Acórdão nº 1705/19.8BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 13 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelDORA LUCAS NETO
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório I.....

, interpôs recurso da sentença do TAC de Lisboa, de 18.10.2018, que julgou a ação administrativa em matéria de asilo por si intentada totalmente improcedente, absolvendo o Ministério da Administração Interna do pedido.

As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões: «(…) A. Entende o Recorrente que andou mal a apreciação pelo Tribunal a quo da aplicação aos presentes autos do disposto nos artigos 16 ° e 17 ° e à «cláusula de salvaguarda», prevista no artigo 3 °, n ° 2, 2 ° parágrafo do Regulamento EU 604/2013, de 26.6., por duas ordens de razões: B. Em primeiro lugar, o Recorrente declarou não pretender regressar a Itália e, por outro lado, a imprensa nacional e estrangeira e organizações não governamentais apontam falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento dos requerentes de asilo em Itália.

C. incumbia ao SEF, primeiro, diligenciar pelo apuramento junto do Recorrente das suas circunstâncias pessoais e das situações vivenciadas em Itália e por informação atualizada sobre as condições de acolhimento dos requerentes de proteção internacional em Itália para, de seguida, num juízo de prognose, avaliar a situação a que o Recorrente ficará sujeito após a transferência Dublin e, por fim, decidir se procede ou não à transferência do Recorrente para a Itália.

D. Na verdade, a situação apurada exigia uma interpretação do art 3° do Regulamento de Dublin em conformidade com o princípio da solidariedade (cfr art 80° do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia).

E. Por a decisão do SEF de transferência do Recorrente para Itália, por este Estado ter aceite tacitamente a retoma a cargo do Recorrente, ser totalmente omissa, relativamente ao caso concreto do Recorrente e à situação atual de acolhimento dos requerentes de proteção internacional em Itália, não obstante o Recorrente ter referido que não queria regressar àquele país, mostra-se a sentença recorrida desconforme com o Direito.» O Recorrido, notificado para o efeito, não contra-alegou.

Neste Tribunal Central Administrativo Sul, o DMMP, notificado nos termos e para os efeitos do art. 146.º do CPTA, apresentou pronúncia no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente do processo, mas com disponibilização prévia do texto do acórdão, vem o mesmo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.

  1. 1. Questões a apreciar e decidir A sentença recorrida, entendeu que «(…) não estão reunidos os pressupostos legais para que o pedido de protecção internacional formulado pelo Autor possa ser apreciado por Portugal, como decidiu a entidade intimada, não cabendo, pois, às autoridades portuguesas, proferir decisão de mérito acerca desse pedido, por ser entidade responsável o Estado Italiano, ao abrigo do artigo 13.°, n.° 1, do Regulamento (UE) n.° 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho”, tendo, consequentemente, julgado improcedente a pretensão do A. em ver anulada a decisão da Diretora Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que considerou inadmissível o pedido de proteção internacional formulado, determinando a sua transferência para Itália, e a sua substituição por outra decisão que permitisse a análise do pedido de proteção Internacional pelo Estado Português.

    O objeto do recurso é delimitado, em princípio, pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso ainda não decididas com trânsito em julgado – cfr. art.s 635.º, 639.º e 608.º, n.º 2, 2ª parte, todos do CPC. E dizemos em princípio, porque o art. 636.º do CPC permite a ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido, situação que não se coloca nos autos.

    No caso em apreço, cumpre, assim, aferir do erro decisório imputado à sentença recorrida, que in casu, pronunciando-se no âmbito do procedimento especial que vem regulado nos art.s 36.º e ss. da Lei n.º 27/2008, de 30.06, 3..º 4.º, 5.º, 18.º e 23.º do Regulamento (EU) n.º 604/2013, de 26.07 (doravante Regulamento DublinIII), relativo à determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional, que culminou com a decisão de inadmissibilidade do pedido, ao abrigo dos art.s 19.º-A, n.º 1, e 37.º, n.º 2, da citada Lei n.º 27/2008, na seguinte vertente: a) omissão, na decisão impugnada, de adequada ponderação das condições de acolhimento de Itália e, bem assim, quanto às condições que, de momento, o sistema de asilo italiano apresenta.

  2. Fundamentação II.1. De facto Na decisão recorrida foi considerada provada, a seguinte factualidade, que não vem impugnada em recurso e que aqui se transcreve ipsis verbis: a) O autor, nasceu a 01/01/1997, em Mansabam, na Guiné-Bissau (cfr. fls. 1 do Processo Administrativo, constante de doc. n. 007986161, 23-09-2019 11:46:24 constante de fls.50 e segs. do SITAF, a que doravante faremos referência); b) No sistema Eurodac, constam com os n.s° de referência IT1NA043C1 — de 30/05/2017, NAPOLI, Itália (cfr. fls. 3 do PA); c) A 26/06/2019, o autor pediu protecção internacional ao Estado Português (cfr. fls. 1 e 14 do PA); d) A 10/07/2019, o aqui autor prestou declarações no SEF, nas quais se pode ler o seguinte (cfr. fls. 20 a 24 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido): “Porque motivo solicita protecção internacional? Foi por motivos familiares. Tive problemas com o meu pai. O meu pai tinha duas mulheres, a minha mãe e outra mulher, Quando eu nasci a minha mãe morreu. A minha madrasta tem sete filhos. O meu pai mandou os filhos todos estudar o alcorão. Eu não queria ir, queira estudar na escola normal. A partir daí começou o conflito com o meu pai, ele disse para eu sair de casa. Eu tinha 19 anos. Como eu não queria praticar a religião muçulmana o meu pai começou a maltratar- me. Ele tratava-me de forma diferente em relação aos meus irmãos e disse que seu não cumprisse as suas ordens que me matava. Foi por esta razão que decidi sair da Guiné-Bissau.

    Perante a presente informação, tem algo mais a declarar? Não quero ir para Itália e prefiro ficar em Portugal. Gosto mais de Portugal, quero poder ficar para arranjar emprego, estudar à noite e levar a minha vida normal”.

    e) A 11/07/2019 o SEF, formulou um pedido de tomada a cargo do ora autor à Itália, por registo existente no “Eurodac — Article, n.°1, b) (applicant madíe na application in anotherMember State or is in anotherMember State” - (cfr. fls. 31 do PA); f) A 26/07/2019, Portugal informou as autoridades italianas que ao abrigo do artigo 25.°, n.°1 do...

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