Acórdão nº 908/18.7BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCHÃO MARQUES
Data da Resolução16 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório L...

propôs no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria contra o Estado Português acção administrativa comum, na qual peticionou a condenação do R. ao pagamento de EUR 6.000,00, a título de danos não patrimoniais por responsabilidade civil extracontratual por atraso na justiça, montante acrescido de juros vincendos.

Alegou que o processo-crime com o n.º 72/11.2PATNV, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo Central Criminal, em que o Autor foi absolvido, demorou seis anos e dez meses até ser proferida a decisão final. Face ao impacto negativo que a demora do processo lhe causou, entende que deve ser indemnizado no montante de EUR 6.000,00, correspondendo EUR 1.000,00 a cada ano de atraso.

Por sentença de 2.07.2019 a acção foi julgada parcialmente procedente e condenado o Estado Português ao pagamento de EUR 1.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

Nas alegações do recurso interposto o A., ora Recorrente, conclui do seguinte modo: «IMAGEM NO ORIGINAL» O Ministério Público, em representação do Estado, ora Recorrido contra-alegou, concluindo do seguinte modo: 1. Tendo em consideração a factualidade dos presentes autos e respeitada a doutrina e a jurisprudência actualmente maioritárias quer no TEDH, quer nos Tribunais Nacionais, foi decidido, pela Mma. Juiz subscritora da sentença recorrida, condenar o demandado no pagamento da quantia de 1.000 Euros (mil euros), ao Autor W, “a título de danos não patrimoniais sofridos pela demora no do Proc. nº 72/11.2 PATNV”.

  1. Face à fundamentação de facto e de direito da mesma, entendemos não assistir qualquer razão ao recorrente, no que respeita ao quantum indemnizatório o que, em nosso entender, resulta evidente da mera leitura atenta da douta decisão recorrida e das normas legais, doutrina e jurisprudência aplicáveis, in casu, as quais foram integralmente respeitadas, no presente caso concreto.

  2. De facto, o Tribunal apurou devidamente a matéria factual dos autos e respeitou os critérios indemnizatórios da jurisprudência do TEDH e Nacional, como facilmente se pode constatar da leitura dos diversos Acórdãos citados a fls. 46 a 58 da sentença recorrida, cujo teor aqui damos como integralmente reproduzido.

  3. Por todo o exposto e tendo em consideração as especificidades do presente caso concreto, bem como a deficitária situação económico-financeira do país, resulta óbvia, em nosso entender, a conclusão de que nunca poderia ser legitimamente aplicável, in casu, o quantum indemnizatório pretendido pelo Autor, o qual afigura-se-nos carecer de qualquer fundamento plausível ou razoável.

  4. Não se nos afigura, por todo o exposto, merecer qualquer reparo a douta sentença recorrida, no que respeita à questão supra referida, tanto mais que, ao proferi-la, a Mma. Juiz, apurou de forma detalhada todos os factos pertinentes in casu e fundamentou devidamente a sua convicção, quer de facto, quer de direito, respeitando integralmente as normas legais aplicáveis ao presente caso concreto, sendo certo que o Tribunal pode reduzir equitativamente o quantum debeatur se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa – que, pelas vicissitudes registadas no âmbito do Processo nº 72/11.2 PATNV, sumariamente descritas na douta sentença recorrida, sempre seria mínima – e o dano alegadamente sofrido.

  5. No que respeita, por seu lado, ao pagamento dos juros vincendos, constata-se que os mesmos efectivamente foram peticionados e são devidos, mas apenas e tão só na parte respectiva à quantia em que o Estado foi condenado, como decorre implicitamente do disposto na al. a) do dispositivo da douta sentença recorrida, conjugado com o disposto nos art. 805º e 806º do Código Civil (cfr., no mesmo sentido e a título de exemplo, os Acórdão do TCA Sul de 31.01.2018, 4.04.2019 e o Ac. do TCA Norte de 22.10.2010).

    Neste TCA foi proferido despacho em 28.01.2020, do seguinte teor: “1.

    O requerimento de recurso que vem interposto contém 5 páginas de alegações (não articuladas) e 7 páginas de conclusões.

  6. No capítulo designado de "conclusões", o Recorrente identifica e transcreve diversa jurisprudência dos Tribunais Administrativos e do TEDH em matéria de responsabilidade do Estado pela morosidade na administração da Justiça.

  7. Sem que, nas mesmas “conclusões”, aponte um único preceito legal/norma jurídica que considere ter sido violada pelo tribunal recorrido; nenhum vício da sentença vindo concretamente identificado (para além da matéria contida na conclusão 19.ª, referente aos juros).

  8. A função do recurso ordinário é, no nosso direito, a reapreciação da decisão recorrida e não um novo julgamento da causa.

    Como previsto no art. 144.º, nº 2, do CPTA: “[o] recurso é interposto mediante requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão, que inclui ou junta a respetiva alegação e no qual são enunciados os vícios imputados à decisão e formuladas conclusões”.

  9. E a finalidade ou função das conclusões é definir o objecto do recurso, através da identificação abreviada dos fundamentos ou razões jurídicas, já desenvolvidos nas alegações, delimitando, desse modo, a pronúncia judicial.

    Nos termos do art. 639.º, n.º 1, do CPC: “[o] recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”.

  10. As conclusões são, pois, “proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação” (cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, p. 359).

  11. Assim, notifique o Recorrente para apresentar conclusões nos termos legalmente previstos, sob pena de rejeição do recurso na parte afectada.

    ” Pelo requerimento o ora Recorrente veio responder ao despacho supra identificado do seguinte modo: 1. o autor instaurou a acção à luz do s arts 1, 13º e 41º da CEDH; 2. o recurso tem em vista ver aplicada a Justiça da COUR EUROPEENNE em Portugal sendo inúmeras as condenações pelos Senhores Juizes de Estrasburgo; 3 o autor não pode nem deve estar sujeito a formalismo excessivo; a aplicação de regras processuais de uma forma excessivamente formal conduz à violação do artº 6º 1 da CEDH : affaire POIROT contra França, nº 29938/07 de 15 12 2011 e S.A. S otiris and Nikos Koutras ATTEE contra Grécia, nº 39442/98 de 16 11 2000.

    4 no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem basta a invocação do atraso e a identificação do processo para condenar qua tale o art º 6º 1 da CEDH; Pelo exposto o autor não modifica o recurso nem as Conclusões pois os danos estão provados existindo apenas discordância relativamente ao quantum fixado no douto TAC, devendo ser aplicada a Jurisprudencia da COUR in casu.

    • Com dispensa de vistos legais, importa apreciar e decidir.

    • I. 1.

    Questões a apreciar e decidir: Embora o Recorrente venha afirmar que “não modifica o recurso nem as Conclusões”, sustentando que “no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem basta a invocação do atraso e a identificação do processo para condenar qua tale o art º 6º 1 da CEDH” – o que, para além de se apresentar como não inteiramente correcto (pois sempre haverá que demonstrar que houve efectivo atraso imputável ao Estado), esquece que a presente acção é instaurada nos Tribunais portugueses e que os mesmos se regem pela lei adjectiva aplicável a título principal; no caso: o CPC e o CPTA - certo é que é possível extrair do mesmo requerimento, conjugadamente com a leitura das conclusões de recurso, que a única divergência relativamente ao decidido se prende com o quantum indemnizatório fixado no tribunal recorrido. Como afirma o Recorrente: “existindo apenas discordância relativamente ao quantum fixado no douto TAC”.

    Assim, as questões suscitadas pelo Recorrente, como vimos de explicitar e considerando ainda o princípio da promoção do acesso à justiça (cfr. art. 7.º do CPTA), traduzem-se em apreciar se o tribunal a quo errou na fixação do montante indemnizatório arbitrado, bem como se são devidos os juros de mora peticionados.

    • II.

    Fundamentação II.1.

    De facto Na sentença recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto: 1. No dia 22 de Fevereiro de 2011 foi instaurado nos serviços do Ministério Público na comarca de Torres Novas o processo n.º 72/11.2PATNV com vista à investigação de um furto qualificado, com base em auto de notícia elaborado pela Polícia de Segurança Pública de Torres Novas, onde se comunicava a ocorrência de factos, verificados entre as 20h00 do dia 12 de Fevereiro de 2011 e as 10h00 do dia 14 de Fevereiro de 2011, abstratamente integradores do crime de furto qualificado previsto e punível pelo artigo 204.º n.º 2, do Código Penal, praticados no estabelecimento comercial denominado “N...”, localizado em C..., em Torres Novas, freguesia de Salvador, distrito de Santarém (cf. documento a fls. 2 a 6 do processo n.º 72/11.2PATNV); 2. No dia 22 de Fevereiro de 2011 o auto de notícia descrito em 1 foi registado, distribuído e autuado como inquérito criminal e o magistrado do Ministério Público de turno determinou que se tratava de crime de investigação prioritária, nos termos da alínea b), do n.º 1, e n.º 2, do artigo 4.º, da Lei n.º 38/2009, de 20 de julho, e ordenou que o processo fosse concluído ao magistrado a quem fosse distribuído (cf. documento a fls. 2 a 6 do processo n.º 72/11.2PATNV); 3. No âmbito do processo de inquérito n.º 72/11.2PATNV foram incorporados os inquéritos n.º 463/08.6PATNV, referente a furto qualificado, n.º 80/10.0TATNV, referente a furto e recetação, n.º 1/11.3PAENT, referente a furto qualificado, n.º 206/11.7PATVNV, referente a furto qualificado, n.º 1490/09.1PBLRA, referente a furto de viatura, e n.º 390/10.7PATNV, referente a furto qualificado e realizadas escutas, buscas e apreendidos objetos melhor descritos nos autos (cf. acusação a fls. 2092 a 2013 e despachos a fls. 918, 1604 a 1606, a fls. 1685 a 1692, relatório a...

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