Acórdão nº 03286/11.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução30 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório M.

e D.

, no seguimento da Ação Administrativa Especial que intentaram contra o Instituto de Emprego e Formação Profissional IP, tendente à anulação do despacho de 24-06-2011 do Diretor do Centro da (...)/(...) que determinou a conversão do apoio não reembolsável em reembolsável e o vencimento imediato da importância em divida (39.749,18€), no âmbito do Programa Iniciativas Locais de Emprego, inconformados com o Acórdão proferido em 25 de fevereiro de 2014, através do qual foi julgada “improcedente a presente Ação”, veio interpor recurso jurisdicional do mesmo, proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.

Formularam os aqui Recorrentes M. e D., nas suas alegações de recurso, apresentadas em 10/04/2014, as seguintes conclusões: “1- Os cidadãos merecem que, pelo menos, seja garantido o que a Constituição, no seu artigo 20°, lhes afiança corresponder a um direito fundamental: o direito a uma tutela jurisdicional efetiva.

2- É deveras gritante a forma ligeira e completamente alheada da situação fáctica concreta e individual, com que o acórdão em crise decidiu a pretensão trazida a juízo pelos AA., os quais confiada e pacientemente aguardavam pela sua prolação, na inocente convicção de que tal demora refletiria a profundidade da análise que essa prolação implicava.

3- Os factos que servem de fundamento à decisão do julgador, para além de constituir a imprescindível base de decisão de direito, são o ponto de partida para o controlo a efetuar pelas instâncias superiores sobre a decisão da primeira instância relativa à matéria de facto, pois esse Venerando Tribunal pode conhecer e julgar os factos através de uma reponderação ou reexame da decisão (arts. 662° nº 1 do CPC), pode ordenar a produção de novos meios de prova (art. 662 nº 2 b) CPC), ou pode usar de poderes de rescisão ou cassatórios, anulando a decisão da primeira instância por deficiência, obscuridade ou contradição desta decisão, por se considerar indispensável a ampliação dessa matéria de facto (art, 662 n" 2 c) CPC), o que, cremos, se imporá.

4 - Como consta dos autos, o ato impugnado - despacho da Sra. Diretora do Centro de Emprego de 24/06/2011 - que determinou a resolução do contrato de concessão de incentivos (adiante designado por CCIF) celebrado com os AA, em 28/12/2004, na sequência de projeto apresentado em 15/12/2003, foi tomado com base na informação de que existia uma situação de incumprimento injustificado por parte dos proponentes, ora autores.

5 - Os AA., ora recorrentes, na ação que intentaram impugnando aquele ato, acusam-no, entre outros vícios, de erro nos pressupostos de facto, o que é dizer que impugnam que o seu comportamento na execução do projeto configure uma situação de incumprimento, e muito menos incumprimento total ou injustificado.

6- Estando em causa o cumprimento ou não, do indicado CCIF referente a projeto de Iniciativa local de emprego, importava saber que empregos gerou o projeto, em que número e durante quanto tempo, a fim de se poder extrair qualquer conclusão acerca do cumprimento do mesmo. Mais importava apurar, em sede de instrução, durante quanto tempo o projeto foi executado, se os proponentes contribuíram com dinheiro próprio para a sua efetivação, que trabalho desenvolveram, que postura tiveram perante o mesmo, que impacto a empresa por si criada teve, como foi administrada, como foi publicitada, como evoluiu a sua faturação, e por fim, como cessou. Isto, na senda do apuramento da «verdade» material a que alude o artigo 90° do CPTA, que dispõe: «No caso de não poder conhecer do mérito da causa no despacho saneador, o juiz ou relator pode ordenar as diligências de prova que considere necessárias para o apuramento da verdade.» 7- O que não ocorreu, pois nada desses pontos da matéria de facto constam da matéria provada. E não é por falta de alegação, nem de meios de prova.

8- O tribunal recorrido, na decisão sobre a matéria de facto - que se impugna veementemente - dá como provado apenas 11 factos, nove dos quais correspondem «ipsis verbis» aos 9 primeiros artigos da contestação do réu (!), dos quais não foram sequer expurgadas conclusões deles constantes, que exorbitam manifestamente a matéria de facto.

9- Impugna-se a decisão de matéria de facto, que o tribunal recorrido tenta justificar no princípio da livre apreciação da prova e nas regras da experiência comum, porque não colhem os seus parcos fundamentos e porque é manifestamente insuficiente.

10 - Salvo o devido respeito, não só essa frase não chega como fundamentação da sentença, como a observância pelo tribunal «a quo» da livre apreciação da prova a que apela na justificação da decisão, não pode postergar os outros importantes princípios da investigação ou do inquisitório (art. 6° e 411° do CPC/2013), da aquisição processual (413° do CPC/2013), da universalidade dos meios de prova, os quais todos cooperam no contencioso, seja judicial, seja administrativo, como ocorreu in casu.

11 - Acresce que nos termos do n° 5 do artigo 607º do CPC/2013 a livre apreciação da prova não se estende a factos provados por documentos, que, no caso, são muitos os que constam dos autos com relevo para a boa decisão da causa, mas que o tribunal «a quo» ignorou.

12- Mais, o PA não tem valor probatório superior a quaisquer outros documentos ou a outros meios de prova legalmente admissíveis no processo judicial, o mesmo não faz fé em juízo, pelo que valem todas as regras decorrentes dos artigos 341º ss do Código Civil.

13- Atentos os amplos poderes inquisitórios que tem o Julgador, ele não se pode contentar com o que consta do PA (na versão trazida na contestação) quando existem muitos outros documentos e meios de prova ao seu dispor que visam contraditar os fundamentos ou pressupostos factuais nos quais se fundou o ato administrativo impugnado, pelo que a prova a produzir não pode, de forma alguma, ficar limitada ou condicionada pela existência do PA, sob pena de violação do princípio da igualdade das partes (artigo 4º do CPC/2013).

14 - Acresce que não se conhece a análise crítica da prova feita pelo Julgador, ignora-se os motivos pelos quais se formou a sua convicção, para além da evidente adesão ao alegado pelo R. na contestação.

15 - Sobre isto nada ficou dito, sendo certo que toda a matéria alegada na p.i. e controvertida era relevante para uma decisão correta e ponderada da causa, de acordo com as várias soluções jurídicas que poderiam ser encontradas.

16 - O tribunal afirma no ponto 8. da matéria assente, existir situação de incumprimento injustificado? (fá-lo porque o ponto 6° da contestação o afirmava?!) Como é manifesto não se encontram provados quaisquer factos de onde se possa extrair essa conclusão. Sendo certo que o afirmado trata-se de uma conclusão do Réu. Ora, que se sabia, a matéria assente deve-se restringir a factos. As conclusões, extrai-as depois o tribunal na análise da matéria de facto.

17 - O tribunal afirma no ponto 3. da matéria assente que «após várias análises à execução do projeto verificou-se...» (fá-lo porque o ponto 3° da contestação o afirmava?!).

Salvo o devido respeito, o afirmado trata-se de uma conclusão do Réu. Como se acaba de afirmar, a matéria assente deve-se restringir a factos. As conclusões extrai-as, depois, o tribunal na análise da matéria de facto.

18- Afirma o tribunal no ponto 4 da matéria assente que os autores não lograram, no ano de 2009 manter os postos de trabalho. Mais uma vez, trata-se de uma conclusão, pelo que, tal como as outras, não deve integrar a matéria provada.

19- Dá o tribunal no ponto 7, como matéria assente não ter o promotor, na resposta de 11-02-2010 "trazido factos novos que pudessem alterar aquela intenção de resolução".

20- Mais uma conclusão extraída pelo Réu no item 5° da contestação, pelo que, tal como as outras, não deve integrar a matéria provada.

21- Afirma também no ponto 10 da matéria assente que os AA. não apresentaram reclamação, tal como alegado pelo Réu no item 8° da contestação, mas erradamente, porquanto os AA. usaram do exercício do direito de audiência prévia quando forma notificados da proposta de decisão, tal como consta do PA., na sequência da notificação que lhes foi feita e referida em 6 da matéria assente, onde contraditaram esse projeto de decisão.

22- Termina o acórdão com a afirmação de que «não se deram como provados quaisquer outros factos com relevo para a decisão a proferir.» - o que se impugna e já se demonstrou não ser verdade, pois toda a factualidade alegada pelos AA. na petição foi impugnada na contestação apresentada pelo Réu, em que expressamente nos itens 11° e 12° declara que "devem ter-se por contraditados todos os factos alegados pelo Autor que estejam em desconformidade com o constante no presente articulado JJ e que "cumpre realçar a versão correta dos factos, ainda que seja diferente à expendida pelo A.

23- É, pois manifesto que não pode manter-se a decisão de facto proferida.

24- Há evidente erro de julgamento, quer de facto, quer de direito, por força da incorreta interpretação e aplicação do disposto nos artigos 90º do CPTA, 266º n° 2 da CRP e ainda os artigos 5°,100°,101° n° 3 do CPA.

25- Mais, é clara e evidente a insuficiência da matéria de facto provada, perante a miríade de matéria controvertida existente nos autos, e que supra se transcreveu, da qual os AA. tinham-se proposto fazer a prova, arrolando testemunhas e juntando documentos.

26- O acórdão recorrido, louvando-se apenas na alegação do réu e seguindo o entendimento por este defendido, limitou-se a dar como provados os factos invocados pela administração, fazendo tábua rasa do alegado pelos AA. e por toda a documentação por estes junta.

27- Assiste aos AA. o direito a produzir prova. a provar como foi e em gue circunstancialismo tudo ocorreu, afim de depois, o tribunal na posse de todos os elementos, e fazendo a análise crítica da prova...

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