Acórdão nº 100/19.3BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelPEDRO NUNO FIGUEIREDO
Data da Resolução30 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I. RELATÓRIO O Centro de Apoio Social de Pais e Amigos da Escola n.º 10 (CASPAE) requereu no Tribunal Arbitral do Desporto (TAD), ao abrigo da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto (LTAD), aprovada pela Lei n.º 74/2013, de 6 de setembro, na redação da Lei n.º 33/2014, de 16 de junho, arbitragem necessária contra a Associação de Natação de Coimbra (ANC) e a Federação Portuguesa de Natação (FPN), apresentando os pedidos seguintes: i) condenação_das Demandadas Federação Portuguesa de Natação e Associação de Natação de Coimbra à inscrição imediata das equipas e demais atletas da Demandante que se encontram pendentes, bem como a atribuição imediata de pistas nos termos e horários por si anteriormente solicitados; ii) declaração de ilegalidade dos artigos 24.º a 26.º do Regulamento de Transferências da Federação Portuguesa de Natação e do Anexo II ao Regulamento dos Direitos de Formação e Compensação da mesma entidade; iii) nulidade da deliberação da demandada Federação Portuguesa de Natação de liquidação a favor do Clube Fundação Beatriz Santos da quantia de 11.984,00 euros; iv) nulidade do processo disciplinar em curso contra a demandante que corre os seus termos no Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Natação; v) condenação das demandadas ao pagamento dc danos desportivos patrimoniais e não patrimoniais; vi) condenação das demandadas em custas e demais despesas devidas.

Citadas, ambas as demandadas apresentaram contestação.

Por acórdão de 21/06/2019, o TAD decidido, por maioria: a) declarar a inutilidade da condenação das demandadas à inscrição imediata de equipas e de praticantes desportivos da demandante, uma vez que tal já ocorreu na pendência do presente processo judicial; b) indeferir o pedido de atribuição de pistas à demandante nos termos por si requeridos por se considerar que a atuação nesse campo da demandada Associação de Natação de Coimbra se mostra conforme com a juridicidade administrativa, nomeadamente com os princípios da igualdade e da imparcialidade; c) declarar a inaplicabilidades das normas contidas nos artigos 24.º a 26.º do Regulamento de Transferências da Federação Portuguesa de Natação e do Anexo II ao Regulamento dos Direitos de Formação e Compensação da mesma federação desportiva à situação em análise nos presentes autos, em virtude de as mesmas apenas poderem ser aplicadas quando exista contrato de trabalho desportivo ou contrato de formação desportiva; d) declarar a nulidade da decisão comunicada pela demandada Federação Portuguesa de Natação à demandante em 17 de maio de 2018, que procedeu à liquidação de uma compensação financeira a pagar pela mesma à Fundação Beatriz Santos e à primeira entidade; e) declarar a inutilidade da pretensão de declaração de nulidade de procedimento disciplinar instaurado pela demandada Federação Portuguesa de Natação por se ter apurado a inexistência do referido procedimento; f) Condenar a demandada Federação Portuguesa de Natação ao pagamento de uma indemnização à demandante, a título de responsabilidade civil por facto ilícito e culposo, cujo valor em concreto deve ser calculado em incidente de liquidação, nos termos do artigo 358.º, n.º 2, do Código de Processo Civil; g) Absolver a demandada Associação de Natação de Coimbra do pedido indemnizatório formulado pela demandante.

Inconformada, a FPN interpôs recurso desta decisão, pugnando pela respetiva revogação, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem: “1 - O presente recurso vem interposto do acórdão arbitral proferido pelo Colégio Arbitral constituído junto do Tribunal Arbitral do Desporto, proferido no dia 21 de Junho de 2019, na parte em que decidiu "c) Declarar a inaplicabilidade das normas contidas nos artigos 24° a 26° do Regulamento de Transferências da Federação Portuguesa de Natação e do Anexo II ao Regulamento dos Direitos de Formação e Compensação da mesma federação desportiva à situação em análise nos presentes autos, em virtude de as mesmas apenas poderem ser aplicadas quando exista contrato de trabalho desportivo ou contrato de formação desportiva", bem como na parte em que decidiu "d) Declarar a nulidade da decisão comunicada pela Demandada Federação Portuguesa de Natação à demandante em 17 de maio de 2018, que procedeu à liquidação de uma compensação financeira a pagar pela mesma à Fundação Beatriz Santos e à primeira entidade", e, bem assim, no segmento decisório que condenou "f) a Demandada Federação Portuguesa de Natação ao pagamento de uma indemnização à Demandante, a título de responsabilidade civil por facto ilícito e culposo, cujo valor em concreto deve ser calculado em incidente de liquidação, nos termos do artigo 358°, n.º 2, do código de Processo Civil ".

2 - A parte em que o tribunal "a quo" decidiu "c) Declarar a inaplicabilidade das normas contidas nos artigos 24° a 26° do Regulamento de Transferências da Federação Portuguesa de Natação e do Anexo II ao Regulamento dos Direitos de Formação e Compensação da mesma federação desportiva à situação em análise nos presentes autos, em virtude de as mesmas apenas poderem ser aplicadas quando exista contrato de trabalho desportivo ou contrato de formação desportiva" está ferida de nulidade e deve ser revogada por violação dos artigos 2.° e 202.°, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, 14.°, alíneas a), ponto i), e b), da Lei n.º 5/2007, de 16.1 (LBAFD), 10.°, 11.º e 13.°, n.ºs 1, alínea g) e 2, do Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31.12, republicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 93/2014, de 23.6 (RJFD) e (desaplicação dos) 24.° a 26.° do Regulamento de Transferências da FPN, aprovado pela respectiva Direcção em 27 de Maio de 2016.

3 - O Colégio Arbitral andou, manifestamente, mal ao pronunciar-se sobre a inaplicabilidade dos artigos 24. ° a 26. ° do Regulamento de Transferências da FPN ao invés de, como lhe era imposto, se limitar a decidir sobre a legalidade das normas regulamentares constantes daqueles artigos, permitindo-se, antes, e ilegitimamente, exprimir uma valoração sobre a opção tomada pela FPN ao fazer consagrar no seu Regulamento de Transferências a disciplina da - "Artigo 24. ° - Transferência de Praticantes Não Vinculados Por Contrato; Artigo 25. ° - Condições de Transferência de Praticantes e - Artigo 26° - Compensação pela Transferência de Praticantes não Vinculados por Contrato".

4 - O tribunal "a quo" deveria conhecer que os poderes de regulamentação, organização, direcção e disciplina no âmbito da natação portuguesa são prerrogativas públicas e exclusivas da FPN, que decorrem da lei e do seu estatuto de utilidade pública desportiva, pelo que, apenas por si, FPN, ora recorrente, podem ser exercidos no território nacional, o que abrange, nomeadamente, a definição das normas aplicáveis à modalidade sobre a transferência de praticantes desportivos, inclusive, de praticantes de natação (que são amadores - artigo 3.° n.º 2 dos Estatutos da FPN, estatutos a que o Colégio Arbitral alude no artigo 3.° da "III - Fundamentação de facto") sem contrato de trabalho desportivo ou sem contrato de formação desportiva.

5 - "O estatuto de utilidade pública desportiva confere a uma federação desportiva a competência para o exercício, em exclusivo, por modalidade ou conjunto de modalidades, de poderes regulamentares, disciplinares e outros de natureza pública, bem como a titularidade dos direitos e deveres especialmente previstos na lei"; “Têm natureza pública os poderes das federações desportivas exercidos no âmbito da regulamentação e disciplina da respetiva modalidade que, para tanto, lhe sejam conferidos por lei” e "As federações desportivas têm direito (...) A regulamentação dos quadros competitivos da modalidade".

(Artigos 10. °, 11° e 13. ° do RJFD) 6 - O Colégio Arbitral ignorando o conteúdo e o sentido daquelas normas, inequivocamente habilitantes da competência da FPN para regulamentar as situações de transferência e compensação pela transferência de praticantes desportivos sem contrato de trabalho desportivo ou de contrato de formação desportiva, a que correspondem os artigos 24.° a 26.° do seu Regulamento de Transferências, decidiu, in casu, que estes eram inaplicáveis, desaplicando-os infundadamente.

7 - O Colégio Arbitral ”considerando que a LBAFD e o RJFD são omissos a esse respeito", especificamente sobre as situações de transferência e compensação pela transferência de praticantes desportivos sem contrato de trabalho desportivo ou de contrato de formação desportiva firmados, formulou um mero prognóstico referindo, imagine-se, que, a mesma, "a existir” “haveria de encontrar-se no Regime Jurídico do Contrato de Trabalho de Praticante Desportivo e de Contrato de Formação Desportiva, anteriormente aprovado pela Lei n.º 28/98, de 26 de junho, e agora plasmado na Lei n.º 54/2017, de 14 de julho".

8 - O tribunal "a quo" concluiu, opinativa e erroneamente, que "os poderes regulamentares das federações desportivas ao nível da transferência de praticantes desportivos pressupunham sempre a existência de contrato de trabalho desportivo ou de contrato de formação desportiva", quando o entendimento que se alcança daqueles diplomas legais é precisamente o oposto, porquanto, a dita Lei n.º 28/98, de 26 de Junho, na vigência da qual foi aprovado o Regulamento de Transferências da Federação Portuguesa de Natação, estabelecia no artigo 1.° que "O presente diploma estabelece o regime jurídico do contrato do praticante desportivo e do contrato de formação desportiva", sendo que, é óbvio, quanto aos atletas vinculados mediante contrato de trabalho desportivo ou por contrato de formação desportiva, tal lei disciplinava, efectivamente, a sua transferência nos termos do disposto nos seus artigos 18.° e 20 °, ou seja, naquele âmbito, a aplicação das regras sobre a transferência de praticantes desportivos cinge-se exclusivamente, nos termos da lei, aos casos em que exista contrato de trabalho desportivo ou...

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