Acórdão nº 00459/19.2BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório M.C.C.C.

, com os sinais nos autos, no âmbito da presente Ação Administrativa intentada contra a Caixa Geral de Aposentações, ao abrigo do DL nº 503/99, de 20 de novembro, tendente à anulação do ato administrativo consubstanciado na decisão da CGA, de 6 de março de 2019 que fixou a sua pensão por acidente de serviço, no valor mensal de 1.740,20€, não acumulável com a pensão de aposentação até então auferida (1.851,72€), com exceção do valor de 137,52€, inconformada com a decisão proferida no TAF de Coimbra, em 11 de dezembro de 2019, através da qual a Ação foi julgada totalmente improcedente, veio, em 26 de dezembro de 2019, recorrer da decisão proferida, na qual se conclui: “I - Prevalecendo a decisão contida na sentença nos seus precisos termos, tal significaria que ao funcionário da Administração Pública, vitimizado por um qualquer infortúnio laboral que o deixe prostrado com uma incapacidade absoluta permanente, não seria reconhecido nem ressarcido qualquer dano indemnizável, antes se dissolvendo o mesmo na íntegra no “quantum” resultante da pensão de aposentação a que tem direito o funcionário.

II - Como se manifestou já o Sr. Provedor de Justiça, em comparação desenvolvida entre o regime previsto na Lei dos Acidentes de Trabalho (LAT) e o regime previsto no D. Lei n.º 503/99, atualizado pela Lei n.º 11/2014, “… existe uma iníqua diferenciação de regimes de reparação do infortúnio laboral na medida em que a LAT prevê expressamente que a pensão por incapacidade permanente seja cumulável com qualquer outra (n.º 2 do art.º 51.º da referida Lei) e que a pensão por incapacidade permanente por doença profissional seja acumulável com a pensão atribuída por invalidez ou velhice no âmbito de regimes de proteção social obrigatória, sem prejuízo das regras próprias destes regimes”.

III - Concluindo assim que “…a alínea b) do n.º 1 bem como os n.ºs 3 e 4, na parte em que remetem para aquela norma do art.º 41.º do D. Lei n.º 503/99, na redação conferida pela Lei n.º 11/2014 de 06 de Março, violam o princípio da igualdade expressamente consagrado no art.º 13.º da CRP”.

IV- Não se justifica nem é aceitável uma aplicação claramente divergente entre os dois regimes quando o próprio corpo preambular deste diploma legal consagra a necessidade de aproximar e fazer convergir os regimes e não de gerar discriminações negativas.

V - A aplicação à situação da Recorrente do segmento normativo contido no n.º 3 do art.º 41.º do D. Lei n.º 503/99 de 20 de Novembro, na redação resultante do art.º 6.º da Lei n.º 11/2014 de 06 de Março, por evidente discriminação e manifesta irrazoabilidade, fica ferida de inconstitucionalidade por violação do disposto na alínea f) do art.º 59.º e do consagrado no art.º 13.º, ambos da Constituição da República Portuguesa, o que gera a anulação do ato impugnado, seja o ato de 6 de Março de 2019 que não permitiu a acumulação das pensões, seja, de forma instrumental, o ato de processamento da respetiva pensão de aposentação no valor de 137,52€.

Nestes termos e nos que doutamente se suprirá, deve o presente recurso ordinário merecer provimento e, em consequência, com fundamento nos vícios de que o mesmo está inquinado, deve anular-se o ato administrativo proferido pela CGA, entidade demandada ora apelada, substituindo-o por outro que, a condene à prática do ato devido, o qual consiste em abonar mensalmente à Autora, com efeitos desde Abril de 2019, o valor correspondente à prestação periódica que lhe é devida por incapacidade absoluta permanente em resultado do acidente em serviço, acumulando-a com a pensão de aposentação no respetivo montante fixado, sem restrições de qualquer natureza quanto ao seu valor, praticando todos os atos, procedimentos, instruções e diligências necessários aos indicados fins, por assim ser de JUSTIÇA!” A Recorrida/CGA veio a apresentar Contra-alegações de recurso em 22 de janeiro de 2020, nas quais concluiu: “

  1. A douta sentença recorrida fez correta interpretação da alínea b) do n.º 1 do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, na redação dada pelo artigo 6.º da Lei n.º 11/2014, de 6 de março, não merecendo censura.

  2. O objetivo do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro é a reparação na capacidade de trabalho ou de ganho.

  3. A Lei n.º 11/2014, de 6 de março, veio estabelecer mecanismos de convergência do regime de proteção social da função pública com o regime geral da segurança social conferindo ao artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, alterações no regime de acumulação de prestações por incapacidade permanente resultante de acidente ou doença profissional com remunerações ou pensões.

  4. Em virtude da solução normativa vertida no n.º 3 do art.º 41.º do Decreto-Lei n.º 503/99, não é permitido acumular livremente a pensão de aposentação com a prestação periódica por incapacidade permanente.

  5. Num caso como o dos autos, o sinistrado tem direito: - a receber a título de reparação do evento danoso ocorrido em serviço, a totalidade da prestação periódica por incapacidade permanente; - a receber, a título de pensão de aposentação, e por força do regime de inacumulabilidade previsto nos n.ºs 3 do art.º 41.º do Decreto-Lei n.º 503/99, apenas o valor que exceda o correspondente à pensão devida pelo acidente em serviço.

  6. Ou seja, o valor a receber a título de pensão de aposentação é limitado pela aplicação do regime de inacumulabilidade previsto no n.ºs 3 do art.º 41.º do Decreto-Lei n.º 503/99.

  7. Acrescendo dizer que, as normas em causa foram alvo de um exame de constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional, através do Acórdão n.º 786/2017, proferido em sessão plenária de 2017-11-21, que se pronunciou no sentido da sua conformidade com a Constituição da República Portuguesa, para além de terem sido já proferidas diversas decisões sumárias, que abaixo se identificam: - Decisão Sumária n.º 1/2018, de 2018-01-02, proferida no Processo n.º 1353/2017 - Decisão Sumária n.º 181/2018, de 2018-03-16, proferida no Processo n.º 122/2018 - Decisão Sumária n.º 210/2018, de 2018-04-10, proferida no Processo n.º 128/2018 - Decisão Sumária n.º 374/2019, de 2019-05-20, proferida no Processa n.º 477/2019 - Decisão Sumária n.º 480/2018, de 2018-07-10, proferida no Processo n.º 611/2018 - Decisão Sumária n.º 693/2019, de 2019-10-10, proferida no Processo n.º 855/19 Termos em que a decisão recorrida deve mantida, uma vez que aquilatou corretamente o regime legal em presença.” O Recurso Jurisdicional veio a ser admitido por despacho de 23 de janeiro de 2020.

O Magistrado do Ministério Público junto deste tribunal, notificado em 30 de janeiro de 2020, nada veio dizer, requerer ou Promover.

Com dispensa de vistos prévios (art.º 36º, nº 2, do CPTA), cumpre decidir.

II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, o que se consubstancia na necessidade de verificar, designadamente, se a pensão resultante de acidente em serviço se se mostrará acumulável com a pensão de aposentação.

III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte matéria de facto relevante para a apreciação da questão controvertida, cujo teor infra se reproduz.

“1) A Autora é professora de artes visuais, desde 1984, tendo sofrido um acidente de serviço, em 27 de outubro de 2015, na Escola EB 2/3 Infante (...), (...), (...), onde lecionava (cf. facto parcialmente admitido por acordo – artigo 1.º da petição inicial e artigo 1.º da contestação; registo biográfico junto a fls. 10 e 11 do PA; participação e qualificação do acidente de trabalho a fls. 54 e 55 do PA); 2) Em 18 de Setembro de 2018, na sequência do acidente identificado no ponto 1), foi a Autora submetida a junta médica dos serviços da Entidade Demandada, homologada por despacho da Direção da CGA de 24 de Setembro de 2018, da qual resultou uma incapacidade permanente absoluta da Autora para o exercício de funções e para todo e qualquer trabalho, tendo-lhe sido atribuída um grau de 63,04 % de incapacidade permanente parcial (cf. facto parcialmente admitido por acordo – artigo 2.º da petição inicial e artigo 1.º da contestação; auto de junta médica junto a fls. 133 do PA); 3) Por ofício de 25 de Setembro de 2018, foi comunicado à Autora o resultado da Junta Médica identificada no ponto precedente e de cujo teor se destaca (cf. ofício n.º EAC721RM.966736/00 junto a fls. 142 do PA): “(…) Das lesões apresentadas resultou uma incapacidade permanente absoluta para o exercício das suas funções Das lesões apresentadas resultou uma incapacidade permanente absoluta de todo e qualquer trabalho Das lesões apresentadas resultou uma incapacidade permanente parcial de 63,04% de acordo com o Capítulo III nº.2.12.3.2 alínea b), capítulo III nº. 5.2.1 alínea b) e capítulo X, grau II da T.N.I.

Informo ainda, de que esta Caixa não pode desencadear o processo de aposentação por incapacidade sem que haja uma manifestação expressa de vontade, seja do subscritor, seja do respetivo serviço. (…)”.

4) Por requerimento de 29 de Outubro de 2018, a Autora, concordando “com a decisão tomada pela junta médica realizada em 18 de Setembro de 2018”, solicitou, junto da Caixa Geral de Aposentações, a passagem à aposentação (cf. facto admitido por acordo – artigo 3.º da petição inicial e artigo 1.º da contestação; requerimento de fls. 148 do PA); 5) Por despacho de 28 de Janeiro de 2019, notificado à Autora por ofício da mesma data, a Direção da CGA reconheceu à Autora o direito à aposentação, requerido conforme requerimento melhor identificado no ponto precedente, tendo a mesma passado a auferir uma pensão de aposentação no valor de € 1.832,91 (cf. facto admitido por acordo – artigo 2.º da petição inicial e artigo 1.º da...

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