Acórdão nº 00197/18.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Julho de 2020
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 15 de Julho de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A F. - ASSOCIAÇÃO DE SOCORROS MÚTUOS DA (...), Contrainteressada na presente Ação, intentada por M.
contra o INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos Saúde, tendente, à declaração de nulidade ou a anulação da Deliberação do Conselho Diretivo da Entidade Demandada, de 08/09/2016, que aprovou o processo de instalação de farmácia social privativa com a designação de “Farmácia (...)”, bem como o pagamento de uma quantia indemnizatória, não se conformando com a Sentença proferida no TAF do Porto, em 4 de Outubro de 2019, que decidiu, em síntese, anular o ato objeto de impugnação, que aprovou o processo de instalação de farmácia social privativa, veio em 10 de novembro de 2019 recorrer jurisdicionalmente da mesma.
Formula a aqui Recorrente/A F.
nas suas alegações de recurso, as seguintes conclusões: “Pronúncia excessiva. Omissão do princípio do contraditório.
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Na medida em que a douta decisão recorrida aplica (1) a norma do nº 2 do artigo 59º-A que manda desatender o nº 3 do artigo 14º, ambos do DL 307/2007, na redação do DL 171/2012; (2) entendimento esse vazado no douto acórdão do STA de 06.07.2018; (3) sem que o ato recorrido tenha por fundamento esse entendimento e sem que a recorrente e a recorrida tenham invocado essa factualidade ou este entendimento de direito e (4) sem que às partes fosse dada a oportunidade de se pronunciarem; ocorreu uma decisão surpresa proibida por lei.
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Ocorreu, pois, a nulidade da parte final da alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC - excesso de pronúncia e bem assim falta de prévio contraditório na dimensão do nº 3 do artigo 3º do CPC, normas aplicáveis ex vi CPTA, o que aqui se invoca.
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Dessa nulidade, resulta nítido prejuízo para a ora recorrente, que assim viu ser-lhe retirado o meio de defesa que seria oportuno usar: alegar as inconstitucionalidades que aqui alega; IV. Dessa nulidade e do não uso, na forma apontada, do dever de gestão processual (artigo 6º do CPC) resultou para a recorrente, ser-lhe retirado o meio de defesa que seria oportuno usar quando à decisão de revogar o ato impugnado quando à venda de MNSRM, daqui resultando notória ilegalidade assacada ao douto aresto recorrido, uma vez que tal atividade nada tem a ver com o regime do DL 307/2007 (LPF), o que aqui se invoca.
Falta de pronúncia - nulidade V. Na medida em que o douto aresto recorrido (1) não se pronunciou quanto ao alegado nos artigos 49º a 57º da contestação (2) o próprio aresto recorrido se refere que as EES só podem aceder à propriedade de farmácias nos mesmos termos das entidades do sector lucrativo - através de sociedades comerciais e por concurso - em desacordo com o acórdão do TC 612/2011, (3) e faz de conta que ninguém trouxe para o pleito o regime de licenciamento que em concreto se reputa aplicável, para além do DL 307/2007; ocorre falta de pronúncia sobre a solução adiantada pela aqui recorrente.
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Daí que se verifique a nulidade da parte inicial da alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC, aplicável ex vi CPTA} que aqui se invoca.
Contradição entre factos provados e a decisão adotada. Ilegalidade notória da decisão recorrida VII. A douta decisão recorrida quanto à anulação do ato recorrido na parte relativa à venda de MNSRM, constitui afronta ao regime jurídico de licenciamento de venda de MNSRM que consta dos 1) Decreto-Lei n.º 134/200S, de 16 de Agosto (2) Decreto-Lei n.º 238/2007, de 19 de Junho (3) Portaria n.º 827/2005, de 14 de Setembro e (4) Deliberação n.º 1706/2005, de 7 de Dezembro (5) Proibição da venda de tabaco em locais de venda de MNSRM Circular Informativa n.º 045/CD de 03/03/2008.
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Pelo que deve ser substituída por outra que se conforme com a legalidade.
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Nessa medida, dando-se como provado no facto 3, em conjunto com o facto 6, de onde resulta que o licenciamento abrange a venda de MNSRM, que se rege por ordenamento jurídico diferente da LPF aplicável apenas à venda de MSRM e que foi a única citada no aresto ora recorrido, ocorre a nulidade da alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC, o que se invoca.
Da inconstitucionalidade da norma do nº 2 do artigo 59ºA do DL 307/2007, na redação do DL 171/2012, na parte que desaplica às EE5 o nº 3 do artigo 142 do mesmo diploma legal X. A matéria que se trata neste caso, tem a ver com a definição dos sectores de propriedade dos meios de produção, e por isso é uma competência exclusiva da AR, nos termos da alínea j) do nº 1 do artigo 165º da CRP.
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E isso resulta claro do próprio DL 307/2007, uma vez que a única lei de autorização legislativa conferida ao Governo, na matéria em causa, que foi a Lei n.º 20/2007, de 12 de Junho que "autoriza o Governo a legislar em matéria de propriedade das farmácias e a adaptar o regime geral das contraordenações às infrações cometidas no exercício da atividade farmacêutica", XII. Mas tal autorização teve apenas a duração de 180 dias nos termos do seu artigo 4º.
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Muito embora o Decreto-Lei nº 171/2012, de 01.08, refira que é emitido "nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 198º da CRP", invocando-se matéria de reserva relativa da AR, o certo é que não invoca qualquer lei de autorização legislativa no sentido de permitir ao Governo alterar a lei, visando impossibilitar ou proibir as EES de aceder a "farmácias sociais" através das suas vestes próprias de associações, como resulta da alteração da redação do artigo 59ºA-2 do DL 307/2007, que impede a aplicação à EES do nº 3 do artigo 14º do mesmo diploma legal, a disposição que consagrava o acesso das EES a farmácias sociais, na leitura do acórdão do TC nº 612/2011.
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Também, entre Janeiro de 2012 e Agosto de 2012, nenhuma lei foi emitida pela AR que permitisse ao Governo semelhante opção jurídica, conforme documento da AR em anexo.
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Pelo que a norma do nº 2 do artigo 59ºA do DL 307/2017, na redação do DL 171/2012, padece de inconstitucionalidade orgânica na medida em que manda desaplicar às EES o nº 3 do artigo 14º da mesma lei, devendo ser desaplicada pelo Tribunal, porque o Governo não tinha competência para o efeito.
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Mesmo que existisse qualquer autorização legislativa, o que não se consente, a alteração da lei não se conteve nos seus limites e por isso sempre ocorreria ilegalidade, porquanto a norma aplicada (nº 2 do artigo 59ºA do DL 307/2007, na redação do DL 171/2012, na medida em que afasta a aplicação às EES do nº 3 do artigo 14º do mesmo diploma legal), por extravasar o sentido e extensão da respetiva lei de autorização seria ilegal, o que à cautela se invoca.
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O único sentido e limites em que uma autorização legislativa poderia ser balizada pela AR, são revelados pelo próprio exórdio do DL 171/2012, que fala na adequação à jurisprudência do acórdão do TC 612/2011, o que, de forma escandalosa e grosseira não é feito, fazendo-se o inverso na medida em que (1) não se fixou prazo para as farmácias que vendiam ao público em geral se adaptarem (2) veio dizer-se diz-se no nº 2 do artigo 59ºA do DL 307/2007 que o nº 3 do artigo 14º do mesmo diploma, não se aplica às farmácias das EES, ou seja, vem dizer-se, implicitamente, que as EES, se quiserem aceder à propriedade da farmácia social, vão ter que se constituir em sociedades comerciais para acederem à propriedade das farmácias socais, mas nunca nas suas vestes de associação na venda de MSRM apenas aos membros do seu substrato associativo. Ou seja, faz-se o contrário do que diz o acórdão do TC.
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Cremos que este tipo de grosserias ostensivas, que não são admissíveis no plano técnico-jurídico, pelo que deveriam ser objeto de necessária investigação pelo MP.
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Para além do mais, a norma do artigo 59º-A nº 2 do DL 307/2007, na medida em que aniquila o acesso das EES à instalação de farmácias sociais, nas vestes de associação, para venda de MSRM, apenas aos membros do seu substrato associativo e as obriga, caso queiram aceder a essa propriedade, a usar a forma travestida em sociedades comerciais (forma usada pelas entidades do sector privado especulativo), viola o princípio constitucional da coexistência do sector social com o sector privado consagrado no artigo 82º da CRP, viola o princípio da proteção do sector social previsto na alínea f) do artigo 80º da CRP e não se respeita o princípio consagrado no nº 5 do artigo 63º da CRP e viola o princípio da proibição do excesso ínsito no princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição. O que se invoca XX. Pelo que deveria e deve ser desaplicada.
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Viola-se ainda, de forma acintosa, a alínea c) do artigo 10º da Lei n.º 30/2013, de 8 de Maio (Lei de Bases da Economia Social), aprovada por unanimidade na AR, na medida em que compete aos poderes públicos "remover os obstáculos que impeçam a constituição e o desenvolvimento das atividades económicas das entidades da economia social", fazendo-se exatamente o contrário do que se diz, de forma inqualificável.
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Foram violadas as disposições legais que se citaram e invocaram nos lugares próprios.
Termos em que, com os melhores de direito, devem julgar-se procedentes as nulidades e devolver o processo ao Tribunal “a quo" para que as aprecie à luz do que acima se alega, devendo a final decidir-se pela procedência do pedido feito ao Infarmed, mediante a desaplicação do normativo que se julgue contra os princípios constitucionais invocados e outros que sejam aplicáveis, assim se fazendo como se espera Justiça!” O aqui Recorrido/INFARMED veio apresentar contra-alegações de Recurso em 12 de dezembro de 2019, não tendo apresentado Conclusões.
Igualmente em 12 de dezembro de 2019 veio a Autora, aqui Recorrida, M.
, apresentar as suas contra-alegações de Recurso, nas quais concluiu: “1- A douta sentença recorrida anulou o ato impugnado, consubstanciado na deliberação datada de 08/09/2016 do Conselho Diretivo do Infarmed, IP que aprovou, nos termos propostos pela contrainteressada e ora recorrente, o processo de instalação de farmácia social...
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