Acórdão nº 02032/10.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Fevereiro de 2020
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 14 de Fevereiro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I-RELATÓRIO 1.1.
L., Lda., a quem sucedeu, em consequência de habilitação, T., S.A., propôs contra o Município de (...) ação administrativa comum, pedindo a condenação do Réu no pagamento do montante de € 73.654,85, acrescido de IVA à taxa em vigor à data do pagamento, bem como nos juros legais, à taxa legal prevista no artigo 213.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de março, contados desde a data da citação do Réu até efetivo pagamento.
Alegou, para o efeito, em síntese, que na sequência de um concurso público, a Autora executou a empreitada denominada “Edifício Principal – Ampliação/Reformulação (Ampliação do Edifício dos Paços do Concelho)”, e que durante a execução da empreitada, o dono da obra, lhe exigiu a execução de trabalhos de desmonte e transporte de pedras de granito, bem como a substituição do elevador previsto no caderno de encargos, os quais foram executados em total conformidade com o solicitado, tendo a obra sido provisoriamente rececionada em 23/06/2009 e 29/09/2009.
O valor/custo desses mesmos trabalhos ascendeu ao montante de € 73.654,85, ao qual acresce o IVA, à taxa legal em vigor.
Sucede que, apesar de ter sido várias vezes interpelado, o Município não procedeu ao pagamento do referido montante, sem que exista causa justificativa para o enriquecimento do Réu à custa da Autora.
Mais alega que na execução dos ditos trabalhos, agiu de boa-fé, no cumprimento de ordens e instruções recebidas do dono da obra e na convicção de que a quantia peticionada lhe seria paga, porque o Município sempre prometeu e garantiu que iria proceder ao pagamento, independentemente do meio escolhido para esse efeito, o que não fez.
*1.2.
Regularmente citado, o Réu contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Na defesa por exceção, invocou a caducidade do direito de ação por força do decurso do prazo previsto no artigo 255.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de março.
Na defesa por impugnação, alegou, em síntese, que a Autora, estava obrigada a proceder aos trabalhos de demolição de acordo com as determinações do autor do projeto.
Reconheceu, no entanto, que o Município devia à Autora o montante de € 16.584,85, respeitante a trabalhos a mais, bem como a quantia referente ao elevador panorâmico, valores que não foram pagos por falta de celebração dos contratos.
*1.3.
Por articulado de fls. 66 e ss.
dos autos, a Autora respondeu à matéria de exceção vertida na contestação.
*1.4.
Realizou-se audiência preliminar, na qual foi proferido despacho saneador, relegando-se o conhecimento da matéria de exceção para o momento da decisão final, fixaram-se factos como assentes e elaborou-se a competente base instrutória.
*1.5.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento.
*1.6.
O Município de (...) apresentou alegações escritas.
*1.7.
Em 30.09.2015, o TAF de Braga proferiu sentença, que julgou a presente ação totalmente procedente, dela constando o seguinte segmento decisório: «Por todo o exposto, julga-se totalmente procedente a presente ação administrativa comum e, em consequência, condena-se o Réu no pagamento da quantia total de € 73.645,85, acrescida de IVA e juros correspondentes.
Fixo à causa o valor de € 73.645,85, indicado pela Autora e não impugnado pelo Réu, além de obedecer ao critério estabelecido no artigo 32.º do CPTA.
Custas pelo Réu- artigo 527.º do CPC e artigo 6.º, Tabela I, do RCP.
Registe e notifique.»*1.8.
Inconformado com esta decisão, o Réu interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que a decisão recorrida fosse revogada e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente.
Concluiu as suas alegações da seguinte forma: «1ª A douta sentença de que agora se recorre é inválida- nulidade da sentença ou nulidade processual -, por violação do princípio da plenitude da assistência do Juiz (cfr. artigo 605º do CPC), porque o Juiz que a proferiu não foi o Juiz que presidiu às audiências de julgamento.
De qualquer modo 2ª Estando dado como assente ( alínea K) dos factos assentes enumerados na sentença) que, no dia 23 de Junho de 2008, o Fiscal da Obra notificou a Autora, por escrito, de que o Município de (...) não aceitava as mais valias reclamadas pelos trabalhos de demolição nem a respetiva prorrogação do prazo de execução do contrato, por considerar que esses trabalhos estavam previstos no contrato de empreitada, e estando também dado como assente ( alínea W) dos factos assentes enumerados na sentença) que a presente ação foi instaurada no dia 22 de Novembro de 2010, isto é, muito depois de ter terminado o prazo de 132 dias fixado no artigo 255.º do Decreto-Lei n.º 59/99, a douta sentença incorreu em erro de julgamento, ao ter julgado improcedente a exceção da caducidade do direito de ação referente à pretensão da autora receber pelos trabalhos de demolição mais 43.458,00€ do que o preço contratual da empreitada; 3ª A Autora invocou o enriquecimento sem causa do Município de (...) em relação à sua pretensão de receber esses 43.458,00 €, razão pela qual não vale, neste caso, o prazo de três anos fixado no artigo 482.º do CC; Ainda que assim não fosse, 4ª A douta sentença do TAF de Braga incorreu em erro de julgamento ao condenar o Município de (...) a pagar à Autora 43.458,00€ por trabalhos de desmonte, numeração e transporte de pedras de granito, porque esses trabalhos estavam previstos no contrato de empreitada e já foram pagos, quando a Autora recebeu atempadamente o preço do contrato de empreitada, Apesar de tudo isto, 5ª A douta sentença objeto do presente recurso jurisdicional incorreu em erro de julgamento ao condenar o Município de (...) a pagar à Autora pelos pretensos trabalhos a mais de demolição 43.458,00€, porque, mesmo que, por hipótese meramente especulativa, fosse devido o pagamento de alguma quantia extra por esses trabalhos, essa verba nunca poderia ser de 43.458,00€, porque esse montante foi impugnado no artigo 4.º da Contestação e não foi dado como provado ou assente.
6ª O Município de (...) não impugnou os montantes que tem de pagar à Autora por trabalhos a mais de 13.612,00€, só não tendo ainda efetuado esses pagamentos porque, para isso, será necessário celebrar os contratos adicionais ao contrato de empreitada, exigidos pelo nº 7 do artigo 26º do Decreto-Lei nº 59/99, que ainda não foram firmados, por aparente indisponibilidade da Autora.
Nestes termos e nos demais de direito que serão superiormente supridos: a) deve ser declarada a nulidade da sentença (ou a nulidade processual) por violação do «princípio da plenitude da assistência do Juiz», consagrado no artigo 605º do CPC, ou, se assim não for, b) deve a doura sentença objeto do presente recurso jurisdicional ser revogada, por erro de julgamento, e ser substituída por outra que absolva o Município de (...) do pedido, em relação à pretensão da Autora de receber os tais 43.458,00€, por caducidade do direito de ação em relação a esse pedido ( cfr. artigo 255.º do Decreto-Lei nº 59/99), ou, se assim não for entendido, c)deve a presente sentença ser revogada, por erro de julgamento e substituída por outra que absolva o Município de (...) do pedido em relação à pretensão da Autora de receber esses 43.458,00€, porque os pretensos trabalhos a mais de demolição em causa já constavam do contrato e faziam parte da execução da empreitada, de qualquer modo.
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a douta sentença do TAF de Braga teria sempre de ser revogada, na parte referente à condenação do Município de (...) a pagar à Autora essa verba de 43.458,00€, uma vez que esse montante foi impugnado no artigo 4.º da Contestação e não foi dado como provado ou assente, devendo, a dar-se esse mirífico caso, os autos serem remetidos ao Tribunal a quo, para apuramento do montante a pagar à Autora»*1.9.
A Autora contra-alegou mas não formulou conclusões.
*1.10.
O Ministério Público junto deste TCA Norte, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n. º1 do CPTA, emitiu parecer, pugnando pelo não provimento do recurso jurisdicional e pela confirmação da sentença recorrida.
*1.11. Prescindindo-se dos vistos legais mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento**II.DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1.
Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado em função do teor das conclusões do Recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso –cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e artigos 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do NCPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPTA – e, por força do regime do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem no âmbito dos recursos de apelação não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
2.2. Nos presentes autos, as questões que a este tribunal cumpre ajuizar, cifram-se em saber: (i) se a decisão recorrida padece de nulidade secundária ou atípica decorrente da violação do principio da plenitude da assistência do juiz, consagrado no artigo 605.º do CPC; (ii) se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento por julgar não verificada a exceção da caducidade do direito de ação, em violação ao disposto no artigo 255.º do D.L. 59/99, de 02.03; (iii) se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento decorrente do Tribunal a quo ter omitido pronúncia em sede de julgamento da matéria de facto, não julgando provado, sequer como não provado, que o custo dos trabalhos de desmonte e de numeração das pedras como trabalhos a mais ascendesse a 43.458,00€, tal como vem alegado pela Autora.
(iv) se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento na subsunção jurídica por ter julgado os trabalhos de desmonte e de numeração das pedras de...
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