Acórdão nº 893/10.3BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução09 de Julho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I- Relatório C..............., LDA., melhor identificada nos autos, veio intentar impugnação judicial contra as correções oficiosas efetuadas por Métodos Indiretos à matéria tributável de IRC, do exercício de 2005, no valor de € 98.607,17, que deram origem à Demonstração de Acerto de Contas n.°…………, no montante de € 25.336,82.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por sentença proferida a fls. 216 e ss., (numeração do SITAF), datada de 15 de Novembro de 2019, julgou a presente impugnação procedente, determinando a anulação dos atos de liquidação n.°s ……… (IRC) e ………… (juros compensatórios).

Desta sentença foi interposto recurso, conforme requerimento de fls. 236 e ss., (numeração do SITAF).

Inconformada a Fazenda Pública, alegou nos termos seguintes: «I - Com a ressalva da devida vénia, entende esta RFP que a douta Sentença a quo fez uma errada apreciação dos factos controvertidos e sujeitos a análise o que consequentemente conduziu a erro de julgamento, quer da matéria de fato, quer de direito.

II - Estando em causa a legalidade da consideração de custos fiscais contabilizados e declarados pelo sujeito passivo, a Administração Tributária atuou no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, tendo em conta a factualidade individualmente considerada e valorada, demonstrando a existência de indícios sérios e credíveis de que as faturas que suportam tais custos, não consubstanciaram serviços efetivamente prestados.

III - Legitimada a actuação da Administração Fiscal, o esforço probatório competiria ao sujeito passivo, no intuito de primeiramente afastar os indícios recolhidos pela Administração Tributária e que recaem sobre a simulação das operações, e por outro lado demonstrar a efectividade da prestação de serviços, o que, contrariamente ao doutamente prolatado, não foi alcançado pela Impugnante.

IV - Com efeito, o fato de as sociedades alegadamente emitentes das faturas – M…………, Lda; A………………., Lda e F……………………. Unipessoal, - não apresentarem uma adequada estrutura empresarial que lhes permitisse prestar os serviços em causa, não podia por si só ser desvalorizado pela douta sentença a quo, porquanto tal indício devia ter sido objeto de análise conjunta com os restantes fatos índice evidenciados pelos serviços inspetivos no respetivo relatório.

V - Desde logo, não se concebe como pode dar-se como provada a materialidade dos serviços alegadamente prestados à Impugnante por aquelas sociedades, quando esta nem sequer logrou demonstrar a necessária correlação entre o circuito económico do dinheiro e os documentos traduzidos nas faturas e nos contratos com aquelas celebrados.

VI - E nem poderia sê-lo, tendo presente, como revela o probatório, que a maioria dos alegados pagamentos foi efetuada em numerário; uma pequena parte mediante cheques posteriormente endossados e transferências bancárias, sendo que, neste último caso, nem em todos os casos foi possível através dos respetivos documentos identificar os destinatários de tais transferências, como o reconheceu a douta Sentença a quo.

VII - E este circunstancialismo verificou-se quando a Impugnante bem sabia das obrigações legais a que estava adstrita por força do disposto no art.° 63° C da LGT, isto é, de os meios de pagamento utilizados permitirem a identificação do respetivo destinatário e de os pagamentos e recebimentos se mostrarem refletidos numa conta bancária, optando antes pelo incumprimento deste preceito, de acordo com o qual o pagamento de quantias avultadas deixou de poder ser feito em numerário, precisamente, também, para garantir a veracidade dos registos contabilísticos.

VIII - Sendo que no caso dos pagamentos efetuados por cheque, para além de não permitirem a identificação dos destinatários dos pagamentos, nos casos dos cheques emitidos em nome da sociedade A………….., Lda, e da sociedade M…………., Lda, verificou-se que as assinaturas dos respetivos sócios-gerentes que constam do verso dos cheques objeto de endosso não coincidem com as assinaturas de outros documentos que constam dos autos, mormente com a declaração daquela primeira sociedade junta aos autos (fls. 82 do PAT) ou com a que consta do contrato celebrado pelo gerente B……… em nome da segunda (fls. 134 do procedimento inspetivo).

IX - Deveria também concorrer para a assunção de um juízo de falta de materialidade das operações em causa, o fato de os extratos de conta das entidades prestadoras (cfr. fls. 157 do procedimento inspetivo) apresentarem saldos credores muito elevados, chegando a ser equivalentes aos montantes dos fornecimentos e prestações, o que denota que os serviços e fornecimentos não foram pagos, daqui decorrendo outro indicio forte de que tais operações também não tiveram lugar.

X- Considerou-se ainda na douta Sentença a quo como fato demonstrativo da efetividade dos serviços prestados pela sociedade A……………., Unipessoal, a circunstância de a Impugnante ter demandado judicialmente esta última, mediante Ação Declarativa por Incumprimento e Pagamento de uma Indemnização.

XI- Dissente a RFP desta asserção porquanto, quer no caso dos alegados serviços prestados por esta sociedade, quer nos alegadamente prestados pelas restantes duas, a efetividade das operações apenas seria demonstrável mediante a exibição de folhas de presença em obra; autos de medição e de progresso; folhas de obra; guias de transporte; troca de correspondência e meios de pagamento pelos quais se perceba o circuito financeiro subjacente às faturas, o que não foi feito.

XII- Assim, fazendo apelo à jurisprudência expressa no Acórdão TCAS de 25/05/2017 (processo n° 08666/15) estamos nos presentes autos perante uma situação em que não é possível estabelecer uma exata correspondência entre as faturas e os meios de pagamento, em virtude de estes se terem efetuado primacialmente por numerário e cheques posteriormente endossados a terceiros, tornando impossível estabelecer uma linha segura do circuito do dinheiro e estabelecer a convergência com o circuito documental.

XIII- Sendo certo que por via das faturas que visam justificar os custos incorridos, também não se alcança a materialidade das operações em causa, visto que nem sequer cumprem os requisitos previstos no previstos no n° 5 do art.° 36° do CIVA, porquanto: contêm descrições genéricas, não referindo concretamente o tipo de trabalho efetuado e reconduzindo-se a expressões genéricas como: “Execução de trabalho em vossa obra, conforme contrato”. Sendo que também não fazem referência aos materiais utlizados, nem ao respetivo valor unitário; não indicam as datas em que foram prestados os alegados serviços e não contêm o número de horas faturadas, nem o valor/hora e não fazem referência a qualquer mapa de pessoal.

XIV- Face ao exposto, salvo o devido respeito, entende esta RFP que a douta Sentença recorrida ao julgar proceder a presente impugnação judicial, enfermou de erro de apreciação da prova, de erro de interpretação de lei e viola o disposto, entre outros, nos art°s 17°; 23°; 52°, 87 e 88a do CIRC e os art.°s 74° e 75° da LGT, pelo que não se pode manter na ordem jurídica.» X Em sede de contra-alegações, a C..............., LDA expendeu o seguinte: «1) A decisão objecto do presente recurso mostra-se totalmente acertada e justa, conforme o direito, pelo que não merece ser revogada.

2) De facto, no que toca à matéria factual assente, que aqui se dá por inteiramente reproduzida para todos os efeitos legais (pontos 1 a 50 da fundamentação de facto da sentença), salienta-se que o Tribunal «a quo» andou bem quanto à sua apreciação e julgamento.

3) Pois, conforme decorre do teor da aludida sentença, resultou provada, grosso modo, através de prova documental.

4) Isto é, por causa de diversa prova documental apresentada pela ora recorrida (contratos, facturas, fotografias, meios de pagamento, etc.), a qual, diga-se, não foi posta em causa na sua grande totalidade pela recorrente.

5) Assim, partindo destes pressupostos factuais, conclui-se que, para além da recorrente ter desvalorizado em sede e momento oportunos toda a prova que lhe foi apresentada, a mesma limitou-se a levantar suspeitas, aliás, totalmente ligeiras, vagas, conclusivas e infundadas, que de modo algum podem sustentar a aplicação de métodos indirectos.

6) Ao ponto de tal fundamentação, salvo o devido respeito, se revelar absurda e caricata, quando, por exemplo, invoca a ausência de estrutura por parte das empreiteiras e o facto de se desconhece a identidade dos executantes dos serviços.

7) Portanto, em bom rigor, defende-se o arrazoado pelo Tribunal «a quo» no que toca à circunstância da recorrente não ter logrado concretizar o disposto nos artigos 87° n° 1 alínea b) e 88° da LGT.

8) Sendo certo que, para além disso, se mantém a presunção legal prevista no artigo 75° deste diploma legal.

9) Deste modo, se pugna pela integral manutenção da decisão aqui em sindicância.

Nestes termos e nos mais de direito, deverá ser julgado totalmente improcedente o presente recurso, com as legais consequências».

X O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, foi regularmente notificado.

X Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

X II- Fundamentação.

A sentença recorrida assentou na seguinte fundamentação fáctica e jurídica: «1. A Impugnante é uma sociedade comercial que tem por objeto ”Outras atividades de consultoria para os negócios e a gestão”, a que corresponde o CAE 70220, encontrando-se enquadrada, no ano de 2005, no Regime Normal Mensal em sede de IVA e no Regime Geral de Tributação em sede de IRC - cfr. fls. 471 a 473 do PAT apenso aos autos; 2. Em 01.01.2005, foi subscrito pela ora Impugnante (primeira outorgante) e a sociedade A………………. Lda. (segunda Outorgante), instrumento designado “contrato”, em que a segunda outorgante se obriga a prestar à primeira serviços profissionais de consultoria, bem como os restantes serviços necessários à boa e atempada pré-produção e pós-produção dos programas com os...

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