Acórdão nº 00153/10.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* *I – RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL do (i) “(…) despacho saneador proferido a fls. 134 na ação, datado de 08.07.2010 que decidiu, sem necessidade de mais indagações, conhecer totalmente do mérito da causa, e determinou a notificação das partes para apresentarem as alegações (…)”; (ii) do “(…) despacho a fls. 200 na ação, datado de 14.01.2016 que indeferiu o pedido de realização de perícia, e, em inspeção no local, requerido pelo Ministério Público a fls.142 e ss. (…)”, e da (iii) “(…) sentença igualmente datada de 14.01.2016 que indeferiu o pedido na sua totalidade (…)”, tudo promanado no âmbito da presente Ação Administrativa Especial por este intentada contra o MUNICÍPIO DA (...), com vista à declaração de nulidade dos despachos do Presidente da Câmara Municipal da (...) de 24 de abril de 2003, de 13 de agosto de 2004, de 19 de agosto de 2005 e de 3 de fevereiro de 2006.

Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) 1ª - O Ministério Público veio pedir na ação em causa a declaração de nulidade dos Despachos:1. Despacho do Presidente da Câmara Municipal da (...) de 24 de abril de 2003, (Doc. n°2); 2. Despacho do Presidente da Câmara Municipal da (...) de 13 de agosto de 2004 (Doc. n° 6); 3. Despacho do Presidente da Câmara Municipal da (...) de 19 de agosto de 2005 (Doc. n° 9); e 4. Despacho do Presidente da Câmara Municipal da (...) de 3 de fevereiro de 2006 (Doc. n° 12).

  1. - A questão versa sobre o pedido de licenciamento que J.D.L. e Outros, em 2003.02.03 requereram ao Presidente da Câmara Municipal da (...) (CM(...)) o licenciamento da construção, moradia familiar no Lote C, situado na Rua (...), em (...), (...), resultante do loteamento com o alvará n°1/00, dando origem ao processo camarário n° 56/03.

  2. - Tal pedido, após a junção de alterações ao projeto e de Certidão da Conservatória do Registo Predial comprovativa do título de propriedade, foi deferido por Despacho do Presidente da CM(...) de 24 de abril de 2003.

  3. - Ainda, por Despacho Por despacho do Presidente da CM(...) de 13 de agosto de 2004, foi deferido o pedido de aprovação do projeto do muro de divisão e suporte de terras.

  4. - Por despacho do Presidente da CM(...) de 19 de agosto de 2005, o projeto de alterações ao projeto de arquitetura foi aprovado.

  5. - E, com fundamento em informação de serviço, por despacho do Presidente da CM(...) de 3 de fevereiro de 2006, este pedido de alterações foi aceite, e os pedidos de autorização de construção (legalização) e de autorização de utilização foram deferidos.

  6. - Em 2006.02.10 foi emitido o alvará de obras de alteração n° 79/06, relativo às obras de alteração aprovadas por este último despacho do Presidente da CM(...) de 2006.02.03. onde se refere: “(...) Por despacho do Diretor do Dep. De Urbanismo de 06/02/2006, foi autorizada a seguinte utilização: 1 fogo - 254m2+1garagem+3 arrumos-132m2+piscina-55m2 (...)” (cfr. alvará n.° 72/06 a fls. 97 dos autos).

  7. - Ora, o prédio em questão com loteamento, titulado pelo alvará 1/00, do qual resultou o Lote C insere-se em área caracterizada no Plano Diretor Municipal, como Espaço Periurbano I (P.U.I), da qual uma parte se encontra afeta ao Espaço Nacional II - E.N.P. II., devendo o índice de utilização líquido ser de 251,00 m2 (1004,00 m2x0,25), quando com nas alterações aprovadas foi permitido o índice de utilização de construção líquido de 386 m2 (254+132), ou seja superior ao permitido pelo plano.

  8. - Assim, foi alegado na petição inicial violação dos arts. 42° e 43°, a) com referência ao art. 8° do Regulamento do PDM da (...), que deveria conduzir ao indeferimento do licenciamento, em conformidade com o art. 24°, n°1 a) do RJUE, Aprovado pelo DL n° 555/99, de 16.12.

  9. - Não obstante, o Mmº. Juiz “a quo” deu como improcedente o pedido de declaração de nulidade de todos os Despachos, considerando que a moradia foi licenciada com uma área de construção de 239,21m2, e, por isso fora cumprido o limite da área de construção definido pelo loteamento n°1/00, de 245 m2.

  10. - Ora, o cerne da questão está na definição exata da área de construção da moradia licenciada a favor do contra interessado para o Lote C, e, saber se ultrapassa o índice de construção líquido permitido para aquela zona atento o disposto nos arts. 42° e 43° a) , por referência ao art. 8° do RPDM.

  11. - Acontece que, dos autos não resulta com exatidão qual a área da construção licenciada, e seu índice de utilização, daí a apresentação de três (3) áreas distintas indicadas pelo Autor/Ministério Público: 386 m2, sugeridos pelo Município: 239,21 m2, indicados pelos contra interessados: 237,46 m2, e, finalmente o alcançado pela sentença recorrida, num total de 239,21 m2.

  12. - Ora, o valor alcançado na sentença, conforme é dito na mesma, resulta duma mera estimativa orçamental entregue juntamente com o pedido de alterações e com o aditamento à memória descritiva (veja-se ponto 14 probatório), e, não, com base na área exata, alvo de alteração, já que não foi referido em que é que tinha resultado a alteração da área de construção no alvará de utilização n° 72/06, em análise, nem resulta, como deveria, das plantas, nem da respetiva memória descritiva.

  13. - Pelo exposto, há que concluir que a instrução peca por defeito, pois que faltam elementos probatórios essenciais, inclusive de perícia no sentido de se apurar qual a área do licenciamento no limite, conforme foi pedido pelo Ministério Público/Autor a fls. 142 e ss na ação, onde se pugna: 15ª - Pela elaboração de despacho saneador, com a seleção da matéria de facto assente e fixação da matéria probatória, com a consequente realização de perícia nos termos do art. 568° e ss do CPC antigo, (atual art. 467°e ss do CPCnovo), para colmatar as dúvidas que sobressaem nas telas finais, (fls. 52 do processo camarário - 38 pasta, fls.66 do processo camarário) de forma a ser indagado ao certo quantos metros quadrados perfazem as somas das superfícies brutas de todos os pisos da obra licenciada, incluindo escadas e caixas de elevadores, acima e abaixo do solo, com exclusão de terraços descobertos, áreas de estacionamento, serviços técnicos instalados na cave, galerias exteriores públicas, arruamentos ou espaços livres de uso público cobertos pela edificação e zonas de sótão não habitáveis, de cada uma das versões inicial e alteradas que o projeto teve e que foram sendo aprovados; e, 16ª - Verificar, em inspeção ao local, quantos metros quadrados perfazem as somas das superfícies brutas da cave da obra licenciada, incluindo escadas e caixas de elevadores, acima e abaixo do solo, com exclusão de terraços descobertos, áreas de estacionamento, serviços técnicos instalados na cave, galerias exteriores públicas, arruamentos ou espaços livres de uso público cobertos pela edificação e zonas de sótão não habitáveis, de cada uma das versões inicial e alteradas que o projeto teve e que foram sendo aprovados.

  14. - Já que, parece-nos certo dizer, que qualquer estimativa orçamental que seja, não pode ser considerada meio probatório idóneo e suficiente para alcançar ou definir a área de construção, razão pela qual haverá que concluir que na situação em causa há, claramente matéria de facto controvertida que carece de prova a realizar, que deveria ter sido disponibilizada ao abrigo do art. 87°, n°1 c) do CPTA.

  15. - Dito de maneira diferente, a decisão final peca por falta de matéria de facto essencial para a tomada da mesma e, que, por isso, se baseou não em factos, mas numa mera estimativa orçamental, entregue juntamente com o pedido de alterações e com o aditamento à memória descritiva, conforme ponto 14 probatório, não tendo sido cumprido o disposto no art. 87°, n°1 c) do CPTA, como deveria, porque o estado do processo não permitia que se conhecesse imediatamente do mérito da causa pois que havia matéria de facto controvertida por provar, no caso, através de prova pericial, e, inspeção ao local, essencial para apuramento da verdade e, tomada de decisão, contrariamente ao decidido.

  16. - Aqui chegados, urge determinar a anulação de todos ao atos decisórios intercalares e da sentença a final, a começar pelo despacho saneador datado de 08.08.2010; despacho datado de 14.01.2014, e determinar a realização das diligências acima descritas, e pedidas nos autos a fls. 142 e ss pelo Autor/Ministério Público, já que só assim se poderá decidir o mérito da causa, com o apuramento da área da construção em análise, e sua descrição, e, consequentemente aplicação do índice de utilização correto.

  17. - Pugna-se, assim pela anulação dos despachos mencionados, e da sentença agora em crise, e pela determinação das diligências de prova periciais, essenciais para a boa decisão da causa, nos termos mencionados (…)”.

*Notificados que foram para o efeito, o Recorrido e os Contrainteressados identificados nos autos produziram contra-alegações, todos defendendo a manutenção do decidido quanto à improcedência da presente ação.

*O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

*O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu o parecer a que se alude no nº.1 do artigo 146º do CPTA.

*Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

* *II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Examinando as conclusões vertidas no presente recurso jurisdicional, logo se constata que as mesmas assentam fundamentalmente na circunstância de alegadamente ter sido cerceada...

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