Acórdão nº 543/07.5BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução21 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

L….., veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de segunda avaliação efetuada ao lote de terreno para construção inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …... da freguesia da ….., concelho de ….., no valor de €348.580,00.

O Recorrente, veio apresentar as suas alegações, tendo concluído como segue: 1. A audiência de julgamento, na qual prestaram depoimento as duas únicas testemunhas indicadas nos presentes autos, foi presidida pela Ilustre Magistrada Judicial Maria do Rosário Meneses da Silva Pais (cfr. acta de fls.).

  1. No entanto, a sentença recorrida, na qual se inclui a decisão sobre a matéria de facto, foi proferida pelo Ilustre Magistrado Judicial Manuel Antunes.

  2. O que constitui violação do princípio da plenitude da assistência dos Juízes, consagrado no artigo 654° do Código de Processo Civil, nos termos do qual: “Só podem intervir na decisão da matéria de facto os juízes que tenham assistido a todos os actos de instrução e discussão praticados na audiência final” (cfr. n.° 1 do referido artigo).

  3. Este princípio é consequência dos princípios da oralidade e da imediação que presidem à produção de prova e que privilegiam o contacto entre o Juiz e a prova produzida de forma oral, salvaguardando-se, assim, a essencialidade das atitudes, expressões e reacções, que, naturalmente, só podem ser observadas in loco.

  4. Também o artigo 653°, n.° 2 do Código de Processo Civil dispõe que: “(…) a decisão proferida declarará quais os factos que o Tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.” 6 A sentença recorrida viola, igualmente, o princípio constitucional da tutela jurisdicional, consagrado no artigo 20.° da Constituição da República Portuguesa, pois, a manutenção na ordem jurídica de decisão sobre a matéria de facto proferida por Juiz que não assistiu à produção de prova, determina uma limitação, inadmissível, do direito constitucional de acesso ao direito e aos tribunais, uma vez que ao Recorrente terá sido negada a possibilidade de expor os seus interesses perante Juiz que decida, na íntegra, a matéria de facto.

  5. Tendo sido também colocado em causa o princípio do acesso à justiça consagrado na lei ordinária, no artigo 2º do Código de Processo Civil, pois a apreciação da prova e a tomada de decisão sobre a mesma por um Juiz diferente, limita, e muito, todo o efeito da prova e a descoberta da verdade.

  6. Assim, resulta claro que toda a produção de prova deve ser presidida pelo mesmo Juiz, que é o único que tem condições para avaliar os depoimentos em toda a sua plenitude.

  7. E o facto dos depoimentos terem sido gravados, não invalida nada do que acima se deixou exposto, uma vez que não é possível, através da gravação, detectar as expressões faciais e o comportamento das testemunhas durante o seu depoimento, que são essenciais para a formação da convicção do Juiz e insusceptíveis de reprodução em papel, de forma a serem transmitidas a outro Juiz.

  8. Consequentemente, é evidente que a sentença recorrida, na qual a decisão da matéria de facto foi proferida por um Juiz que não assistiu à produção de prova, designadamente aos depoimentos das testemunhas, viola o princípio da plenitude da assistência dos juízes, consagrado no artigo 654° do Código de Processo Civil, e viola também o artigo 20° da Constituição da República Portuguesa, bem como o artigo 2.º do Código de Processo Civil, o que determina a sua nulidade que não pode deixar de ser declarada.

  9. Dos diversos elementos que compõem a equação utilizada para a obtenção do valor patrimonial tributário, o Recorrente impugnou o coeficiente de localização (1.60) e a área bruta de construção e área de implantação do prédio (800,400 m2), mas a sentença recorrida só se pronuncia sobre o coeficiente de localização.

  10. A impugnação da área de 800,400m2 configura uma verdadeira “questão” a ser decidida, não podendo ser entendida como um mero argumento ou raciocínio, pois trata-se, tal como o coeficiente de localização, de um dos elementos determinantes do valor patrimonial tributário do terreno em causa nos presentes autos.

  11. Para além do mais, tratando-se de questão absolutamente autónoma de todas as outras que foram abordadas na sentença recorrida, não pode a sua decisão considerar- se prejudicada pela solução dada a qualquer das outras.

  12. Consequentemente, uma vez que o Tribunal a quo deixou de se pronunciar sobre uma questão sobre a qual se deveria ter pronunciado, a sentença recorrida está ferida de nulidade, nos termos dos artigos 125°, n.° 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 668°, n.° 1, alínea d) do Código de Processo Civil.

  13. Inconformado, vem ainda o Impugnante recorrer da matéria de facto, desde logo por ser incorrecta a decisão respeitante aos pontos 4, 7 e 8 da factualidade assente.

  14. Uma vez que a decisão no que respeita aos pontos 4 e 8 da matéria assente está em contradição com os depoimentos gravados das testemunhas do ora Recorrente - Senhor Eng.° F….. e Senhor J…...

  15. E no que respeita ao ponto 7 da matéria assente, para além de se tratar de matéria expressamente alegada pelo Recorrente, e com interesse para a boa decisão da causa, resulta expressamente do documento n.° 5 junto aos autos com a impugnação.

  16. Deveria, ainda, ter sido considerada assente, e, sobretudo, ponderada na decisão recorrida, a matéria de facto alegada nos artigos 97, 98, 99, 106 e 107 da impugnação (cfr. II, ponto 4 supra).

  17. São termos em que se verificam cumulativamente as condições previstas nas alíneas a) e b) do n°1 do artigo 712° do Código de Processo Civil, pelo que a decisão sobre a matéria de facto deverá ser modificada nos termos indicados nas presentes alegações.

  18. Em alternativa, deverá ser anulada a sentença proferida pelo Tribunal a quo por ser contraditória, deficiente e obscura relativamente aos pontos da matéria de facto supra referidos, nos termos previstos pelo n° 4 do artigo 712° do Código de Processo Civil.

  19. A sentença recorrida, ao entender que o acto impugnado está devidamente fundamentado, violou os artigos 124° e 125° do Código de Procedimento Administrativo, 77.° da Lei Geral Tributária e 268.°, n.° 3 da Constituição da República Portuguesa.

  20. Isto porque, nenhum dos valores constantes da equação que determinou o valor patrimonial tributário do referido terreno está minimamente concretizado, em nenhuma das duas avaliações, mencionando-se, apenas, que o valor foi apurado nos termos do artigo 45° CIMI.

  21. A referência à equação e a mera indicação de que a mesma resultou da aplicação de uma determinada norma jurídica, neste caso concreto o artigo 45° CIMI, não é suficiente para as exigências legais de fundamentação vigente no nosso sistema jurídico, designadamente em matéria fiscal, e impostas pelos artigos supra referidos.

  22. A avaliação do terreno em causa nos presentes autos é susceptível de afectar os direitos e interesses legalmente protegidos do Recorrente consequentemente tem que ser fundamentada de modo a que seja minimamente perceptível a motivação de facto e de direito que determinaram a fixação do valor de €348.580.00.

  23. Aliás, a própria sentença recorrida acolhe, pelo menos parcialmente, este entendimento, ao defender que é imprescindível, quanto ao coeficiente de localização, a menção ao artigo 42° do CIMI.

  24. Ora, do acto impugnado não consta qualquer referência ao artigo 42° do CIMI (cfr. documento n.° 5 da impugnação), pelo que, de acordo com o raciocínio exposto na sentença recorrida, o acto tributário impugnado padece, pelo menos, de vício de falta de fundamentação, em consequência da omissão da indicação da norma que estabelece os critérios para determinação do coeficiente de localização.

  25. Resulta da ponderação dos documentos 6 e 7 juntos com a impugnação, totalmente ignorados na sentença recorrida, que o Recorrente é igualmente proprietário do Lote ….., contíguo ao Lote ….., em discussão nestes autos (cfr. documento n.° 6 da impugnação).

  26. Tendo sido notificado, em Maio de 2007, da avaliação efectuada pelo Serviços de Finanças de Óbidos após a construção de moradia no Lote ….. (cfr. documento n.° 7 da petição inicial), que fixou o valor patrimonial tributário de €502.440.00.

  27. Consequentemente, ao terreno para construção (Lote-…..), com área de 2668m2. a Administração Fiscal fixou o valor patrimonial tributário de €348.580.00.

  28. Enquanto que para o terreno contíguo (Lote-…..), com área de 2895m2, no qual foi construída uma moradia de 2 pisos, com área de implantação de 250m2, 6 divisões, garagem individual, piscina individual e sistema central de climatização, a Administração Fiscal fixou o valor patrimonial tributário de €502.440.00.

  29. Consequentemente, a Administração Fiscal entendeu - com apenas 4 meses de diferença entre as datas das duas avaliações - que um terreno e respectiva moradia de 250m2. com garagem e piscina individual, vale apenas mais €153.860.00, que o terreno contíguo onde nada foi construído.

  30. Mais se refira que a avaliação efectuada, em Maio de 2007, ao Lote ….. (cfr. documento n.° 7 da petição inicial), determinou que para uma área total de terreno de 2895m2, a área de implantação da moradia é de 250m2.

  31. Enquanto que na avaliação objecto dos presentes autos - cfr. documento n.° 5 da impugnação -, para uma área total de terreno de 2668m2 foi considerada uma área de 800,400m2 para implantação de futura moradia.

  32. A desproporção, e consequente desigualdade objectiva, na avaliação destes dois terrenos é evidente.

  33. Não deixando margem para dúvidas que a sentença recorrida violou, ao entender em contrário, os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade - 13°, 18°, n.° 1 e 104°, n.° 3 todos da Constituição da República Portuguesa.

  34. É entendimento do ora Recorrente que a decisão...

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