perturbam gravemente o repouso do recorrente e respectivos agregados familiares, facto este provado pela sentença recorrida! 18 - E, claro, se não forem decretadas as medidas requeridas, sofrerão durante as suas noites de férias e fins de semana, danos à sua personalidade impossíveis de reparar.

19 - O artigo 70° do Código Civil prescreve a protecção dos indivíduos contra qualquer ofensa ilícita, ou ameaça de ofensa, à sua personalidade física ou moral, permitindo ao ameaçado ou ofendido requerer, independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, as providências adequadas às circunstâncias do caso com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa j á cometida.

20 - Tutela-se, por esta via, direitos de personalidade essenciais, entendidos como direitos subjectivos absolutos cuja função é constituir o mínimo necessário e imprescindível ao conteúdo da personalidade e sem os quais os outros direitos subjectivos perderiam todo o interesse para o indivíduo 21 - Dentre os direitos de personalidade referem os autores, além de outros, os direitos à vida, à integridade física, à honra, à saúde, ao bom nome, à intimidade, à 22 - Vários estudos científicos demonstram, inequivocamente, que o ruído é um problema de saúde pública. Os seus efeitos mais frequentes traduzem-se em perturbações psicológicas ou fisiológicas associadas a reacções de stress e cansaço.

23 - A perturbação pelo ruído é uma das mais críticas, porque o silêncio faz- se necessário para o sono ocorrer na melhor qualidade, que garante as mais nobres funções, até há pouco tempo desconhecidas.

24 - Caso contrário, mesmo dormindo, o organismo começa a reagir gradualmente com o seu alerta, e o indivíduo tende a acordar.

25 - Evidentemente, não há quaisquer dúvidas de que o direito ao repouso e ao descanso, sobretudo no período noctumo, é manifestamente um direito de personalidade. Conforme se escreveu no Acórdão da Relação de Lisboa, de 27/0211997, «o local onde especialmente devem ser protegidos e reconhecidos tais direitos é precisamente no lar individual de cada um. O lar de cada um é o local de descanso, de repouso da extenuante jornada diária, onde se retemperam as forças necessárias desgastadas pela vivência no seio da comunidade».

26 - Acresce que, para o enquadramento...

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