Acórdão nº 1041/16.1BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 27 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1.ª SECÇÃO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I – RELATÓRIO A.............., com os demais sinais nos autos, intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de LISBOA ação administrativa contra ESTADO PORTUGUÊS.

A pretensão formulada perante o tribunal a quo foi a seguinte: - A condenação do Estado Português a pagar ao autor: a) Uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a dezasseis mil euros, pela duração do processo n.º 759/06.1BELRA; b) Uma indemnização de dois mil euros por cada ano de duração do ressente processo sobre a morosidade, agora instaurado, após o decurso de dois anos, até ao seu termo, também a título de danos morais; c) Juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento sobre as verbas mencionadas em a) e b); - Despesas de abertura de dossier, despesas administrativas e de expediente, taxas de justiça pagas pelos autores, despesas de certidões, todas as despesas de tradução de documentos; - Os honorários a advogado neste processo nos Tribunais Administrativos em quantia a fixar equitativamente ou a liquidar, oportunamente, fixados de acordo com o Estatuto da Ordem dos Advogados; - Todas as quantias que eventualmente sejam devidas a título de imposto que incida sobre as quantias recebidas do Estado; - Uma sanção pecuniária compulsória de quinhentos euros por dia, por cada despacho, decisão do Tribunal ou ato dos funcionários que ultrapasse os prazos legais, ou caso o processo dure mais de dois anos, incluindo liquidação de honorários; - Custas e demais encargos legais, como o reembolso de taxas de justiça inicial e outras e quaisquer quantias pagas pelo autor.

Por sentença de 02-07-2019, o tribunal a quo decidiu - Condenar o réu no pagamento ao autor da quantia de € 4.000,00, a título de indemnização por danos causados pela morosidade na administração da justiça, relativamente ao processo que correu termos neste tribunal, sob o n.º 759/06.1BELRA, acrescida dos respetivos juros, contados à taxa legal, desde citação e até integral pagamento, e bem assim das quantias que sejam devidas a título de imposto; - Absolver o réu do demais peticionado pelo Autor.

* Inconformada, a ré interpôs o presente recurso de apelação contra aquela decisão, formulando na sua alegação o seguinte quadro conclusivo: 1 – Ficou provado nos presentes autos que é imputável ao Estado Português, enquanto juiz, toda a duração da tramitação do processo nº 759/06.1BELRA desde a instauração do processo até ser proferida decisão, ou seja, desde 02/06/2006 até 29/08/2013.

2 – Dos factos assentes resultou também que o Recorrente acreditava que o processo em causa se resolveria mais rapidamente e a demora causou-lhe desgaste, preocupação, nervosismo e desgosto, até à sua resolução; 3 – De acordo com entendimento jurisprudencial aceite sem reservas, as normas de Direito interno respeitantes à responsabilidade civil do Estado Juiz, devem ser objeto de interpretação conforme à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e devem ser aplicados tomando em consideração a jurisprudência do TEDH; 4 – Segundo a Jurisprudência do TEDH, existe um núcleo de processos em que a indemnização por cada ano de demora do processo pode subir do patamar de € 1.000,00 a € 1.500,00 para € 2.000,00; 5 –Aliás, o Acórdão Apicella C. Italie de 10/11/2004, considerando nº --, “O montante global será aumentado até 2.000 se o que estiver em causa for importante, nomeadamente em matéria de direito do trabalho, estado e capacidade das pessoas, pensões, processos particularmente importantes relativamente à saúde ou à vida das pessoas.”; 6 – No caso concreto, o Recorrente intentou ação de impugnação de decisão sobre a atribuição de um subsidio de desemprego, e como tal a resolução de uma situação referente a um meio de proteção social fundamental, sendo a indemnização por danos morais pela morosidade da mesma fixada no valor de 4000,00€, cuja fixação não encontra eco na Jurisprudência do TEDH ou Nacional, sendo o montante inaceitável e desfasado dos parâmetros daquelas duas Jurisprudências; 7 – No processo 759/06.1BELRA inexistiu recurso, não foram deduzidos incidentes complexos, não se tendo verificado comportamento da parte, nem dificuldade da causa ou da tramitação justificação para tamanha demora, desde a data de entrada da Petição Inicial até à prolação da decisão de final, a não ser a falha do sistema judicial; 8 – O Tribunal a quo também se distanciou dos critérios de determinação da razoabilidade da duração processual, porquanto não se pode considerar aceitável a duração de um processo por três anos, quando em causa estava a simples apreciação de ação declarativa, sem instância de recurso.

9 – A apreciação e integração do conceito obtenção de decisão em “prazo razoável” constitui um processo de avaliação a ter de ser aferido “in concreto.

10 – Pelo que, analisando o caso concreto, o processo 759/06.1BELRA nunca devia ter ultrapassado a duração de dois anos.

13 – De modo que, face à duração global imputável ao Tribunal onde correu o processo moroso, foi excedido o prazo razoável em 5 anos, e 2 meses 14 – Ora, o Tribunal a quo afastou-se, de forma escandalosa, dos critérios indemnizatórios da jurisprudência do TEDH e Nacional, dado que o caso sub judice possui todos os requisitos para que lhe seja fixado. por cada ano de duração do processo, uma indemnização não inferior a € 2000,00, num total de € 10000,00 euros; 15 – A ser de outro modo, o Recorrido teria um imerecido prémio, dado que este tipo de decisões tem e deve assumir um carácter penalizador no sentido de se evitar a repetição de práticas que levem a que, um processo desta natureza, demore a mais de cinco anos a ser resolvido.

16 – Nos processos contra o Estado em que esteja em causa a violação de direitos fundamentais, deve o mesmo ser condenado, além do mais, pelas despesas processuais e honorários em que o Autor incorra.

17 – Tal demonstração e aferição apenas pode ser realizada após a finalização da ação judicial, porquanto a respetiva nota de liquidação só é emitida nessa fase.

18 – A existência de despesas e honorários com a constituição de mandatário judicial não carece de prova, a não ser para efeitos da sua contabilização em sede de liquidação de sentença, uma vez que a atividade advocaticia tem escopo lucrativo, sendo obrigatória a constituição de mandatário judicial, pelo que consiste num facto notório.

19 – Além de que, a liquidação das custas de parte nos termos da legislação específica não permite a cobertura de todos os prejuízos com despesas de honorários, mas apenas um valor calculado em virtude da taxa de justiça devida pelo processo e outros montantes.

20 – Quando os honorários do mandatário devem ser fixados segundo o Estatuto da Ordem dos Advogados, Lei 145/2015, de 09/09, artigo 105º.

21 – De modo que é em sede de liquidação de sentença que deve ser fixado o montante indemnizatório a pagar a esse título, constituindo um obstáculo excessivamente oneroso a demonstração da existência dessas despesas aquando da propositura da ação, quando as mesmas apenas são determináveis após a conclusão do processo, e constituem um facto notório a partir do momento em que existe uma procuração forense! 22 – Nesta parte, a sentença traduziu-se numa decisão surpresa, em violação do artº 3 nº 3 do CPC; 23– As exigências do artigo 6º do TEDH, do artigo 20º, nº 2 da CRP e 2º do CPC, foram completamente demovidas do caso concreto, em benefício do infrator, atendendo a que a indemnização fixada consiste numa indemnização miserabilista, violadora do direito à justiça em prazo razoável e que tem que ser acolhida pelos nossos Tribunais, sob pena do Estado acabar por ser condenado no TEDH, esgotadas que sejam todas as etapas recursivas possíveis nos Tribunais Nacionais; 24 – Mostram-se violados os artigos 20º CRP, 6º CEDH, 496º do Código Civil e 3 nº 3 e 615º, 1, c) do Código de Processo Civil.

* A recorrida contra-alegou, concluindo assim: 1. Contrariamente ao defendido pelo Recorrente, não resultou provado, face à prova apresentada em juízo “que o recorrente acreditava que o processo em causa se resolveria mais rapidamente e a demora causou-lhe desgaste, preocupação, nervosismo e desgosto, até à sua resolução”.

  1. De facto, o que resultou dos autos e não nos merece qualquer reparo, foi que “O autor se sentiu angustiado, ansioso, preocupado, vivendo numa situação de incerteza, em resultado da demora na prolação da decisão final dos autos identificados em “1” (cfr. fls. 8 da sentença).

  2. Tendo em consideração a factualidade constante dos autos e respeitada a doutrina e a jurisprudência atualmente maioritárias quer no TEDH, quer nos Tribunais Nacionais, foi decidido, pela Mma. Juiz subscritora da sentença recorrida, condenar o demandado no pagamento da quantia de 4.000 Euros (quatro mil euros), “a título de indemnização por danos causados pela morosidade na administração da justiça, relativamente ao Processo que correu termos neste tribunal, sob o nº 759/06.1 BELRA”.

  3. Assim, no que respeita à primeira questão suscitada, pelo Recorrente, entendemos que a mesma é completamente desprovida de fundamento uma vez que o Tribunal apurou devidamente a matéria factual dos autos e respeitou os critérios indemnizatórios da jurisprudência do TEDH e Nacional, como facilmente se pode constatar da leitura dos diversos Acórdãos citados a fls. 18 a 46, cujo teor aqui damos como integralmente reproduzido.

  4. Por todo o exposto e tendo em consideração as especificidades do presente caso concreto, bem como a deficitária situação económico-financeira do país, resulta óbvia, em nosso entender, a conclusão de que nunca poderia ser legitimamente aplicável, in casu, o quantum indemnizatório pretendido pelo Autor, o qual afigura-se-nos carecer de qualquer fundamento plausível ou razoável, sendo certo que o Tribunal pode reduzir equitativamente o quantum debeatur se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa – que, pelas...

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