Acórdão nº 766/19.4BELSB-A de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução21 de Julho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO A Caixa de Previdência do Ministério da Educação, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 13/02/2020, que no âmbito do processo cautelar não especificado para restituição de coisa certa, movido contra a C……, Lda.

, apresentado como incidente a processar por apenso à reconvenção deduzida na ação administrativa, indeferiu a adoção da providência cautelar, de entrega do imóvel pela Requerida à Requerente, livre de pessoas e bens, absolvendo a Requerida do pedido.

* Formula a aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “- Da alegada violação dos princípios da instrumentalidade e da provisoriedade: a) Mal andou o Tribunal recorrido ao decidir que os requisitos da “instrumentalidade” e da “provisoriedade” da providência cautelar requerida não se encontram preenchidos.

b) O Tribunal recorrido não levou em devida linha de conta que o deferimento da providência cautelar, com a consequente entrega do imóvel à ora Recorrente, manterá intacto o direito/crédito peticionado pela Recorrida, que é o verdadeiro pedido.

c) A ser decretada, a providência não antecipará qualquer decisão sobre se os valores das facturas são, ou não, devidos pela Recorrente.

d) Foi em função do pedido reconvencional, formulado na acção principal, que a Recorrente propôs a providência cautelar, pelo que seria somente quanto ao mesmo que o preenchimento dos mencionados requisitos da providência cautelar teria que ser apreciado, o que não aconteceu.

e) E, também quanto à reconvenção o deferimento da providência cautelar não anteciparia qualquer decisão, porquanto esta apenas visa “estancar” os prejuízos da Recorrente, fazendo cessar os prejuízos vincendos, nos termos em que foram peticionados e objecto de correcção pela Ré, aqui Recorrente, a qual foi totalmente desconsiderada pela sentença recorrida, conforme resulta da respectiva fundamentação.

f) A providência requerida visando conter, em valores, os prejuízos passiveis de ser ressarcidos pelo património da ora Recorrida, verifica-se uma clara conformação entre a reconvenção e a providência cautelar requerida.

g) E nem se diga que para o deferimento da providência teria que se verificar uma correspondência entre o pedido cautelar e o pedido reconvencional.

h) Muito embora a entrega do imóvel não conste do pedido reconvencional da acção principal, resulta da contestação ao direito de retenção, que foi dada por reproduzida no pedido reconvencional.

i) A entrega do imóvel à Recorrente é um desfecho inevitável da acção de que depende a providência cautelar requerida, independentemente até do desfecho da mesma, pois que a Recorrente, em caso de eventual condenação transitada em julgado para pagamento das facturas, procederá ao pagamento e recuperará o imóvel.

j) Já na situação inversa, isto é, caso a decisão transitada em julgada declare a ilicitude do direito retenção, a restituição do imóvel acontecerá também, seja voluntária ou coercivamente; o que acontece é que, neste último cenário o património da Recorrida poderá não ser suficiente para pagar os prejuízos à Recorrente, dado o seu elevado montante crescendo.

k) Situação essa, em relação à qual a sentença recorrida fez tábua rasa, pois nem sequer permitiu a produção de prova em audiência sobre tal circunstância.

l) Vem sendo doutrinal e jurisprudencialmente pacífico e assente que entre a providência cautelar e a acção principal não tem que existir uma identidade entre os pedidos formulados, (cfr. entre outros, acórdão proferido no processo n.º 00104/15.5BECBR, disponível em www.dgsi.pt, sublinhado nosso).

m) Entre o procedimento cautelar e a ação principal não tem de existir coincidência de pedidos, mas tão-só quanto às partes e à causa de pedir.

n) No caso dos autos, a identidade das partes na reconvenção e no procedimento cautelar é manifesta, assim como é manifesta a identidade entre as causas de pedir, que são os prejuízos que a ora Recorrente sofreu, e continua a sofrer, de mês para mês com a retenção ilícita do imóvel pela Recorrida e a não conclusão da empreitada.

o) A entrega do imóvel justifica-se para salvaguardar o efeito útil do pedido reconvencional, isto porque a delonga própria da acção principal faz crescer mensalmente, em quantia significativa, o prejuízo da Recorrente que facilmente poderá atingir, como já atingiu, valores que a aqui Recorrida não possa, nem consiga ressarcir.

p) A Recorrente, mesmo obtendo provimento no seu pedido reconvencional, a lesão que lhe é causada é grave e dificilmente reparável considerando os montantes em causa, os quais a Recorrente calculou para dois anos de pendência, como alegado nos autos, mas que a Recorrida vaticina de cinco anos.

q) A confirmar-se o cenário, os prejuízos da Recorrente serão muito superiores a € 1.000.000,00 (um milhão de euros), quando a decisão transitar em julgado, e o património da Recorrida certamente insuficiente para o liquidar como se verifica facilmente das contas da mesma, juntas aos autos.

r) A providência cautelar é a que for adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado e a acautelar a irreparabilidade do dano, sendo um dos critérios de decisão “os prejuízos de difícil reparação” – n.º 1, do artigo 120º do CPTA.

s) A restituição do imóvel à Recorrente fará cessar o crescente prejuízo, até montantes impossíveis agora de calcular, t) É a providência adequada a garantir a efectividade do direito da Recorrente, consubstanciado no pedido de indemnização levado a cabo na reconvenção que se poderá conter, por agora, em montantes que possam ser ressarcidos pelo património da Recorrida, u) Prejuízos esses que facilmente, face à demora inevitável do processo, com os recursos possíveis para Tribunais superiores, irá atingir valores que o património da Recorrida não conseguirá ressarcir.

v) Não se justifica, por manifesta desproporcionalidade, a Recorrente ficar privada do imóvel que é seu, quando o prejuízo da retenção é muito superior ao alegado benefício da Recorrida, que são o valor das facturas peticionadas, cujo pagamento não está posto em causa, nem comprometido, com a delonga da acção, como foi demonstrado nos autos, face à capacidade financeira da Recorrente, que além do mais é uma entidade pública.

w) Se o efeito útil de uma decisão favorável à Recorrida está assegurado, face a um alegado crédito, apurado em valor definitivo, o mesmo não se pode dizer, caso a decisão seja favorável à Recorrente, situação que não foi considerada pela sentença recorrida, verificando-se uma manifesta violação, entre outros, do princípio da proporcionalidade enquanto critério de decisão expressamente previsto no artigo 120º, n.º 2 do CPTA.

x) Só a entrega do imóvel, e nenhuma outra situação, se mostra capaz de assegurar esse efeito útil, pois faz conter o prejuízo da Recorrente, impossível de calcular de outra forma, como referido nos autos.

y) O efeito útil da sentença não se resume à condenação da Requerida no pagamento de uma quantia, sendo por demais evidente que o montante da quantia é o facto mais relevante para esse efeito útil.

z) De nada servirá à aqui Recorrente uma sentença que condene a Recorrida numa quantia que esta seja e esteja objectivamente incapaz de liquidar, sendo que não há outra forma de fazer cessar o avolumar dos prejuízos da requerente, até montantes agora incalculáveis, que não seja com a entrega e posse do imóvel.

aa) A sentença recorrida fez uma incorreta apreciação dos requisitos da providência cautelar, assim como fez um errado enquadramento da situação de facto que está na origem dos presentes autos, o que viciou o seu resultado final, concluindo, erradamente, pelo não preenchimento dos requisitos da instrumentalidade e da provisoriedade da providência.

bb) Ao decidir como decidiu, a sentença recorrida violou, entre outros, os artigos 112º, n.º 1, 120º, n.ºs 1, 2, 3 e 4 do CPTA.

– Da alegada antecipação da decisão da causa principal: cc) A sentença recorrida merece igualmente um objectivo juízo de censura ao considerar que a providência cautelar requerida constituiria uma antecipação da decisão da causa principal, “no sentido de definitivamente anular o objecto da causa”.

dd) A sentença recorrida olvida que mesmo que o direito de retenção venha a ser declarado lícito tem sempre o efeito útil para o período em que foi exercido, o qual não seria prejudicado pela decisão de entrega do imóvel em sede da presente providência.

ee) O Tribunal recorrido não teve em conta que o que está verdadeiramente peticionado na acção principal pela Requerida, aqui Recorrida, é o pagamento de facturas.

ff) Na acção principal a Recorrida não pede a retenção do imóvel, mas apenas que seja reconhecida que a retenção é legítima, como forma de garantir o seu eventual crédito.

gg) A própria sentença recorrida faz referência ao alegado direito de retenção como um direito real de garantia, nada mais, o que é perfeitamente compreensível, porquanto o direito retenção alegado não é, verdadeiramente, o pedido da Recorrida, o qual apenas serve para garantia do alegado crédito, este sim o verdadeiro pedido.

hh) O decretar da providência cautelar requerida não anteciparia a decisão da causa principal, a qual prosseguiria a sua normal tramitação para apreciar se os valores peticionados pela Recorrida são ou não devidos e, por seu turno, se os valores peticionados pela ora Recorrente, na reconvenção, são ou não devidos.

ii) Pedidos esses cuja apreciação na acção principal respectiva em nada seria beliscada, ou prejudicada com o deferimento da providência cautelar, cuja apreciação autónoma mostra-se perfeitamente possível e legalmente admissível.

jj) Sendo que, mesmo que assim não fosse, o que não se admite mas ora se equaciona por mera hipótese de raciocínio, verifica-se que a lei...

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