Acórdão nº 586/19.6BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 27 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelPAULA DE FERREIRINHA LOUREIRO
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO A Diretora-Geral da Direção-Geral da Administração Escolar (Recorrente), vem interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa em 14/08/2019 que, julgando a vertente intimação procedente, intimou a agora Recorrente a, no prazo de dez dias, facultar a informação requerida, “após expurgada toda a informação relativa a dados pessoais”, de acordo com o pedido formulado pelo Sindicato dos Professores da Grande Lisboa (SPGL) (Recorrido).

Neste processo, o Recorrido veio peticionar a intimação da Recorrente para acesso e reprodução de documentos, “por via eletrónica (correio eletrónico) da informação administrativa remetida pelos Agrupamentos de Escolas e Escolas não Agrupadas a essa DGAE, através da plataforma eletrónica SIGRHE, relativamente aos docentes que foram reposicionados na carreira ao abrigo da Portaria n.º 119/2018, de 4 de maio, e que contém, entre outros, os seguintes elementos: data de ingresso na carreira, número de dias de tempo de serviço para efeito de progressão contabilizados antes do ingresso na carreira, escalão e índice em que foram reposicionados e o tempo de serviço remanescente a considerar nesse escalão”.

Inconformada com a sentença proferida em 14/08/2019, que julgou procedente o peticionado pelo Recorrido, deferindo a intimação, vem a Recorrente apelar a este Tribunal Central Administrativo, imputando à sentença a quo erros de julgamento diversos, clamando, por isso, pela revogação da mesma e sua substituição por outra que indefira a requerida intimação.

As alegações do recurso que apresenta culminam com as seguintes conclusões: “Das Conclusões a) Os documentos solicitados circunscrevem-se no âmbito do direito à informação de natureza procedimental, designadamente o reposicionamento ao abrigo da Portaria n.º 119/2018 de 4 de maio.” b) As associadas do Recorrido não foram reposicionadas ao abrigo da Portaria nº119/2018, de 5 de Maio porquanto, a docente Ana ..... ingressou na carreira em 01.09.2006 e a docente Patrícia ..... ingressou na carreira em 01.09.1998.

  1. “O direito à informação procedimental, consagrado nos Artigos 268.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e 82.º a 85.º do CPA, pressupõe a existência de um processo pendente e de um interesse direto [cfr. Artigo 82.º do CPA] ou legítimo [cfr. Artigo 85.º do CPA] da requerente.

  2. Nesta conformidade, não integrando o referido procedimento, carecem as associadas do Recorrido de interesse direto na informação procedimental, art.º 82.º do CPA.

  3. Por “interesse legítimo deve entender-se um interesse específico atendível, que deverá ser avaliado casuisticamente, dentro de critérios de razoabilidade, em função da relação existente entre o requerente e a matéria sobre a qual ele pretende obter informação”. (cfr. Aroso Almeida e Fernandes Cadilhe, no Comentário ao CPTA).

  4. O recorrido fundamenta o seu pedido no facto de muitos dos seus representados manifestarem “a convicção de que do referido reposicionamento terá resultado a colocação de docentes com o mesmo ou menos tempo de serviço em posição remuneratória superior à de docentes com mais tempo de serviço”.

  5. Esta fundamentação apresenta-se muito vaga, sem qualquer base factual, pois que não se sabe quem se queixou, nem de quem se queixou e muito menos como apreenderam essa convicção.

  6. O acesso a tais elementos para efeitos de recurso a eventual processo judicial, de nada valeria à Recorrida, pois que o ato de progressão dos docentes, e bem assim de qualquer trabalhador em funções públicas não resulta do exercício de poder discricionário da Administração, mas, sim, de um poder vinculado com inteira subordinação à lei.

  7. Mesmo que existissem erros na progressão dos docentes, cujos dados o recorrido peticiona, tais erros e/ou progressões indevidas não afetariam, de modo algum, a progressão das associadas do Recorrido, as quais podem sempre impugnar o ato administrativo que determinou, ou não, a sua progressão.

  8. Por outro lado, caso o Recorrido queira atacar a Portaria n.º119/2018, de 4 de maio, sempre poderá lançar mão da ação de impugnação de normas, vide art.º 72.º e seguintes do CPTA, para o que não necessita da informação peticionada.

  9. A fundamentação do recorrido carece ainda de razoabilidade porquanto a informação solicitada, por duas docentes não intervenientes no procedimento, respeita a mais de 800 estabelecimentos de ensino da rede pública e mais de 10.000 docentes.

  10. Tudo ponderado falece assim o hipotético interesse legítimo do Recorrido na informação.

  11. Dado pessoal, nos termos do nº 1, do artigo 4º, do RGPD, é qualquer informação, relativa a um qualquer cidadão, seja ela de que índole for – pessoal, familiar, profissional, desportiva, religiosa, política, etc.

  12. Nestes termos, entendemos que a informação pretendida pelo Recorrido integra, para este efeito, o conceito de dados pessoais [cfr. art.º 4.º, alínea 1), do RGPD], porquanto traduzem-se em informações relativas a pessoas singulares identificadas ou identificáveis.

  13. Perante aquele circunstancialismo legal, o determinado na douta sentença levanta uma questão insolúvel para a Entidade Requerida – Que dados fornecer? p) É que os dados do reposicionamento, na perspetiva legal, são, praticamente todos, dados pessoais e a douta sentença parece apenas referir como dado pessoal o nome.

  14. Revela-se a douta sentença incompleta, tornando impossível a sua execução, porquanto a Entidade Requerida ficou sem saber que dados fornecer, uma vez que isso não ficou determinado e há dados que podem identificar os seus titulares indiretamente.

  15. O facto de o Recorrido ter alegado que pretende o acesso a tais informações, fundamentando-se no facto de muitos dos seus representados manifestarem a convicção de que do referido reposicionamento terá resultado a colocação de docentes com o mesmo ou menos tempo de serviço em posição remuneratória superior à de docentes com mais tempo de serviço, tal não é esclarecedor nem tão pouco coloca os seus alegados interesses num plano de supra ordenação relativamente à tutela constitucional dos dados pessoais cujo acesso pretende obter.

  16. Trata-se de uma argumentação genérica, abstrata, da qual não resulta matéria de facto suscetível de preencher todos os segmentos normativos de verificação cumulativa constantes das disposições legais, vide art.º 6.º, al. e) da Lei 67/98 de 26/10 e art.º 6.º, n.º1, al .f) do RGPD Nestes termos e nos mais de Direito, que muito doutamente serão supridos por VV. Exas., deverá ser proferida decisão que conclua pela procedência do presente recurso, como é de JUSTIÇA.” O Recorrido apresentou as respetivas contra-alegações de recurso, pugnando, em suma, pelo acerto da decisão recorrida e consequente manutenção da mesma, expendendo conclusivamente o seguinte: “CONCLUSÕES: 1a Os argumentos que fundamentam o recurso apresentado pelo recorrente assentam na alegada "Ilegitimidade ativa do recorrido* e à dificuldade de execução da sentença recorrida por alegado desconhecimento dos dados a fornecer ao recorrido.

2a Como ficou demonstrado, tais argumentos carecem de fundamento legal apenas visaram protelar, mais uma vez, o acesso do recorrido aos elementos pedidos.

3a Na verdade, para além do requerimento inicial ser claro quanto à pretensão a satisfazer, o recorrente sabia perfeitamente que só os docentes na situação das associadas que o recorrido representa é que foram lesados e não os que foram posicionados pela Portaria n° 119/18 ou seja, está perfeitamente ciente e não desconhece que só esses docentes é que se encontram na situação que o recorrido pretende comprovar.

4a Nesta medida, era sua obrigação ter, desde logo, facultado os dados peticionados pelo recorrido de forma a agilizar e garantir aos lesados a defesa dos seus direitos, em vez de o obrigar a ter que recorrer à via judicial para o efeito.

5a Na verdade, embora tendo sido reposicionadas ao abrigo da Portaria n° 119 /18, às representadas pelo recorrido assiste o direito a aceder aos dados peticionados.

6a E isto, porque foi da aplicação de tal diploma legal que resultou a violação dos direitos das referidas docentes.

7a Sem o acesso a tal informação as representadas do Autor não têm como comprovar as ultrapassagens ilegais de que foram objeto e, nessa medida, recorrer às vias próprias para dirimir a questão.

8a O argumento da alegada “ilegitimidade ativa do recorrido” já havia sido esgrimida anteriormente pela recorrente a propósito da então invocada (no âmbito do seu Io recurso jurisdicional) “Necessidade de reforma da sentença” e não tem qualquer fundamento legal.

9a Com efeito, o objetivo visado com a Intimação Judicial encontra-se claramente manifestado no requerimento inicial e logo só podia identificar como suas representadas docentes que, por decorrência da aplicação da Portaria n° 119/2018, estavam a ser ultrapassadas nos seus direitos remuneratórios.

10a Embora não tendo sido reposicionadas ao abrigo da Portaria n° 119/18, às representadas pelo recorrido assiste o direito a aceder aos dados peticionados.

11a E isto, porque foi da aplicação de tal diploma legal que resultou a violação dos direitos das referidas docentes.

12a Sem o acesso a tal informação, as representadas do recorrido não têm como comprovar as ultrapassagens ilegais de que foram objeto e, nessa medida, recorreu às vias próprias para diminuir a questão.

13a Nos termos do C.P.A. é ao interessado (neste caso, é ao recorrido e não à Administração) que cabe ajuizar sobre a pertinência da informação pretendida.

14a De facto, embora não tendo sido reposícionadas ao abrigo da Portaria n° 119/18, as representadas pelo recorrido foram lesadas (como ficou comprovado pelo exemplo dado) com a sua aplicação e, para o comprovarem tinham que ter acesso aos elementos em questão.

15a As representadas pelo recorrido têm direito a aceder aos elementos solicitados uma...

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