Acórdão nº 548/19.3BECTB de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelDORA LUCAS NETO
Data da Resolução16 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório T..., não se conformando com a sentença do TAF de Castelo Branco, de 29.02.2020, que indeferiu o pedido de decretamento de providência cautelar de suspensão de eficácia da decisão de recuperação do pagamento indevido de ajuda – prémio à instalação de jovem agricultor, no valor de €30.000,00, no âmbito da operação n.º 02... - que intentou contra o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP (doravante IFAP), veio interpor recurso da mesma.

Em sede de alegações de recurso, o Recorrente conclui da seguinte forma: «(…) A) O presente recurso vem interposto da douta sentença que indeferiu o decretamento da presente providência cautelar com a qual, pese embora o mais elevado respeito, o aqui recorrente não se conforma, pelas razões e com os fundamentos supra alegados e sintetizados nestas conclusões.

B) O recorrente começa por não se conformar com o douto despacho, proferido na fase de saneamento da causa, que considerou não haver necessidade em determinar a abertura de um período de produção de prova testemunhal, o qual aqui vai também impugnado por ser a fase própria para o fazer (Ac. de 19-12-2017 do TCAS).

C) O Tribunal faz recair sobre o recorrente a prova da sua gestão de facto da exploração, mas impede-o de fazer tal prova porque indeferiu o pedido de produção da prova testemunhal por ele requerido, sendo certo que, para provar a gestão que faz da exploração, o recorrente necessita de o fazer através de prova testemunhal através da qual demonstrará o trabalho de tomar decisões para governar a exploração, comandar os destinos da exploração e tomar as demais decisões de administração, com o que exerce, também, a sua gestão de facto.

D) Consequentemente deve ser revogada a douta sentença recorrida, ordenando-se a abertura de produção de prova testemunhal e, só após a mesma ser produzida, deve ser proferida douta sentença que conclua pelo deferimento da presente providência cautelar.

E) A douta sentença recorrida concluiu pela improbabilidade de procedência da ação principal, (já proposta pelo aqui recorrente à data em que foi prolata a sentença ora recorrida,), o que, segundo o Mmº Juiz a quo, é suficiente para que o pedido de decretamento da providência deva ser indeferido e, consequentemente, foi decidido indeferir o pedido de decretamento da providência, fixando ao incidente o valor de €30.000,00 e condenar o recorrente no pagamento das custas.

F) Na douta sentença recorrida apenas é feita menção a esta ação principal, quando o Mmº Juiz regista – e bem – que a ação administrativa de impugnação já foi “entretanto intentada”, mas, com critério diferente (mas não desvendado) o Mmº Juiz a quo teve a preocupação de proceder à consulta do processo judicial 544/19.0BECTB, em tramitação naquele Tribunal e do processo administrativo junto a esse processo (no qual o aqui recorrente não é parte) (vide resposta aos factos provados nos pontos 3., 20., 21. 28., 29., 31., 53.) G) Assim o Mmº Juiz a quo, conheceu, nos presentes autos de matéria que não foi nos mesmos alegada nem pelo Requerente nem pelo Requerido, vejam-se os pontos 3., 20., 21., 28., 31. 53., o que aqui se alega para todos os legais e devidos efeitos, pelo que daí devem ser retiradas todas as legais consequências.

H) Relativamente à falta de realização de audiência prévia, ao contrário do que considerou o Mmº Juiz a quo, foi a entidade requerida que considerou que a resposta dada pelo requerente ao IFAP em 09-08-17, não equivalia a audiência prévia e, por isso, após tal resposta decidiu dispensar a audiência prévia.

I) Ao contrário do que foi consignado na douta sentença recorrida, o Requerente não foi efetivamente ouvido, antes da tomada da decisão final, sobre todas as questões com interesse para a decisão, em matéria de facto e de direito [CPA, 121.º, n.º 1].

J) Não obstante o entendimento contrário expendido na sentença pelo Mmº Juiz a quo, o recorrente reafirma que a decisão de dispensa de audiência de interessados não foi fundamentada nos termos exigidos pelo n.º 2 do artigo 124.º do CPA, conforme, aliás, deixou alegado nos art.ºs 10.º a 24.º do r.i. uma vez que tal decisão (a) não indica as razões, os fundamentos e a justificação para a não realização da audiência prévia e, (b) não basta referir “porquanto tomou conhecimento do incumprimento que implicava o reembolso das quantias indevidamente recebidas”, já que tal expressão, não corresponde à verdade e não serve de justificação, fundamento e razão para a não realização da audiência.

K) O Recorrente não foi notificado de que o alegado incumprimento implicava o reembolso das quantias indevidamente recebidas e nem de que o reembolso era do valor de 30.000,00€, somente tendo sido notificado de alegadas desconformidades e irregularidades, suscetíveis de consubstanciarem uma situação de incumprimento da legislação aplicável e do contrato celebrado.

L) O Recorrente não foi notificado, nem ao mesmo foi facultado, ou por qualquer outro modo lhe foi dado a conhecer, o Relatório nº 1350 a fim de apreciar as invocadas desconformidades/irregularidades que justificam, alegadamente, incumprimentos do contrato celebrado, como, aliás, foi considerado provado no ponto 44. dos Factos provados, tendo em conta a confissão do Requerido.

M) Vir, agora, o Tribunal decidir que existiu audiência prévia do recorrente é decidir contra os factos alegados pelas partes, uma vez que o recorrente alega que não foi realizada a audiência prévia e com isso foram violados os seus direitos e o recorrido alega que não foi realizada a audiência prévia mas pugna pela dispensa da mesma.

N) O Tribunal ao decidir, como decidiu, que foi realizada a audiência prévia, feriu de nulidade a decisão uma vez que, assim decidindo o Tribunal violou o disposto no art.º 608.º n.º 2, 2ª parte do CPC dado que, de acordo com este preceito legal “O Juiz (…) não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes (…)”, pelo que a douta sentença recorrida incorreu na nulidade prevista na 2ª parte da al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, ao conhecer desta questão de que não podia tomar conhecimento por não ter sido alegada por nenhuma das partes.

O) Consequentemente, pelas razões e com os fundamentos invocados, deve a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que decida que, in casu, não foi realizada a audiência prévia e, por isso, a decisão objeto dos presentes autos violou o direito fundamental da participação do recorrente/interessado na formação da decisão, objeto dos presentes autos (artº 12º do CPA e 267º/1 e 5 da CRP).

P) Apreciando a alegação sobre o erro de direito e de facto da decisão impugnada, o Mm.º Juiz a quo procedeu a uma minuciosa e detalhada exposição sobre a evolução da regulamentação, a nível do direito Europeu, das ajudas aos jovens agricultores, após o que passou a efetuar uma não menos laboriosa exposição da evolução, no plano nacional, da regulamentação de tal matéria.

Q) Da evolução legislativa e respetiva regulamentação decorre que foi abandonada a exigência inicial da atividade agrícola ser atividade exclusiva e a exigência de ser atividade principal, nada dispondo os Regulamentos atualmente quanto à exigência de se tratar de atividade exclusiva, ou sequer principal.

R) A supra transcrita interpretação da lei e do Regulamento de Aplicação da Acção n.º 1.1.3 feita pelo Mmº Juiz a quo segundo a qual “(…) para se verificar a instalação, para efeitos do disposto nessa alínea, - (al d) do art 3º do Regulamento) - o jovem agricultor tem, não só de ser materialmente [i.e., de facto] o gestor da exploração, como tem de assumir formalmente [i.e., de direito] as funções de gestão.”, contraria a lei, excedendo, inadmissivelmente, o texto da mesma e contrariando a própria evolução legislativa.

S) A norma jurídica em apreço (al. d) do artº 3º da Portaria n.º 357-A/2008, de 9 de Maio, (que aprovou o Regulamento de Aplicação da Acção n.º 1.1.3, «Instalação de Jovens Agricultores», cuja redação em vigor na data do contrato [Abril de 2013 – cfr. o facto provado n.º 14] era a que lhe foi conferida pela Portaria n.º 184/2011, de 5 de Maio, que a republicou), não admite a interpretação extensiva, que é feita pelo Mmº Juiz a quo, já que a interpretação extensiva só é possível quando o intérprete, ao reconstituir a parte do texto da lei, segundo os critérios estabelecidos pelo artigo 9º, do CC, conclua pela certeza de que o pensamento legislativo coincide com um dos sentidos contidos na lei, o que não acontece nos presentes autos.

T) Não assiste razão ao Mmº Juiz a quo quando afirma que “Não tem, pois, aquela definição da alínea d) do artigo 3.º do REGULAMENTO DE APLICAÇÃO DA ACÇÃO N.º 1.1.3, o sentido de dispensar a gestão de facto, antes o de exigir que coincidam gestão de facto e a assunção formal dessa realidade de facto” e, tanto assim é que, o IFAP, quando aprovou a candidatura do aqui recorrente, reconhecendo-o como jovem agricultor, bem sabia que o mesmo não tinha residência permanente no local da exploração agrícola mas sim em Aveiro.

U) Por assim ter acontecido o recorrente não aceitar e muito menos reconhece que se lhe aplique a afirmação/insinuação feita pelo Mmº Juiz a quo segundo a qual “O jovem agricultor não pode, portanto, ser mero testa-de-ferro do efetivo explorador do estabelecimento agrícola, sob pena de fraude na obtenção de subsídio.” V) Na Portaria n.º 357-A/2008, de 9 de Maio, não consta, nos critérios de elegibilidade dos beneficiários ou nos critérios de elegibilidade das operações, qualquer referência à distância da residência do Jovem Agricultora da exploração ou à obrigatoriedade da presença física na exploração, realidade esta que o Mmº Juiz a quo ignorou na douta sentença recorrida.

W) O Mmº Juiz a quo decidiu que: “O processo administrativo reunia, portanto, prova que permitia à entidade requerida concluir (presumir – presunção “natural”, “de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT