Acórdão nº 02287/19.6BEBRG-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Julho de 2020
Magistrado Responsável | Helena Canelas |
Data da Resolução | 15 de Julho de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO S., LDA (devidamente identificada nos autos) requerente no processo cautelar que instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga em 29/01/2020, contra a POISE – PROGRAMA OPERACIONAL TEMÁTICO INCLUSÃO SOCIAL E EMPREGO na pendência da respetiva ação principal, ao qual foi apenso – no qual requereu a decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo consubstanciado na decisão da entidade requerida relativa ao pedido de pagamento de saldo n.º 4/2018 mediante ofício datado de 29/08/2019, que determinou a aprovação do custo total reembolsável, após análise técnico-financeira, no valor de 537.570,00€ (vertida no Doc. nº 1 junto com o Requerimento Inicial da providência) – inconformada com a sentença do Tribunal a quo, datada de 29/04/2020 (fls. 311 SITAF) que indeferiu o pedido cautelar, dela interpôs o presente recurso de apelação (fls. 383 SITAF), pugnando pela sua revogação com decretação da providência, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos: 1 - Nos presentes autos cautelares, foi proferida douta sentença que julgou improcedente a Providência Cautelar de Suspensão de Eficácia de Acto Administrativo, por considerar não demonstrada a provável existência do direito a favor da Recorrente (“fumus boni iuris”), assim como entendeu que, por défice de alegação, não preenche o pressuposto do “periculum in mora”.
2 - A Recorrente não se conforma com o Douto teor da Sentença assim proferida, e por isso, o presente recurso é apresentado em matéria de direito nos termos do artigo 1.º, n.º 1 do CPTA.
3 - As providências cautelares visam impedir, que na pendência da acção principal, a situação de facto de altere de modo a que a decisão aí proferida, sendo favorável ao autor, perca o seu efeito. Têm em vista, portanto, impedir que a sentença não vire uma sentença “para encaixilhar”.
4 - Em causa nos autos cautelares está um pedido de suspensão da eficácia do acto administrativo, praticado pelo Recorrido, mediante ofício datado de 29 de Agosto de 2019.
5 - Considera a douta sentença em recurso que o comportamento da Entidade Recorrida ao longo de todo o procedimento foi absolutamente irrelevante para a capacidade da Recorrente atingir as metas de formação a que contratualmente se obrigou.
6 - Tal posição não pode ser aceite. O acto administrativo impugnado resulta, em primeira linha, da violação clara e manifesta de todas as disposições legais e regulamentares que enquadravam a actividade da Recorrida na execução da operação.
7- Para a apreciação da provável existência de um direito a favor da Recorrente, a Douta sentença fixou-se no Ponto 18 do Aviso para a apresentação de Candidaturas (AAC) n.º POISE-24-2016-04, nos termos da qual o custo médio por participante, para efeitos de reembolso de despesas, seria de 110,00€ (cento e dez euros). Daqui, a Recorrente só poderia receber do Recorrido o valor que resultasse da multiplicação deste valor pelo número de pessoas efectivamente formadas.
8 - O quadro jurídico aplicável ao litígio em apreciação judicial impõe, salvo sempre melhor opinião, solução diversa da constante da douta sentença.
9 - O teor “mecanicista” do acto administrativo impugnado, que se limita a proceder a uma operação aritmética, abstraindo-se dos que factos que decorreram na execução do procedimento, não pode ser aceitável.
11 - Vejamos os diversos e sucessivos incumprimentos da Recorrida: Primeiro que tudo, é imprescindível ter presente o modelo de financiamento público definido para este projecto. A entidade beneficiária é obrigada a suportar sozinha, como efectivamente suportou, o pagamento de todas e custos que resultam das suas operações de mercado. Só depois, e mediante comprovação, a Recorrida procede à entrega das quantias que a Recorrente, previamente, já suportou.
Ora, este tipo de operação exige grande esforço e um grande investimento de meios, quer humanos, quer financeiros, com o intuito de corresponder de forma cabal à responsabilidade aprovada. A par disto, é imprescindível que não se quebre a relação de confiança entre as partes, existe uma gestão de expectativas baseada na boa fé e na segurança da competência e no desempenho efectivo que se espera da Entidade Pública.
A Recorrente preparou, planeou e apresentou a sua candidatura dentro do prazo designado para o efeito, a 01 de Agosto de 2016.
I. O Aviso do concurso estabelecia que a decisão fundamentada da Recorrida sobre o mérito da candidatura teria que ser emanada até 26 de Outubro de 2016. Sem qualquer justificação, a decisão só ocorreu a 18 de Março de 2017, ou seja, mais de meio ano depois. – Lembrar que as candidaturas pressupunham a realização de acções formativas nos de 2016, 2017 e 2018.
Em face deste atraso injustificado, a Recorrente ficou impossibilitada de realizar acções formativas logo no ano de 2016.
A Recorrente foi obrigada a reprogramar o seu projecto, tanto na vertente pedagógica, como financeira. Esta reprogramação foi comunicada à Recorrente em Abril de 2017 e por esta foi aceite. Cumprindo com o projectado, a Recorrente iniciou as formações no mesmo mês de Abril.
O Aviso de concurso previa três tipos de pagamentos: (i) adiantamento de 15% do valor total aprovado em cada ano civil da execução do projecto; (ii) reembolsos das despesas efectivamente realizadas no prazo máximo de 30 dias úteis após recepção dos respectivos pedidos; (iii) pagamento de saldo final no prazo de 45 dias úteis apos o encerramento das actividades do projecto.
II. A Recorrente só recebeu a quantia correspondente ao adiantamento devido para o ano civil de 2017 a 30 de Junho de 2017.
III. Mais, a Recorrida ficou impedida de realizar qualquer pedido de reembolso (ii) durante todo o ano de 2017. – Pois que a plataforma electrónica através da qual seriam realizados estes pedidos só entrou em funcionamento em Dezembro de 2017.
IV. A Recorrida só permitiu à Recorrente a realização do seu primeiro pedido de reembolso, correspondente às actividades formativas realizadas até 31 de Outubro de 2017, a 21 de Fevereiro de 2018.
V. Mais ainda, apesar de obrigada a fazer este reembolso até 15 de Julho de 2017, a Recorrida só o fez a 24 de Maio de 2018, quase um ano depois.
A 23 de Março de 2018, via e-mail, a Recorrente já havia exposto a sua situação económica deficitária resultado dos diversos incumprimentos da Recorrida, expressando a sua preocupação e solicitando intervenção urgente.
Ora, é indiscutível que, o não pagamento, por parte da Recorrida, das despesas previamente suportadas pela Requerente determinou, automaticamente, prejuízos significativos.
A Recorrente apenas foi capaz de proceder aos demais reembolsos a 31 de Outubro de 2018 e a 13 de Novembro de 2018. As formações terminaram em Junho de 2018, tal como estava programado e aceite pela Recorrida.
12 - É inegável, a Recorrida não cumpriu de forma reiterada com as suas responsabilidades. Os sucessivos e muito significativos atrasados das obrigações da Recorrida tornaram financeiramente impossível à Recorrente cumprir com a integralidade das acções de formação programas.
13 - Enquanto foi capaz financeiramente de suportar sozinha e por recurso aos seus meios próprios, a Recorrente sempre assegurou o regular funcionamento das formações.
14 - Nestas circunstâncias, e na medida em que o Recorrido nunca foi capaz de cumprir as suas obrigações, a Recorrente foi obrigada a realizar um esforço financeiro muito significativo, que fez esgotar os seus recursos próprios. Foi o Recorrido que impediu a Recorrente de realizar acções de formação que abrangessem as 9.033 pessoas previstas na candidatura.
15 - Estes factos demonstram um incumprimento grave e reiterado, por parte do Recorrido, relativamente às obrigações que, para si, resultam do contrato administrativo contido no “Termo de Aceitação” da candidatura.
16 - O Recorrido sabe e conhece o nexo de causalidade existente entre o seu incumprimento quanto às obrigações de reembolso e a impossibilidade que, para a Recorrente, decorreu desse incumprimento quanto à realização de todas as acções de formação contratualmente previstas.
17 -Ao não fazer aplicar a sanção prevista no Ponto 23.º do Aviso de Concurso, o Recorrido reconheceu, expressamente e para todos os efeitos legais, o seu incumprimento quanto às obrigações legais e contratuais a seu cargo.
18 - Salvo sempre o devido respeito por posição diversa, a norma regulamentar que prevê um valor de 110,00€ por formando tem natureza procedimental e destina-se a assegurar que, em sede de apreciação de candidatura, a entidade requerida não autorize apoios financeiros que, nessa fase, possam determinar pagamentos de valor superior àquele limite.
19 - Esta norma regulamentar, porém, já não se mostra apta para fundamentar a decisão final do procedimento e, por essa razão, e para esse momento, o Recorrido criou a sanção prevista no Ponto 23 do Aviso.
20 - Da execução concreta dos projectos financiados, podem resultar circunstâncias concretas e especificas – incluindo aquelas que derivam de comportamentos do próprio Recorrido – que determinam que, a final e de forma legítima, o valor do apoio financeiro a conceder possa ultrapassar o custo de 110,00€ por formando (sem que equivalha, como é evidente, a ser ultrapassado o valor total aprovado em sede de candidatura).
21 - Não é verdade que a diminuição do número de cursos formativos possa, proporcionalmente, fazer descer os custos da operação projectada pela Recorrente e aprovada pela Recorrida.
22 - Caberia ao Recorrido aplicar, nestas circunstancias, a norma contida no n.º 1 do Artigo 428.º do Código Civil, nos termos da qual “se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo” 23 - Dispõe...
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