Acórdão nº 1930/19.1BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução21 de Julho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO S……………….

, nacional da República Democrática do Congo, devidamente identificada nos autos de ação administrativa urgente instaurada contra o Ministério da Administração Interna – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 19/11/2019, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou a ação improcedente, absolvendo a Entidade Demandada do pedido de impugnação da decisão que recusou o pedido de asilo e de proteção subsidiária, por o pedido ser infundado, devendo ser proferida nova decisão, nos termos do artigo 7.º da Lei n.º 27/2008, de 30/06, de proteção subsidiária e, em consequência, a autorização de residência por razões humanitárias, realizando as diligências probatórias que entender necessárias.

* Formula a Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “I. O presente recurso jurisdicional vem interposto da douta sentença que decidiu julgar improcedente a acção administrativa para impugnação da decisão proferida, pela Excelentíssima Senhora Directora Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, datada de 27/09/2019, que não admitiu o pedido de protecção internacional formulado pela aí Requerente, ora Recorrente, por o considerar infundado, absolvendo assim a Entidade Demandada - Ministério da Administração Interna - do pedido.

  1. A sentença veio então concluir que: “As declarações da requerente não se mostram credíveis porquanto o seu relato é completamente genérico, sem qualquer pormenor que permita criar a convicção de que viver efectivamente algum tipo de perseguição ou ameaça.

    Além do que as suas declarações são contraditórias relativamente à criança que a acompanha. Primeiro disse ser sua mãe e, mais tarde, veio dizer ser sua avó.

    Todavia, da matéria de facto provada resulta que a criança não tem qualquer parentesco com a requerente, o que é bem demonstrativo da sua falta de credibilidade.

    Acresce que, já no aeroporto de Lisboa, apenas pediu asilo depois de lhe ter sido recusada a entrada em território nacional (por não ter documentos válidos).

    A requerente ao não solicitar imediatamente asilo em Portugal revelou uma postura que não é própria de quem necessita de protecção internacional.

    Da análise das declarações da requerente resulta um quadro de alguém que sai do seu país motivado por razões económicas.

    O que denota que a requerente tenha apresentado pedido de protecção internacional com o propósito de tentar obter melhores condições de vida.

    Não se verificam, pelos motivos expostos, a violação do princípio do “non refoulement” consagrado no artigo 33º, nº 1, da Convenção de Genebra de 1951, conjugado com os preceitos do artigo 3º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.

    Trata-se, portanto, de um pedido de protecção internacional inadmissível por infundado (cfr. artigo 19º, nº 1, alínea e), da Lei nº 27/2008).

    ” III. Para a decisão de dar como provados os factos aí constantes, serviram os elementos expressamente indicados em cada um dos pontos do probatório, ou seja, e basilarmente, o Processo Administrativo apenso aos autos.

  2. O Tribunal a quo considerou então essencial, na sua fundamentação e para formular posteriormente a decisão: - Que a ora Recorrente alega ter deixado o seu país de origem por causa de um evento relacionado com o seu marido que trabalhava nas finanças, de onde terá desaparecido dinheiro. Na sequência do qual um grupo de militares vestidos à civil terá levado o seu marido e voltado à sua casa à procura do dinheiro. Pensa que o marido foi morto e tem medo que a matem também.

    - Que, sendo certo, que a natureza pública dos direitos invocados e a feição universalista que assumem, centrada na pessoa humana, podem permitir que nos processos em que está em causa o direito de asilo, se mitigue o ónus probatório que recai sobre o requerente do asilo, atendendo às especiais condições e circunstâncias em que os pedidos são formulados. A razão de ser do princípio da mitigação do ónus probatório reside no facto de, em grande parte dos casos, dificilmente ser possível a um refugiado provar todos os factos relativos ao seu caso.

    - Que as declarações da Recorrente não se mostram credíveis porquanto o seu relato é completamente genérico, sem qualquer pormenor que permita criar a convicção de que viver efectivamente algum tipo de perseguição ou ameaça.

    - Que as declarações da Recorrente são contraditórias relativamente à criança que a acompanha. Primeiro, por ter dito que era mãe da criança e, mais tarde, disse ser sua avó. Porém, da matéria de facto provada resulta que a criança não tem qualquer parentesco com a requerente, o que será demonstrativo da sua falta de credibilidade.

    - Que, a Recorrente apenas no aeroporto de Lisboa, pediu asilo depois de lhe ter sido recusada a entrada em território nacional.

  3. Mas, o douto Tribunal recorrido, ao manter e confirmar na íntegra a decisão do Director Nacional Adjunto do SEF, devidamente impugnada, cometeu erro de julgamento violando preceitos legais com os quais se deveria conformar, nomeadamente o disposto nos Artigos 2.º, n.º 1, al. n), iii) e al. v), 3.º, 5.º, 6.º e 7.º da Lei n.º 27/2008 de 30.06, os artigos 33.º da Convenção de Genebra e 14.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, e o n.º 2 do artigo n.º 8 da Constituição da República portuguesa.

  4. O Recorrente declarou desde logo e peremptoriamente que tinha fugido da RDC, por causa do seu marido. Porquanto, o seu falecido marido, na altura do antigo Senhor Presidente Kabila, e antes das eleições, renunciou ao seu trabalho, que era nas finanças, por ter havido o desaparecimento de dinheiro daquele serviço, e ele não queria vir a ser relacionado com o referido desaparecimento e então, decidiu não trabalhar mais naquele serviço.

  5. Foi ainda peremptória ao afirmar que caso regressasse ao seu país, seria morta pelas mesmas pessoas que mataram o seu marido.

  6. O SEF, veio também dizer que as declarações do requerente, nos pontos fulcrais para a apreciação dos seus fundamentos e nos quais baseia o seu pedido, o seu relato foi apresentado de forma subjectiva, realizado sem qualquer detalhe, e, sobretudo, sem qualquer coerência, face aos factos que apresenta como fundamento do pedido de protecção internacional e para concluir tal estriba-se fundamentalmente em que a requerente, ora Recorrente, referiu ter saído de Kinshasa a conselho de amigos do seu falecido marido, pois o grupo que matou o seu marido iriam regressar para a matar.

  7. Pois assentando nestes factos, que dizem indubitavelmente respeito à pessoa da então requerente, avaliando-os pelos padrões de um homem médio e não em termos meramente subjectivos, foi errónea a conclusão, já que sob aqueles padrões normais, não podia ter-se considerado estranho, e, mormente, apto então a condicionar a decisão, que alguém que, acompanhado do seu neto, menor, inusitadamente, tome conhecimento de uma situação gravíssima, como saber que é perseguido até à morte por algo que desconhece, procure rumar até a um local, também seguro, e aí recomeçar uma vida nova longe do terror, temor que é o medo de perder a vida do...

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