Acórdão nº 00342/13.5BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução30 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I.

veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 21.02.2019, pela qual foi julgada parcialmente procedente a acção administrativa comum, intentada pelo Recorrente contra o Estado Português, e em consequência condenado o Estado Português a pagar ao Autor a quantia de €12.228,91, a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, bem como a quantia de €4.000,00, a título de indemnização por danos morais, acrescida de juros de mora desde a data da prolação da sentença até efectivo e integral pagamento, tendo pedido a condenação do Réu Estado Português a indemnizá-lo nos montantes de €49.965,98, a título de danos patrimoniais e de €7.500,00, a título de danos não patrimoniais, no valor global de 57.465,98.

Invocou para tanto que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento pela não aplicação dos quantitativos definidos nos termos do DL nº 106/98 e subsequentes Portarias enquanto critério para determinar o quantum indemnizatório devido ao A. pelos danos patrimoniais provocados pela actuação ilegal, pela consideração de factores erróneos para o cálculo do quantum indemnizatório segundo o critério adoptado pelo Digno Tribunal a quo (valor médio do preço da gasolina, consumo médio do automóvel, montante pela desvalorização e desgaste do veículo), quanto à data fixada para o vencimento dos juros de mora sobre a indemnização por danos patrimoniais, quanto à fixação do quantum indemnizatório devido pelos danos morais suportados pelo Autor e respectivos juros de mora.

O Estado Português, representado pelo Ministério Público, contra-alegou, defendendo a manutenção da sentença recorrida.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1) Ao contrário do decidido, o critério ajustado para ressarcir os danos patrimoniais do A. é o decorrente do DL 106/98 e Portarias subsequentes, o qual tem ínsita uma medida de equidade ao fixar um montante para ressarcir as deslocações em viatura própria e, assim, definido que é em função da conjuntura económica anual e de todos os custos que a utilização do automóvel implica; 2) Pressupondo naturalmente um carro de qualidade e predicados médios, usado de acordo com parâmetros de normalidade, normalidade esta que tem que servir como critério de equidade e não outros critérios que, naturalmente, suportam situações de anormalidade e distorção, quer seja por o combustível utilizado ser o mais aditado, quer seja porque os pneus são os mais dispendiosos, etc… 3) Não está em causa a aplicação direta das normas dos diplomas ao caso concreto, mas o recurso ao raciocínio analógico que a situação impõe e o princípio da igualdade – o critério é inclusive usado para ressarcir danos deste tipo no âmbito do setor privado, quando o empregador determina a ilegal deslocação do trabalhador do local de trabalho (a título de exemplo, cfr. Ac. da Relação de Guimarães de 19/04/2018, proc. 133/17.4T8BGC.G1).

4) Um cidadão português não pode compreender que o Estado use um determinado critério para pagar os custos das deslocações lícitas feitas pelos seus trabalhadores (critério do DL 106/98 e Portarias subsequentes) e não use o mesmo critério para ressarcir os mesmos custos inerentes às deslocações quando sejam ilicitamente determinadas pela atuação da Administração.

5) Não há lógica jurídica, nem racionalidade neste raciocínio, que afronta a igualdade, ressarcindo-se de modo diferente os mesmos custos, consoante provenham de facto lícito ou ilícito, discriminando-se agravadamente aqueles que suportam o facto ilícito e discriminando-se os mesmos, inclusive, em relação aos trabalhadores privados que, em casos como o vertente, são ressarcidos com base nesse critério.

6) Isto sempre seria assim ainda que o legislador do DL 106/98 e Portarias subsequentes que definem o quantitativo devido por quilómetro tivesse em conta (que não tem) outros fatores para alcançar esse valor, suponhamos até incómodos e desgaste do próprio trabalhador com a deslocação.

7) Nesse caso, quando muito, poderia entender-se que os danos morais peticionados pelo A. seriam consumidos no montante atribuído por quilómetro, não merecendo uma valoração autónoma.

8) Em suma, pelos motivos expostos, o critério propugnado é aquele que permite uma maior aproximação aos danos reais suportados pelo A. e que se visam ressarcir, e é o critério que se impõe para alcançar a justiça no caso concreto, satisfazer o princípio da igualdade e a uniformidade de critérios em situações idênticas e impedir, inclusive, o enriquecimento sem causa da Administração – tudo isto ínsito a um julgamento segundo a equidade.

9) Portanto, ao decidir diversamente, o Tribunal a quo incorre em erro de julgamento, por violação dos arts. 562.º e 566.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Civil, impondo-se a revogação da sentença recorrida.

10) Caso assim se não entenda, no que se não concede e só por mera hipótese académica se admite, a verdade é que, mesmo usando o critério seguido pelo Tribunal a quo, os montantes fixados não são minimamente idóneos a ressarcir o A. do dano patrimonial suportado. Isto porque o Tribunal parte de pressupostos que não correspondem à realidade e são desajustados do caso concreto.

11)Em primeiro lugar, o A. utilizava gasolina sem chumbo 98 e não gasolina sem chumbo 95, o que é perfeitamente legítimo e aceitável por aquela ser mais adequada ao automóvel, o Renault Mégane, com cilindrada 1390, tendo em conta que a gasolina 98 dá mais rendimento ao motor do carro e, porque é mais aditivada, melhora a capacidade de combustão do motor e reduz os resíduos produzidos pela gasolina e, assim, o seu impacto negativo no motor.

12) Utilizando a mesma base de dados da decisão recorrida (https://www.pordata.pt/DB/Portugal/Ambiente+de+Consulta/Tabela), atendendo aos anos em causa, alcançamos a média global de € 1,47 por litro de gasolina sem chumbo 98, valor substancialmente superior aos € 1,39 erroneamente considerados pelo Tribunal.

13) Em segundo lugar, o automóvel do A. jamais por jamais tinha o consumo médio considerado pelo Tribunal, de 5 litros aos 100 km, mas antes de 8 litros por 100 km – neste sentido, apesar de ser facto notório, cfr. doc. 1 que se junta (documento que só agora foi obtido e cuja junção se revela essencial à boa decisão da causa, face à sentença proferida).

14) Salvo o devido respeito, só a inexperiência na matéria ou a confusão entre o que gasta um carro a gasolina e o que gasta um carro a gasóleo pode justificar o gasto considerado pelo Tribunal para um carro a gasolina como o do A.… 15) Deste modo, ainda que seguindo o raciocínio do Tribunal a quo, considerando o preço médio por litro do combustível utilizado (€ 1,47) e o consumo médio do automóvel do A. (de 8 litros aos 100 kms, o que dá, pelos 132.790 kms a mais, 10.623,20 litros de gasolina consumidos), temos que, no mínimo, o A. gastou a mais, só em combustível, o montante de € 15.616,104 – montante consideravelmente superior ao julgado.

16) Portanto, conclui-se que a sentença recorrida, fosse como fosse, jamais poderia manter-se na ordem jurídica, incorrendo em erro de julgamento por violação dos arts. 562.º e 566.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Civil, bem como dos princípios inerentes ao julgamento segundo a equidade, nomeadamente o princípio da igualdade e a proibição do enriquecimento sem causa, pois o montante fixado é ostensivamente parco para ressarcir os danos do A. em combustível, tendo em conta as circunstâncias do caso concreto e, assim, viola-se a justiça que é devida no caso.

17) Aliás, não tendo os factos considerados pelo Tribunal a quo, referentes ao combustível usado e ao consumo médio do automóvel, sido trazidos aos autos, nem sequer resultado da instrução da causa, não podia o Tribunal adotar este critério, que, também sob este enfoque, é totalmente alheio à justiça devida no caso e resulta antes em iniquidade, por o montante indemnizatório ser desfasado do prejuízo suportado.

18) A sentença incorre assim em erro de julgamento, não só por violação dos arts. 562.º e 566.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Civil, como do art. 5.º do CPC, aplicável ex vi arts. 1.º e 35.º do CPTA, jamais podendo manter-se na ordem jurídica.

19) Em terceiro lugar, o Tribunal fixou um montante adicional de € 3.000 a título de desgaste e desvalorização do automóvel por força da quilometragem adicional, mas tal valor não tem qualquer suporte fáctico ou fundamento concreto e, ademais, não vêm considerados os gastos acrescidos com revisões automóveis e mesmo com os seguros automóveis, que refletem os maiores riscos decorrentes de viagens mais longas, tudo conforme alegado na pi. (arts. 27.º, 28.º e 46.º da pi.).

20) Deste modo, o Tribunal incorre em erro quanto aos factos, por insuficiência da matéria de facto provada, devendo aditar-se, no ponto 25 da fundamentação de facto, que o A. suportou ainda gastos acrescidos com revisões automóveis e mesmo com os seguros automóveis, os quais refletem os maiores riscos decorrentes de viagens mais longas – facto este notório, que decorre das regras da experiência de vida.

21) Por outro lado e determinantemente, o valor é ostensivamente parco, afastando-se da justiça concreta que a equidade impõe, desde logo porque 132.000 kms corresponde, em normalidade, a mais de metade da quilometragem máxima de um automóvel a gasolina, no seu período de duração útil! 22) Um carro deste tipo não custa menos de € 20.000 (custa mais) e, se a vida média de um carro a gasolina é de cerca de 250.000 kms, no máximo, é evidente que só a desvalorização do automóvel é, no mínimo, metade deste preço! – basta pesquisar na internet para perceber isto mesmo, em sites de venda de automóveis usados… (Standvirtual, Autosapo, OLX…).

...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT