Acórdão nº 41/19.4BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 20 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO Liga Portuguesa de Futebol Profissional (doravante Impugnante) veio apresentar impugnação da decisão arbitral proferida a 12.03.2019, pelo Tribunal Arbitral Coletivo constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no processo a que aí foi atribuído o n.º …../2018-T, ao abrigo dos art.ºs 27.º e 28.º do DL n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária – RJAT).

Nesse seguimento, a Impugnante apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “1. A Sentença impugnada (do Tribunal arbitral fiscal com o n.° …../2018-T) é ilegal (por nulidade e/ou anulável) por (i) omissões de pronúncia, (ii) oposição dos fundamentos com a decisão e (iii) não especificação dos fundamentos de facto (e de direito) que justificam a decisão (art. 28.

0, n.° 1, al a), b) e c), do RJAT).

  1. Há omissão de pronúncia quando o tribunal arbitral não aprecie questões que devesse conhecer, porque suscitadas pelas partes.

  2. Há oposição dos fundamentos com a decisão quando os fundamentos da Sentença devam conduzir a uma decisão oposta, ou pelo menos diferente da que foi adotada, como corolário de um processo lógico (silogismo judiciário) da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais 4. Há não especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão quando a Sentença não efetue qualquer exame crítico da prova (sobretudo testemunhal) e não indique os “factos não provados”, os quais (não tendo sido dados nem como provados nem como não provados) possam relevar para a decisão em causa.

    Omissão de pronúncia na questão da “violação do princípio da operação única” 5. Esta questão é formulada no RI (art. 17.

    0 e) e art. 311.

    0 a 329.

    0) e a Sentença arbitral não se pronuncia sobre a mesma.

  3. A questão foi exposta de forma clara no RI (factos, argumentos, lei aplicável e jurisprudência comunitária confirmativa); foi deduzida a título subsidiário, exigindo- se pronuncia, na sequência da improcedência (como improcederam) (d)os demais argumentos expendidos.

  4. A Sentença assume, sem dar como provado (noa omissão de pronúncia) que quaisquer prestações efetuadas pela Federação Portuguesa de Futebol (prestação principal) estariam não sujeitas ou isentas de IVA, em face do seu estatuto de utilidade pública. O que implicaria a não incidência/isenção de IVA nessas prestações - e reforça a procedência do argumento da violação do princípio da operação única.

    Oposição dos fundamentos com a decisão: distribuição de excedentes em associação sem fins lucrativos 8. A Sentença deu como provado que a LIGA é uma associação sem fins lucrativos e que os excedentes (saldo positivo) da componente comercial, a existirem, são devolvidos aos Clubes associados (facto provado 1 e 16).

  5. A Sentença (p. 19) advoga que a LIGA não é um organismo sem finalidade lucrativa (e portanto estaria sujeito e não isento de IVA - art. 9.

    0, n.° 19, do CIVA), na medida em que os excedentes das explorações comerciais são atribuídos (devolvidos) aos associados.

  6. É flagrante a oposição entre os fundamentos (facto provado 1 e 16) e a decisão arbitral: o argumento para imputar finalidade lucrativa à LIGA (e negar a isenção de IVA) é aquele que permite concluir no sentido oposto - isto é, que não tem finalidade lucrativa.

  7. A LIGA não obtém excedentes. Mas se porventura os tiver na parte comercial, são atribuídos aos associados. “Atribuir [devolver] excedentes” é diverso de “distribuir lucros”.

  8. A LIGA atribui os excedentes para não gerar lucros; se não atribuísse os excedentes aos associados, então sim, a LIGA geraria lucros - e aí sim, violaria, o seu fim estatutário (e não teria direito à isenção).

    “Omissão de pronúncia” e “oposição dos fundamentos com a decisão”: boa-fé, complexidade da situação, interpretação plausível e inexistência de intuito evasivo 13. A Sentença fundamenta que a exigência ou não do pagamento de IVA nas situações dos autos se reveste de especial complexidade e que a LIGA efetuou uma interpretação plausível da lei, sem intuito evasivo (o que conduziu à anulação dos juros).

  9. Existe omissão de pronúncia: a questão da boa-fé colocada no RI é de base fiscal (interpretação plausível, em questão técnica, sem intuito evasivo), por violação das leis tributárias (artigos 55.

    0 e 68.°-A da LGT e 19.

    0 do CIVA).

  10. Ao invés, a Sentença decide-a com argumentação do direito administrativo, através de princípios e normas deste ramo de direito (art. 7.°, 8.° e 1o.

    0 do CPA) que não foram glosados no RI (e nada se referindo sobre a hipotética natureza tributária da questão e não se pode assumir, sem mais, o conteúdo igual do princípio em ambos os ramos de direito).

  11. Existe ainda outra omissão de pronúncia: a LIGA argumentou que a procedência da boa-fé no tema do imposto [IVA] envolve automaticamente a procedência da boa-fé no tema dos juros (e vice versa) - e a Sentença é omissa sobre a existência (ou não) desta relação de causalidade.

  12. Há oposição entre os fundamentos e a decisão: os fundamentos da Sentença (complexidade técnica das questões dos autos, interpretação plausível da LIGA e inexistência de intuito evasivo) deveriam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou pelo menos diferente da que foi adotada: deveriam conduzir ao reconhecimento da boa-fé da LIGA na parcela relativa ao imposto, com a anulação das liquidações impugnadas.

    Não especificação de fundamento de facto (e direito) que justifica a decisão: factos não provados, análise crítica das provas e Despacho …../2008 18. Aquando da inquirição das testemunhas, foi junto aos autos um documento: Despacho n° …../2008 do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, a pedido da Associação de Futebol do ....., que considera que as importâncias recebidas pelas Associações de Futebol por inscrições e transferência de jogadores estão isentas de IVA, nos termos do art. 9.

    0, n.° 21, do CIVA 19. A aplicação à LIGA da isenção do IVA do art. 9.

    0, n.° 19 e 21, do CIVA é uma das questões suscitadas no RI e decidida na Sentença.

  13. A Sentença arbitral não menciona este documento (Despacho …../2008), e o facto ínsito I - nos factos provados, nos factos não provados ou em qualquer outra parte.

  14. Não diz, tão-pouco, que esse Despacho não se aplica ao caso dos autos (apesar da identidade factual e jurídica entre a situação do Despacho e o caso dos autos).

  15. E tal documento é relevante para a decisão da causa - trata-se de pronunciamento do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais sobre a interpretação de caso similar aos dos autos. Não se especifica este facto (nos factos provados ou não provados) que é relevante, em abstrato e em concreto, para justificar a decisão (acerca do tema da boa fé e da interpretação e aplicação do art. 9.

    0, n.° 21 do CIVA).

  16. Tudo isto corresponde a violação do art. 28.

    0, n.° 1, al. a), do RJAT (e 125.

    0 do CPPT e 615.

    0, n.° 1, al. b) do CPC).

  17. A Sentença arbitral não tem uma parte com os “factos não provados”, em violação do art. 28.

    0, n.° 1, al. a), do RJAT (e 125.

    0 do CPPT e 615.

    0, n.° 1, al. b) do CPC).

  18. A Sentença arbitral não efetua qualquer exame crítico de apreciação da prova (testemunhal), em violação do art. 28.

    0, n.° 1, al. a), do RJAT (e 125° do CPPT e 615°, n.° 1, al. b) do CPC).

  19. O presente recurso tem natureza cassatória: o TCA Sul apenas tem competência para anular/declarar a nulidade da Sentença; não profere nova decisão sobre o mérito da causa, mas declarando ilegal a Sentença (pelas ilegalidades apontadas neste recurso) devolverá o processo à procedência, para que o Tribunal arbitral emita nova decisão expurgada dessas ilegalidades.

    Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas suprirão, requer-se: a) A procedência desta impugnação (recurso); b) Com a declaração de ilegalidade (nulidade/anulável) da Sentença recorrida (Sentença arbitral do proc. …../2018-T, que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa [CAAD]) c) Com a consequente devolução do processo ao Tribunal arbitral (CAAD), para que emita nova decisão arbitral expurgada das ilegalidades agora apontadas”.

    Foi ordenada a notificação de Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante Impugnada ou AT) para alegar, nos termos consignados no art.º 144.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), ex vi art.º 27.º, n.º 2, do RJAT, não tendo sido apresentadas contra-alegações.

    O Ilustre Magistrado do Ministério Público (IMMP) foi notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146.º, n.º 1, do CPTA.

    Colhidos os vistos legais vem o processo à conferência.

    São as seguintes as questões a decidir: a) Há nulidade por omissão de pronúncia? b) Há nulidade por oposição dos fundamentos com a decisão? c) Há nulidade por não especificação dos fundamentos de facto e de direito? II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A.

    Na decisão impugnada foi considerada provada a seguinte matéria de facto: “1. A Liga Portuguesa de Futebol Profissional é uma associação de direito privado, sem fins lucrativos, que se rege pelos Estatutos, regulamentos e demais legislação aplicável; 2. Por delegação da Federação Portuguesa de Futebol exerce competências relativas às competições profissionais, nomeadamente de organização e regulamentação, de controlo e supervisão, de definição dos pressupostos desportivos, financeiros e organizativos de acesso às competições e de fiscalização; 3. Os associados têm a obrigação estatutária de contribuírem para as despesas de funcionamento da Liga, pagando as quotas e outros encargos fixados na lei; 4. Constituem receitas da Liga o produto das joias de admissão e das quotizações dos associados, o produto de multas, indemnizações e percentagens de sobre estas, custas, emolumentos, preparos e cauções e as receitas que lhe couberem nos jogos em que intervenham as sociedades desportivas; 5. Podem existir quotas de valor fixo, de valor variável destinada a financiar o orçamento geral da Liga ou o Fundo de Equilíbrio Financeiro, e quotas suplementares, estas exigidas por efeito da inscrição das equipas...

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