Acórdão nº 779/19.6BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE PELICANO
Data da Resolução14 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul.

A...

vem interpor recurso da sentença proferida no TAF de Beja que julgou improcedente o pedido de suspensão de eficácia da deliberação da Comissão Executiva da C..., S.A., que lhe aplicou a sanção disciplinar de demissão.

Apresentou as seguintes conclusões com as suas alegações de recurso: “1) O Tribunal a quo, na douta sentença proferida, ao considerar que não é seguro que proceda – na ação principal – a prescrição do direito de instaurar o processo disciplinar, incorre em evidente erro na apreciação da matéria de facto; 2) Em consequência, a douta sentença pronuncia-se, erradamente, pela não verificação do requisito fumus boni iuris da providência cautelar; 3) Na verdade, encontra-se indiciariamente provado que à data da instauração do processo disciplinar, ocorrida em 29 de agosto de 2018, o direito da Recorrida de instaurar processo disciplinar havia já prescrito.

4) Destarte, resulta da matéria de facto indiciariamente provada que a Recorrida, tal como por esta confessado, tomou imediato conhecimento da infração ocorrida em 19 de julho de 2017; 5) Aliás, já conhecendo, à data da instauração do inquérito, dos elementos essenciais, integrantes da infração, a saber, a autoria, o modo, o tempo e o lugar da sua prática; 6) Deste modo, o termo “imediato” utilizado pela Recorrente na arguição da prescrição, deve ser interpretado à luz da factualidade provada, designadamente, considerando que a própria Recorrida utiliza o identificado termo ao descrever que «de imediato [após o alerta gerado pela operação no dia 19/07/2017] questionou a hierarquia da empregada para que fosse apresentada justificação para o sucedido…»; 7) Ainda que assim não fosse, sempre se dirá que, resulta igualmente evidente que o conhecimento pleno de todos os elementos da infração ocorreu, no limite, até ao dia 24 de agosto de 2017, uma vez que, nessa data, tinha a Recorrida conhecimento de todos os elementos necessários para formar um juízo fundado de que a conduta da Recorrente integraria uma infração disciplinar.

8) Logo, é evidente que, em 29 de agosto de 2018, quando a Recorrida inicia o processo disciplinar, já havia prescrito há muito o seu direito.

9) Além disso, ainda que se considere a suspensão legal do prazo prescricional, por um período máximo de seis meses, o direito de instaurar o processo disciplinar, em 29 de agosto de 2019, já havia prescrito.

10) Não encontra qualquer correspondência com a lei e, por conseguinte, deverá ser expurgado da ordem jurídica, o que se encontra vertido na sentença, cf. pág. 43, no passo em que se refere que “não só a (imputada) infracção disciplinar só prescreverá em 18.07.2032 (isto é, decorridos quinze anos sobre a mesma: cfr. alínea a) do n.º 1 do artigo 118.º do Código Penal aqui aplicável por remissão do artigo 178.º, n.º 1 2ª parte, da Lei Geral dos Trabalhadores em Funções Públicas) como, e sobretudo, de igual forma o direito de instaurar o procedimento disciplinar apenas prescreverá nessa mesma data, ou seja em 18 de Julho de 2032, pois, conforme visto, “(…) estes dois prazos [de um ano e de sessenta dias: cfr. n.ºs 1 e 2 do artigo 178.º] devem conciliar-se: os sessenta dias devem conter-se no prazo de 1 ano (ou o que for aplicado por força da lei penal)”, fazendo corresponder o prazo prescricional da infração ao prazo prescricional do direito a instaurar procedimento disciplinar.

11) Por fim, quanto ao vício da violação dos princípios da proporcionalidade e da adequação, diremos que, ainda que num juízo perfunctório próprio da sede cautelar, deve o douto Tribunal a quo ponderar e considerar, na aferição dos pressupostos da providência cautelar, toda a factualidade indiciariamente provada; 12) Logo, ainda que, em abstrato, deveria o Tribunal a quo ter apreciado o circunstancialismo concreto do caso, amplamente demonstrado e indiciariamente provado nos autos, inclusive as circunstâncias atenuantes da conduta da Recorrente e conduta da Recorrida após o conhecimento da infração; 13) Aliás, só assim se poderá o Tribunal a quo aferir da quebra, ou não, de confiança – ainda que em abstrato – e da inviabilidade da manutenção da relação funcional, configurando-se como proporcional ou não a aplicação da pena de demissão e, por conseguinte, conhecer da séria probabilidade da pretensão ser deferida em sede da ação principal; 14) Pelo exposto, o Tribunal a quo decidiu mal ao concluir pela improcedência do pedido cautelar, errando ao considerar que não existe nos autos uma probabilidade suficientemente séria e forte do denominado “bom direito” e, por conseguinte, que não é provável que a decisão a proferir no processo principal seja julgada procedente.

A Recorrida apresentou as seguintes conclusões com as suas alegações de recurso: 1. A douta sentença recorrida não merece a censura que lhe faz a Recorrente.

  1. No que respeita à alegada prescrição do pode disciplinar, importa renovar a explicação, já dada nos autos, do enquadramento aplicável à Recorrente, de onde se conclui que a Recorrente estava, enquanto funcionária da Recorrida, sujeita ao Regulamento Disciplinar dos Funcionários Civis de 1913.

  2. Por qualquer das duas vias acima apontadas, conclui-se que o poder disciplinar (seja para instauração do processo, seja para a aplicação da pena de demissão) cabe ao Conselho de Administração da Recorrida que o delegou na sua Comissão Executiva, ficando a constar do Regulamento da Comissão Executiva.

  3. É, pois, à Comissão Executiva que cabe, nos termos do disposto no artigo 31.º do Regulamento Disciplinar dos Funcionários Civis de 1913, instaurar, por despacho, os processos disciplinares.

  4. E não a qualquer superior hierárquico.

  5. Ao contrário do que defende a Recorrente, o prazo de prescrição de 60 dias apenas se inicia com o conhecimento das infrações pela Comissão Executiva da Recorrida e não por qualquer superior hierárquico, sendo certo que a DAI não tem qualquer poder disciplinar nem nenhum superior hierárquico da Recorrente.

  6. Nem os factos em causa, tal como indiciariamente provados nestes autos, foram do conhecimento de qualquer hierarquia da Recorrente, pois o único facto conhecido da chefia da Recorrente foi a transferência que esta fez para a conta da sua filha no dia 20/09/2017, desconhecendo todos os actos anteriores que, no mesmo dia, a Recorrente perpetrou com vista à apropriação de verba do cliente A..., como se descreve nos artigos 3.º, 4.º e 5.º da nota de culpa.

  7. Não se verifica, assim, o decurso de qualquer prazo prescricional.

  8. Primeiro, porque no que respeita à prescrição de curto prazo – 60 dias – tal prazo apenas se iniciou, como se viu, com o conhecimento das infracções pela Comissão Executiva da Recorrida.

  9. Atendendo a que a Comissão Executiva do Conselho de Administração, que é o órgão com competência disciplinar, teve conhecimento dos factos em 29/08/2018 e deliberou imediatamente a instauração do procedimento disciplinar à Recorrente, sendo a nota de culpa entregue à Recorrente em 20/09/2018, é por demais evidente que não decorreu o referido prazo de 60 dias.

  10. Segundo, porque, no que respeita ao prazo longo de prescrição, as infracções disciplinares imputadas à Recorrente constituem igualmente crime (furto/artigo 204.º do Código Penal; falsificação de documento/256.º do Código Penal, abuso de confiança/ artigo 205.º do Código Penal, infidelidade/artigo 224.º do Código Penal), aplicando-se o prazo de prescrição de 5 anos, com decorre do disposto no artigo 118.º, n.º 1, alínea c) do Código Penal.

  11. Constituindo crime aplica-se, como decorre da cláusula 105.ª, n.º 2 do Acordo de Empresa (ou, se se quiser, do artigo 178.º, n.º 1 da LGTFP), o prazo de prescrição do crime, sem que para tal se mostre necessário prévia ou posterior participação criminal, nem prévia ou posterior condenação (da Recorrente) em processo penal, relativamente aos mesmos factos.

  12. Embora com fundamentação algo diferente daquela que foi esgrimida na douta sentença recorrida, é manifesto que a decisão de demissão não padece de qualquer vício decorrente de alegada prescrição do poder disciplinar, devendo, neste contexto, confirmar-se...

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