Acórdão nº 1932/19.8BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução16 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Ministério da Administração Interna, devidamente identificado nos autos de ação administrativa urgente instaurada por S............

, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 24/12/2019, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou a ação procedente, condenando-o à reconstituição do procedimento relativo ao pedido de proteção internacional, procedendo à audiência prévia do requerente e à instrução do pedido para efeitos de determinar se encontram preenchidos os pressupostos de aplicação da cláusula de salvaguarda constante do artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento Dublin II em relação à transferência para Itália, assim como a apreciar as informações coligidas e decidir com conformidade.

* Formula o Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “A. Resulta evidente que o Tribunal ad quo na sua ponderação e julgamento do caso sub judice fez uma interpretação incorreta dos critérios e mecanismos de determinação do Estado Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional apresentado por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida. Vejamos então, B. O recorrido formulou pedido de proteção internacional no Gabinete de Asilo e Refugiados do ora recorrente, o qual foi seguido de uma entrevista pessoal realizada em 08 de Agosto de 2019 nas instalações do SEF.

C. A entrevista supra referida foi realizada de acordo com o que vem determinado no art.º 5º Regulamento EU nº 604/13 Do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de junho de 2013.

D. Com interesse determinam o nº 1e 6 daquele normativo, respetivamente, o seguinte: “1 - A fim, de facilitar o processo de determinação do Estado-Membro responsável, o Estado-Membro que procede à determinação, realiza uma entrevista pessoal com o requerente. A entrevista deve permitir, além, disso, que o requerente compreenda devidamente as informações que lhe são facultadas nos termos do artigo 4ª (...) 6- O Estado-Membro que realiza a entrevista pessoal deve elaborar um resumo escrito do qual constem, pelo menos, as principais informações facultadas pelo requerente durante a entrevista. Esse resumo pode ser feito sob a forma de um relatório ou através de um formulário tipo. O EstadoMembro assegura que o requerente e/ou o seu advogado ou outro conselheiro que o represente tenha acesso ao resumo em tempo útil.

” E. Quanto ao art.º 4º atinente ao direito á informação determina o mesmo que: 1- Após a apresentação de um pedido de proteção internacional, na aceção do artigo 20º, nº 2, num Estrado-membro, as suas autoridades competentes informam o requerente da aplicação do presente regulamento e, em especial, dos seguintes elementos: a) Os objetivos do presente regulamento e as consequências da apresentação de um novo pedido num estado-Membro diferente, bem como as consequências da deslocação de um Estado-Membro para outro durante o processo de determinação do Estado-Membro responsável nos termos do presente regulamento durante a análise do pedido de proteção internacional; b) Os critérios de determinação do estado-Membro responsável, hierarquia desses critérios durante as diversas etapas do procedimento e a duração das mesmas, nomeadamente que a apresentação num Estado-Membro de um pedido de proteção internacional pode implicar que esse Estado-Membro passe a ser o responsável nos termos do presente regulamento mesmo que essa responsabilidade não decorra dos critérios; c) A entrevista pessoal nos termos do artigo 5º e a possibilidade de informar da presença de membros da fami1 ia, de familiares ou de outros parentes nos Estados-Membros; bem como os meios de que o requerente dispõe para transmitir essas informações· d) A possibilidade de contestar uma decisão de transferência e, se necessário, de pedir a suspensão da transferência; e) O facto de as autoridades competentes dos Estados-Membros poderem trocar dados sobre o requerente unicamente para dar cumprimento às suas obrigações decorrentes do presente regulamento; j) (...) 2- As informações referidas no nº 1 devem ser facultadas por escrito numa língua que o requerente compreenda ou que possa razoavelmente presumir que compreenda. Para o efeito, os Estados-Membros devem utilizar o folheto informativo comum nos termos do n 3.

Caso se afigure necessário para a correta compreensão por parte do requerente, as informações também devem ser facultadas oralmente, por exemplo no âmbito da entrevista pessoal a que se refere o art.º 5º.

” F. Ora, atendendo e respeitando as normas e critérios estabelecidos no Regulamento, foi, em conformidade, realizada a entrevista, que se encontra documentada e como tal provada a fls. 21 e ss do processo administrativo.

G. Contrariamente ao que vem dito na Douta Sentença, o ora recorrente cumpriu com todas as suas obrigações legais, nomeadamente ouviu o recorrido em entrevista de acordo com o que vem determinado, sendo que indagou não só pelos motivos que determinaram o seu pedido de proteção internacional, como também solicitou informação sobre o seu percurso desde que saiu do país de origem até chegar a Portugal.

H. Em declarações que constam a fls. 25 do processo administrativo o recorrido declarou que quando chegou à Itália pediu asilo, fez a entrevista e que lhe deram resposta negativa, da qual, recorreu. Permaneceu em Itália cerca de dois anos, mas não quer regressar porque lhe disseram que iria para um campo maior e não quer ir para lá. Quer ficar em Portugal porque quando aqui entrou ficou agradado e sabe que vai ser bem tratado.

I. Ora das declarações do recorrido durante o procedimento administrativo, e desde já se sugere a sua leitura integral e atenta, não decorre que o mesmo tivesse sofrido de maus tratos ou que o sistema de asilo em Itália o tivesse afetado de tal modo que pudesse sugerir a existência de falhas sistémicas e que essas falhas sistémicas o tenham afetado diretamente.

J. Por essa razão não se afigura que os argumentos pelos quais se pautou o Tribunal ad quo possam vingar, pois as autoridades administrativas em momento algum do procedimento administrativo foram confrontadas com declarações que pudessem inferir tratar-se de alguém que sofreu maus tratos ou que no país onde solicitou proteção internacional, in caso, Itália tivesse sido afetado por eventuais falhas sistémicas no procedimento de asilo.

K. Procedimento de asilo que aliás no caso concreto foi objeto de análise pelas autoridades Italianas que entrevistaram o ora recorrido, ouviram-no em declarações onde terá exposto os motivos do seu pedido de proteção internacional, tendo o mesmo, a final, sido negado por não cumprir os critérios de concessão de proteção internacional.

L. Aliás, partindo do pressuposto que os motivos invocados pelo recorrido, junto das autoridades Italianas, para justificar o pedido de proteção internacional, foram os mesmos que invocou junto das autoridades portuguesas, então afigura-se que aquelas não atuaram sob um sistema de falhas sistemáticas, mas sim e tão somente em conformidade com os pressupostos de concessão de proteção internacional.

M. Atente-se que o recorrido em auto de declarações administrativo alegou que o seu pedido de proteção internacional tinha por base o facto de ter tido problemas familiares no país de origem, nada tendo que ver com os pressupostos para beneficiar do regime de proteção internacional. (vide fls 26 e ss. do processo administrativo) N. Afigura-se ao recorrente que a jurisprudência citada na Sentença recorrida em nada vem abalar a convicção do recorrente de que foram respeitadas normas do procedimento de determinação do Estado Responsável pela análise pedido de proteção internacional.

O. Na verdade, a jurisprudência citada refere-se sempre a casos concretos que foram levados ao TEDH por efetiva existência de situações perfeitamente identificadas e respeitantes a um universo bastante restrito de migrantes que por causa da sobrelotação, foram vítimas de falhas no sistema de asilo e consequentemente de maus tratos, sendo que todas se reportaram ao período compreendido entre 2015 e 2017.

P. Assim se é verdade que em situações pontuais e perfeitamente identificadas tenham ocorrido situações em que o sistema de asilo em Itália falhou, não é menos verdade que na generalidade o sistema respondeu dentro dos limites que lhe são impostos, não se podendo em bom rigor dizer que se tratava de uma falha sistemática do sistema de asilo, mas tão somente de uma falha sistémica, porém pontual, do sistema de asilo em Itália, o qual tem sido nos últimos dois anos objeto de satisfatória melhoria, mormente com a ajuda e intervenção dos organismos responsáveis da União Europeia.

Q. Podemos concluir do que foi dito que, é falho o que vem sustentado na Sentença recorrida, pois ao longo de todo o procedimento administrativo o ora recorrido não referiu ter sido vítima nem de maus tratos, e neste caso refira-se que os maus tratos referem-se a condições tais que a pessoa se veja privada dos mais elementares bens e serviços necessários para garantir a sua sobrevivência condigna, nem de falhas no sistema de asilo, pois que no seu caso efetuou o pedido, obteve resposta da qual recorreu, mas deliberadamente não esperou pelo veredito do tribunal, tendo antes optado sair de Itália (depois de dois anos) e dirigir-se apara outro país dentro do Espaço Europeu.

R. Foi por constatar que se encontravam reunidas as condições de determinação de EstadoMembro responsável que o ora recorrente encetou diligências nesse sentido, pelo que, confirmada a Itália como Estado responsável por já ter sido aí efetuado pedido de proteção internacional, o SEF, nos termos do artigo 37º, nº 1, e com sustento no mencionado registo EURODAC, solicitou às autoridades congéneres Italianas a retoma a cargo, ao abrigo do art.º 18º nº 1d) do Regulamento (UE) 604/2013 do...

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