Acórdão nº 00598/19.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Janeiro de 2020
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 17 de Janeiro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.RELATÓRIO D.A.R.S.G., intentou ação administrativa, contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P., formulando os seguintes pedidos: a)Ser declarada a nulidade do ato praticado pelo réu, que indeferiu o pedido de pagamento à Autora das prestações de desemprego requeridas; b) Ser o réu condenado a deferir o pagamento da totalidade das prestações requeridas pela autora, nos limites e com as consequências legais.
Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese, que o despacho impugnado violou os artigos 6.º e 7.º do Decreto-Lei n.º 12/2013, de 25 de janeiro, na medida em que tanto a empresa como a Autora apresentam a situação contributiva regularizada perante a segurança social, preenchendo, desta feita, todos os pressupostos de que depende o reconhecimento da proteção social na eventualidade de desemprego dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas.
*A Entidade Demandada contestou a ação, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Na defesa por exceção, invocou a intempestividade da prática do ato processual, no que se reporta à pretensão da Autora, visto que aquando da propositura da presente ação, se encontrava esgotado o prazo previsto no artigo 58.º do CPTA ainda que considerado o regime previsto no artigo 59.º, n.º 4, do CPTA, concluindo que a verificação da referida exceção obsta ao prosseguimento dos autos para o conhecimento do mérito da causa, nos termos da alínea k) do n.º 4 do artigo 89.º do CPTA.
Quanto à defesa por impugnação, alegou, em síntese, que a Entidade Demandada a empresa “S.E.S.S., Lda.”, á data da cessação de atividade, no dia 08.09.2016, não tinha a situação contributiva regularizada perante a segurança social, o que determinou o despacho de indeferimento, datado de 06/02/2017, por estrita aplicação conjugada dos artigos 5.º, 7.º e 8.º todos do Decreto-Lei n.º 12/2013, de 25 de janeiro.
*A Autora, em sede de contraditório, pugnou pela improcedência da exceção invocada, alegando, em suma, que em outubro de 2018 o Réu criou na Autora a expectativa de que o recurso interposto estava ainda a ser apreciado pela entidade competente e, assim, a sua atuação constitui manifesto abuso de direito, na vertente de “venire contra factum proprium”, que é prevista no artigo 334.º do Código Civil.
*Foi proferido despacho saneador, relegando-se o conhecimento da matéria de exceção para momento posterior ao julgamento da matéria de facto.
* Por decisão de 11 de julho de 2019, o tribunal a quo julgou verificada a exceção dilatória de intempestividade da prática do ato processual e, em consequência, absolveu o Réu da instância.
* Inconformada com essa decisão, a Autora veio dela interpor recurso para este Tribunal Central Administrativo do Norte, formulando as seguintes conclusões: «1.
A sentença recorrida considerou julgada a exceção de intempestividade da prática de ato processual, absolvendo em consequência o réu da instância.
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A sentença recorrida considerou provado que a recorrente, em 01 de junho de 2017, interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento da atribuição de subsídio de desemprego.
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A sentença recorrida considerou ainda provado que, por ofício de 19 de setembro de 2018, o recorrido comunicou à recorrente que o seu processo havia sido remetido à entidade competente (Gabinete de Assuntos Jurídicos e contencioso), a qual iria decidir sobre o provimento ou não do recurso hierárquico interposto.
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Nesse ofício de 19 de setembro de 2018, o recorrido informou a recorrente que esta iria ser informada da decisão que viesse a ser proferida.
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Com o ofício de 19 de setembro de 2018, o recorrido criou na recorrente a expectativa de que o recurso hierárquico interposto estava ainda a ser apreciado pela entidade competente e que iria ser proferida decisão final sobre a procedência ou não do mesmo.
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Ao invés da prolação de qualquer decisão, veio o recorrido, nos presentes autos, pugnar pela intempestividade da prática de ato processual pela recorrente.
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A posição do recorrido nos presentes autos contradiz a sua conduta anterior e frustra a confiança gerada na recorrente.
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A atuação do recorrido constitui manifesto abuso de direito, na vertente “venire contra factum proprium”.
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As expectativas criadas na recorrente pelo teor do ofício enviado pelo recorrido e datado de 19 de setembro de 2018 foram frustradas com a conduta que o recorrido assumiu nos presentes autos.
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O princípio da confiança é um princípio ético fundamental de que a ordem jurídica não se pode alhear e que está presente, desde logo na norma do artigo 334º do Código Civil.
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Face ao teor do ofício do recorrido datado de 19 de setembro de 2018, a recorrente podia fundadamente confiar que, apesar do tempo decorrido, o recurso por si interposto estava a ser apreciado e que iria ser objeto de uma decisão.
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É inadmissível, e contrária à boa fé, a conduta agora assumida pelo recorrido, na exata medida que trai a confiança gerada na recorrente pelo seu comportamento anterior.
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Entende a recorrente que o comportamento do recorrido integra um venire contra factum proprium, proibido pelo artigo 334º do Código Civil, e como tal deveria ter sido sancionado pela sentença recorrida.
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A sentença recorrida fez incorreta interpretação e aplicação da lei, violando o disposto no artigo 334º do Código Civil, e como tal seve ser revogada.
Nestes termos deve o presente recurso ser julgado procedente, com as consequências legais, assim se fazendo a COSTUMADA JUSTIÇA.”*O Recorrido contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e formulou as conclusões que se seguem: “A – Veio a ora Recorrente, na presente ação, impugnar a decisão do Centro Distrital de (...) do ISS, IP, notificada pelo ofício n.º 056003, de 23/02/2017, que determinou o indeferimento do subsídio de desemprego, com os seguintes fundamentos: Não apresentar a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social (alínea c) do n.º 1 do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 12/2013, de 25 de janeiro), (cfr. fls. 228 do PA).
B – Considerando que o ofício de notificação da decisão impugnada, ofício n.º 056003, de 23/02/2017, seguiu via postal simples, presume-se que a Recorrente terá sido notificada da mesma, no dia 01/03/2017, considerando os 3 dias úteis de correio.
C - O prazo legal para a propositura de ação administrativa de atos administrativos anuláveis é de três meses, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 58º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
D – Entendendo-se que a ora Recorrente foi notificada da decisão definitiva no dia 01/03/2017, o prazo para impugnação hierárquica ou contenciosa teve início no dia 02/03/2017 e o Recorrente interpôs recurso hierárquico a 01/06/2017.
E - A utilização de meios de impugnação administrativa, tais como a reclamação e o recurso hierárquico, suspendem o prazo de impugnação contenciosa, mas não impedem a impugnação contenciosa do ato na pendência da impugnação administrativa, nos termos conjugados dos n.ºs 4 e 5 do artigo 59º do CPTA.
F - O prazo aplicável à impugnação contenciosa de atos anuláveis encontra-se previsto no artigo 58.º, n.º 2 alínea b) do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), o qual dispõe que a mesma tem lugar no prazo de 3 meses, ao que acresce o disposto no seu n.º 2 que prevê: “Sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil” G- Importa, ainda dizer que de acordo com o disposto no artigo 328º, do Código Civil: “O prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine.” H - Considerando o disposto no artigo 59.º, n.º 4 do CPTA, na redação em vigor à data dos factos, o Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciara sobre esta disposição (no seu Acórdão de 27/2/2008, relativo ao Proc. 0848/06) no sentido de que o prazo de impugnação contenciosa se suspende até à notificação da decisão de recurso hierárquico, ou até ao termo do prazo legalmente fixado para a sua decisão - que é de 30 dias úteis nos termos dos artigos 198 n.º 1 do CPA - conforme o facto que ocorrer em primeiro lugar, verificando-se que a nova redação do artigo 59º, n.º 4 do CPTA veio, precisamente, consagrar esse entendimento.
I- O certo é que o prazo legal de três meses para impugnação judicial ficou suspenso com a interposição de recurso hierárquico (facultativo).
J - Sendo, no entanto, retomado no termo do prazo de 45 dias úteis, resultante da soma do prazo de 15 dias úteis concedidos ao autor do ato impugnado para se pronunciar e remeter o processo ao órgão competente (n.º 1 do artigo 195.º do CPA) com o prazo de 30 dias úteis para decisão do recurso hierárquico a contar da data da remessa do processo (n.º 1 do artigo 198.º do CPA).
L - No caso concreto, contando 15 dias úteis a partir do dia 02/06/2017, ao qual acresce os 30 dias úteis previstos para pronúncia do órgão superior sobre o recurso hierárquico (num total de 45 dias úteis), período durante o qual o prazo de contagem para propositura da ação judicial se suspendeu (conforme o disposto no artigo 59º, n.º 4, do CPTA), retomou o seu curso no dia 04/08/2017, verifica-se que o prazo para a propositura da ação judicial terminou a 07/08/2017.
M - Considerando que a presente ação apenas deu entrada a 01/04/2019, forçoso é concluir que o prazo para a respetiva propositura já se encontrava largamente ultrapassado, pelo que a mesma é...
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