Acórdão nº 237/16.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelSOFIA DAVID
Data da Resolução02 de Julho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO O Instituto dos Registos e Notariado (IRN) vem apresentar recurso da sentença do TAC de Lisboa, que julgou procedente a acção interposta por E................... e condenou o IRN a deferir o pedido de concessão de nacionalidade portuguesa, por naturalização, formulado por aquele.

Inconformado com a decisão a Recorrente, o IRN, apresentou as suas alegações, onde formulou as seguintes conclusões: “I - A legalidade dos atos administrativos deve ser apreciada por referência ao quadro legal e factual em vigor à data da sua prática, devendo o preenchimento dos requisitos legais ser aferido à data da decisão do pedido e nem na data da entrada do pedido, ou na da sua decisão o pressuposto existia.

II – Como princípio a Lei não é retroativa, mas o legislador pode, a título excecional, elaborar e publicar leis retroativas, se o entender necessário, salvo em três matérias sensíveis em relação às quais a Constituição da Republica Portuguesa (CRP) proíbe explicitamente a retroatividade das leis: “restrição de direitos, liberdades e garantias” (artigo 18.º, n.º 2); “criação de novos tipos de crimes, ou de medidas de segurança, e agravamento de penas ou medidas de segurança pré-existentes” (artigo 29º); “criação ou agravamento de impostos” (artigo 103.º, nº 3); III – Quando o legislador ordinário, fora das três áreas constitucionalmente proibidas, fizer alguma lei a que decida conferir eficácia retroativa, ou efeito retroativo e, se os termos e modalidades dessa retroactividade não forem por ele clara e detalhadamente estabelecidos, o Código Civil (CC), nos seus artigos 12º e 13º regula supletivamente a matéria, ou seja, IV – A lei só dispõe para o futuro e ainda que lhe seja atribuída eficácia retroativa, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular e quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos – (artigo 12º, nº 1 CC); V - A chamada lei interpretativa é lei nova e, como tal, só se aplica aos casos não decididos, sob o pálio da lei interpretada, pelo que o princípio da irretroatividade das leis, enquanto opção do poder constituinte, em sistemas como o nosso, inibe a eficácia retro operante atribuída à chamada interpretação autêntica do legislador ordinário – (artigo 13º do CC) VI. A sentença recorrida, sanciona uma flagrante violação dos princípios constitucionais da universalidade, da segurança e da igualdade (artigos 2º e 13º da CRP); VII. A Conservatória dos Registos Centrais, ao indeferir no tempo, o pedido de naturalização do ora recorrido, interpretou corretamente a alínea d) do n.º 1 do art.º 6º da LN, pois era a medida abstrata da pena, segundo a lei portuguesa, como pressuposto fundamental para determinar quem podia ou não adquirir a nacionalidade portuguesa, sendo desde logo, um elemento perfeitamente objetivo e encontra pleno acolhimento quer na letra quer no espírito da lei que vigorava ao tempo e por isso não foi declarada inconstitucional e o requerente, agora autor, não se encontrava reabilitado, nem legal, nem judicialmente; VIII - Não se vislumbrou, por essa razão, qualquer vício de violação de lei que afetasse a validade da decisão impugnada, também, porque na data da DECISÃO ADIMINISTRATIVA, continuava a constar o crime e a pena, pelo qual foi condenado no certificado do registo criminal, probatório na qualificação.

Devendo, IX. - Ser revogada a douta sentença recorrida; e, XI - Integralmente mantida a decisão que indeferiu a naturalização requerida.” O Recorrido não contra-alegou.

II – FUNDAMENTAÇÃO II.1 – OS FACTOS Na 1.ª instância foram fixados os seguintes factos, que se mantém: A) – O Autor, E..................., nasceu na República Democrática de São Tomé e Príncipe, no dia 28.05.1979, e é filho de J................... e de J.................... – Cfr. fls. 17-18 do suporte electrónico dos autos e fls. 6-7 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; B) – O Autor reside legalmente em Portugal, desde 25.08.2008. – Cfr. fls. 50 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; C) – Em 10.05.2013, foi proferida sentença, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Almada, no processo sumário n.º 287/13.9GEALM, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte: “I-Relatório: Em processo sumário, o Ministério Público requereu o julgamento de: E..................., solteiro, motorista, nascido em 28.05,1979, filho de J................... e de J..................., natural de Conceição, São Tomé, Santomense, residente na Rua………., n.º ….., 2.º Esq., Amora, Pela prática, como autor material, na prática um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p.p. pelos artigos 69.º, n.º 1, al. a) e 291.º n.º 1 al. b) do Código Penal, por referência aos artigo 93.º, n.º 1, 145.º, n.º 1, al. f), i) do Código da Estrada, nos termos e pelos factos constantes da acusação de fls. 21 e ss. dos autos e cujo conteúdo aqui se dá por inteiramente reproduzido para todos os eleitos legais.

(…) Mostram-se assim preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do crime em discussão, por referência aos artigos 93.°, n.º 1, 145.º, n.º 1, alíneas f) e i) do Código da Estrada.

IV - Determinação da medida concreta da pena: Aqui chegados, urge proceder à determinação da medida concreta da pena a aplicar ao arguido pela prática dos crimes assinalados.

Já foi referido supra, em sede de enquadramento jurídico-penal, a moldura penal abstracta do crime em apreço.

Assim, atendendo aos critérios do art. 70.º conjugado com o art. 40.º, ambos do C.P. considera-se que, in casu, se deve dar preferência à pena de multa por a mesma se mostrar suficiente e adequada à realização das finalidades da punição.

Nesta medida, e atendendo agora ao preceituado no art. 71.º, n.º 1 ex vi do art. 47.º, n.º 1 do CP, diremos que a determinação da medida da pena deverá fazer-se em função da culpa do agente e das exigências de prevenção atendendo a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de legal de crime, deponham a favor ou contra o agente.

Assim há que ponderar o conjunto de circunstâncias internas e externas relacionadas com os acontecimentos, nomeadamente a motivação da conduta típica do arguido, o modo de execução e o meio de actuação do mesmo - colocando em perigo diversos bens jurídicos - que revela uma perigosidade na medida em que demonstra uma certa indiferença para o resultado da sua conduta.

A natureza de tal ilícito reveste-se de particular gravidade, atendendo à alta sinistralidade rodoviária que afecta o país, revestindo-se como tal de especial relevância as finalidades da prevenção geral em relação a tais tipos de crimes muitas vezes geradores de acidentes de viação (neste caso com quase um embate e um atropelamento).

O arguido agiu com dolo directo, pois apesar de ter consciência de não estar legalmente habilitado, voluntária e conscientemente, tomou a direcção e conduziu o veículo em causa.

Aplicando agora os princípios sumariamente expostos ao caso em apreço, salienta-se que: - a gravidade objectiva dos factos decorre, primeiramente, do valor do bem jurídico, a segurança rodoviária, cujas circunstâncias apuradas poderiam ter consequências muito graves, face à distância percorrida, a condução verificada - não existem antecedentes criminais - o arguido mostra-se inserido em sociedade Entende-se que, no caso em apreço e relativamente ao crime praticado pelo arguido, verificados os condicionalismos dos factos e as suas consequências, que foram de gravidade acentuada, ainda assim, se afigura adequado e suficiente a aplicação de uma pena de multa, mas junta aos seu patamares médios.

Assim, para o crime de condução perigosa, a pena de 180 (cento e oitenta) dias.

Afigura-se-nos ainda, atenta a situação económica do arguido, que se conseguiu apurar, aplicar a razão diária de € 6,00 (tendo em conta a alteração ao art.º 47.º n.º 2 do Código Penal introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro), o que perfaz o montante de €1.080,00 (mil e oitenta euros), ou na pena de prisão subsidiária de 120 (cento e vinte) dias.

O arguido deverá ser igualmente condenado na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados nos termos do art.º 69.º n.º 1, alínea a) do Código Penal. Atentas as razões anteriormente referidas para a aplicação da pena de multa, julgo adequado aplicar a proibição de conduzir pelo período de 6 (seis) meses.

(…) V - Dispositivo: Pelo exposto, julgando procedente por provada a acusação, e em consequência: • Condeno o arguido, pela prática de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário p. e p. pelo art.º 291 nº 1 alínea b) do Código Penal, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à razão diária de € 6,00, o que perfaz o montante de € 1.080,00 (mil c oitenta euros), ou na pena de prisão subsidiária de 120 (cento c vinte) dias.

• Mais vai o arguido condenado nos termos do art.º 69.º n.º 1 alínea a) do Código Penal na inibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 (seis) meses.” – Cfr. fls. 54-63 do suporte electrónico dos autos; D) – Em 12.11.2014, foi recebido, na Conservatória de Registos Centrais, o requerimento, subscrito por mandatária constituída pelo Autor, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte: «IMAGENS NO ORIGINAL» E) – Com o requerimento identificado na alínea anterior foram recebidos, os documentos constantes a fls. 6 a 14 do Processo Administrativo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

F) – Em 17.02.2015, foi emitido, pela Direcção-Geral da Administração da Justiça, o certificado de registo criminal de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte: «IMAGEM NO ORIGINAL» G) – Em 02.06.2015, foi emitido, na Conservatória dos Registos Centrais, o instrumento intitulado...

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