Acórdão nº 00159/20.0BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Agosto de 2020
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 31 de Agosto de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O Ministério da Administração Interna, no âmbito de Providência Cautelar apresentada por L., Agente da PSP, não se conformando com a decisão proferida no TAF de Mirandela, vem Recorrer da mesma.
Pediu o Requerente a suspensão da eficácia dos seguintes despachos da Entidade Requerida: a) Despacho datado de 19 de março de 2020, que aplicou ao Requerente a medida preventiva de suspensão; b) Despacho datado de 19 de março de 2020, que aplicou ao Requerente a pena disciplinar de eliminação do curso.
Decidiu o Tribunal a quo deferir “a presente providência, por provados os respetivos pressupostos, e determino a suspensão dos atos da Entidade Requerida de 19.03.2020.” Formula o aqui Recorrente/MAI nas suas alegações de recurso, apresentadas em 16 de junho de 2020, as seguintes conclusões: “a) A douta sentença errou quando considerou preenchido o pressuposto do artigo 120.º, n.º 1, do CPTA “e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente”; e errou igualmente na avaliação da ponderação a que alude o n.º 2 do mesmo artigo; b) Errou o douto Tribunal ao julgar, como julgou, representando como provável a improcedência da exceção de inimpugnabilidade do ato; c) Tem natureza de recurso hierárquico necessário o recurso consagrado no artigo 225.º n.º 4 da LGTFP nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro que aprova o atual CPA; d) O facto de o legislador conceder uma margem de liberdade para afastar esse efeito suspensivo da decisão ao seu autor, em nome do interesse público, não se pode entender, como entendeu o Tribunal “a quo” que altera a natureza legal do recurso mas apenas o seu efeito.
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Não existindo ainda decisão final do procedimento – porque em tempo – por recurso para Sua Excelência o Ministro da Administração Interna, não se pode concluir estarmos perante um ato com eficácia externa, em termos que os efeitos que ele se destina a introduzir na ordem jurídica sejam suscetíveis de se projetar, designadamente na esfera jurídica, de modo a que haja utilidade na sua impugnação; f) Sendo o ato suspendendo inimpugnável, à luz do critério decisório contido do n.º 1 do artigo 120º do CPTA, contrário ao decidido, nenhuma utilidade há a assegurar, relativamente à ação principal, por a mesma estar votada ao fracasso, na medida em que nela nem sequer se chegará a apreciar o mérito da pretensão material do interessado, por verificação de exceção dilatória, obstativa do conhecimento do mérito.
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Errou, também, no julgamento, quando considerou no sentido da ilegalidade do ato da suspensão preventiva, previsto no artigo 23.º, do Regime Disciplinar Escolar dos Alunos do Curso de Formação de Agentes da PSP; h) As medidas cautelares que são adotadas em processo disciplinar distinguem-se das sanções disciplinares e com estas não se podem confundir; i) A aplicação da medida cautelar de suspensão preventiva visou em concreto, evitar que o aluno da PSP, pratique novos factos ilícitos, dado o legítimo e fundado receio, face aos factos indicados no procedimento disciplinar, que tal possa ocorrer, dada a preponderância para a violência e défice de autocontrolo emocional e social do Requerente; j) A suspensão preventiva do aluno determinada no âmbito do processo disciplinar, contrário ao decidido, foi uma medida cautelar preventiva, que se justifica em razões de ordem funcional, relativa à necessidade de defesa do prestígio do serviço da PSP; k) Conhecidos os factos e a proposta de aplicação da pena de eliminação, outra não podia ser a decisão do Exmo. Senhor Diretor da EPP/PSP, de suspender preventivamente o aluno até decisão final administrativa, na salvaguarda desses interesses; l) O juízo de prognose efetuado para aplicação da pena de eliminação do curso considerou que a conduta do Requerente, enquanto aluno atingia de tal forma o prestígio e a credibilidade da instituição de que pretende fazer parte que a sua não aplicação, não só iria contribuir para degradar a imagem de seriedade e de isenção dessa instituição, como também poderia ser considerada pela opinião pública como escandalosa ou indigna; m) A douta sentença erra igualmente quando julga pela insuficiência de um juízo quanto à falta de suficiência ou adequação das demais penas disciplinares, bem como da inviabilização da manutenção da relação funcional; n) Contrário ao decidido, a valoração da infração disciplinar, como inviabilizadoras da relação, assentou, não só na gravidade objetiva dos factos cometidos, mas ainda no reflexo dos seus efeitos no desenvolvimento da função exercida e a exercer e no reconhecimento, através da natureza do ato e das circunstâncias em que foi cometido, de que o seu autor revela uma personalidade inadequada ao exercício das funções Policiais.
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A douta sentença também errou na avaliação da ponderação a que se refere o artigo 120º, nº 2, do CPTA; p) Dada a gravidade dos factos imputados – ofensas no meio escolar –, saliente-se, de um aluno do curso de Agentes da PSP, e que conduziram ao processo disciplinar, considera-se que, devidamente ponderados os interesses em presença, os danos no prestígio, credibilidade e boa imagem pública da PSP, dos seus serviços e dos agentes ao seu serviço, que resultam da concessão da providência de suspensão da sanção disciplinar de eliminação do curso, com o regresso daquele ao fim do curso e posteriormente ao exercício de funções, são muito superiores aos que podem resultar da sua recusa, o que reclama e impõe, no caso concreto, a execução imediata daquela decisão.
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É inquestionável que, de acordo com o regime legal, a providência cautelar só pode ser atribuída no caso de se verificar o preenchimento cumulativo de todos os pressupostos previstos no artigo 120.º do CPTA (nºs. 1 e 2). Então, r) Perante a demonstração de que não se encontrava preenchido o pressuposto do artigo 120.º, n .º 1, do CPTA “e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente”, impunha-se a recusa da providência requerida.
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Errou, por isso, a douta sentença na decisão deste processo cautelar.
Termos em que, com o douto suprimento dos Venerandos Juízes Desembargadores, deve conceder-se provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogar-se a douta decisão recorrida em conformidade, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!” O aqui Recorrido/L.
veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 4 de julho de 2020, nas quais concluiu: “1. A sentença proferida pelo Tribunal a quo não merece qualquer reparo, tendo sido verificados os requisitos previstos nos números 1 e 2 do artigo 120.º do CPTA.
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Entende o Recorrido que no presente caso o levantamento do efeito suspensivo ao recurso hierárquico, nos termos do artigo 225.º n.º 4 da LGTFP, retira a possível natureza necessária ao recurso hierárquico.
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A previsão imperativa do n.º 3 e n.º 4 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015, garante uma relevante importância para a efetividade da tutela jurisdicional dos interessados. Caso assim não fosse, questionar-se-ia a constitucionalidade da imposição da utilização de impugnações administrativas como pressuposto processual atípico.
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E, também, a aplicação da Lei levaria a uma restrição do direito de acesso à justiça enquanto direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias.
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Como defende a doutrina dominante, o regime do n.º 3 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015, prevalece, como resulta do seu teor literal, sobre toda a legislação especial existente à data da entrada em vigor que preveja solução diferente, designadamente aquela que confira ao Recorrente o poder de afastar o efeito suspensivo da impugnação administrativa por considerar que a não execução imediata do ato causaria grave prejuízo ao interesse público.
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Neste sentido, entre outros, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo 1033/15.8BEPRT, de 01.03.2019.
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Sob pena de violação do direito a uma tutela jurisdicional efetiva, nos termos do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, considera-se inadmissível que o Recorrido possa ficar impedido de reagir judicialmente contra um ato da Administração que produza integralmente os seus efeitos durante todo o período de análise do respetivo recurso hierárquico.
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Quanto ao ato que aplicou a suspensão preventiva, dir-se-á que o mesmo é ilegal, tendo em conta a sua natureza cautelar e temporária e que vigorará apenas durante o decorrer do procedimento disciplinar até à prolação da decisão que aplica a pena disciplinar.
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Esta medida preventiva é instrumental, porque, está funcionalizada à eficácia da investigação ou à integridade da função num quadro de exercício da ação disciplinar.
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Tal extemporaneidade da medida transgride o perímetro legítimo da suspensão e da proporcionalidade exigível relativamente à finalidade que persegue ou à função objetiva que cumpre.
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No caso dos presentes autos a medida de suspensão preventiva foi proferida e notificada no mesmo dia da decisão final. Tendo esta nomeadamente começado a produzir os seus efeitos após a respetiva notificação ao Recorrido.
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Ou seja, o Recorrido foi notificado no mesmo dia dos dois atos e no dia imediatamente a seguir ficou impedido de assistir às aulas não presenciais (devido à pandemia COVID-19), deixou de ter acesso ao email, aos conteúdos formativos e ficou impedido de realizar testes e outros elementos avaliativos.
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Nos termos em que foi aplicada, deixa de ser uma medida cautelar para se converter numa sanção autónoma e atípica, imposta sem procedimento dirigida à mesma, com infração notória do princípio da legalidade que rege o ius puniendi.
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O que gerará nulidade por preterição total de procedimento legalmente exigido.
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No que se refere ao ato que aplicou a pena disciplinar de eliminação do curso, também o mesmo padece de várias ilegalidades, nomeadamente no que...
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