Acórdão nº 1106/10.3BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução14 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO F…………………………….., SA, devidamente identificada nos autos, veio interpor recurso jurisdicional do acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datado de 29/01/2014, que no âmbito da ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo, instaurada contra o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e o Contrainteressado, Sindicato Nacional dos Maquinistas dos Caminhos de Ferro Portugueses, julgou a ação improcedente, absolvendo do pedido de anulação do despacho da Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social, de 25/01/2010, de definição do objeto do processo de arbitragem obrigatória n.º 1/2009, a correr junto do Conselho Económico e Social.

* Formula a aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem: “A O presente recurso tem por objecto o Acórdão Recorrido, o qual, para tentar salvar a legalidade do Despacho de 25.01.2010, viola diversas normas constitucionais e legais e fez uma errada interpretação e aplicação do Direito.

B O Acórdão Recorrido é inconstitucional por violar directamente o princípio da separação dos poderes previsto no n.2 1do artigo 111º da CRP e o princípio da independência dos tribunais previsto no artigo 203º da CRP, fazendo uma interpretação inconstitucional da norma do n.º 1do artigo 162 do DL 259/2009 face ao disposto no n.º 2 do artigo 209º da CRP.

C O Acórdão Recorrido decidiu mal ao não ter julgado nulo o Despacho de 25.01.2010 nos termos da alínea a) do n.2 2 do artigo 1332 do Código do Procedimento Administrativo ("CPA"), por ter havido usurpação de poder.

D A Acórdão Recorrido viola o disposto no n.º 1do artigo 1002 do CPA, tendo feito uma incorrecta interpretação e aplicação desta norma legal, na medida em que sendo o Despacho de 25.02.2010 um novo acto administrativo relativamente ao Despacho de 14.09.2009 (razão formal), com um conteúdo e um sentido decisório diferente (razão material) e dispondo sobre uma matéria lesiva para os interesses da F............... (razão procedimental), a F............... tinha direito de audiência prévia relativamente ao despacho de 25.02.2010, o qual foi violado.

E O Acórdão Recorrido faz uma errada aplicação e interpretação da norma do n.º 1do artigo 1232 do CPA, na medida em que a análise que lhe está subjacente é totalmente vaga, genérica e incompreensível, não indicando (à semelhança do que ocorre com o Despacho de 25.02.2010) qualquer facto ou qualquer explicação ou razão que permita explicar porque razão a arbitragem há- de incluir no seu objecto “a retribuição e outras condições patrimoniais e os direitos, deveres e garantias das partes”.

F O Acórdão Recorrido faz a este respeito uma incorrecta aplicação e interpretação da norma do artigo 125º do CPA, na medida em que, para além de não especificar a que parágrafo em concreto da referida norma se está a referir, não é verdade que a exigência de fundamentação seja meramente "formal" e não também "substancial"·, ou seja, com indicação de factos concretos que a sustentem.

G Atento o disposto nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 6392 do Código do Processo Civil, o Acórdão Recorrido viola as normas do nº 1dos artigos 111º e 203º da CRP, bem como do no n.º 1do artigo 1002 e do n.º 2 do artigo 1252 ambas do CPA, fazendo das mesmas uma incorrecta interpretação e aplicação jurídicas, merecendo ser revogado por esse Venerando Tribunal.”.

Pede que o presente recurso seja julgado provado e procedente, revogando-se o Acórdão recorrido, com as respetivas consequências legais.

* Notificados os ora Recorridos da admissão do recurso, nenhum apresentou contra-alegações, nada tendo dito ou requerido.

* Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, foi emitido parecer no sentido da improcedência do recurso e da confirmação do acórdão recorrido.

* Notificado o Recorrente do parecer antecedente, sobre o mesmo se veio pronunciar no sentido da improcedência das razões invocadas.

* O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II.

DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas pela Recorrente, resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de: 1. Erro de julgamento, quanto ao vício da usurpação de poder, nos termos do artigo 133.º, n.º 2, a) do CPA, por inconstitucionalidade, por violação do princípio da separação de poderes, previsto no artigo 111.º da CRP e o princípio da independência dos tribunais, previsto no artigo 203.º da CRP, fazendo uma interpretação inconstitucional do artigo 16.º, n.º 1 do D.L. n.º 259/2009, em face do artigo 209.º, n.º 2 da CRP; 2.

Erro de julgamento, no tocante à violação do artigo 100.º, n.º 1 do CPA, no tocante à audiência prévia; 3.

Erro de julgamento no tocante à violação dos artigos 123.º, n.º 1 e 125.º, do CPA, quanto ao dever de fundamentação.

* Considerando que o Ministério Público no parecer emitido pronunciou-se pela procedência de matéria de exeção, no sentido de defender que o ato impugnado não reveste as características de lesividade para poder ser impugnado contenciosamente, nem carece de eficácia externa, além de ser um ato processual e não um ato administrativo, embora termine concluindo pela improcedência do recurso, considera-se que as questões suscitadas excedem o âmbito de pronúncia, nos termos estabelecidos no artigo 146.º, n.º 1 do CPTA, por este ser limitado ao mérito do recurso.

Consequentemente, não se conhecerá do suscitado pelo Ministério Público, limitando-se as questões a decidir no presente recurso às que pela Recorrente foram invocadas nas conclusões do recurso.

III.

FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “a) A autora é uma sociedade comercial que tem por objecto a exploração do serviço de transporte ferroviário suburbano de passageiros no EixoFerroviário Norte-Sul da Região de Lisboa, com extensão a Setúbal (Praias do Sado) [documento de fls. 37 a 41 dos autos].

b) A autora é, desde 1999, a concessionária do serviço suburbano de transporte ferroviário de passageiros no Eixo Norte-Sul, nos termos do contrato de concessão celebrado com o Estado Português [acordo e documento de fls. 42 a 48 dos autos].

c) A concessão à autora da exploração do serviço suburbano de transporte ferroviário de passageiros no Eixo Norte-Sul foi prorrogada até ao ano de 2019 [facto público].

d) No dia 19/12/2008, foi enviado à autora, para efeitos de audiência prévia, o ofício com a referência 3449-07/1488, onde consta, designadamente, o seguinte: Encarrega-me Sua Excelência o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social de, nos termos do disposto no artigo 100.º do Código do Procedimento Administrativo, informar V. Ex.a que, após audição das partes, da Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS) e da entidade reguladora do sector e de supervisão do sector, o sentido provável da decisão será determinar a arbitragem obrigatória requerida pelo Sindicato Nacional dos Maquinistas dos Caminhos de Ferro (SMAQ), relativamente ao conflito colectivo emergente da negociação de um Acordo de Empresa, nos termos e com os fundamentos que se seguem.

1) Admissibilidade da Arbitragem Obrigatória Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 567.º do Código do Trabalho, em conflito que resulte da celebração ou revisão de uma convenção coletiva, é admissível a realização de arbitragem obrigatória, a requerimento de uma qualquer das partes desde que esta tenha participado em negociações prolongadas e infrutíferas, em conciliação e, ou, mediação frustrada e bem assim não tenha sido possível dirimir o conflito em sede de arbitragem voluntária, em virtude de má conduta da outra parte, depois de ouvida a Comissão Permanente de Concertação Social.

Dos elementos e informações constantes do processo resulta que se encontram preenchidos os requisitos previstos naquela disposição legal, a saber: a) O conflito em apreço insere-se no âmbito da negociação tendente à celebração de um Acordo de Empresa entre o SMAQ e a F...............; b) Em 02/04/2007, o SMAQ apresentou à F............... uma proposta de celebração de um Acordo de Empresa e regulamento de carreiras da condução-ferrovia/tracção; c) A F............... inviabilizou qualquer resultado por via da negociação directa uma vez que não apresentou, em qualquer momento, resposta à proposta do SMAQ; d) Em 10.05.2007, o SMAQ requereu a conciliação à Direcção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT), que resultou frustrada, e no âmbito da qual se realizou uma única reunião, no dia 19.06.2007; e) Em 02.07.2007, o SMAQ requereu a mediação à DGERT, cujo procedimento foi concluído em 03.09.2007, com a comunicação da recusa pela F............... da proposta apresentada pelo respectivo mediador: f) O SMAQ propôs à F..............., em 06.11.2007, que o conflito fosse submetido a arbitragem voluntária, tendo a empresa comunicado a sua recusa no dia 07.11.2007; g) Não foi possível dirimir o conflito em virtude de “má conduta” da F..............., uma vez que esta: i) Não respondeu à proposta de celebração de convenção colectiva que lhe foi dirigida pelo SMAQ; ii) Continuou a não apresentar qualquer resposta ou contraproposta em sede de conciliação; O facto de a F............... ter mantido sistematicamente a sua recusa quanto à apresentação de uma resposta ou contraproposta à proposta negocial apresentada pelo SMAQ, aceitando, recusando...

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