Acórdão nº 113/19.5BEFUN de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução05 de Março de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão 1. Relatório C...... e C...... intentaram no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, nos termos e ao abrigo, conjugadamente, do preceituado nos artigos 89.º - A, n.ºs 7 e 8, da Lei Geral Tributária (LGT) e 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), recurso contencioso contra a decisão de fixação do rendimento colectável de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), referente ao exercício de 2014, por métodos indirectos. 1.2. Alegaram, em resumo nosso, que: (i) a Administração Tributária não fundamentou devidamente o recurso a métodos indirectos, sendo, por essa razão, ilegítimo e ilegal o recurso a este meio de fixação da matéria tributável (artigos 11.º a 27.º da petição inicial); (ii) a decisão impugnada foi proferida em violação do seu direito de defesa, uma vez que a Administração Fiscal não ouviu as testemunhas arroladas no exercício do seu seu direito de audição prévia (artigos 28.º a 34.º da petição inicial); (iii) a referida fixação da matéria colectável por métodos indirectos foi proferida com erro sobre os pressupostos de facto e de direito porque justificou integralmente os acréscimos patrimoniais que suportam a decisão e que alegadamente constituiriam a “manifestação de fortuna evidenciada”(artigos 35.º a 83.º da petição inicial); (iv) a decisão impugnada viola os princípios constitucionais de tributação das pessoas singulares segundo o seu rendimento real, da proporcionalidade, da capacidade contributiva e da legalidade, bem como os princípios legais do inquisitório, da verdade material e “in dubio contra fiscum”, a que deve obediência e pelos quais deve pautar a sua actuação (artigos 83.º a 93.º da petição inicial).

1.3. A Fazenda Pública, devidamente notificada, deduziu oposição, pugnando pela improcedência total do recurso judicial por não se verificar nenhum dos vícios invocados na petição inicial

Concretizando, explicam que a decisão não padece de falta de fundamentação, por os pressupostos de facto e de direito sobre os quais foi proferida a decisão estão devidamente espelhados no Relatório de Inspecção

No que respeita à alegada violação do direito de defesa dos Recorrentes, defendem que a mesma não se verificou uma vez que os Recorrentes foram ouvidos e foram analisados os elementos documentais por eles apresentados, como se vê do reconhecimento que após essa audição a Administração Pública fez de parte do valor que a título de acréscimo patrimonial lhes era imputado, sendo que, no mais, não foi apresentada prova bastante para esse efeito

Enfrentando de forma especial a questão suscitada pelos Recorrentes no que respeita às testemunhas, esclareceu a Fazenda Pública que a sua não audição ficou a dever-se ao facto de não terem sido devidamente identificadas (e, consequentemente, não podia a Fazenda Pública estabelecer qualquer contacto), para além de que, constituía obrigação dos Recorrentes tê-las apresentado junto da Administração Tributária no prazo de 15 dias que lhes havia sido concedido para efeitos de audição prévia, o que não fizeram

Por fim, e ainda quanto à questão de não produção da prova requerida no procedimento, remata que os depoimentos das testemunhas sempre seriam irrelevantes por constituírem meio inidóneo para realização da prova dos factos vertidos no Relatório de Inspecção e que sustentaram a decisão de fixação da matéria colectável por recurso a métodos indirectos. É ainda com base nesta última argumentação que a Fazenda Pública termina a sua Oposição, pedindo ao Tribunal que não admita a prestação dos depoimentos de qualquer testemunha

1.4. Por despacho de 9 de Maio de 2019, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal suscitou oficiosamente a questão de suspensão dos autos - atenta a pendência de recurso jurisdicional da sentença de improcedência proferida no recurso da decisão de levantamento do sigilo bancário intentado pelos Recorrentes e a eventual impossibilidade de utilização de parte dos elementos de prova integrados no procedimento - tendo, após ouvir ambas partes, decidido, por despacho do dia 28, do mesmo mês e ano, determinar essa suspensão

1.5. Após trânsito em julgado do acórdão do Tribunal Central - que confirmou a sentença de 1ª instância que julgou válida a derrogação do sigilo fiscal - prosseguiram os autos a sua normal tramitação com a admissão dos requerimentos de prova apresentados pelos Recorrentes - declarações de parte e rol de testemunhas, com excepção da última (11.ª) testemunha arrolada, atento o preceituado no artigo 511.º do Código de Processo Civil (CPC)

1.6. Designada data de inquirição das testemunhas, vieram os Requerentes, na data da sua concretização, prescindir de quatro (4) das testemunhas arroladas, incluindo as testemunhas J...... e A...... (cfr. fls. 406, 421 e 422 dos autos).

1.7. As partes foram notificadas para apresentarem alegações escritas, o que os Recorrentes fizerem, mantendo, no essencial o que haviam aduzido em antecedentes articulados, tendo, de seguida, os autos sido apresentados com “Termo de Vista” ao Ministério Público que emitiu parecer no sentido de improcedência integral do recurso interposto pelos Recorrentes da decisão de fixação da matéria colectável por recurso a métodos indirectos

1.8. Proferida sentença julgando o recurso judicial da decisão de fixação da matéria colectável parcialmente procedente, ambas as partes interpuseram recurso jurisdicional, apresentando, simultaneamente, as suas alegações. 1.9. Para os Recorrentes no recurso judicial (neste acórdão serão sempre designados como Recorrentes independentemente da posição subjectiva que assuma nos recursos jurisdicionais) a sentença, na parte que julgou improcedente o seu pedido, padece de erro de julgamento de facto e de direito, o que determina a sua revogação, porque, em síntese: «a) o Tribunal a quo errou ao não considerar provados os factos a) e b) da matéria de facto dada como não provada; b) face a toda a prova produzida nos autos (documental, testemunhal e declarações de parte), o Tribunal a quo deveria ter dado como provados os factos a) e b) da matéria de facto dada como não provada; c) o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que, em 2014, J......, amigo do Recorrente, emigrado no Reino Unido, solicitou que este rececionasse na sua conta bancária o montante total de € 64.918,27, para entrega ao seu irmão A......, a fim deste realizar obras num terreno agrícola no Sítio das G......, em São Vicente; d) o Tribunal a quo deveria ter sido dado como provado que a receção do montante referido no ponto antecedente na conta pessoal do Recorrente deveu-se ao facto do irmão de J......, A......, não ter conta bancária em Portugal; e) foi junta aos autos uma declaração assinada e subscrita pelo Sr. J...... (Doc. 16 da pi), em que este expressamente reconhece e declara ter transferido e entregue ao Recorrente, no ano de 2014, o valor de € 64.918,27, para entrega ao seu irmão A...... para este realizar trabalhos no seu terreno agrícola no Sítio das G...... em São Vicente; f) a referida declaração, assinada pelo Sr. J......, não foi impugnada pela Fazenda Pública; g) a Fazenda Pública não contestou ou impugnou especificamente quaisquer factos articulados pelos Recorrentes na presente ação; h) a Fazenda Pública não impugnou qualquer documento junto pelos Recorrentes aos autos; i) dando-se como provado e justificado o montante de € 64.918,27 transferido pelo Sr. J...... ao ora Recorrente, o Tribunal a quo deveria ter considerado justificada a quantia total de € 239.578,19 (€ 174.339,92 + € 320,00 + € 64.918,27) e não apenas € 174.659,92 (€ 174.339,92 + € 320,00); j) deduzindo-se a quantia justificada nos autos de € 239.578,19 à matéria tributável apurada em sede inspetiva de € 260.935,06, obtém-se um montante total não justificado pelos Recorrentes de apenas € 21.356,87 (€ 260.935,06 - € 239.57819); k) não se encontram reunidos os pressupostos de aplicação da avaliação indireta, nos termos da alínea f) do n.º 1 do art.º 87.º da LGT, na medida em que a divergência não justificada apurada entre os rendimentos declarados pelos Recorrentes na declaração Modelo 3 de IRS do ano de 2014 e as entradas de dinheiro nas contas bancárias é inferior a € 100.000,00; l) perante os montantes justificados pelos Recorrentes nos presentes autos de € 174.659,92 ou € 239.578,19 (em caso de procedência do recurso da decisão da matéria de facto), verifica-se que apenas ficou por justificar o montante total de € 86.275,14 (€ 260.935,06 - € 174.659,92) ou € 21.356,87 (€ 260.935,06 - € 239.578,19), respetivamente, o que demonstra, por si só, que a divergência entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património foi inferior a € 100.000,00, pressuposto essencial para a aplicação da alínea f) do n.º 1 do art.º 87.º da LGT; m) nos termos do n.º 1 do art.º 87.º da LGT epigrafado “Realização da avaliação indireta”, a avaliação indireta só pode efetuar-se nas situações aí previstas; n) o Tribunal a quo andou mal ao considerar que a justificação parcial efetuada pelos Recorrentes não afasta a aplicação do método de avaliação indireta previsto na alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º da LGT; o) o Tribunal a quo errou no seu julgamento, mediante uma apreciação e valoração inapropriada e incorreta dos factos e do direito aqui aplicáveis, valoração essa que deveria ter conduzido a uma decisão diversa da encontrada, designadamente, à procedência total do recurso contencioso da decisão de avaliação coletável, por métodos indiretos, referente ao IRS do exercício de 2014. Termos em que, dando-se provimento ao presente recurso e com o douto suprimento de V. Exas., deve a douta sentença recorrida ser anulada, com todas as consequências legais, designadamente, julgando o recurso contencioso totalmente procedente, assim se fazendo a tão acostumada JUSTIÇA!!!.» 1.10. Para a Fazenda Pública (que será sempre assim designada neste acórdão independentemente da sua qualidade de Recorrida ou Recorrente) a sentença não se pode manter...

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