Acórdão nº 141/19.0BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução07 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão 1. Relatório 1.1.A Autoridade Tributária e Aduaneira, ao abrigo do preceituado nos artigos 26º e 27º, ambos do Decreto-Lei nº10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Voluntária, doravante apenas designado por RJAT), impugnou a decisão do Tribunal Arbitral, proferida no processo arbitral nº35/2019-T, que, julgando procedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pela B..., SGPS, S.A., anulou a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra o acto de autoliquidação de IRC do ano de 2014, na parte em que não relevou fiscalmente os encargos suportados pela Impugnada nos exercícios de 2004 a 2007, no valor de €22.626.128,74

1.2. No articulado inicial, resumindo a sua pretensão, formula a Impugnante as seguintes conclusões: «1.ª A presente impugnação visa reagir contra a decisão arbitral proferida a 2019-10-21 pelo Tribunal Arbitral constituído no âmbito do processo n.º 35/201-T que correu termos no CAAD; 2.ª A decisão proferida pelo referido Tribunal Arbitral padece de nulidade pelo facto de não ter conhecido de duas questões essenciais sobre as quais se deveria ter pronunciado [artigo 28.º/1-c) do RJAT]; 3.ª Por via do pedido de pronúncia arbitral visou a Impugnada colocar em crise e pedir a anulação da «Reclamação Graciosa n.º 4..., em que se discutia a legalidade da autoliquidação de IRC referente ao exercício de 2014 e refletida nas Declarações Modelo 22 individual, com o código 4..., e do GRUPO B...- SGPS, S.A., com o código 4… (cf. Doc.1), vem, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º , n.º 1, alínea a), 3.º , n.º 1, e 10.º , n.º 1, alínea a), e n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, REQUERER A CONSTITUIÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA, com vista à obtenção da declaração de ilegalidade da mencionada decisão e, bem assim, dos referidos atos de autoliquidação de IRC, na parte em que não consideram a dedução do valor de € 2.626.128,74, referente aos encargos financeiros acrescidos em anos anteriores em cumprimento do disposto no artigo 32.º , n.º 2, do Estatuto dos Benefícios Fiscais e da Circular n.º 7 /2004, de 30 de março.» 4.ª Pugnando pela legalidade dos actos tributários colocados em crise por parte da Impugnada, a Impugnante deduziu oportunamente Resposta ao pedido de pronúncia arbitral, mediante a apresentação de articulado através do qual, suscitou a inconstitucionalidade da interpretação pugnada pela Requerente 5.ª Cada uma destas questões foi devidamente desenvolvida pela Impugnante ao longo do seu articulado e era perfeitamente identificável por parte de qualquer leitor; 6.ª Conforme se pode verificar, cada uma destas questões foi devidamente desenvolvida pela Impugnante ao longo do seu articulado e era perfeitamente identificável por parte de qualquer leitor. 7.ª Como referido, a 2019-10-21 o Tribunal Arbitral proferiu decisão final, tendo julgado procedente o pedido da ora Impugnada e condenado a Impugnante ao pagamento das custas do processo. 8.ª Tal decisão deveria ter sido o corolário da resolução de todas as questões suscitadas pelas partes em litígio do processo, designadamente a inconstitucionalidade da interpretação feita pela Impugnada. 9.ª Porém, assim não foi. 10.ª o Tribunal Arbitral entendeu que as questões a decidir se limitavam ao seguinte: «A principal questão que se coloca nos presentes autos reconduz-se a saber se os encargos financeiros incorridos pela Requerente respeitantes à aquisição de participações sociais, no período de 2004 a 2007, podem ser deduzidos à matéria colectável, atenta a revogação do artigo 32.º, n.º 2 do EBF. (…) Face ao exposto, relativamente à posição das Partes e aos argumentos apresentados, para determinar se o acto tributário sub judice é ou não ilegal será necessário verificar qual é a interpretação que deve ser efectuada à norma constante do artigo 32.º, n.º 2 do Código do IRC.» 11.ª O Tribunal Arbitral apreciou as questões por si elencadas, as quais correspondem, no essencial, às questões suscitadas pela própria Impugnada; 12.ª Contudo, não só este elenco de questões fixado pelo Tribunal Arbitral omitiu totalmente a questão suscitada por banda da Impugnante, a saber: - As diversas inconstitucionalidades que a interpretação propugnada pela Impugnada – e adoptada pelo Tribunal Arbitral - padece. 13.ª Como também – e mais importante ainda – a própria fundamentação da decisão não dedicou uma palavra sequer àquelas questões não despiciendas. 14.ª As questões a decidir não eram exclusivamente as questões suscitadas pela Impugnada, mas, sim, também as questões suscitadas pela Impugnante, pois de outro modo de nada serve o contraditório corporizado na Resposta oportunamente apresentada; 15.ª tudo se processou como se, pura e simplesmente, a Impugnante jamais tivesse suscitado as questões das diversas inconstitucionalidades (suscitadas pela Impugnante) que a interpretação propugnada pela Impugnada – e adoptada pelo Tribunal Arbitral - padece. 16.ª Ao ignorar estas duas questões fundamentais o Tribunal Arbitral não incorreu em qualquer erro de apreciação da prova ou erro de julgamento, mas, sim, numa inequívoca omissão de pronúncia; 17.ª Nenhuma relação de dependência jurídica existe entre a interpretação da lei em torno do thema decidendum feita pelo Tribunal Arbitral e as questões da inconstitucionalidade suscitadas pela Impugnante que justificasse a preterição ou omissão em que incorreu aquele areópago. 18.ª Na realidade, a razão de ser das suscitadas questões da inconstitucionalidade permaneceram inteiras quando o Tribunal Arbitral aderiu à tese defendida pelo Impugnado. 19.ª A decisão arbitral não padece de uma “mera” fundamentação lacónica ou deficiente, antes configura uma “decisão surpresa”; 20.ª Acresce que, ao não cumprir um dos requisitos essenciais inerentes a uma decisão (i.e., a de convencer os seus destinatários) o Tribunal Arbitral coartou irremediável e incompreensivelmente um dos poucos mecanismos de controlo que assistem à Impugnante: o recurso para o Tribunal Constitucional [artigo 70.º/1-b) da Lei 28/82, de 15 de novembro]; 21.ª Motivo pelo qual não deve ser mantida na ordem jurídica a decisão arbitral ora colocada em crise, devendo antes ser aquela declarada nula. Termos em que, por todo o exposto supra e sempre com o douto suprimento de V.Exas., deve a presente Impugnação ser julgada procedente e, consequentemente, ser declarada nula a decisão arbitral, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA. Mais se requer, desde já, atendendo a que o valor da ação é superior a € 275.000, seja a Autoridade Tributária e Aduaneira dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art.º 6.º n.º 7 do Regulamento de Custas Processuais, tendo em consideração o valor e a natureza da causa.» 1.3. Admitida a impugnação e notificada a B..., SGPS, S.A., foi apresentada resposta na qual se conclui nos seguintes termos: «A) A Fazenda Pública apresentou impugnação da decisão arbitral proferida no processo n.º 35/2019-T com fundamento na omissão de pronúncia sobre «a inconstitucionalidade da interpretação pugnada pela Requerente, ora impugnada», que tinha sido invocada pela mesma em sede de resposta ao pedido de pronúncia arbitral. B) No entanto, as inconstitucionalidades invocadas pela Administração tributária não figuram como verdadeiras questões sobre as quais o Tribunal Arbitral devesse ter tomado uma posição individualizada, mas consistem, por outro lado, em meros argumentos introduzidos na Resposta ao pedido arbitral de forma completamente descontextualizada daquela que era a verdadeira questão decidenda. C) Para além disso, os vícios invocados pela Fazenda Pública à interpretação do regime especial do artigo 32.º, n.º 2, do EBF, através de integração de lacunas da lei e em alegada violação do princípio da legalidade, nunca poderiam constituir uma omissão de pronúncia da decisão arbitral, pois, no momento em que o Tribunal arbitral decidiu que deveria ser feita uma interpretação do regime contido no artigo 32.º, n.º 2 do EBF - de acordo com o entendimento da Circular n.º 7/2004- e fixou, ao abrigo de outros princípios constitucionais e legais, os efeitos que deveriam ser extraídos no momento da revogação do referido regime especial, a Administração tributária apenas poderia (se tal fosse admissível) recorrer do mérito da decisão, por não concordar com a solução adotada na mesma. D) Para que a questão da inconstitucionalidade suscitada pela Administração tributária na Resposta pudesse constituir uma verdadeira questão, sobre a qual devesse recair uma apreciação individualizada pelo Tribunal, era necessário que a mesma tivesse explicitado, claramente, as razões de facto e direito do entendimento que defendia e de cuja decisão, indubitavelmente, pretendia que fossem extraídos efeitos para a decisão dos autos, o que não aconteceu. E) Conforme foi decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão proferido em 20 de setembro de 2017, no processo n.º 945/17, segundo a qual «A falta de concretização das alegadas violações dos preceitos constitucionais invocados impede que o tribunal emita também uma apreciação individualizada sobre as mesmas, não se podendo, por isso, configurar como verdadeiras questões que mereçam um tratamento singular e individualizado, antes tendo a sua apreciação que se reconduzir à procedência ou improcedência da questão principal» (cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo disponível para consulta em www.dgsi.pt) [Sublinhado nosso]. F) Naquele segmento decisório, o Supremo Tribunal Administrativo referiu que «Não tendo autonomizado qualquer vício de inconstitucionalidade, não pode assacar à sentença recorrida omissão de pronúncia, pois recai sobre os sujeitos processuais o deve de identificarem de forma clara as questões que pretendem que sejam apreciadas pelo tribunal - art. 608° do CPC - e só nessa medida se pode censurar o tribunal por omissão na sua apreciação» [Sublinhado nosso]. G) Partilhamos, aqui, do...

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